Acórdão nº 26/18.8T8MDR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelLÍGIA VENADE
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I RELATÓRIO.

A presente ação foi intentada por A. S. e A. M. contra A. P. e A. F..

Pretendem pela mesma, e formulam os respetivos pedidos, que: -se declare que os A.A. são donos e legítimos proprietários do imóvel identificado –prédio rústico constituído por terra para cultura de centeio, situado no sítio de Campo ... na povoação da ..., pertencente à união das Freguesias de ..., concelho de Miranda do Douro, que confronta de norte com M. J., de sul com A. E., de nascente com Comissão Fabriqueira e de poente com A. A., e está inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ..., que teve origem no artigo ..., e descrito no registo predial com o nº. ...- uma vez que lhes foi adjudicado em processo de inventário por morte dos pais da A.; -se condenem os R.R. a entregar aos A.A. o prédio referido, bem como a reconhecerem e respeitarem o direito aludido; -se condenem os R.R. a absterem-se de praticar quaisquer atos, seja por que modo for, que impeçam os dificultem no futuro o acesso ao prédio referido e o exercício pleno e absoluto do direito de propriedade sobre ele por parte dos A.A.; -se condenem os R.R. a pagar aos A.A. a título de indemnização pelos danos patrimoniais já causados, a quantia de € 700,00, bem como juros à taxa legal desde a citação e até efetivo pagamento; -se condenem os R.R. a pagar aos A.A. a quantia de € 200,00 para que possam tapar a vala aberta junto à entrada do prédio, que lhes impede o acesso ao mesmo, e para que possam reerguer os marcos e sinais delimitadores; -se condenem os R.R. a pagar a cada um dos A.A., a título de indemnização pelos danos morais já causados, a quantia de € 2.500,00, bem juros à taxa legal desde a citação e até efetivo pagamento.

Para tanto alegam que são donos e legítimos proprietários do referido prédio que pertencia ao casal C. M. e seu marido M. P., pais da A., falecidos, que por sua vez o receberam por herança dos antepassados dele, aquisição que vem da usucapião. Com o falecimento dos pais da Autora, procedeu-se à partilha dos bens do casal através do processo de inventário n.º 125/07.1TBMDR que correu termos no tribunal Judicial de Miranda do Douro - Secção única, através de sentença transitada em julgado a 30/04/2009, em que eram únicas herdeiras a A., cabeça-de-casal, e sua irmã C. M.. Da Relação de Bens apresentada pela cabeça-de-casal no referido processo de inventário, consta a verba n.º 21 composta por “Terra para cultura de centeio no sítio de Campo ..., que confronta de norte e poente com A. E., de sul com comissão fabriqueira e de nascente com M. R., inscrita na matriz sob o art. ..., com o valor matricial de dezassete euros e quarente e sei cêntimos”, que se refere ao prédio melhor descrito no ponto supra. Na Ata de Conferência de Interessados consta que a verba n.º 21 foi licitada pelos ora aqui A.A. e foi-lhes adjudicada. Por força dessa aquisição, a Autora procedeu ao registo do referido prédio na Conservatória do Registo Predial de … em 28/12/2009. Desde essa data até novembro de 2016, os A.A. possuíram o prédio. Sucede que, em meados de 2016, os A.A. tomaram conhecimento que os R.R. pretendiam ocupar o terreno melhor descrito no ponto supra como se deles fosse, o que levaram a efeito em novembro de 2016, destruindo culturas dos A.A. e marcos e sinais. Em maio de 2017 os A.A. recuperaram o prédio. Para acederem ao mesmo usavam uma entrada do lado nascente. Os R.R. em agosto de 2017 abriram uma vala na mesma impedindo-lhes assim o acesso, e voltaram a derrubar os marcos, e voltara a cultivar o prédio.

Quando confrontados com a atuação acima melhor descrita, os R.R. alegam, em síntese, que o prédio referido no ponto supra lhes pertence e é sua propriedade uma vez que o compraram no verão de 2016 a Maria (irmã da A.) e seu marido N. S.. Referem que o prédio que supostamente compraram à irmã da A. se situa no local das ..., na povoação da ..., freguesia de ..., concelho de Miranda do Douro, e está registado na matriz sob o número ..., tendo origem no anterior artigo .... Tendo procedido ao respetivo registo na Conservatória do Registo Predial de … em 05/09/2016. No seu modo de ver as coisas o prédio que supostamente compraram à irmã da A., e com as características referidas, situa-se geográfica e fisicamente no local onde se situa o prédio dos A.A..

Tal situação não corresponde à verdade.

O que está na base deste equívoco, é o facto de a irmã da A. e seu marido estarem plenamente convencidos desde que se procedeu à partilha dos bens no processo de inventário supra referido que a referida verba n.º 18 da relação de bens, por eles licitada, era propriedade de seus pais quando tal facto não corresponde à realidade, o que a A. só constatou depois de apresentada a relação de bens.

No dia da conferência de interessados, e antes de se proceder às licitações, a A. requereu que a referida verba n.º 18 não fosse tomada em consideração e fosse retirada da relação de bens, uma vez que não pertencia à herança de seus pais e que fora aí colocada por equívoco; o ilustre advogado da irmã da A. opôs-se ao requerido pela cabeça de casal, e requereu que a referida verba n.º 18 se mantivesse na relação de bens, pois havia a convicção de que o referido prédio pertencia á herança dos pais da A.. Por despacho aí proferido foi indeferido o requerido pela cabeça-de-casal e manteve-se a verba n.º 18 na relação de bens, a qual foi licitada e lhes foi adjudicada (irmã e marido). Após o trânsito em julgado do processo de inventário, munidos da sentença homologatória da partilha, dirigiram-se aos Serviços de Finanças e promoveram a alteração da descrição da referida verba n.º 18.º: alteraram o número de inscrição do artigo (passou de … para ...), alteraram as confrontações e a localização (passando do sitio ... para o sitio ...), retiraram as macieiras e mantiveram a mesma área. Com tal atuação, hoje é impossível apurar de que prédio se trata pois no sítio das ... não existe nenhum prédio com estas características. E o que fizeram foi uma alteração substancial à partilha, ilegal e inválida.

No seguimento desta atuação, em meados de janeiro de 2014 a irmã da A. e seu marido viriam inclusive a intentar uma ação executiva para entrega de coisa certa contra os A.A., dando origem ao processo executivo n.º 125/07.1TBMDR-A e aos embargos de executado respetivos, onde pediam que lhes fosse entregue o prédio a que se refere a verba n.º 18 da relação de bens do inventário, mas já com as alterações por eles promovidas e anteriormente referidas; sendo que aquilo que verdadeiramente pretendiam com este processo executivo, como os A.A. viriam a comprovar mais tarde, era que lhes fosse entregue o prédio descrito na verba n.º 21 da relação de bens do inventário. Os A.A. não se opuseram à entrega do prédio com as características e com a descrição que constavam do requerimento executivo, uma vez que não o ocupavam e nunca o tinham ocupado. Mas sempre foram dizendo em sua defesa (dentro dos pressupostos e limitações a que aludem o art. 729.º do Código de Processo Civil) que com base nas alterações promovidas pelos exequentes a obrigação exequenda não se encontrava certa, liquida e exigível pois não se conseguia perceber em concreto a que prédio se referiam na realidade. E foi essa a questão de fundo para a qual os Autores sempre alertaram o Tribunal (quer em primeira instância quer em recurso para o Tribunal da Relação do Porto), mas sem sucesso. Inclusive, pediram para que os exequentes apresentassem a localização do prédio num mapa ou através de uma imagem aérea para se poder concretizar e apurar no terreno a que prédio se referiam, mas nunca o fizeram (e nem podiam) pois o prédio com tais características não existe. A final, e uma vez que os aqui AA. não puderam discutir essa questão de fundo (como é típico nos processos executivos baseados em sentença condenatória) foram condenados a entregar aos exequentes o prédio rústico composto por terra de cultura de centeio, sito nas ..., que confronta a Norte com M. L., atualmente com M. J., a Sul com A. E., Nascente com Comissão Fabriqueira e Poente com M. A., sendo que atualmente poente com A. P., inscrita na matriz sob o art. ...; o agente de execução procedeu à elaboração do auto de entrega do prédio dentro do prédio rústico dos A.A., que lhes foi adjudicado em processo de inventário, como sendo aquele que deveriam entregar aos exequentes. Ficando assim claro aquilo que a irmã da Autora e seu marido pretenderam desde início, que não era executar a sentença homologatória de inventário mas sim alterar a partilha.

Ora, é com base neste auto de entrega (entrega formal mas não real, pois para todos os efeitos o prédio referido no ponto 1.º desta peça continua a pertencer aos A.A.) que a irmã da A. e seu marido se julgaram proprietários do referido prédio no ponto supra. E foi nessa convicção que o venderam aos R.R.. E induziram assim os R.R. em erro que julgam ter comprado o prédio descrito no pedido aos legítimos proprietários, quando na realidade os legítimos proprietários do mesmo são os A.A..

De seguida concretizam os prejuízos e o que tem de ser feito para repor a situação.

*Citados para contestar os R.R. impugnaram a matéria alegada. Referem que o prédio que os A.A. ocuparam corresponde ao prédio da verba 18, o que fizeram de má fé e contra a vontade dos seus donos. Por sua vez os R.R. adquiriram o prédio correspondente a essa verba e é esse que ocupam, sendo que em sede de inventário foram retificadas as respetivas confrontações.

*Os A.A. responderam à matéria de exceção.

*Foi proferido despacho que determinou a notificação das partes para se pronunciarem sobre a exceção de caso julgado/autoridade de caso julgado face às ações com sentença transitada em julgado nºs. 125/07.1TBMDR, 125/07.1TBMDR-A, 125/07.TBMDR-B, e 104/16.8GBMDR.

*Os Réus pronunciaram-se pela procedência da exceção de autoridade de caso julgado.

*Os A.A. pugnaram pela improcedência da...

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