Acórdão nº 7276/16.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | RAMOS LOPES |
Data da Resolução | 17 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1)*RELATÓRIO*Autor/apelante: E. R.
Ré/apelada: X - Seguros de Vida, S.A.
Juízo local cível de Guimarães (lugar de provimento de Juiz 4) – Tribunal Judicial da Comarca de Braga.
*Intentou o autor a presente acção pedindo que, por força do contrato de seguro do ramo vida celebrado entre a sociedade comercial Y Mediação de Seguros, Lda., e a ré, que tinha como pessoa segura o autor e beneficiária a Caixa ... SA, seja a ré, em virtude da ocorrência do risco seguro, condenada: a) a reconhecer que a situação incapacitante do autor se enquadra na previsão contratual do seguro subscrito, b) a pagar a totalidade do capital seguro, no valor de 45.862,81€, i) entregando à Caixa ..., SA, beneficiária do mesmo, a quantia que se encontrar em débito à data da sentença a proferir nos autos, resultante das obrigações decorrentes do contrato de mútuo hipotecário celebrado entre si (autor) e tal entidade bancária, e ii) entregando ao autor o remanescente, nos termos clausulados, c) a pagar os juros de mora desde a data de pagamento de cada uma das prestações já realizadas junto da aludida entidade bancária e que, à data da entrada em tribunal da petição inicial, se computavam em 172,21€, e dos vincendos, a liquidar até efectivo e integral pagamento das aludidas quantias, e d) a pagar ao autor o prémio de seguro referente ao ano de 2015, no valor de 235,24€, acrescido dos respectivos juros de mora até efectivo e integral pagamento daquela quantia.
Formulou também o pedido subsidiário de condenação da ré a restituir-lhe/pagar-lhe o valor dos prémios de seguro pagos desde a data da celebração do contrato de seguro até ao ano de 2015, no valor de 1.628,41€, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento de cada uma das prestações e prémio, até efectivo e integral pagamento.
Alegou, fundando tal pretensão de tutela jurisdicional, ter sido celebrado contrato de seguro de grupo, ramo vida, entre a sociedade Y Mediação de Seguros, Lda. (tomadora de seguro) e a ré (seguradora), sendo pessoas seguras os clientes da tomadora, no âmbito da sua actividade de mediação de seguros, emitindo-se para cada pessoa apólice individual, tendo o autor, enquanto cliente do tomador, subscrito/aderido ao aludido contrato em 1/05/2008, na modalidade contributiva, contrato que cobria os riscos de morte e de invalidez (invalidez absoluta e definitiva ou invalidez definitiva para a profissão ou actividade compatível ou invalidez para qualquer profissão) e tinha a duração de um ano, prorrogando-se por iguais períodos, sucessivamente, sendo contratado o capital no montante de 54.343,00€, valor posteriormente reduzido, com efeitos a partir de 1/05/2014, para 45.862,81€, tendo sido indicada como beneficiária do seguro contratado pelo autor a Caixa ... SA, a favor de quem reverteriam os benefícios garantidos pela apólice contratada até montante subscrito (pois visara o autor, ao celebrar o contrato de seguro, garantir todo e qualquer empréstimo contraído junto da entidade bancária, nomeadamente um crédito à habitação, cujas obrigações, à data da entrada da petição em juízo ascendiam ao valor de 40.683,87€) e o remanescente, a reverter para beneficiários indicados (a saber, o próprio segurado ou, em caso de morte, o cônjuge em primeiro lugar, depois os filhos e por fim os herdeiros legais). Continua alegando que após suspeitas detectadas Novembro de 2013 lhe viria posteriormente a ser detectado linfoma não Hodgkin do centro folicular, estádio IV, sendo sujeito a tratamento com quimioterapia, que teve bons resultados, estando sujeito a vigilância e controlo médico, por se tratar de patologia que evolui com recorrências frequentes, tendo-lhe sido atribuída, em consequência da doença, inicialmente, incapacidade definitiva de 60% e posteriormente, em Maio de 2015, dada a evolução da doença, incapacidade permanente global de 85%, tendo participado em Julho de 2015 tal invalidez à ré, em vista de accionar o seguro, reclamando o pagamento do capital à beneficiária Caixa ... e exigindo a entrega do remanescente, ao que a ré se escusou argumentando que aquando da contratação do seguro lhe foram omitidos factos relevantes pelo autor que levariam à não aceitação do seguro, comportamento que obrigou o autor a continuar a pagar à Caixa ... as prestações do mútuo com esta contratado. Alega ainda que a ré lhe comunicou a anulação do contrato (por considerar ter-lhe sido omitida informação relevante sobre a situação clínica aquando da contratação do seguro, matéria que a ser conhecida teria influenciado decisivamente na aceitação do contrato), considerando-o nulo e de nenhum efeito desde o seu início – o que o autor refuta –, assistindo-lhe o direito, caso se conclua pela invalidade do contrato – o que o autor não concede – a ver restituídos os prémios prestados, acrescidos de juros.
Contestou a ré invocando a nulidade do contrato por ter o autor omitido informação sobre doenças pré-existentes aquando da celebração do contrato de seguro, aduzindo ainda, de todo o modo, não estarem preenchidos os requisitos previstos nas condições gerais da apólice para ser accionada a cobertura subscrita pelo autor. Argumenta também, quando ao pedido subsidiário, que por ter o autor violado intencionalmente o dever de informação a que estava obrigado, omitindo, de forma dolosa, informações relevantes acerca do seu estado de saúde, não tem direito a receber o valor dos prémios de seguro que pagou. Conclui, com tais fundamentos, pela sua absolvição dos pedidos, principal e subsidiário.
Prosseguiu a causa a pertinente tramitação (tendo o autor respondido à invocada arguição da nulidade do contrato e à suscitada questão da cobertura contratual), sendo proferido saneador, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova e, realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo a ré dos pedidos.
Não conformado, apela o autor em vista da revogação da sentença e sua substituição por decisão que condene a ré no pagamento das quantias peticionadas, terminando as alegações pela formulação das seguintes conclusões (que se transcrevem): 1- A sentença proferida nos presentes autos contém uma incorreta valoração da matéria de facto e uma incorreta aplicação do Direito, enferma de incorreta interpretação e apreciação da prova produzida em audiência de julgamento (art.º 640.º do CPC), devendo a mesma ser revogada e alterada nos termos das alegações apresentadas, nos termos do art.º 662.º, n.º 1 e 2 do C.P.C..
2- O Recorrente considera que foram incorretamente julgados (artº 640.º, n.º 1, alínea a) do CPC), e por isso vão impugnados, os pontos a) e b) da matéria dada como não provada (constante do ponto B da fundamentação de facto), impondo-se uma decisão diversa, no sentido de os considerar como provados, bem assim da subsunção da prova produzida ao Direito.
3- Considera o apelante que da leitura da resposta à matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo, e salvo o devido respeito, resulta que houve um erro na apreciação e valoração da prova produzida, consistente em se haver dado como não provado algo para o qual resultou produzida prova para o efeito, concretamente a prova testemunhal, por si e conjugada com a prova documental e pericial, a qual é indicadora de sentido diverso daquele que foi plasmado na decisão de facto e reproduzido na sentença recorrida, no atinente aos pontos aqui impugnados, devendo os mesmos ser alterados.
4- Concretamente, o depoimento do Autor E. R. no âmbito da prestação de declarações de parte, prestado no dia 13 de Fevereiro de 2020 e gravado no sistema áudio por faixa 20200213102922_5392045_2870585, com início às 10h29m22s e fim às 10h59m16s, e o depoimento da testemunha P. J. prestado no dia 13 de Fevereiro de 2020 e gravado no sistema áudio por faixa 20200213105917_5392045_2870585, com início às 10h59m18s e fim às 11h25m52s, cujas passagens pertinentes estão reproduzidas no corpo das alegações e para onde se remete.
5- Resulta dos ditos depoimentos, perfeitamente credíveis - porquanto decorrem diretamente de quem sofre e convive diariamente com a doença oncológica em causa -, conjugados com o teor do relatório pericial no âmbito da segunda perícia efetuada nos autos, e a documentação clínica do autor insertos nos autos que o apelante, em consequência da descrita doença (linfoma não Hodgkin), dos tratamentos a que foi e é sujeito e das sequelas de que vem padecendo desde Novembro de 2013, está, medico-legalmente e de forma irreversível, incapacitado de realizar a sua atividade profissional de eletromecânico/eletricista e bem assim qualquer outra atividade remunerada ou lucrativa.
6- Na verdade, o Autor prestou declarações de parte, referindo que o diagnóstico do segundo linfoma (não hodgkin), foi no ano de 2014, que nada teve a ver com o primeiro, que foi completamente remido, sendo a única ligação o nome ser parecido e que este linfoma “(17.41min.) Não, isto não tem remições”, tendo sido sujeito a tratamentos “(17.47min.) Foi feito 6 ciclos de quimioterapia”.
7- Refere que está acompanhado medicamente e a razão desse tratamentos, “17.59 sim sim. Tou na fisioterapia, e também ando na consulta da dor.” e “(… impercetível) dói-me várias coisas: articulações, músculos” e que deixou de exercer a sua profissão desde o diagnóstico “(18.28min) porque não tinha condições, estive de baixa bastante tempo e depois deram-me a reforma” e que atualmente não consegue exercer qualquer outra atividade, designadamente remunerada, referindo “(18.44min) Não, porque eu tenho bastantes dores, a cada passo tenho que levar infiltrações”, “o médico tinha-me dito logo (que não poderia ter qualquer atividade)”.
8- Quanto ao seu estado atual clínico referiu que “(19.14min.) há dias… Há dias melhores…Há dias que nem saio da cama…E eu levo infiltrações e aquilo tem um efeito, e depois quando começa a passar muito tempo eu começo … a parte muscular, aas...
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