Acórdão nº 228/17.4T8PTL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Data da Resolução26 de Novembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório A. P.

instaurou, em 29/03/2017, a presente acção especial de interdição/inabilitação contra R. G.

, sua mãe, pedindo que fosse decretada a interdição da requerida fixando-se o início da incapacidade em Janeiro de 2008 e, caso assim não se entendesse, que fosse decretada a inabilitação da mesma fixando-se o início da incapacidade na mesma data.

Para tanto alegou, em síntese, que a requerida tem 78 anos de idade e desde 2007 tem vindo a perder progressivamente a sua audição, o que interfere no desenvolvimento da linguagem e da fala. Acresce que desde Janeiro de 2008 que a requerida apresenta um quadro de demência e de debilidade, o que a torna incapaz para governar a sua pessoa e bens.

*A requerida contestou impugnando a quase totalidade da factualidade alegada pelo autor e requerendo que a acção seja julgada improcedente.

*Procedeu-se a exame pericial à requerida e foi junto relatório de perícia médico-legal.

*Foi proferido despacho que decidiu não proceder a interrogatório da requerida naquela concreta fase processual.

Foi dispensada a audiência prévia, foi fixado o valor da acção, foi proferido despacho saneador, foi fixado o objecto do litígio, foram enunciados os temas da prova, foram admitidos os requerimentos probatórios tendo sido ordenado novo exame médico.

*Procedeu-se a novo exame pericial que teve lugar em 09/10/2018 no Gabinete Médico-Legal de Braga, instalado no Hospital desta cidade.

Em 19/10/2018 o requerente arguiu a nulidade do acto de perícia médico-legal dizendo que a sua mandatária, munida de poderes especiais, apresentou-se no gabinete médico-legal de Braga no dia e hora designados, mas não pôde acompanhar a perícia. Juntou recibo de pagamento de parque de estacionamento junto do Hospital de Braga.

A requerida pronunciou-se impugnando o documento junto. Mais referiu que a presença do mandatário do requerente ofenderia o seu pudor. Sendo este um processo especial aplica-lhe estas normas (art. 546º do C.P.C.). Uma vez que do art. 580º nº 3 do C.P.C. não resulta a obrigatoriedade da parte estar presente num exame pericial não se pode falar em omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreve (art. 195º nº 1 do C.P.C.). Acresce que as observações que as partes podem fazer não têm a virtualidade de influir na decisão.

O tribunal convidou o requerente a esclarecer por que razão não pôde acompanhar tal diligência tendo este esclarecido que a sua mandatária chegou ao local pelas 09H20, foi informada que a perícia estava a decorrer, pediu para informar o perito da sua presença, foi-lhe pedido que aguardasse, a perícia terminou pelas 09H35 sem que tivesse podido acompanhar a mesma.

O tribunal proferiu em 22/11/2018 (conclusão de 16/11/2018) o seguinte despacho: “Indefere-se à arguida nulidade: não só o requerente não deu conta de um único facto que permita concluir que a ausência da sua mandatária influenciou os termos em que a perícia médico-legal foi realizada (artigo 195.º, 1 do CPC), como se entende que um exame médico-legal no âmbito da psiquiatria forense contende necessariamente com a intimidade psíquica do visado e, nessa medida, a presença de advogados, em especial de advogados não mandatados pelo examinado, é ofensiva do pudor, que, como é evidente, não se restringe à exposição física (artigo 480.º, 3 do CPC). Aliás, os motivos que presidem à exceção levada ao artigo 3.º da Lei 45/2004 têm também, se não por maioria, por igualdade de razões, toda a aplicabilidade ao regime civil das interdições.

Por último, tendo em contas as características do tipo de perícia em causa, não se vê que nela possa estar presente qualquer outra pessoa que não a indicada pelo próprio examinado, conforme se esclarece no artigo 6.º, 3 da Lei 45/2004. Ao examinado bastará já a circunstância de, por ter sido demandado, ser obrigado a sujeitar-se a perícia.

As custas do incidente são a cargo do requerente, que a elas deu causa, que se fixam em 2UC (artigo 7.º RCP e tabela II anexa).”*Entretanto foi junto o relatório de perícia médico-legal.

*Foi designada data para a realização de audiência final, na qual foi proferida sentença que julgou extinta a acção por impossibilidade superveniente da lide por o requerente não ter legitimidade.

Desta decisão foi interposto recurso e por Acórdão de 12/09/2019 foi revogada esta sentença e ordenado que os autos prosseguissem “alertando a primeira instância para a necessidade de audição obrigatória da requerida”.

*Procedeu-se a audiência de julgamento.

No decurso da mesma o Tribunal proferiu decisão que considerou ser detentor de prova bastante e que indeferiu o requerido pelo Requerente em requerimentos probatórios apresentados depois da contestação. Desta decisão foi interposto recurso tendo vindo a ser proferido Acórdão em 01/10/2020 que confirmou a decisão recorrida (Proc. 147/20.7YRGMR) tendo o mesmo transitado em julgado.

*Procedeu-se a audiência de julgamento na qual se procedeu à audição da requerida.

Após, foi proferida sentença, cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos: “Por todo o exposto, julga-se a ação totalmente improcedente, absolvendo-se a requerida do pedido. (…)”*Não se conformando com esta sentença veio Requerente dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela Instância Local de Ponte de Lima do Tribunal Judicial de Viana do Castelo, no processo supra referido, de acordo com a qual, “(…) se a ação totalmente improcedente, absolvendo-se a requerida do pedido.” 2) Recorre-se, ainda, do despacho interlocutório com a referência 43199180 datado de 16-11-2018, que indeferiu a nulidade arguida tempestivamente através de requerimento datado de 18-10-2018 com a referência 2114516 e com os esclarecimentos constantes do de requerimento datado de 12-11-2018 com a referência 30674501.

3) Salvo o devido e merecido respeito, o Recorrente não formulou um pedido, mas sim dois pedidos: um de interdição, e caso assim não se entendesse foi requerida a inabilitação fundada em prodigalidade.

4) Em 29/03/2017, o Requerente, ora Recorrente, instaurou a presente ação especial de interdição e/ou inabilitação contra a Requerida, sua mãe, alegando, em síntese, que que a mesma contava com 78 anos de idade e desde 2007 tem vindo a perder progressivamente a sua audição, o que interfere no desenvolvimento da linguagem e da fala, apresentando, ainda, desde janeiro de 2008, um quadro de demência e de senilidade.

5) Para além destes o Requerente assentou a presente acção também em prodigalidade, alegando factos para esse efeito. (Cfr. com petição inicial, factos vertidos de 14º a 55º e com fundamentação da sentença - pontos D) a R) da matéria de facto dada como provada e 14), 15), 17), 18) da matéria de facto dada como não provada.

6) Não pode, todavia, e salvo o devido respeito, a apelante conformar-se com a decisão do tribunal a quo, insurgindo-se contra os seguintes pontos:

  1. Matéria de facto dada como provada; b) Apreciação e interpretação da matéria de facto dada como provada; c) Aplicação do direito à matéria de facto dada como provada.

7) Atenta toda a prova produzida, quer documental, quer testemunhal em sede de audiência de julgamento, de forma totalmente incompreensível, foram dados como provados factos que, salvo o devido respeito por melhor opinião, deveriam ter merecido resposta negativa, e outros, ao invés, que foram julgados não provados quando deveriam ter sido julgado provados, e que a sê-lo, teriam levado certamente a uma decisão diversa.

8) Tendo a prova sido devidamente gravada, o presente recurso pode ser, e é, de facto e de direito.

9) Determina o artigo 615º do Código de Processo Civil, n.º 1, alínea c) e d) que, “É nula a sentença quando: Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;” – (Sublinhado nosso).

10) O dever de fundamentar as decisões (artigo 154.º do NCPC) impõe-se por razões de ordem substancial – cabe ao juiz demonstrar que, da norma geral e abstracta, soube extrair a disciplina ajustada ao caso concreto – e de ordem prática, posto que as partes precisam de conhecer os motivos da decisão a fim de, podendo, a impugnar.

11) Conforme referido supra o Recorrente ao abrigo de legislação anterior formulou dois pedidos: um de interdição e outro de inabilitação fundada em prodigalidade, alegadando, para tanto factos, ou no dizer da lei – comportamentos da Requerida. - (Cfr. com artigo 138º do CC).

12) Face à matéria dada como provada, confronte-se com a fundamentação da sentença - pontos D) a R) da matéria de facto dada como provada – a sentença padece de uma completa ausência de fundamentação ou explicação lógica e racional quanto aos comportamentos exibidos pela Requerida (artigo 138º do actual Código Civil) se enquadrarem ou não no conceito/instituto da prodigalidade, bastando-se com: 13) “Agora, nos termos do artigo 138.º do Código Civil (doravante CC), na redacção da Lei 49/2018 de 14.8, o maior impossibilitado, por razões de saúde, deficiência ou pelo seu comportamento, de exercer, plena, pessoal e conscientemente os seus direitos, ou de, nos mesmos termos, cumprir os seus deveres, beneficia das medidas de acompanhamento previstas no CC. Ora, não há a mínima demonstração de que a requerida não exerça de forma plena, pessoal e consciente, os seus direitos ou que não cumpra os seus deveres. E tanto basta para, com absoluta desnecessidade de quaisquer outros considerandos, concluir pela improcedência da ação.” – (Cfr. com sentença recorrida).

14) Salvo o devido e merecido respeito por opinião diversa, em face da matéria dada como provada - fundamentação da sentença - pontos D) a R) da matéria de facto dada como provada – a douta sentença nem sequer...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT