Acórdão nº 954/19.3T9BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO 1.

No processo de instrução com o NUIPC 954/19.3T9BRG, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no Juízo de Instrução Criminal de Braga (Juiz 1), foi proferido despacho, em 22-10-2019, a indeferir o requerimento de abertura de instrução apresentado pelo assistente H. M., por inadmissibilidade legal da mesma, nos termos do art. 287º, n.º 3, do Código de Processo Penal, com o fundamento de, tendo o requerente optado, no prazo aludido na al. b) do n.º 1 desse artigo, por solicitar a intervenção hierárquica ao abrigo do art. 278º do mesmo código, renunciou a uma apreciação judicial do despacho de arquivamento do titular do inquérito, prescindindo do pedido de abertura de instrução.

  1. Inconformado com tal despacho, dele veio interpor recurso o assistente, concluindo a respetiva motivação nos termos que a seguir se transcrevem[1]: «CONCLUSÕES 1. Não pretende o recorrente nas conclusões que se seguem, reduzir o objeto do presente recurso.

  2. Nos presentes autos, foi decidido que não assiste ao recorrente o direito de requerer a abertura da instrução, por inadmissibilidade legal nos termos do artigo 287º, nº3 do CPP.

  3. O ora recorrente não se conforma com a douta decisão proferida pelo que da mesma interpôs recurso.

  4. Com o presente recurso pretende-se que sejam apreciadas as nulidades, que refletem as razões de discordância do recorrente com o despacho proferido.

  5. Ao contrário do alegado no despacho recorrido o recorrente não requereu a intervenção hierárquica no processo.

  6. Nulidade já arguida pelo recorrente nos autos, da qual não foi ainda proferido despacho, o que justifica a apresentação do presente recurso.

  7. O recorrente, face à notificação do despacho de arquivamento, solicitou por requerimento dirigido ao Exmo. Senhor Procurador Adjunto – a transmissão da queixa-crime às autoridades competentes do país onde o crime foi cometido - não sendo aplicável a lei penal Portuguesa ao caso concreto, nos termos da Convenção Europeia de Auxilio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, dado o recorrente ser cidadão europeu, os factos denunciados integrarem a prática de crime em Portugal e no país destinatário.

  8. O requerimento apresentado pelo recorrente no processo não podia ter sido convolado em requerimento de intervenção hierárquica, à revelia do pretendido pelo recorrente, que não o suscitou.

  9. O Ministério Público deveria, apenas, pronunciar-se quanto ao solicitado pelo recorrente.

  10. Se o Exmo. Sr. Procurador Adjunto não podia dar sequência ao requerido “ … por implicar revogar o seu próprio despacho de arquivamento… “ deveria ter indeferido o requerido e nunca convolar o requerimento em algo que não foi solicitado sem conhecimento e sem consentimento do visado.

  11. Ao entender ser mais importante manter o seu despacho, decidindo não dar sequência às diligências solicitadas pelo recorrente e necessárias no domínio da investigação criminal, apenas poderia ter indeferido a pretensão do recorrente.

  12. Não podia convolar o requerimento apresentado, em algo que não foi pedido, sem a prévia pronúncia do visado.

  13. Omitindo, assim, o direito de pronúncia do recorrente.

  14. Da concreta causa de pedir invocada pelo recorrente não se pode intuir – outra pretensão – diversa da formulada.

  15. Foi feita uma interpretação errada e precipitada quanto ao requerimento apresentado pelo recorrente nos autos, que não solicita qualquer intervenção hierárquica, nem teve qualquer oportunidade de se pronunciar quanto à mesma.

  16. Estranhe-se, o requerimento apresentado pelo recorrente é convolado em algo que não foi solicitado, exatamente, no mesmo dia em que foi apresentado pelo recorrente o requerimento para a abertura de instrução - dia 7 de Outubro de 2019.

  17. O facto indevidamente praticado pelo Ministério Público impediu o recorrente de exercer os seus direitos, e coartou-lhe a possibilidade da apreciação judicial - que requereu oportuna e expressamente nos autos com a apresentação do pedido da abertura de instrução face ao despacho de arquivamento - o que efetivamente veio a acontecer com a decisão proferida pelo Tribunal a quo quando refere que não assiste o direito de requerer a abertura de instrução por inadmissibilidade legal nos termos do artigo 283, nº 3 do CPP .

  18. Acresce que, tendo em conta o conteúdo do despacho proferido pelo Exmo. Senhor Procurador da República verificamos que existe erro quanto ao objeto dos presentes autos. O despacho pronuncia-se sobre factos que não fazem parte e não constam do requerimento apresentado nos autos pelo recorrente. Sobre os factos do requerimento em causa não se pronuncia. Omissão de pronúncia por não tratar das questões de que deveria conhecer.

  19. Nulidades que se invocam, devendo a decisão proferida ser revogada e substituída por outra.

    (…) TERMOS EM QUE, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente e, por essa razão, ser revogada a douta decisão recorrida com as legais consequências, (…).» 3.

    O Exmo. Procurador da República junto da primeira instância, em resposta à motivação do recorrente, pronunciou-se no sentido de o recurso ser considerado improcedente, pelas razões sintetizadas nas conclusões que a seguir se transcrevem: «Concluindo diremos que: A) O requerimento apresentado pelo então denunciante, e ora recorrente, a fls. 54 a 56, configura, do ponto de vista material, um requerimento para intervenção hierárquica; B) Com efeito, tendo o Ministério Público o monopólio da ação penal, em Portugal, C) Pedir a um Procurador, num dado processo de inquérito, a intervenção do Estado Português para desenvolver as diligências necessárias no domínio da investigação criminal, equivale a pedir que o Ministério Público prossiga com as investigações; D) No domínio do CPP, determinar o prosseguimento de um processo arquivado é prerrogativa que compete ao imediato superior hierárquico do magistrado que proferiu o despacho de arquivamento; E) Assim, o requerimento apresentado pelo arguido apenas poderia surtir efeito útil sendo encarado como um verdadeiro requerimento de intervenção hierárquica e foi como tal que foi objeto de despacho pelo superior hierárquico do magistrado que proferira o despacho de arquivamento; F) A M.ª Juiz a quo não pôs em causa esse entendimento; G) Antes, na mesma linha, indeferiu o RAI apresentado, por considerar que as faculdades de requerer a intervenção hierárquica ou a abertura da instrução são alternativas, e não cumulativas; H) Sendo exercidas ambas, de forma sucessiva, a instrução é legalmente inadmissível, sob pena de violação do disposto no n.° 1 do art. 279.° do CPP.

    I) Assim, a decisão recorrida não merece qualquer reparo.

    Termos em que deverá o recurso em apreço ser considerado improcedente.» 4.

    O recorrente apresentou um requerimento, junto a fls. 144, em que toma posição sobre a resposta do Ministério Público.

    Todavia, considerando que o exercício de tal faculdade não está legalmente previsto nem, consequentemente, é admissível, não será esse articulado tomado em consideração.

  20. Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, no sentido de, em seu entender, não se poder concluir que o requerimento em apreço possa ser tido como reclamação hierárquica apresentada pelo queixoso, não só porque todo o processado da iniciativa deste é irregular, não respeitando a sequência lógica nem as fases processuais legalmente previstas, como também desde a apresentação da queixa que se dirige ao mesmo Senhor Procurador, sem distinção entre procurador-Adjunto e Procurador da República, para além de ele próprio negar tal intenção, não sendo ainda de descurar o facto de a suposta reclamação hierárquica ser um dos requerimentos que o mesmo...

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