Acórdão nº 2927/18.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Maio de 2021
Magistrado Responsável | MARIA CRISTINA CERDEIRA |
Data da Resolução | 13 de Maio de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO M. S.
intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra X, Automóveis, Lda.
, pedindo que seja:
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Declarado resolvido o contrato de compra e venda do veículo identificado no artº. 1º da petição inicial, celebrado entre A. e Ré; b) Condenada a Ré a restituir à A. o valor que pagou pela compra do veículo identificado no artº. 1º da petição inicial, no montante de € 26.750,00, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento; Caso assim se não entenda: c) Condenada a Ré a substituir a viatura automóvel da A. por outra viatura, nova, da mesma marca, modelo, versão e ano; Caso ainda assim se não entenda: d) Condenada a Ré a reparar definitivamente a avaria do veículo em apreço identificada no artº. 34º da petição inicial e que gera os sinais identificados no artº. 7º do mesmo articulado, sob pena de ficar obrigada a pagar uma sanção pecuniária compulsória nunca inferior a € 2.500,00 por cada vez que a mesma surgir, após cada reparação.
Em todo o caso: e) Condenada a Ré a pagar à A. uma indemnização a título de danos não patrimoniais nunca inferior a € 5.000,00, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese, que a Ré é concessionária da marca K, comercializando e prestando serviços de reparação e manutenção de veículos automóveis daquela marca, e em 1/12/2015 vendeu à A. um veículo automóvel da marca K, modelo Civic Tourer Elegance Navi, 1.6 diesel, 120cv, com a matrícula QP, em estado novo, para seu uso pessoal, pelo preço de € 26.750,00, pago a pronto.
A Ré concedeu uma garantia de 5 anos ao veículo em apreço, que cobria qualquer problema/defeito que o mesmo apresentasse.
Sucede que, decorridos dois meses após a compra, mais concretamente em 13/02/2015 (sábado), quando a A. circulava com o veículo, no painel de instrumentos por cima do volante acendeu-se a “luz indicadora de avaria no motor” e apareceu inscrita a menção “verificar sistema”, tendo a A. em 15/02/2016 (2ª feira) levado o veículo à oficina da Ré para reparação de tal problema. Nessa altura o veículo tinha percorrido 4.480 Km, distância que marcava no respectivo conta-quilómetros. No final desse dia, quando procedeu à recolha do veículo, verificou que os sinais de alerta tinham desaparecido do painel de instrumentos.
Esta situação repetiu-se nos dias 4/04/2016 (nesta data o veículo marcava 7.775 Km no respectivo conta-quilómetros), 15/06/2016, 8/09/2016, 11/09/2016 e 20/09/2016, sendo que nesta última data, o chefe da oficina comunicou à A. que a marca K iria enviar um “sensor melhorado” para resolver definitivamente o problema da viatura, tendo o veículo sido deixado na oficina da Ré em 12/10/2016 para esse fim.
Acontece que, nos dias 26/12/2016 e 12/01/2017, o veículo voltou a exibir as mencionadas luzes no painel de instrumentos, sendo que nestes dias a A. voltou a levá-lo à oficina da Ré, que fez uma “reprogramação/reaprendizagem” do sensor colocado em 12/10/2016 e as luzes desapareceram do painel.
No dia 22/04/2017, o veículo voltou a apresentar os sinais de alerta identificados no artº. 7º da petição inicial e em 28/04/2017 a A. voltou a conduzi-lo à oficina da Ré, onde permaneceu das 9h às 17h30, mas foi devolvido com as luzes acesas no painel de instrumentos. Nesse dia 28/04/2017, a Ré pediu à A. que voltasse a levar o veículo no dia 9/05/2017, para tirar fotografias ao motor e ao sensor, bem como para reparar o problema que o veículo apresentava, o que ela fez.
Em 9/05/2017, ao instalar o veículo no elevador, para o levantar e tirar fotografias, a Ré danificou a embaladeira, amolgando-a, por baixo da porta do condutor, mas entregou o veículo sem que o mesmo apresentasse os sinais de alerta.
No dia 7/07/2017, o veículo voltou a apresentar as luzes no painel de instrumentos, a A. voltou a levá-lo à oficina da Ré e recolheu-o no final do dia, tendo verificado que tais “sinais” haviam desparecido do painel. Em 9/08/2017, o veículo voltou a apresentar os mesmos “sinais de alerta”, a A. levou-o à oficina da Ré, onde foi observado por um engenheiro, foi trocado o sensor e devolvido sem as luzes acesas no painel de instrumentos.
Em 4/09/2017, a A. conduziu novamente o veículo à oficina da Ré para que esta reparasse os danos que havia causado na embaladeira no dia 9/05/2017, o que foi feito.
Nos dias 13/11/2017, 11/12/2017, 19/12/2017, 26/12/2017, 19/01/2018, 25/01/2018, 1/02/2018, 5/02/2018, 9/02/2018, 13/04/2018 e 12/06/2018 (contando nesta última data com 50.870 km), o veículo acendeu as ditas luzes no painel de instrumentos e, de todas essas vezes, foi levado à oficina da Ré para reparação e devolvido supostamente com a anomalia resolvida, ou pelo menos, sem que os tais sinais de alerta aparecessem no painel de instrumentos.
Depois de ter sido sujeito a mais de vinte intervenções na oficina da Ré, o problema persiste, pois o veículo da A. padece de uma incapacidade de regeneração do filtro de partículas diesel e dos orifícios das sondas de oxigénio do veículo, que quando colmatados por fuligem tornam impossível a viabilidade de utilização do veículo, circunstância de que a A. só veio a tomar conhecimento por carta que lhe foi enviada pela K em finais de Maio de 2018.
Na sequência desta comunicação e após o chefe da oficina da Ré lhe ter dito que não tinha mais soluções para resolver o problema do veículo, em Junho de 2018 a A. solicitou uma reunião com os responsáveis da Ré e os representantes da K, numa última tentativa de resolver definitivamente o problema do seu veículo, a qual teve lugar em 29/06/2018, tendo a A. comparecido na esperança de que lhe fosse efectivamente proposta uma solução para o problema do veículo, seja através da substituição por um veículo idêntico ou através do reembolso do dinheiro que havia despendido com a compra.
Todavia, a única solução que a Ré propôs à A., após vistoriar o veículo nas suas instalações, foi que esta colocasse um aditivo a cada 5 depósitos de gasóleo, a expensas suas, com o objectivo de dilatar o espaço de tempo entre avarias, tendo sido ainda informada pela Ré que teria de suportar as reparações que se afigurassem necessárias daí para a frente, pois a K já não as iria suportar mais.
Esta anomalia/avaria determina que, logo que as luzes de aviso apareçam no painel de instrumentos, o veículo não possa mais ser utilizado, sob pena de o sistema de controlo das emissões e o motor poderem ficar danificados.
Acrescenta que tendo a Ré vendido à A. um veículo automóvel com deficiência ou defeito, que não apresentava, como não apresenta, as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, assiste à A. o direito a ver resolvido o contrato de compra e venda do veículo em apreço celebrado com a Ré e peticionar o reembolso do dinheiro que pagou, de harmonia com o preceituado nos artºs 406º, 432º, 763º, 879º e 882º do Código Civil e nos artºs 2º, nº. 1 e 4º da Lei de Defesa do Consumidor.
Refere, ainda, que por via de toda esta situação, a A. sofreu, como continua a sofrer, muitos incómodos, transtornos, chatices, aborrecimentos e muitas perdas de tempo, nomeadamente em deslocações para tentar resolver esta situação, recolha de elementos, documentos, testemunhas, envio de cartas, consultas na Deco, em advogado e reuniões com a Ré. E com a proposta feita pela Ré para “resolver” o problema do seu veículo, sentiu-se enganada, ludibriada, incomodada, desgostosa e passou muitas noites sem dormir, sofreu nervosismo e ansiedade, devendo ser-lhe atribuída quantia não inferior a € 5.000,00 para compensação de todos estes danos não patrimoniais sofridos.
A Ré contestou, excepcionando a sua ilegitimidade para ser demandada na presente acção, por se tratar de uma concessionária da marca de automóveis K, que é representada em Portugal pela sociedade Y Portugal, S.A., a qual se dedica à importação para o território nacional de veículos novos da marca K, peças sobressalentes, acessórios e respectivos equipamentos e sua distribuição, através de uma rede comercial constituída por concessionários independentes, que a Ré integra, e também representa a K no território nacional para efeitos de garantia legal e/ou contratual de que beneficiam as viaturas novas comercializadas na rede de concessionários, pelo que caso haja defeito de fabrico, como alega a A., deverá ser chamado o fabricante ou, no caso, o importador para território nacional dos veículos automóveis daquela marca, a Y Portugal, S.A.
Mais alega que mesmo que se considere que a viatura em causa padece efectivamente de um defeito, sempre se estará, “in casu”, no âmbito da cobertura e aplicação da garantia legal de que a viatura beneficia e, no caso concreto, da garantia contratual de 5 anos de que o veículo da A. beneficia, sendo tal garantia da responsabilidade da marca K e do seu representante em Portugal, não tendo a aqui Ré qualquer responsabilidade na mesma.
Por esta razão, no caso dos autos, foi a K através da Y, que respondeu por escrito às reclamações da A. e declinou a existência de defeito da viatura e obviamente a cobertura do mesmo pela garantia de que o veículo gozava na data, pelo que deveria o fabricante da viatura ou o seu representante no território nacional ser chamado aos presentes autos, não tendo a Ré qualquer interesse em contradizer.
A Ré impugnou, ainda, a matéria de facto alegada na petição inicial, invocando que o defeito alegado pela A. resulta exclusivamente de uma utilização inadequada do veículo automóvel em causa por parte daquela, face às características técnicas e parâmetros de utilização definidos pela marca para o mesmo, sendo que a garantia K (extensão 5 anos) exclui do seu âmbito a reparação de qualquer avaria causada pelo uso indevido ou negligente da viatura.
A A. esteve pela última vez nas oficinas da Ré em 18/06/2018, tendo a...
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