Acórdão nº 1199/15.7T8GMR.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução15 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório F. F.

e cônjuge, A. F.

, intentaram a presente acção declarativa comum contra “X – Banco ..., S.A.

”, pedindo a condenação do réu a cumprir pontualmente e até ao seu termo o contrato de arrendamento que celebrou com os autores, em especial no que respeita ao pagamento das rendas, sendo que as rendas que forem pagas em mora deverão ser acrescidas do valor correspondente a 50% do respectivo montante.

Para tanto e em suma alegaram ter celebrado com o réu um contrato de arrendamento de bem imóvel para fins não habitacionais pelo prazo expressamente acordado de 30 anos, tendo o réu, contudo, procedido à resolução antecipada do mesmo, em termos que consideram ilícitos.

Citado, veio o réu contestar, pugnando pela improcedência da acção, invocando que a resolução foi lícita, posto que teve na sua origem a alteração das circunstâncias que fundaram o contrato.

Os autores responderam, terminando como na p.i.

No dia 15 de Fevereiro de 2016, data inicialmente agendada para julgamento, foi junto o documento de fls. 169 ss., que constitui cópia da Deliberação do BdP datada de 20.12.2015 (23:30 horas), com os respectivos anexos, relativos aos estatutos da sociedade Y (veículo de gestão de activos que teve por objecto a administração dos direitos e obrigações transferidos do X - anexo 1), aos direitos e obrigações correspondentes a activos do X transferidos pela Y (anexo 2) e aos direitos e obrigações que constituem activos, passivos, elementos extrapatrimoniais e activos sob gestão, do X, transferidos para o Banco ..., SA (anexo 3).

Nessa sede, as partes pediram “a suspensão da instância por dez dias com vista a tomar posição sobre a eventual necessidade de regularização da instância do lado passivo, decorrente da resolução do Banco de Portugal no que ao X respeita”.

No dia 24.02.2016 os autores pediram a substituição do lado passivo, solicitando a saída do X e a entrada do Banco ..., SA para essa posição processual, o que veio a ser decidido, e mantido em recurso, por decisão desta Relação.

Em consequência, o X deixou de figurar no processo e a acção passou a correr (apenas) contra o Banco ..., SA.

No dia em que teve início o julgamento, o Banco ...

apresentou o requerimento de fls. 290 ss., alegando que a agência do X que funcionara no locado em causa nestes autos não se mostrava registada na contabilidade desse Banco aquando da deliberação do BdP, não tendo tal activo transitado para o Banco ..., concluindo que os autos padecem de um vazio de objecto, já que o lado passivo é composto por quem não titula a posição contratual que se discute.

Na própria audiência foi proferido despacho considerando que essa questão já estava decidida pelo acórdão da Relação acima referido, já transitado em julgado (vd. fls. 304 ss.).

No decurso da audiência de julgamento vieram os autores requerer a ampliação do pedido, apresentando um pedido subsidiário para a eventualidade de se entender que a resolução operada pelo réu, mesmo que ilícita, produziu efeitos extintivos do contrato. Nesse caso, requerem o pagamento de uma indemnização correspondente ao valor das rendas que seriam devidas até ao termo do prazo acordado contratualmente, bem como das que se venceram já, incidindo uma taxa de 50 % sobre as rendas cujo pagamento seja efectuado no período da mora.

Foi proferido um despacho a admitir essa ampliação, sem prejuízo de, estando em causa uma “indemnização”, ser questionável, face à deliberação do BdP, se a pretensão indemnizatória poderá ser dirigida ao o Banco ...

.

Foi então proferida sentença que julgou a acção totalmente procedente e, em consequência, condenou o réu Banco ..., S.A.

, por via da substituição processual operada, a cumprir o contrato de arrendamento que (o X) celebrara com os autores F. F. e cônjuge, A. F., que se mantém em vigor, cabendo-lhe proceder ao pagamento das rendas que se venceram, sendo as não pagas até Abril de 2017 acrescidas de 50% e as demais no valor acordado, sem prejuízo do acréscimo desse percentual em caso de mora.

O réu recorreu, quer da sentença, quer do despacho que não admitiu o articulado superveniente.

Esta Relação (por acórdão do mesmo Colectivo) julgou procedente o recurso na parte relativa ao articulado superveniente.

Em consequência, o processo baixou à primeira instância, onde se procedeu à realização das diligências probatórias indicadas a fls. 420, tendo sido, a pedido da ré, reinquirida uma testemunha.

A final, veio a ser proferida sentença, que julgou a acção improcedente e em consequência, absolveu o réu “o Banco ..., S.A.” do pedido.

Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

Terminam a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1- A douta sentença recorrida reproduz, na sua quase totalidade, a anterior sentença, anulada por acórdão desta Relação de 25.01.2018, acrescentando-lhe apenas a parte final que é consequência da decisão de admissão do articulado superveniente e dos fundamentos que a sustentam; 2- Esta parte final contraria claramente o caso julgado formal violando-o - violação esta que constitui o epílogo de uma série de actos que a antecederam: - a apresentação do articulado superveniente; - o douto despacho que o rejeitou por abordar questão já decidida; - a interposição de recurso (também desse despacho); - o acórdão de 25.01.2018 que deu provimento ao recurso, revogando aquele despacho e anulando a sentença recorrida; - a produção de novas provas (ofícios do BdP e inquirição de uma testemunha); 3- Em todos - insiste-se: todos! - esses documentos e peças processuais e, também, na douta sentença recorrida, procede-se: - à análise (ou reanálise) das Deliberações do BdP de 19 e 20 de Dezembro de 2015, no âmbito da aplicação das medidas de resolução ao X; - à análise (ou reanálise) da situação existente na data da aplicação dessas medidas, decorrente da celebração do contrato de arrendamento entre os autores e o X e da (in)eficácia da comunicação da resolução desse contrato por alteração das circunstâncias; 4- O que varia entre eles é a interpretação dada ao texto daquelas deliberações e a sua aplicação à situação em apreço; 5- Trata-se, assim, de decisões contraditórias, proferidas no âmbito do mesmo processo e sobre a mesma questão: a substituição processual do X pelo Banco ....

De salientar que 6- Não pode nem deve confundir-se a titularidade da relação material controvertida e a questão de mérito relativa à existência/subsistência/incumprimento do contrato de arrendamento; 7- Dispõe o art. 30, nº 3 do CPC que é parte legítima quem for titular da relação material controvertida "tal como foi configurada pelo autor"; 8- No momento da propositura da causa, o X era a parte legítima, tal como a relação foi configurada pelos autores. Aliás ele não pôs em causa a sua legitimidade, que foi expressamente reconhecida no despacho saneador proferido em sede de audiência prévia; 9- Na pendência da causa, perante o risco de insolvência do X, o BdP determinou uma medida de resolução que, em parte, consistiu na alienação parcial desta Instituição de Crédito; 10- As consequências processuais das Deliberações do BdP de 19 e 20/12/2015 constam do processo: após requerimentos das partes envolvidas foi proferido o despacho de 31/05/2016, posteriormente confirmado por acórdão desta Relação de 24/11/2016: o Banco ... substituiu o X quer na posição processual quer na de parte no contrato; 11- Esta decisão é claramente suportada pelo nº 6 do art. 145-N do RGICSF; 12- O X perdeu, pois, a legitimidade directa para continuar na causa, já que deixou de ser titular da relação material controvertida e o Banco ... adquiriu-a: estes foram os reflexos processuais da medida de resolução do BdP que acarretou uma modificação subjectiva da instância, sem interferência alguma na causa de pedir e no pedido; 13- O teor do acórdão desta Relação de 24/11/2016 - quer quanto à decisão quer aos seus fundamentos e neste ao falar em activo transmitido - não deixa a este propósito quaisquer dúvidas; 14- Uma vez aferido que o Banco ... sucedeu na posição contratual do X, na sequência da Medida de Resolução do BdP, ficou o Tribunal em condições de julgar o mérito da causa; 15- As causas impeditivas do direito do autor apreciam-se perante o objecto da acção tal como este está delimitado pela causa de pedir e pelo pedido (cfr. artigos 571°,2 e 576°,3, ambos do CPC).

16- Na audiência prévia elencaram-se como elementos do objecto do litígio: "contrato de arrendamento e vinculação entre as partes, prazo e cumprimento; resolução do mesmo pelo inquilino; alteração superveniente de circunstâncias; direito à indemnização fundado na resolução antecipada, designadamente no que respeita ao montante das rendas vencidas e vincendas".

17- Na presente causa, seriam factos impeditivos -os factos contemporâneos ou anteriores ao direito ao cumprimento do contrato de arrendamento; ou caso se entenda que houve resolução antecipada, o direito à indemnização; -estes factos teriam impedido/obstado que estes direitos fossem exigíveis, válidos e eficazes perante o sujeito que tem a posição de arrendatário.

18- Ou seja, uma vez definido quem deve estar na causa, o Tribunal tem de apreciar se a pretensão do autor existe, é eficaz e exigível; 19- Por isso - e contrariamente ao decidido pela douta sentença recorrida no seguimento do acórdão desta Relação de 25/01/2018 - a eventual não transmissão do arrendamento para o Banco ... (e a consequente impossibilidade de ter que cumprir em caso de procedência da acção) não consubstancia um facto impeditivo do direito dos AA; 20- A "construção" de um facto impeditivo, alicerçado em Deliberações já apreciadas nos autos a propósito da questão da legitimidade processual, foi um expediente para "ressuscitar" uma questão transitada em julgado; 21- Qualquer outra pronúncia sobre esta questão...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT