Acórdão nº 3195/19.6T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Intentou J. C. a presente especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, prevista no artigo 98º-B a 98 a 98º - P do C.P.T., face ao despedimento por justa causa de que foi alvo por parte da empregadora “X & Companhia”.

A entidade empregadora veio apresentar o seu articulado a motivar o despedimento, pugnando pela licitude do mesmo, juntando o procedimento disciplinar.

O trabalhador contestou, suscitando a caducidade do procedimento disciplinar e a sua invalidade e negando a prática dos factos que lhe são imputados, pedindo que seja declarada a ilicitude do despedimento, deduzindo pedido reconvencional pedindo a condenação da ré a reintegrá-lo e a pagar-lhe o valor das retribuições que deixou de auferir – incluindo subsídio de férias e de Natal e subsídio de alimentação – desde 16/04/19 até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, deduzida dos valores que recebeu a título de subsídio de desemprego e a quantia de 15.000€ a título de danos não patrimoniais, tudo acrescido de juros de mora.

A ré respondeu, nos termos de fls. 290-294.

Foi proferido despacho saneador no qual foi indeferida a invocada invalidade do procedimento disciplinar, parcialmente apreciada a invocada caducidade e relegada para final a apreciação no que respeita aos factos ocorridos em 15/02/2018 e outubro de 2018.

Foi realizada a audiência de julgamento, na qual o autor optou pela sua reintegração.

Realizado o julgamento foi proferida decisão: Pelo exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado e, consequentemente, a) declaro ilícito o despedimento do autor promovido pela ré; b) ordeno a reintegração do autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, com efeitos desde 13/03/19; c) condeno a ré a pagar ao autor a retribuição base no montante de 3.060,57€ que deixou de auferir desde 13/03/19 – cfr. artigo 390.º, n.º 2, b) - até à data do trânsito em julgado desta decisão, deduzidas das importâncias que o autor recebeu, desde o despedimento até à data do trânsito em julgado desta sentença, a título de subsídio de desemprego, que deverão ser entregues, pela ré à Segurança Social; e d) no mais, absolvo a ré do pedido.

Inconformados interpuseram recurso o trabalhador e a ré.

A ré apresentou as seguintes conclusões: A. Perante a factualidade dada como provada não pode a R., ora Recorrente, conformar-se com o teor decisão de falta de verificação de justa causa de despedimento e suas consequências, nomeadamente, porque para apreciação dessa ilícita conduta do A., dada com provada, importavam outras circunstâncias de facto, também dadas com provadas, que foram omitidas, nomeadamente, sobre o quadro de gestão a empresa, a relação entre as partes, entre os demais trabalhadores e o grau de lesão dos interesses da R..

  1. Verifica-se existirem depoimentos de testemunhos cuja devida apreciação pelo tribunal a quo obrigaria a uma decisão de facto diferente daquela de ora se recorre, pois, relativamente ao dia 25/11/2018, a R. também alegou que nesse dia o A. “... saiu antes das 13:16 horas, voltando a entrar somente às 17:00 horas para fazer uma transferência de um artigo para a loja n. ..., sita em Vila Verde, tendo saído entre as 19:00 e as 19:30 horas.” (vide artigo 24.º, do articulado inicial).

  2. Porém, o tribunal a quo entendeu na sob a alínea 3), da sentença, que esse facto não resultou provado (vide página 6, da sentença), tendo fundado essa convicção no insuficiente depoimento prestado pela chefe de loja de ..., a senhora C. M. (vide ponto 7, das alegações acima).

    … G. Perante a análise desta prova testemunhal e, inclusive, seguindo o sentido da motivação que a acolheu, impunha-se ao tribunal a quo uma decisão diferente que acolhesse parte do teor fáctico vertido e demonstrado dessa alínea 3), dos factos não provados, ou seja, que no dia 25/11/20018, entre as 13:45 horas e as 14:30 horas, o A. não compareceu na loja de ....

    … J. Pelo que deverá ser aditada à matéria de facto provada um novo ponto (EE.), com o seguinte teor “No dia 25/11/2018, entre as 13:15 horas e as 14:30 horas, o A. não compareceu na loja de ...” ou, caso prevaleça somente a motivação na parte fundada apenas no depoimento da testemunha J. M., “No dia 25/11/2018, entre as 13:45 horas e as 14:30 horas, o A. não compareceu na loja de ...” ou outra formulação que o tribunal ad quem mui doutamente melhor se entenda.

  3. Sem conceder minimamente no acima exposto — essencialmente, por relevar à plena corporização da conduta do A. reconhecida pela sentença como um dos ilícitos laborais que lhe é imputável —a natureza da matéria de facto então já dada como provada era per se bastante para impor um juízo sobre a justa causa de despedimento diametralmente diferente daquele que subjaz à sentença, caso junto houvesse sido ponderado, mas não foi, o acervo da matéria assente relativa ao quadro de gestão a empresa, à relação entre as partes, entre os demais trabalhadores e o grau de lesão dos interesses da R.; L. Ora, desse acervo importam, determinantemente, a cimeira posição de chefia e efetiva direção da gestão pelo A. de cinco estabelecimentos de supermercado da R. e do total de 120 trabalhadores, entre os quais 20 chefias de linha hierárquica inferior, em que o A. Foi investido pela R., exercendo as correspondentes funções com autonomia e sem supervisão direta de um superior hierárquico, conforme constante dos pontos F, G, H e DD dos factos provados M. Perante tal factualidade é impraticável procurar escamotear-se à pauta de apreciação da justa causa de despedimento o intenso investimento de confiança que a R. depositou no A. e, vice-versa, o correspondente e insubstituível cumprimento do dever de lealdade deste para com aquela; N. Quando a sentença recorre ao citado Acórdão de 22.03.2017, do Tribunal da Relação de Lisboa (vide ponto 2 das alegações acima), para fundamentar o seu juízo de desproporção da sanção de despedimento, face à ilicitude e gravidade da conduta sub iudice, labora manifestamente em erro de apreciação da prova de que dispunha, e lhe era exigível considerar, por força do comando legal ínsito no n.º 3, do artigo 351.º, bem como do n.º 4, do artigo 387.º, ambos do Código do Trabalho.

  4. Porém, quanto à “porta da desconfiança”, o mesmo não se passa com as condutas dadas como provadas quanto ao trabalhador Chefe de Vendas, aqui A. e ora Recorrido, tanto pela natureza das suas funções como pela sua posição hierárquica, porquanto, este violou frontal e repetidamente o seu dever de lealdade ao mentir, por três vezes consecutivas, ao Diretor de Vendas, seu superior hierárquico (vide pontos P., Q., R. e S., dos factos provados, abaixo transcritos), relativamente ao qual, como se viu, exerce as suas funções com autonomia e sem supervisão direta (ponto DD., dos factos provados), quando por aquele foi confrontado com o horário de trabalho realizado no dia 25.11.2018.

  5. O A. bem saber que no dia 25.11.2018 devia comparecer na loja n.º ..., Barcelos-..., às 10:00 horas (ponto I., dos factos provados) e nesse dia aí ter comparecido apenas pelas 11:40 horas (ponto M., dos factos provados) mas no plano de presenças enviado aos Recursos Humanos da R. ter registado que o seu horário foi o das 10:00 às 15:00 e das 16:00 às 20:50 horas, num total de 09:50 horas (pontos J. e V., dos factos provados); Q. E, de acordo com o propugnado em sede da impugnação da matéria de facto, “No dia 25/11/2018, entre as 13:15 horas e as 14:30 horas, o A. não compareceu na loja de ...” ou, caso prevaleça somente a motivação na parte fundada apenas no depoimento da testemunha J. M., “No dia 25/11/2018, entre as 13:45 horas e as 14:30 horas, o A. não compareceu na loja de ...”, conforme o teor proposto para integrar o futuro ponto EE. a aditar aos factos provados; R. Bem sabendo o A. que, nessa data, receberia um subsídio por ser Domingo, correspondente à quantia de Eur. 17,14 por cada hora de trabalho prestado ao Domingo, tendo assim recebido, por tal subsídio, a quantia total de Eur. 168,48 correspondente às 09:50 horas de trabalho que registou e comunicou (pontos K. e L., dos factos provados) mas que não realizou (pontos M. dos factos provados e o ponto EE., a aditar nos termos acima propostos em sede de impugnação da matéria de facto).

  6. Tendo, para cúmulo, também ficado provado que se o A. tivesse necessidade de apresentar-se mais tarde na loja onde deveria apresentar-se pelas 10:00 horas (Barcelos- ...), estaria obrigado a um conjunto de procedimentos internos, de cujo cumprimento não há registo e que, realmente, não informou a R. de que não se apresentaria na Loja às 10:00 horas, nem apresentou qualquer justificação para tal (vide os pontos O, e N, dos factos provados).

  7. Se na senda do raciocínio da sentença tivessem sido acolhidos e conjuntamente ponderados os elementos fácticos disponíveis, como acima elencados, que a sua decisão teria sido a de considerar inexigível à R. a subsistência da relação de trabalho que manteve como A., por este a ter tornado insustentável, revelando-se a sanção de despedimento com justa causa a única resposta disciplinar possível.

  8. Tendo em consideração o estatuto laboral do A. e a confiança nele depositada, a reiteração ao seu superior hierárquico de falsas declarações sobre o trabalho (não) prestado na véspera e, por último, que a tal falsidade correspondia o pagamento (indevido) de quantias a título de subsídio por trabalho prestado ao Domingo, é patente que as condutas do A. são de desmedida gravidade face à intensidade da violação do dever de lealdade a que o A. estava adstrito; V. E, não tanto pela violação do dever de assiduidade e pontualidade que, apesar de relevante, essencialmente consistiu em instrumento da violação do transversal e absoluto dever de lealdade, mas também por se traduzir no pagamento indevido de quantias monetária a título de subsídio de Domingo.

  9. A tal não obsta a precipitada hipótese de...

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