Acórdão nº 104469/18.2YIPRT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Março de 2020
Magistrado Responsável | RAMOS LOPES |
Data da Resolução | 05 de Março de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães (1) Apelante (ré): A. M.
Apelada (autora): FR. – Restauros de Edifícios, Unipessoal, Ldª Juízo local cível de Guimarães (lugar de provimento de Juiz 3) - Tribunal Judicial da Comarca de Braga *FR. – Restauros de Edifícios, Unipessoal, Ldª, instaurou procedimento de injunção para haver de A. M. a quantia global de 5.478,86€, correspondente a capital (5.248,00€), juros de mora vencidos (128,86€) e taxa de justiça paga (102,00€), sustentando a pretensão alegando ter sido contratada para, no âmbito da sua actividade, prestar à demandada serviços de construção civil, discriminados em facturas que identifica, cujo preço a ré não pagou, tendo para tanto sido interpelada.
Deduziu oposição a ré.
Alegando terem as partes celebrado um contrato de empreitada relativo a obras que especifica, a realizar num pavilhão, no valor global de 16.650€, acrescido de IVA, invocou: i) não ter a autora realizado três dos trabalhos acordados, os quais viriam a ser prestados por outra entidade a quem a requerida pagou 2.500,00€, ii) ter-se a autora atrasado nos trabalhos realizados, o que determinou atraso na montagem de máquina industrial cujo transporte fora já fretado e cobrado, no valor de 1.500,00€, iii) ter a autora durante os trabalhos provocado danos em bens (chapas e portão), cuja reparação ascendeu a 1.750,00€. Contabilizando em 5.750,00€ o valor dos prejuízos sofridos, excepciona a compensação dos créditos, sustentando que apesar da injunção ter valor inferior a 15.000,00€, deve ser-lhe reconhecida a possibilidade de invocar a compensação por via de excepção, sob pena de lhe ser coarctado importante meio de defesa. Concluiu a sua peça pela extinção do reclamado crédito da autora por via da compensação ou, assim não sendo entendido, se declare não exigível a quantia de 2.500,00€ de trabalhos não efectuados.
Findos os articulados, após realizado o julgamento – onde, em cumprimento do contraditório (art. 3º, nº 4 do CPC), a autora se pronunciou sobre a matéria alegada na oposição, sustentando não ter a factualidade alegada fundamento válido e não ser admissível a invocação da compensação – foi proferida sentença que: - considerou (deixando por isso de se pronunciar sobre a matéria de facto a propósito alegada pela ré) não ser admissível a invocação da compensação, por entender dever a mesma ser deduzida por via reconvencional, o que no caso não foi nem poderia ser feito, dado a forma processual não admitir o pedido reconvencional (admitindo tão só a relevância da matéria que poderia considerar-se como integrando a excepção do não cumprimento, alegada nos artigos 11º e 12º da contestação), - julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de 2.770,00€ (dois mil setecentos e setenta euros), acrescida de juros e a quantia que se liquidar em incidente de liquidação relativamente ao valor unitário de cada um dos serviços que identifica na alínea h) dos factos provados, até ao limite de 1.928,00€ (mil novecentos e vinte e oito euros).
Irresignada, apela a ré, pugnando pela revogação da sentença, extraindo da motivação as conclusões que se transcrevem: 1. A recorrente, na sua petição de oposição à injunção, alegou ser credora da recorrida pelo montante de 5.750,00€ correspondente ao valor da sua factura nº 1/5, que juntou aos autos, proveniente do incumprimento ou do cumprimento defeituoso do contrato de empreitada entre ambas celebrado e pretendendo que fosse operada a compensação do crédito que lhe foi reclamado pela recorrida, até àquele montante.
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Alegou, para tanto, que não comportando o procedimento a possibilidade de dedução de reconvenção (uma vez que o valor da acção é inferior a 15.000,00€), deveria ser-lhe permitido – sob pena de grave limitação aos seus direitos de defesa – operar aquela compensação por via de excepção, suportando essa sua pretensão, a título meramente exemplificativo, nos arestos que citou - Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido no processo 12373/17.1YIPRT-A.C1, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido no processo 147667/15.5YIPRT.P1.S2, ambos em www.dgsi.pt.
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A negação desse direito de defesa à demandada obriga-a a ter que satisfazer o crédito reclamado pela recorrida e a posteriormente instaurar nova acção contra a mesma com todos os riscos daí advenientes, nomeadamente, o risco de insolvência desta.
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A douta sentença recorrida indeferiu-se essa pretensão, entendendo-se que nos termos do disposto no artigo 266º nº 2 al. c) do C.P.C., só poderia ser operada a compensação por via de reconvenção, o que, atenta a forma e o valor do presente processo, não é admitido.
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Acontece porém que a norma processual citada se reporta aos trâmites da acção declarativa comum, não contemplando o caso específico dos procedimentos de injunção.
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Sendo certo que estes são – ou pretende-se que o sejam – procedimentos simplificados de cobranças de dívidas emergentes de contratos, não é menos certo que coartar ao demandado a possibilidade de defesa, e obrigando-o a satisfazer a quantia exigida e a propor uma (ou várias) novas acções é, além de injusto, gerador de mais litigância judicial, que é o contrário do que se pretendeu ao implementar o regime da injunção.
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Aliás, os arestos nos quais a recorrente se apoiou para suportar o seu pedido são proferidos em processos posteriores ao Código de Processo Civil de 2013 e foram produzidos já no domínio desta legislação.
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Tal como referido no citado Acórdão da Relação de Coimbra, “a al. c) do nº 2 do artigo 266º do CPC apenas diz que a compensação é admissível como fundamento da reconvenção e não que a compensação só possa ser feita valer por esse meio; (…) a compensação opera por mera declaração unilateral de uma das partes à outra (nº 1 do artigo 848º CC) tendo os créditos eficácia retroactiva ao momento em que os créditos se tornaram compensáveis (artigo 854º do CC); (…) em processo onde seja vedada a dedução de reconvenção – como é o caso dos presentes autos -, ao réu terá de ser facultada a possibilidade de invocar a compensação por via de excepção, sob pena de lhe ser coartado um importante meio de defesa”.
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Tal como referido no Acórdão do STJ citado, “inexiste motivo de justiça material que justifique o tratamento desigual que se consubstancia em admitir a reconvenção em procedimento de injunção instaurado por comerciante contra um outro comerciante e destinado à cobrança de quantia de valor superior a metade da alçada da Relação, mas em rejeitá-la em procedimento de injunção destinado à obtenção do pagamento de importâncias de valor inferior; (…) pretendendo a ré exercer o direito à compensação de créditos (e assim deixar de suportar, pelo menos em parte, o risco de insolvência da contraparte), a rejeição da reconvenção perfila-se como um prejuízo não menosprezável para aquela, cabendo, por outro lado, que não esquecer que o legislador civil facilita a invocação daquela forma de extinção das obrigações e que a celeridade é uma condição necessária, mas não suficiente, da Justiça”.
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Deste modo e na esteira do que ficou defendido nos citados arestos, deveria ter sido concedido à recorrente o direito a invocar a compensação e a fazer a prova do seu contra-crédito, pelo que a douta sentença merece censura, devendo ser revogada e substituída por outra decisão que o permita.
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Tanto mais que, como adiante se procurará demonstrar (em sede de revisão da prova gravada), resultou claramente da prova produzida – inclusivamente, pelos depoimentos do próprio legal representante da recorrida e das testemunhas desta – que o crédito invocado pela recorrente existe e é exigível e, por consequência, susceptível de compensação.
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É certo que douta sentença recorrida entendeu que “a alegação constante dos arts. 11.º e 12.º da oposição (mas apenas esta) releva na medida em que poderá entender-se fundar a mesma a exceptio non adimpleti contratus”, admitindo-a.
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Porém, a verdade é que tal entendimento, como acima se procurou evidenciar, é redutor e gravemente prejudicial à defesa da recorrente, devendo, em consequência, a douta sentença ser revogada e substituída por outra que admita a compensação invocada por via de excepção.
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Acresce que tal tomada de posição apenas veio a ser expressa na douta sentença; por esse motivo, o julgamento abrangeu toda a matéria de excepção invocada pela recorrente na sua petição de oposição, pelo que estará este Venerando Tribunal habilitado a conhecer de toda essa matéria, caso venha a entender ser de sufragar a tese da recorrente.
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A recorrente pretende a revisão da prova gravada e a consequente alteração da matéria de facto, pelos motivos que melhor ficaram explanados na parte alegatória da presente peça processual e que aqui se dão por reproduzidos, e nomeadamente: - Que sejam dados como provados os factos constantes dos pontos 1.2.b) e 1.2.c) do elenco dos factos não provados; - Que seja considerado como valor a abater pela não realização das duas casas de banho (cfr. facto provado 1.1.e)) o de 1.500,00€ e não os 1.100,00€ que a sentença recorrida considerou; - Que na medida da admissão da compensação do contra-crédito da autora, tal como requerido, sejam dados como provados os seguintes factos, sobre os quais foi produzida prova em audiência de julgamento: = As obras destinavam-se a dotar o pavilhão das condições necessárias a receber uma máquina de embalamento de fruta que a oponente havia adquirido em Huelva, Espanha e que deveria ser transportada para Portugal e entregue e montada naquele local até ao dia 31 de Maio de 2018 (artigo 6º da petição), sendo que a autora não cumpriu o prazo acertado para a conclusão da obra.
= A intervenção em obra da autora apenas cessou em Junho de 2018, ultrapassando o prazo estipulado em 86 dias, muito além do prazo de 90 dias estipulado no contrato de empreitada, sendo certo que esse atraso não é imputável à dona da obra, mas tão-só à autora (artigos 6º, 8º, 9º e 10º da p.i.).
= A...
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