Acórdão nº 52095/19.7YIPRT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO Recorrente: X, Soluções em Eficiência e Sustentabilidade, Lda.
Recorrido: A. R.
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R., residente na Rua …, Guimarães, apresentou requerimento de injunção contra X, Soluções em Eficiência e Sustentabilidade, Lda., com sede na Rua do … Vila Nova de Gaia, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 13.954,16 euros, acrescida de juros de mora vincendos, sendo 12.300,00 euros de capital em dívida, 1.332,16 euros de juros de mora vencidos, e 102,00 euros de taxa de justiça paga.
Para tanto alega, em síntese, que no exercício da sua atividade de técnico de engenharia eletrónica, celebrou com a Ré um contrato nos termos do qual se obrigou a elaborar um projeto de licenciamento para instalação de uma unidade de produção solar de autoconsumo, mediante a obrigação desta de lhe pagar a quantia de 15.000,00 euros, acrescida de IVA; Acontece que a Ré apenas pagou 6.150,00 euros, estando a restante quantia em dívida, não obstante ter prestado à última o projeto que se obrigou a elaborar nos termos do acordo celebrado.
A Ré apresentou oposição, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Impugnou parte da matéria alegada pelo Autor e invocou a exceção perentória da compensação de créditos, sustentando que o Autor não conseguiu elaborar em autocard os desenhos e projetos necessários para dar cumprimento ao contrato celebrado, pelo que a solicitação do próprio, contratou a empresa “MT.” para que esta desse seguimento a esse trabalho, a quem teve de pagar, como contrapartida desse serviço, a quantia de 9.225,00 euros.
Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente e seja absolvida do pedido.
Subsidiariamente pede que se admita a compensação, no valor de 9.225,00 euros sobre o crédito reclamado pelo Autor, de 12.300,00 euros.
Remetido o processo à distribuição como ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, por despacho proferido em 5/09/2019, a 1ª Instância não admitiu a exceção da compensação, com fundamento de que esta teria de ser deduzida através de reconvenção e que a Ré não deduziu reconvenção, sequer o podia fazer uma vez que a presente ação não admite reconvenção, constando esse despacho do seguinte teor: “Para a hipótese da procedência da ação pretende a requerida ver compensado o crédito que venha a ser reconhecido ao demandante com um crédito que alega ter sobre ela.
Durante muito tempo foi discutida a questão de saber se a compensação poderia ser deduzida por via de exceção ou se teria obrigatoriamente de o ser em sede de pedido reconvencional. Durante a vigência do anterior CPC o entendimento claramente maioritário era o de que a compensação seria deduzida por via de exceção caso o valor do crédito invocado pelo R. fosse igual ou inferior ao do invocado pelo A.; na parte em que o excedesse e fosse exigido o seu pagamento, a pretensão já consubstanciaria pedido reconvencional.
O CPC 2013 veio a pôr cobro ao dissenso, já que claramente prescreve no seu art. 266.º/2/al. c) que a compensação terá de ser deduzida por via de pedido reconvencional, independentemente do valor do crédito invocado.
Ora, no caso em apreço a requerida não deduziu qualquer pedido reconvencional de forma a possibilitar ao Tribunal apreciar a sua pretensão de ver compensado o crédito que alega ter sobre a requerente com aquele que esta alega ter sobre si. Não o fez nem o poderia fazer, já que esta forma processual não admite essa possibilidade.
Consequentemente, expressamente se consigna que a matéria atinente à invocada compensação não será objeto de apreciação nesta sede”.
Inconformada com o assim decidido, a Ré interpôs o presente recurso, em que apresenta as seguintes conclusões: A.- O douto DESPACHO tem necessariamente que revogar-se pois tal revogação consubstancia a única solução que consagra a justa e rigorosa interpretação e aplicação ao caso "sub judice", das normas legais e dos princípios jurídicos competentes que melhor infra se expõem.
B- Ora com o devido respeito, que é muito, não pode a Recorrente conformar-se com tal decisão, porquanto o Tribunal a quo, ao pronunciar-se nesses termos violou vários preceitos legais e constitucionais que impedem a defesa e o exercício dos direitos materiais da Requerida aqui Recorrente.
C- Designadamente o vertido no artigo 20.º n.º 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa: “1.- Que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a Justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos. (…) 5.- Que para defesa dos direitos, liberdades e garantia pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.” D.- Vertente material essa de tal preceito constitucional plasmado no art.º 2.º do Código de Processo Civil.
E.- Sucede, porém, que a Requerida aqui Recorrente deduziu oposição à injunção na qual, designadamente, invocou a exceção correspondente ao referenciado direito à compensação no valor de € 9.225,00 que detém sobre a Requerente aqui Recorrida, e que opera por mera comunicação unilateral de uma das partes conforme preceitua o artigo 848.º, n.º 1 do Código Civil.
F.- Tendo a extinção dos créditos eficácia retroativa ao momento em que os créditos se tornaram compensáveis, ao abrigo do disposto no art.º 854.º do C.C.
G.- Porquanto estando tal crédito extinto, o Tribunal a quo deve conhecer dessa exceção ao pagamento do valor reclamado pela Recorrida, sob pena de a Recorrente ser condenada a pagar o que já não deve.
H.- Uma vez que a obrigação da Recorrente para com a Recorrida já se encontra extinta naquela medida - € 9.225,00 – quanto ao crédito peticionado pela Requerente no referenciado requerimento de injunção.
I.- Pelo que, data venia, com a decisão em crise o Tribunal a quo, sob a invocação de razões meramente formais que com o devido respeito não encontram acolhimento no espírito da lei, vem criar entorses e total desarmonia entre o direito adjetivo e a relação substantiva existente entre as partes.
J.- Nessa conformidade, a Recorrente ao invocar tal compensação alegou exceção perentória de modo a obter nessa medida efeito extintivo sobre a pretensão do Recorrido ao abrigo do disposto no art.º 576.º, n.º 3 do CPC, K- Pois, com o devido respeito, o tribunal a quo integrou, indevidamente no art.º 266.º, n.º 2, alínea c) do CPC, quando na verdade, a invocação da compensação da recorrente, cabe no âmbito da exceção perentória, cfr. 576.º, n.º 3 do CPC.
L.- Aliás, tal entendimento é sufragado pela jurisprudência, designadamente no recente Ac. da Relação de Coimbra de 16/01/2018, em que foi Relator Maria João Areias, disponível in www.dgsi.pt, no qual: “ 1.- A alínea a) do n.º 2 do artigo 266.º do CPC apenas diz que a compensação é admissível como fundamento de reconvenção e não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio.
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- A compensação opera por mera declaração unilateral de uma das partes à outra (n.º 1 do art.º 848.º CC), tendo a extinção dos créditos eficácia retroactiva ao momento em que os créditos se tornaram compensáveis (artigo 854.ºCC).
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Em processo onde seja vedada a dedução de reconvenção ao Réu terá ser facultada a possibilidade de invocar a compensação por via de exceção, sob pena de lhe ser coartado um importante meio de defesa.” (negrito e itálico nosso) M.- Nesse sentido, ainda veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no processo n.º 285518/10-8YIPRT.L1-7, de 20-05-2014.
N.- De qualquer modo, a verdadeira questão que aqui se coloca não será tanto a da (in)admissibilidade da reconvenção na AECOP de valor inferior a 15.000,00 €, mas se a compensação poderá ser deduzida enquanto defesa por exceção ou se, necessariamente, através de pedido reconvencional formulado contra o autor, ainda que o contra crédito seja invocado apenas como meio de provocar a extinção do crédito do autor e sem que o réu peça a condenação do autor no valor excedente.
O.- Ora, salvo devido respeito por melhor opinião é entendimento da doutrina (Paulo Pimenta) que a compensação deveria ser invocada em sede de exceção, só podendo ser objeto de pedido reconvencional na parte excedente, apoiavam-se no argumento de que se a alegação de factos extintivos do direito do autor assumem a natureza de exceção perentória, parecia inexistirem razões justificativas para sujeitar a compensação a diverso tratamento.
P.- Partindo da ideia de que a compensação se efetiva através de uma mera declaração de vontade unilateral (manifestada extrajudicialmente), Vaz Serra considera que, quer na situação em que o réu tenha “declarado a compensação antes de o autor propor a ação e se defender do pedido deste invocando a compensação”, quer no caso em que o réu apenas na contestação manifesta originariamente a vontade de compensar, não há lugar a reconvenção, porquanto o réu não formula qualquer pedido contra o autor, limitando-se a alegar que o direito de crédito feito valer pelo autor se extinguiu pela compensação que ele demandado declarou.
Q.- Pelo que, uma vez que o demandado, ao invocar a compensação, nada mais pretende do que a improcedência total ou parcial da ação, e o meio adequado para alcançar esse efeito é a exceção perentória.
R.- Logo, no entender de Paulo Pimenta, e, independentemente, do entendimento sufragado pela interpretação restritiva do art.º 266.º, n.º 2 do CPC, formula que o visado art.º 266.º, n.º 2, alínea c), do CPC diz que a reconvenção é admissível nos seguintes casos: “c) Quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.” S.- Contudo, o teor de tal norma apenas se dispõe sobre os casos em que a reconvenção é admissível. Não versa sobre a possibilidade, ou não, de utilização de diferente...
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