Acórdão nº 4122/19.6TVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

Recorrente: M. M..

  1. M., residente na Rua …, freguesia de …, Braga, instaurou a presente ação especial de insolvência, contra C. S., Unipessoal, Lda., com sede na Rua de …, freguesia de … Braga, pedindo que se declare a insolvência da requerida.

    Por sentença proferida em 24/9/2019, foi declarada a insolvência da requerida com caráter limitado, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: “Assim e ainda de harmonia com o preceituado no artigo 36º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, decido: 1) Declarar a insolvência da requerida C. S., Unipessoal, Lda., com sede na Rua …, Braga, com caráter limitado, uma vez que da factualidade alegada, o património do insolvente não será suficiente para a satisfação das custas do processo e dívidas da massa insolvente – art. 39º e 191 do CIRE; 2) Fixo a residência ao sócio da insolvente na mesma morada.

    3) Como Administrador da Insolvência nomeio a Sr. Dr. A. S.”.

    A requerente M. M. veio requerer que a sentença seja complementada com as restantes menções do art. 36º do CIRE, no qual se inclui designar o prazo para apresentação da reclamação de créditos, com vista a que tais créditos sejam reconhecidos por sentença, alegando para tanto que “nos termos do regime legal que regula a atribuição do fundo de garantia salarial, o trabalhador apenas se pode candidatar a parte do pagamento dos seus créditos por esta entidade, caso seja apresentada a reclamação de créditos e que os mesmos sejam juridicamente reconhecidos, tal como sucede com a indemnização por antiguidade”.

    Por despacho proferido a fls. 57 e 58 indeferiu-se o requerido, constando essa decisão do seguinte teor: Fls. 34 – M. M., requerente nos presentes autos, em que foi proferida sentença de insolvência, com caráter limitado de C. S., Unipessoal, Ld.ª, veio requerer o complemento da sentença proferida.

    Alega que o prosseguimento dos autos, nomeadamente com a reclamação do seu crédito, nos termos do disposto no art.º 129 CIRE, lhe permitirá o acesso ao Fundo de Garantia Salarial.

    Decidindo Dispõe o art.º Artigo 336.º do Código de Trabalho, sob a epígrafe Fundo de Garantia Salarial que O pagamento de créditos de trabalhador emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, que não possam ser pagos pelo empregador por motivo de insolvência ou de situação económica difícil, é assegurado pelo Fundo de Garantia Salarial, nos termos previstos em legislação específica.

    Segundo o art.º12,6,o) da L7/2009, que aprovou o Código de Trabalho, manter-se-ia em vigor o disposto nos art.º 317 a 326 da Lei 35/2004, anterior Regulamento do Código de Trabalho, até à sua revogação pelo artigo 4.º al. a) do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, que aprovou o Regime Material do Fundo de Garantia Salarial.

    No âmbito deste diploma, dispõe o art. 5.º que 1 - O Fundo efetua o pagamento dos créditos garantidos mediante requerimento do trabalhador, do qual constam, designadamente, a identificação do requerente e do respetivo empregador e a discriminação dos créditos objeto do pedido.

    2 - O requerimento é instruído, consoante as situações, com os seguintes documentos:

    1. Declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador, emitida pelo administrador de insolvência ou pelo administrador judicial provisório; b) Declaração comprovativa da natureza e do montante dos créditos em dívida declarados no requerimento pelo trabalhador, quando o mesmo não seja parte constituída, emitida pelo empregador; c) Declaração de igual teor, emitida pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, quando não seja possível obtenção dos documentos previstos nas alíneas anteriores.

      3- O requerimento é certificado pelo administrador da insolvência, pelo administrador judicial provisório, pelo empregador ou pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, consoante o caso, sendo a certificação feita:

    2. Através de aposição de assinatura eletrónica; ou b) Através de assinatura manuscrita no verso do documento.

      4 - O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt, através de modelo aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do emprego e da segurança social.

      Como se vê da alínea c) do n.º 2, não havendo possibilidade de se obter declaração autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador, emitida pelo administrador de insolvência, não fica a requerente inibida de exercer o direito de reclamar os pagamentos devidos ao FGS. Antes tem que diligenciar pela obtenção dessa declaração junto da autoridade administrativa competente.

      Não pode é requerer o prosseguimento dos autos, ato manifestamente inútil em termos processuais, pois que o único propósito de um processo de insolvência é a satisfação dos credores pela liquidação do património do devedor insolvente (cfr. art.º 1 CIRE), que como se viu, não existe.

      E a prática de atos inúteis está vedada por lei – art.º 130 CPC.

      Assim sendo, e uma vez que o prosseguimento dos autos consubstancia a prática de actos inúteis, e não se violando, com o encerramento dos autos, o direito da requerente em ver satisfeito o seu crédito pelo FGS, indefere-se o requerido complemento da sentença proferida.

      Custas do incidente, que se fixam pelo mínimo legal, pela requerente.

      Notifique”.

      Inconformada com esta decisão, a requerente M. M. veio interpor o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões:

  2. O despacho recorrido indeferiu o complemento da sentença, requerido pela recorrente, nos termos dos art.ºs 36.º e 39.º do C.I.R.E.

  3. O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão com a alegação de que aquele ato seria inútil, nos termos do art.º 130.º do CPC.

  4. A recorrente foi admitida ao serviço da insolvente, em 11/01/2016, por contrato indeterminado, para exercer as funções correspondentes à categoria de costureira.

  5. – A recorrente manteve-se ininterruptamente ao serviço da insolvente desde a data de admissão – 11/01/2016 até 15/04/2019, data em que cessaram as relações de trabalho entre ambos, como adiante melhor se referirá.

  6. – À data da cessação do contrato de trabalho, a recorrente cumpria o horário de trabalho das 08:30 às 12:30 horas e das 13:30 às 17:40 horas, de 2ª a 6ª feira, auferindo, a retribuição mensal que fixou em 01/01/2019 em € 600,00, acrescida de € 2,40 por dia, a título de subsidio de alimentação, com mais de 10 trabalhadores.

  7. – No dia 15/04/2019, a insolvente, através do seu sócio gerente, comunicou aos trabalhadores o encerramento da sociedade e o consequente encerramento das instalações fabris.

  8. – Nesse mesmo dia, entregou a cada um dos trabalhadores o comprovativo da declaração da situação de desemprego, com o motivo da cessação do contrato de trabalho “Extinção ou encerramento da empresa”, a qual foi enviada via online para a Segurança Social.

  9. – A cessação do contrato de trabalho efetuada pela insolvente foi ilícita, uma vez que não foi precedida das formalidades legais, quer para a extinção do posto de trabalho, quer para o despedimento coletivo, sendo certo que também não foi instaurado qualquer processo disciplinar.

  10. – A insolvente, por força do encerramento do seu estabelecimento e face à inexistência de qualquer actividade a partir de 15/04/2019, não procedeu ao pagamento dos créditos da recorrente.

  11. – A ilicitude da cessação do contrato de trabalho da recorrente confere-lhe o direito de exigir, como exigiu, da insolvente, de harmonia com os artigos 389º e 391º do Código do Trabalho, o pagamento de uma indemnização correspondente a 45 dias por cada ano de antiguidade, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades, no montante de € 3.600,00 (€ 600,00 : 30 x 45 dias x 4 meses).

  12. – Além da referida indemnização, a requerente é credora da requerida de outros créditos laborais, designadamente da retribuição do trabalho prestado no mês de Abril de 2019 e ao respetivo subsídio de alimentação, no valor global de € 326,40 (€ 600,00 : 30 x 15 dias + € 26,40).

  13. – Acresce que requerente é igualmente credora da requerida da retribuição correspondente às férias e respetivo subsídio de férias vencidas em 01/01/2019, respetivamente de € 600,00 e € 442,50, no valor global de € 1.042,50.

  14. – É, ainda, a recorrente é credora da insolvente dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal correspondentes ao tempo de trabalho efetivo prestado ao serviço da insolvente no ano da cessação do contrato de trabalho, a qual ascende à importância global de € 389,25 (€ 182,25 + € 182,15 + € 24,75).

  15. – A insolvente deveria ter assegurado à recorrente 35 horas de formação contínua por ano, o que nunca foi feito, número de horas em falta que se transforma em crédito laboral (cfr. Artºs 131º e 132º do Cód. do Trabalho), pelo que a recorrente é credora da insolvente, a tal título, desde o ano de 2016, da importância de € 364,35 (€ 3,47 x 35 horas x 3).

  16. – Os créditos salariais devidos pela insolvente à recorrente totalizam assim, a importância de € 5.722,50 (€ 3.600,00 + € 326,40 + € 1.042.50 + € 389.25 + € 364,35).

  17. – Dado que todas as retribuições em dívida tinham prazo certo para o seu cumprimento, a requerida constituiu-se em mora na data dos respetivos vencimentos (cfr. art. 805º, nº2, al. a) do Cód. Civil).

  18. A mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor, as quais nas obrigações pecuniárias correspondem aos juros a contar do dia da constituição da mora (artigos 804º, 805º e 806º do Código Civil), ou seja, pelo menos, desde 15/04/2019.

  19. – De capital e juros, deve a insolvente à recorrente, a importância de € 5.768,91 (€ 5.722,50 + € 46,41).

  20. – Posto isto, em 28.06.2019 a recorrente requereu a insolvência da empregadora alegando o supra exposto despedimento ilícito operado por aquela, como...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT