Acórdão nº 3870/20.2T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SAMPAIO
Data da Resolução20 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I - RELATÓRIO X – TÊXTEIS, SA, com sede na Rua …, Fafe, veio instaurar procedimento de decisão europeia de arresto de contas, nos termos previstos no Regulamento (EU) n.º 655/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho de 15 de maio de 2014 contra Y, com sede em …., França.

Alega para o efeito que estabeleceu com a Requerida um acordo comercial para prestação de serviços de confeção e fornecimento de máscaras. Que ficou obrigada a prestar os serviços e a entregar a mercadoria à devedora nas suas instalações, o que sucedeu, e que, em contrapartida, a devedora ficou obrigada a levantar a aludida mercadoria nas instalações da credora, a contratar o transporte e a pagar à credora os serviços prestados e os bens entregues em Portugal.

Realizada a produção de prova indicada pela Requerente, com dispensa da audiência prévia da Requerida, foi decretado o arresto europeu do valor dos depósitos bancários, até ao limite total de € 2.926.460,71, das contas aí melhor identificadas tituladas pela Requerida, sujeito à condição de prévia prestação, pela credora/Requerente, de caução no valor de €39.544,76 (trinta e nove mil, quinhentos e quarenta e quatro euro e setenta a seis cêntimos), na modalidade de penhor dos equipamentos industriais, de valor igual ou superior ao montante caucionado, pertencentes à Requerente.

*Veio a Requerida “Y”, manifestar oposição à providência de arresto decretada, invocando que a Requerente X não informou o tribunal de que está em curso uma ação judicial em França, na qual se discutem os valores dos fornecimentos a que se reportam os presentes autos e que não há perigo de não cobrança de dívida.

Indicou dois meios de prova documental, constituídos por: - certificação YX de que não há perigo de não cobrança de dívida; e - cópia traduzida da citação da feita à X para realização de audiência no dia 15.09.2020, no Tribunal de Comércio de Paris.

Por despacho proferido a 08.09.2020 (fls. 209) foi a Requerida convidada a, entre outras coisas, aperfeiçoar o seu articulado: - descrevendo os factos que, em seu entender, afastam a situação de perigo de não cobrança da dívida; - juntar tradução da petição inicial da cação alegadamente proposta contra a Requerente no Tribunal do Comércio de Paris, bem como, do articulado de contestação / oposição da Requerida, se já constar dos autos, de modo a permitir avaliar os respetivos pedido e causa de pedir.

*Na sequência do convite, a Requerida apresentou oposição aperfeiçoada: - esclarecendo que a ação que corre termos nos Tribunais Franceses, proposta pela Requerida contra a aqui Requerente, se funda no incumprimento, pelas máscaras fornecidas pela “X”, das especificações técnicas e padrões de qualidade ajustados com a Requerida, determinantes da sua retirada do mercado após queixas dos consumidores e de prejuízos avultadíssimos sofridos pela “Y” pois que foi resolvido com justa causa contrato que tinha celebrado com outro fornecedor francês, de 9 milhões de máscaras no valor de € 36.620.000,00 com o que a Requerida deixou de auferir lucros de 22 milhões de euros, a que acrescem € 1,8 milhões de retirada do mercado das máscaras defeituosas e € 100.000,00 de danos reputacionais; - invocou inexistência do receio de perda de garantia patrimonial do crédito da Requerente, já que não padece de falta de liquidez, sendo empresa consolidada no mercado e financeiramente, tendo optado por não responder à carta remetida pela Requerente por entender que deveria ter por interlocutor o W Groupe, sendo o não pagamento dos valores reclamados por outras empresas produtoras de máscaras em Portugal devido a defeitos idênticos aos detectados nas da Requerente. Mais alegou que é detida a 100% pela sociedade anónima de direito francês denominada K, integrada no Grupo C., cotado na Bolsa de Valores de Paris, com reputação de solidez e destacada actividade internacional nos sectores da protecção temporária de superfícies, entretela para vestuário, têxteis técnicos e lã penteada de luxo.

No inicio da audiência de julgamento o Mmº Juiz proferiu despacho sobre a junção de documentos pela Requerente, indeferindo a junção por considerar que, para além de intempestiva, não é relevante para a questão que importa apurar nesta audiência final, com reflexo na decisão de arresto internacional ordenada.

Após a produção de prova testemunhal, a Requerente insistiu na pertinência da junção dos documentos, o que veio a ser novamente indeferida pelos mesmos fundamentos.

O Mmº Juiz proferiu ainda o seguinte despacho: “Nos termos do despacho proferido a 08.09.2020, foi a Requerida convidada para aperfeiçoar o seu articulado de oposição que juntou, descrevendo os factos que em seu entender afastam a situação de perigo da não cobrança da dívida, para além de outros elementos que se destinavam regularizar a instância e a permitir ao tribunal conhecer o objecto do litígio, alegadamente pendente em tribunais franceses.

Na oposição aperfeiçoada junta pela Requerida, para além de matéria que se inscreve no âmbito do convite dirigido pelo tribunal, há também matéria que o extravasa, nomeadamente relativa à existência ou não do crédito alegado pela Requerida. Nesta parte, por exceder o âmbito da oposição apresentada, o tribunal entende não ser admissível produção de prova sobre o teor dos artigos não directamente relacionados com o perigo de perda da garantia patrimonial do alegado crédito da Requerente.

Termos em que determino que a prova incidirá sobre os seguintes artigos da oposição: 20º, 21º, 26º, 72º, 73º, 75º, 87º a 89º, 92º a 95º.- Notifique.

Em aditamento ao despacho acabado de proferir, esclareço as partes que, tal como em qualquer procedimento cautelar em que o contraditório é exercido posteriormente ao decretamento, é admitida também a produção de prova relativamente à matéria de facto que foi alegada pela Requerente no requerimento inicial e que foi considerada provada pelo Tribunal.

Para além do âmbito já definido, a prova incidirá também sobre esta matéria”.

*Dos despachos que antecedem foram todos os presentes devidamente notificados, do que disseram ficar bem cientes.

*Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou improcedente a oposição deduzida, mantendo o arresto europeu de contas determinado nos autos.

*Inconformada com a sentença, a Requerida interpôs recurso, finalizando com as seguintes conclusões: Do despacho proferido no início da audiência final: 1. Conforme se alegou e demonstrou, o despacho proferido pelo Tribunal a quo no início da audiência final padece de clamorosos erros de direito; 2. A Recorrente apresentou nos autos, a 27 de agosto de 2020, formulário de oposição (impugnação) ao abrigo da faculdade prevista no artigo 33.º, n.º 1, alínea a) do Regulamento (EU) n.º 655/2014, no qual, desafiando a verificação dos dois requisitos de que depende a decisão europeia de arresto de contas bancárias (a probabilidade de a Recorrida, ali Requerente, vir a obter ganho de causa no processo principal e a necessidade urgente da decisão, sob pena de, sem ela, a cobrança do alegado crédito vir a ser frustrada ou consideravelmente dificultada), alegou que: (i) está atualmente pendente, nos tribunais franceses, acção judicial instaurada pela Recorrente na qual se discutem os fornecimentos a que se reportam os presentes autos (exceção de litispendência) (cfr. 6.1.1.5. do formulário); (ii) o pedido da Recorrida baseia-se em facturas sem suporte ou correspondência com qualquer ordem de compra (cfr. 6.1.1.5. do formulário); (iii) a Recorrente, sociedade com capital social no valor de EUR 6.328.660,00, goza de perfeita saúde patrimonial e financeira, pelo que não existe qualquer risco de não cobrança do alegado crédito (cfr. 6.1.1.4. do formulário); e (iv) as circunstâncias de facto subjacentes à decisão de arresto não foram estabelecidas com precisão (cfr. 6.1.1.8. do formulário); 3. Mais tarde, respondendo ao convite que lhe foi dirigido pelo Tribunal a quo, a Recorrente apresentou nos autos versão aperfeiçoada da sua oposição, através da qual, partindo dos fundamentos já invocados no formulário anteriormente remetido: (i) juntou aos autos os documentos cuja apresentação lhe havia sido ordenada pelo Tribunal a quo, nomeadamente versões traduzidas do certificado YX e da petição inicial relativa à ação proposta, junto dos tribunais franceses, contra o W Group, a Recorrida e outras entidades portuguesas; (ii) informou os autos a respeito do estado dessa ação, bem como dos factos e fundamentos que estiveram na sua origem, em particular os avultados prejuízos por si sofridos em consequência da entrega de máscaras defeituosas confecionadas pela Recorrida, ali Ré (resolução do contrato-quadro celebrado com o operador francês P. Répartition); (iii) após descrever sumariamente o objeto da sua atividade e dar conta das razões e do contexto que a levaram a dedicar-se à produção de máscaras de proteção sanitária, narrou, de forma sintética, os factos da relação comercial por encetada com o W Group, operador francês do ramo da indústria da moda, esclarecendo também que foi no âmbito dessa relação que o fabrico das máscaras dos autos veio a ser confiado à Recorrida; (iv) em estreita relação com o referido em (iii) e, bem assim, com a ação então pendente nos tribunais franceses, deu conta das razões por que se recusara a liquidar o crédito invocado nos autos, a saber: - por um lado, o carácter defeituoso (falta de resistência à lavagem) de parte significativa das máscaras entregues pela X; - por outro, o facto de o pedido da X se basear em faturas sem correspondência com qualquer ordem de compra, visto que as máscaras a que tais faturas se reportam foram fabricadas ao arrepio das instruções transmitidas pela Recorrente ao W Group; (v) alegou factos que, atestando da robustez da sua situação patrimonial e também da solidez da sua situação financeira, permitem comprovar a inexistência de qualquer risco de não cobrança da...

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