Acórdão nº 4877/09.6TBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelTERESA PARDAL
Data da Resolução25 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO.

Banco… intentou a presente acção declarativa com processo sumário contra Maria M. e Maria C. alegando, em síntese, que a 1ª ré pretendeu comprar um veículo automóvel à sociedade C., SA, mas, como não tivesse possibilidade de pagar a pronto, celebrou com o autor um contrato, por força do qual este adquiriu o veículo à C.SA e deu-o de aluguer à 1ª ré, pelo prazo de 72 meses, mediante o pagamento mensal de 237,34 euros, sendo acordado que a falta de pagamento de qualquer dos alugueres determinaria a faculdade de o autor resolver o contrato através de comunicação fundamentada, fazendo suas as rendas pagas e ficando a 1ª ré obrigada a restituir o veículo e a pagar as rendas em atraso, o valor dos danos que o veículo viesse a apresentar e ainda uma indemnização para ressarcir o prejuízo resultante da desvalorização do veículo e do próprio incumprimento, a qual não seria inferior a 50% do valor total dos alugueres acordados.

Mais alegou que a 2ª ré assumiu a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações da 1ª ré e que esta não pagou a 69ª prestação e as seguintes, pelo que o autor resolveu o contrato, por comunicação de 6/10/2009, continuando, porém a 1ª ré sem restituir o veículo, que tem o valor de 16 000,00 euros e sem pagar as referidas quantias, pelo que são ambas as rés responsáveis pelo respectivo pagamento, sendo devido o valor de 949,36 euros a título dos quatro alugueres em atraso e ainda o valor mensal de 474,68 euros correspondente ao dobro do montante do aluguer desde a data da resolução até à entrega efectiva, por força do artigo 1045º do CC, o que tudo soma 1 424,04 euros à data da propositura da acção e deve ser acrescido de juros.

Concluiu, pedindo a condenação das rés a restituir-lhe o veículo e, solidariamente, a pagarem-lhe a referida quantia de 1 424,04 euros, acrescida de juros vencidos à taxa legal comercial no montante de 22,21 euros e dos vincendos à mesma taxa, mais o valor mensal de 474,68 euros desde a propositura da acção até efectiva restituição do veículo, acrescido também de juros às taxas legais comerciais, bem como a indemnização por perdas e danos a liquidar em execução de sentença e ainda no pagamento de sanção pecuniária compulsória da quantia de 50,00 euros por dia durante os primeiros trinta dias subsequentes ao trânsito em julgado, quantitativo a passar a ser de 100,00 euros por dia nos trinta dias seguintes e de 150,00 euros por dia daí em diante, até integral cumprimento da respectiva condenação, ou no montante que vier a ser fixado na sentença a proferir.

Apenas a ré Maria M. contestou alegando, em síntese, que o contrato é nulo porque a ré nunca celebrou qualquer contrato com o autor, tendo-lhe apenas sido apresentado pela C.,SA para assinar, um contrato, que não lhe foi explicado, não estava totalmente preenchido no tocante às condições contratuais e relativamente ao qual não lhe foi entregue nenhuma cópia ou duplicado; mais alegou que prestou uma caução no montante de 1 600,00 euros, de valor superior ao dos alugueres em dívida e que deve servir para os pagar e ainda que a carta que o autor apresenta como sendo a carta de resolução do contrato não pode produzir os efeitos pretendidos por não ser inteligível nem fundamentada, não tendo sido enviada nova carta a tornar efectiva a resolução, mas sim uma outra comunicação do autor contraditória, com factura/recibo para pagamento da renda, para além de que os valores reclamados são excessivos e desproporcionados.

Concluiu pedindo a improcedência da acção e a absolvição do pedido.

O autor respondeu, alegando que o contrato de locação operacional – aluguer de automóvel foi por si redigido respeitando o que havia sido acordado entre a ré e a C.SA, tendo sido enviado a esta dois exemplares para serem assinados pelas rés, após o que a C.SA os devolveu assinados e o autor enviou à ré um dos exemplares, encontrando-se os exemplares integralmente preenchidos com todas as condições gerais quando a ré os assinou e estando o autor à disposição da ré para lhe prestar todos os esclarecimentos que esta lhe solicitasse, o que ela não fez; mais alegou que celebrou com a ré um outro acordo mediante o qual lhe prometeu vender o referido veículo após o pagamento de todos os alugueres pela ré, pelo preço de 3 200,00 euros, consignando-se que a ré já pagara, a título de caução, a quantia de 1 600,00 euros, caso a ré tivesse interesse em tal aquisição, a ser descontado nesse preço, mas destinando-se a mesma também a garantir o pagamento dos alugueres e revertendo para o autor em caso de incumprimento da ré; alegou ainda que a carta de resolução cumpre os requisitos necessários e que não se verifica qualquer contradição com a comunicação que foi feita posteriormente.

Concluiu pedindo a improcedência das excepções.

Saneados os autos, procedeu-se a julgamento, findo o qual foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré Maria M. a entregar o veículo ao autor no prazo de 10 dias e ambas as rés, solidariamente, a pagar-lhe as rendas vencidas, bem como o valor correspondente a cada uma das rendas vincendas até à efectiva entrega do veículo em questão, sendo de 237,34 euros o valor mensal e os juros de mora calculados à taxa comercial, acrescidos de despesas administrativas por cada aluguer em atraso e ainda o valor do aluguer que acrescerá o valor do prémio do seguro, devendo ser deduzido a estas quantias o valor de 1 600,00 euros pago a título de caução.

* Inconformada, a ré Maria M. interpôs recurso, juntando documento e alegou, formulando as seguintes conclusões: Conclusões sobre a matéria de facto:

  1. Após a transcrição das partes que a recorrente acha pertinente e suficiente para levar à alteração da decisão da matéria de facto relativa aos quesitos supra indicados, não se poderá concordar com a fundamentação dada pela Mma. Juiz uma vez que o depoimento da testemunha (que foi quem apresentou o contrato em apreço nos autos à ré) foi clarividente quanto à falta de informação das cláusulas do contrato, maxime a referente ao valor da caução que foi fixado, sua finalidade e efeito. Foi, aliás, com incompreensão e estranheza que a testemunha reagiu à existência de tal cláusula, não conseguindo explicar o seu conteúdo e alcance. Ora, perante tal estranheza importa perguntar como poderá ter sido observado o dever de informação relativamente à cláusula 12ª do contrato (ponto 8 dos factos provados) se nem o próprio funcionário que representou a autora está inteirado sequer da sua existência? B) Será adequado e razoável exigir a um declaratário normal (a ré) que entenda o conteúdo e alcance de uma cláusula quando tal não ocorre com a pessoa que o apresenta ao consumidor, de quem a lei exige o dever de comunicação e explicação dos deveres e obrigações contratuais? C) Neste sentido e perante tal estranheza do funcionário que apresentou o contrato à ré (na sua pessoa reside o (in)cumprimento dos deveres de comunicação e informação das cláusulas do contrato, já que nenhum funcionário da autora se apresentou, em qualquer circunstância, à ré, nem numa fase pré-contratual nem durante a vigência do contrato) a Mma. Juiz deveria ter decidido em sentido diverso, não considerando ter sido cumprido os deveres de informação, em particular, no que concerne à cláusula 12ª do contrato pois, em face do aí descrito, e atendendo que as regras gerais de interpretação do negócio jurídico devem ser aplicadas dentro do contexto de cada contrato singular (artigo 10º do DLCCG), em caso de dúvida prevalecerá o sentido mais favorável ao aderente – artigo 11º, nº2 do mesmo diploma.

    D) A referida cláusula 12ª do contrato, por não ter sido comunicada à ré, sequer explicada enquanto consumidora, deveria ter sido considerada excluída do contrato ou, assim não se entendendo, deveria ter sido interpretada no sentido mais favorável à ré pois, na referida cláusula refere-se que o depósito de caução destina-se a garantir/caucionar o bom cumprimento das cláusulas pecuniárias deste contrato. Mais se refere que no termo do contrato haveria lugar à prestação de contas respondendo a caução até à concorrência do seu montante pelo pagamento de todas as importâncias e/ou indemnizações que o locatário, nos termos do contrato haja de efectuar ou pagar, sendo devolvido o excesso ou pago o remanescente pelo locatário, conforme o caso. Ora, tendo a ré prestado uma caução de 1 600,00 euros mediante a entrega de uma viatura usada, a autora era obrigada a imputar tal valor de caução nas prestações que se encontravam em atraso, não ocorrendo, por este motivo, incumprimento por parte da ré e, em consequência, motivo para a resolução contratual operada.

    E) Não se poderá aceitar a interpretação da cláusula 12ª do contrato nos termos explicados pela Mma. Juiz na medida em que tal regra não foi sequer explicada à ré e, por essa via, deverá prevalecer o sentido mais favorável à ré, na qualidade de consumidora/aderente. Donde se conclui, pela alteração da resposta dada aos pontos 20 e 21 da decisão da matéria de facto e ao ponto 36 da contestação (transposto para a base instrutória).

    F) Ademais por referência à falta de conhecimento por parte da Mma. Juiz do documento nº1 do articulado de resposta apresentado pela autora (que se refere à existência de contrato promessa de compra e venda do veículo celebrado entre a autora e a ré) reforça ainda mais este entendimento, no sentido em que o valor de 1 600,00 euros que a autora tinha na sua posse desde o início do contrato poderia e deveria ter sido imputado no pagamento dos valores em falta, inexistindo assim quaisquer prestações em atraso pois, o valor em poder da autora era superior ao montante em dívida e na aludida cláusula se fazia referência que tal caução se destinava a garantir o bom cumprimento das cláusulas pecuniárias do contrato.

    G) Por outra via, e em face da análise do documento que ora se junta (factura enviada à ré em data posterior...

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