Acórdão nº 174/16.9T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelRAMOS LOPES
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1)*RELATÓRIO Apelantes (autores): M. L. e marido, A. L..

Apelados (co-réus): A. R. e M. J. e mulher, M. T..

Juízo local cível de Peso da Régua – Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real.

*M. L. e marido, A. L. instauraram a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, demandando A. R. e M. J. e mulher, M. T., pedindo: a) fosse declarado serem eles (autores) os legítimos proprietários do prédio que identificam no primeiro artigo da petição inicial, b) fosse declarado que esse seu prédio é encravado, nos termos dos artigos 12º a 41º da petição, e fosse declarada a constituição judicial de uma servidão de passagem, a pé e de carro, a favor desse seu prédio e onerando os prédios referenciados nos artigos 13º e 14º da petição, pela faixa de terreno/caminho caracterizada nos artigos 12º a 16º e 42º da petição, c) fosse o primeiro réu condenado i) a repor o sistema manual de abertura do portão (fechadura com trinco) colocado no início da faixa de terreno, entregando a respectiva chave aos autores ou, mantendo o sistema eléctrico de abertura que aí colocou, entregando-lhes o respectivo comando, ii) a manter a faixa de terreno/caminho livre e desimpedida ao trânsito, a pé e de carro, e iii) a recolocar na caixa do correio o número da porta dos autores que retirou.

Alegaram, em síntese, factos tendentes a demonstrar ser titulares do direito de propriedade sobre o prédio urbano que descrevem no artigo 1º da petição inicial (cuja aquisição a seu favor se mostra inscrita nas tábuas do registo), descrevendo depois como a tal imóvel acedem - a partir de caminho público, tanto a pé como através de veículos automóveis, por faixa de terreno parcialmente implantada em metade da sua largura no logradouro de prédio urbano propriedade do primeiro réu (e descrito no artigo 13.º da petição inicial), que confronta com o dos autores pelo lado sul, e, na outra metade da sua largura, no prédio rústico dos segundos réus (descrito no artigo 14.º da petição inicial). Mais alegam que o seu prédio confronta a poente e a nascente com caminhos públicos, caminhos que apenas lhes permitem entrar no seu prédio a pé e com dificuldade, pois, para além de muito estreitos, são íngremes e compostos em parte por escadas e em parte por terra batida, não sendo possível realizar obras para permitir o acesso de veículos automóveis. Alegam ainda que em 2015 o primeiro réu passou a impedir a passagem pelo logradouro do seu prédio, deixando os autores de poder aceder ao seu imóvel com veículos automóveis.

Contestou o réu A. R. pugnando pela improcedência da acção. Invocou a ilegitimidade activa, por não serem os autores os proprietários do prédio identificado no artigo 1º da petição inicial, já que o venderam a terceiros antes da propositura da presente acção. Alegou ainda que a passagem objecto da acção se encontra inteiramente implantada no logradouro do seu prédio descrito no artigo 13º da petição inicial e que o prédio descrito no artigo 1º da petição não está encravado, trazendo a constituição da pretendida servidão prejuízo para a normal utilização do seu prédio (pela devassa que constitui para sua vida privada, uma vez que a parcela em causa, constituindo logradouro do seu prédio, constitui o único acesso à sua residência), além de que se não podem constituir servidões de passagem por prédios urbanos. Sustentou, por fim, acarretar a procedência do pedido a fixação de uma indemnização pelos prejuízos causados ao prédio serviente.

Convidados a exercer o contraditório em articulado a tal destinado, alegaram os autores ter sido simulado (simulação absoluta) o negócio jurídico de compra e venda do seu prédio (tendo já celebrado, entretanto, novo contrato de compra e venda por via do qual adquiriram o imóvel).

Prosseguiu a causa a normal tramitação e, saneado o processo, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, foi designada data para realização de julgamento.

Iniciado o julgamento e realizadas duas sessões, viria a ser agendada outra continuação, tendo entretanto os autores requerido, ao abrigo do disposto no art. 598º, nº 2 do CPC, a inquirição duma testemunha, pretensão indeferida por despacho de 23/10/2019. Por se não conformarem com tal decisão, dela apelaram os autores, tendo porém a interposição do recurso sido indeferida por não terem os recorrentes procedido ao pagamento da multa devida pela intempestiva interposição (despacho de 28/01/2020).

Findo o julgamento foi proferida sentença que julgou totalmente improcedente a acção.

Inconformados, apelam os autores, terminando as suas alegações formulando as conclusões que se transcrevem: 1ª- No dia 27 de janeiro de 2020 foi, no âmbito destes autos, prolatada douta sentença, que tendo julgado, como julgou, tal ação totalmente improcedente, é completamente desfavorável aos autores, sentença essa que constitui o objeto do presente recurso.

  1. - Tendo a total improcedência da ação decorrido, designadamente, da Meritíssima Senhora Doutora Juíza que proferiu a sentença recorrida, não ter considerado, como não considerou, provado, sem contudo ter considerado isso não provado, que os autores, na data em que intentaram a presente ação, já tinham adquirido, por usucapião, a propriedade, sendo pois dele proprietários, situação essa que se mantém atualmente, do prédio, a favor do qual peticionaram que fosse constituída uma servidão de passagem, ou seja, do prédio mais bem identificado no artigo 1º, da petição inicial, e ter considerado, como considerou, não provados, os factos constantes dos pontos A., B., C. e D., todos sob a epigrafe "B - Factos não provados", de tal sentença.

  2. - O que não pode merecer, nem merece, a concordância dos recorrentes, na medida em que os mesmos entendem que o facto deles terem adquirido a propriedade do prédio em causa por usucapião deveria ter sido dado como provado, o mesmo sucedendo com os atrás referidos factos, constantes dos pontos A., B., C. e D., todos sob a epigrafe "B ¬Factos não provados", da sentença sob apelação, por ser isso aquilo que decorre da prova produzida nos autos, o que, só por si, seria, ou será, suscetível de conduzir à procedência do presente recurso, o mesmo sucedendo aliás com a impugnação, que adiante no texto se vai fazer também, da matéria de direito.

  3. - Indo pois, no presente recurso, os recorrentes impugnar matéria de facto (artigo 640.°, do CP C) e matéria de direito (artigo 639.°, do CPC).

  4. - E, quanto ao que a tal matéria de facto tange, especifica-se, em cumprimento do artigo 640.°, do CPC, o seguinte: A) Os concretos pontos de facto que os recorrentes consideram que foram incorretamente julgados na sentença sob recurso (artigo 640.º-I-a), do CPC), são, por um lado, o facto dos recorrentes terem adquirido a propriedade do prédio atrás referido por usucapião, facto esse que deveria ter sido considerado provado, e não foi, e, por outro lado, os factos elencados nos pontos A., B., C. e D, todos sob a epigrafe "B - Factos não provados", de tal sentença, factos esses que não deviam ter sido considerados, como foram, não provados, não só por isso ser, como é, incompatível com a aquisição por usucapião em causa, mas também porque tais factos deveriam antes ter sido considerados provados, sendo tais cinco factos, esclareça-se, aqueles que de seguida vão ser indicados, tendo todos eles, naturalmente na opinião dos recorrentes, relevância para a sorte desta ação, na qual, repita-se, e ao contrário daquilo que sucedeu, o primeiro deveria ter sido dado como provado, e, os quatros seguintes, não deveriam ter sido considerados como não provados, antes devendo sê-lo como provados.

    Facto 1 Os requerentes quando, como autores, propuseram a presente ação, tinham já adquirido, por usucapião, sendo pois dele proprietários, o prédio mais bem identificado no artigo 1.°, da respetiva petição inicial, isto é, o prédio urbano, sito no lugar do ..., da freguesia de ..., do concelho de ..., inscrito, na matriz predial respetiva, sob o artigo ..., e descrito, na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o nº ... - Freguesia de ....

    Facto 2 Os segundos réus doaram verbalmente à autora M. L., em Fevereiro de 1986, o imóvel descrito no facto 1.

    Facto 3 À data da doação aludida em A, os segundos réus possuíam, administravam e benfeitorizavam, como se de coisa sua se tratasse, à vista e com o conhecimento de toda a gente, o imóvel descrito no facto 1.

    Facto 4 Na sequência da doação referida em A, a autora M. L. entrou imediatamente na posse exclusiva do imóvel em causa, o que, depois com o marido, vem sucedendo até à presente data.

    Facto 5 Desde há mais de vinte anos que foram sempre os segundos réus, e depois os autores, que reconstruíram, habitaram e benfeitorizaram, como bem lhes aprouve, e pagaram as contribuições do imóvel descrito no facto 1, à vista e com o conhecimento de toda a gente, sem oposição de ninguém, ininterruptamente, agindo e comportando-se como seus verdadeiros e exclusivos proprietários e na convicção de que com a sua posse não lesavam direitos de outrem.

    1. Os concretos meios probatórios, constantes do processo, muito embora não de registo ou gravação nele processo realizados, que impunham decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (artigo 640.º-l-b), do CPC), isto é, que impunham que o Facto 1, constante da alínea A) anterior, que, relembre-se, é relevante para a decisão, devesse ter sido considerado como provado, e que os restantes quatro factos, isto é, o Facto 2, o Facto 3, o Facto 4 e o Facto 5, da mesma alínea A) constantes também, não devessem ter sido considerados como não provados, não só por isso ser, como é, incompatível com ser dado como provado o Facto 1 atrás referido, mas também porque esses Facto 2, Facto 3, Facto 4 e Facto 5 deveriam antes ter sido considerados como provados, consistem, apenas e unicamente, em prova documental e em prova por acordo das partes.

    Consistindo a prova...

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