Acórdão nº 1408/13.7TBVCT-I.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MARTINS MOREIRA DIAS
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO.

Recorrente: X – Sociedade Imobiliária, S.A.

Por apenso aos autos de insolvência, em que por sentença proferida em 11/10/2013, Y – Investimentos Imobiliários, Lda., foi declarada insolvente, veio X - Sociedade Imobiliária, S.A., instaurar o presente procedimento especificado de arresto contra a Massa Insolvente de Y – Investimentos Imobiliários, Lda., pedindo que se ordene o arresto da quantia de 244.746,70 euros, até ao trânsito em julgado da ação a interpor pela requerente, tendo em vista o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre a totalidade da verba n.º 1, designadamente dos seus 7.020,42 m2 ou 7.342,00 m2.

Para tanto alega em síntese, que nos autos de insolvência foram apreendidos os prédios com as descrições prediais n.ºs … 2 e …, descritos no auto de apreensão sob as verbas n.ºs 1 e 3; O prédio descrito sob a verba n.º 1 consta do auto de apreensão como tendo uma área de 7.342,00 m2 e essa área consta igualmente das certidões predial e matricial desse prédio, bem como do anúncio para venda do mesmo e, bem assim do relatório da venda; Os prédios foram vendidos, em sede de liquidação do ativo, por leilão eletrónico, em que a requerente foi licitante e cuja proposta veio a ser aceite; Acontece que poucos dias após o termo do leilão, a requerente foi contactada por M. B., legal representante da insolvente, que a informou que o prédio da verba n.º 1 não tinha a área anunciada para a venda e pela qual foi vendido, mas apenas 5.500m2, isto porque, em momento anterior, tinha sido retificada falsamente a área desse prédio para os valores que atualmente constam das suas descrições predial e matricial, tendo sido nessa área englobada a área de um outro prédio, propriedade de um terceiro, o que se deveu à circunstância de então se encontrarem em curso negociações com uma empresa, que pretendia comprar o prédio, para nele instalar uma loja, mas que necessitava de uma área de pelo menos 6.000 m2, pelo que então se ficcionou a mencionada área de 7.342,00 m2, recorrendo-se ao expediente da retificação da área daquele nas respetivas descrições predial e matricial, sem que o prédio tivesse efetivamente essa área e o negócio com a dita empresa se tivesse chegado a concretizar; A referida informação veio a ser reiterada pelo legal representante da insolvente à requerente em duas reuniões que mantiveram, em que aquele lhe apresentou diversa documentação de cujo teor resultam fortes indícios de que essa informação seja verdadeira, pelo que a requerente informou o administrador de insolvência do sucedido, que argumentou que, no seu entender estava tudo certo e que ainda que não estivesse, para que não se preocupasse, na medida em que foi o próprio legal representante da insolvente que assinou a documentação que referia não ser verdadeira, pelo que não podia agora invocar falsidade; Igual posição veio a ser assumida pelo presidente da Comissão de Credores, que, no entanto, acabou por acordar com a requerente fazer-se um novo levantamento topográfico ao prédio e, bem assim que a confirmar-se a redução da área deste, reduzir-se-ia o preço de aquisição do prédio, vinculando-se aquele a defender essa posição junto dos restantes elementos da comissão de credores e do administrador de insolvência; Acontece que realizado esse levantamento, verificou-se que o prédio tinha, ao invés do 7.342m2 de área, apenas 7.020 m2; O presidente da comissão de credores e o administrador de insolvência contestaram esse resultado, pelo que se efetuou novo levantamento topográfico, do qual resulta que o prédio não tem a área anunciada para a venda, razão pela qual, a requerente e o presidente da comissão de credores negociaram reduzir a proposta de compra da requerente para 628.327,59 euros; Acontece que o administrador de insolvência não aceitou essa redução, argumentando que tal implicaria que o valor da venda do prédio à requerente fosse inferior à proposta imediatamente anterior, o que, a seu ver, implicaria mais um litígio com o propoente não vencedor; Ponderando nesse argumento, a requerente aceitou celebrar a escritura de compra do prédio pelo valor da proposta inicial vencedora, com a condição de que no texto da escritura ficasse uma cláusula que permitisse a redução do valor do preço da venda, caso o legal representante da insolvente ou um terceiro reivindicassem o prédio alegadamente absorvido pela retificação e em caso de procedência dessa ação; Essa proposta não foi aceite pelo presidente da comissão de credores, argumentando que tal implicaria que uma parte significativa do preço da venda do prédio da verba n.º 1 não seria entregue aos credores, correndo-se o risco dos autos se eternizarem.

Como a requerente não quis perder o negócio e deixar de adquirir o prédio da verba n.º 1 e não pretendia ficar mais prejudicada do que já ficara, na medida em que pagou três vezes mais pelo m2 praticado naquela zona, decidiu avançar com a celebração da escritura de aquisição das verbas n.ºs 1 e 3; Acontece que em 03/08/2020, a requerente verificou que no prédio estavam colocadas umas placas de uma imobiliária, promovendo a venda do prédio; Contactada essa imobiliária, esta informou que atuava em representação de J. S., que dizia ser proprietário do terreno; Acresce que dias depois, a requerente recebeu uma carta do referido J. S., em que afirma que o terreno é parcialmente sua propriedade e interpelando-a para se abster de qualquer ato sobre esse terreno; A requerente teme que distribuída a totalidade do produto da venda do prédio da verba n.º 1, eventualmente encerrada a insolvência, se mostre impossível recuperar o valor que se vier a comprovar ter pago em excesso por algo que não pertencia à insolvente e considera que a parte do preço que entregou, equivalente à área que alegadamente pertence ao terceiro, 2.486 m2, acrescida de 10% em virtude das eventuais despesas decorrentes da salvaguarda dos seus direitos, será suficiente para acautelar os seus eventuais prejuízos; Considera que o arresto da quantia de 244.746,70 euros, resultante do cálculo proporcional do preço por m2 pago, 89,50 euros, e do preço correspondente à área alegadamente pertença do terceiro, 222.497,00 euros, acrescido de 10% em virtude das eventuais despesas decorrentes da defesa dos seus direitos, 22.249,70 euros, será suficiente para salvaguarda dos seus interesses e direitos; Paralelamente à presente providência cautelar, a requerente irá instaurar ação declarativa para reconhecimento do seu direito de propriedade, pelo que o arresto daquela quantia deverá manter-se até ao trânsito em julgado da decisão a proferir nessa ação e, se procedente, ser o montante arrestado entregue à requerente.

A 1ª Instância indeferiu liminarmente a presente providência com fundamento na sua manifesta improcedência, nos termos que se seguem: “X - Sociedade Imobiliária, S.A. intentou o presente procedimento cautelar contra Massa Insolvente de Y - Investimentos Imobiliários Ld.ª, pedindo seja decretado o arresto da quantia de 244.746,70 € (duzentos e quarenta e quatro mil setecentos e quarenta e seis euros e setenta cêntimos).--- Alegou, para tanto e em síntese, que: a Requerente adquiriu, por escritura pública entretanto já celebrada, um imóvel em sede de liquidação do ativo, tendo entretanto obtido a indicação de que parte desse imóvel, a saber 2.486 m2, não pertencerá ao transmitente e pretende acautelar a eventual impossibilidade de vir a recuperar o valor do preço referente a essa mesma parte do imóvel, que indevidamente (por força do retro exposto) terá despendido; já depois da aquisição, o alegado proprietário iniciou diligências que são incompatíveis com o direito de propriedade da requerente e que, a corresponderem à verdade, implicarão uma redução substancial do prédio aqui em causa, redução essa que terá de ter como consequência, a redução do preço pago pela adquirente; nesse sentido, a requerente teme que, distribuída a totalidade do produto da venda e eventualmente encerrada a insolvência, se mostre impossível recuperar o valor que se vier a comprovar ter pago em excesso por algo que não pertencia à massa insolvente.--- 2.

A questão posta, nesta sede, consiste em saber se, em face do modo como a requerente estrutura a pretensão formulada, deve ou não ordenar-se o cumprimento dos ulteriores termos do presente procedimento cautelar.--- As providências cautelares destinam-se, por definição, a acautelar o efeito útil de determinada ação, através da composição provisória dos interesses conflituantes, mantendo ou restaurando a situação necessária à eventual realização efetiva do direito ameaçado (A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Ed., pp. 23 e seg., Coimbra, Coimbra Editora).--- A providência cautelar de arresto consiste numa apreensão judicial de bens, legalmente configurada, à semelhança das demais, como uma antecipação ou preparação do processo destinado a regular, de forma definitiva, a relação material litigada. Por isso mesmo, o arresto pode ser decretado como preliminar ou incidente da ação declarativa ou executiva (artºs 362º, nº 1, 364º e 391º, nºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil).--- O arresto tem, por escopo – à semelhança do que ocorre com as restantes providências cautelares – evitar que a demora na resolução definitiva do litígio cause, ao aparente (Fumus Bonis Juris) titular do direito, prejuízo irreparável ou de difícil reparação (Periculum In Mora) – artºs 391º e 392º do Cód. Proc. Civil.--- O arresto exige para ser decretado, a verificação cumulativa de dois requisitos. Por um lado, a probabilidade séria de existência do direito invocado e, por outro, a existência de justo receio de perda da garantia patrimonial respetiva (artº 392º, nº 1 do Cód. Proc. Civil).— Ora, a principal questão que se nos coloca, em face do requerimento inicial, é a de saber se a Requerente do arresto possui sobre a Requerida o invocado direito de crédito, emergente do alegado erro-vicio sobre o...

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