Acórdão nº 2053/21.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelRAQUEL BAPTISTA TAVARES
Data da Resolução26 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório V..., Lda.”, com sede na Rua ..., ..., propôs a presente ação declarativa, com processo comum, contra “...”, com sede na Rua ..., em ..., ..., pedindo que seja declarado o incumprimento contratual da Ré, condenando-a a reconhecer a justa causa da Autora na resolução do contrato e consequentemente, ser a Ré condenada no pagamento da quantia: a) de €199.625,00€ (cento e noventa e nove mil, seiscentos e vinte e cinco euros) a título de danos patrimoniais; b) que se vier a apurar em sede de execução de sentença relativa aos prejuízos imputados à Autora por força do incumprimento contratual com a O...; c) de €10.000,00 (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais.

Para tanto, e em síntese, alega que no exercício da sua atividade comercial celebrou com a Ré um acordo de produção de moldes e subsequente fornecimento de peças produzidas em série (3.ª fase do processo produtivo de “bodykit”), mediante orçamento previamente apresentado pela Ré a 23/10/2019, com adjudicação da obra feita a 25/10/2019, que foi por aquela incumprido, em termos de prazos e em termos de qualidade dos produtos fornecidos.

Que previamente a Autora havia celebrado a 12/10/2019 um contrato com a O...”, cliente final, através do qual foi definido o número e o tipo de veículo para os quais a Autora teria de produzir e montar os “bodykit” (...), bem como os períodos de entrega, sob pena da aplicação de penalizações Após o que a Autora acordou com a Ré, na referida data de 25/10/2019, a produção das peças do “bodykit” (3.ª fase), incluindo o preço e prazos de entrega, tendo-lhe remetido previamente a 10/10/2019 um ficheiro ZIP, em formato CAD, com o desenho das peças que compunham o projeto, bem as informações sobre as peças (medidas, forma e aspeto) a produzir e que integram o “bodykit” (ficheiro da “O...”), e os protótipos finais das peças.

Era com base no protótipo final que a Ré tinha de fazer os moldes para produção em série.

Mais alega que apesar de a Ré estar obrigada a produzir as ferramentas/moldes necessários à produção as peças em carbono, ficando cada “bodykit” ao preço de 4.240,00 Eur. (sem iva), não só se atrasou no processo, o que determinou que já a 15/01/2020 ficasse acordado que a própria Autora produzisse algumas das ferramentas/moldes necessários, como não produziu as primeiras peças do “bodykit” em conformidade com o previamente estabelecido, em termos de qualidade.

Todas as peças enviadas pela Ré à Autora padeciam de vícios/desconformidades, pelo que as partes acabaram por acordar que a Ré produziria e enviaria novas peças, o que fez 14/04/2020, as quais também padeciam de vícios/desconformidades.

Alega ainda que foi obrigada a iniciar a montagem do “bodykit” com as peças enviadas pela Ré, tendo de proceder previamente à sua reparação, e que sofreu diversos prejuízos a título de lucros cessantes e a título de penalizações e danos de imagem aplicados ou reclamados pela “O...”, tendo visto ainda o seu bom nome e imagem ante a O...”, e no mercado, colocados em causa.

A Ré veio contestar alegando que foi a Autora quem, por dispor de um baixo orçamento disponível, ordenou a produção de moldes de baixo custo, bem como pretendeu peças de baixo custo.

Que, além disso, as peças que a Autora entregou e serviam de modelo para os moldes não coincidiam com o modelo 3D (CAD) entregue à Ré.

Mais alega que os ajustes que admite que as peças necessitassem deveriam ser sanados na respetiva montagem, pintura e lacagem, processos que ficaram a cargo da Autora, o que só era possível fazer aquando da sua colocação nos automóveis e que o ficheiro CAD não fornecia detalhes quanto ao acabamento de superfícies e tolerâncias geométricas, pelo que nunca a Autora especificou os parâmetros de qualidade pretendidos das peças.

A Ré deduziu reconvenção pedindo que a Autora seja condenada a pagar-lhe a quantia de €55.020,00, alegando, em síntese, que em face da cessação unilateral pela Autora da relação entre as partes, sofreu prejuízos já que teve de ser ela a assegurar a produção dos moldes com recursos humanos seus (€39.600,00), teve de suportar o custo da matéria-prima e consumíveis (€7.920,00), teve de assegurar a montagem do processo (€5.900,00) e teve ainda de proceder à gestão do mesmo projeto na fase de desenvolvimento (€1.600,00).

A Autora apresentou réplica alegando, em suma, que não quebrou por forma abrupta e unilateral a relação comercial entre as partes, uma vez que foi a Ré que comunicou a 29/04/2020 que só avançaria com a produção das peças necessárias para a produção dos segundo e terceiro veículos caso a Autora aceitasse uma subida de preços, que ainda iria calcular.

E que a 6/05/2020 a Ré comunicou à Autora que só produziria as peças necessárias com um aumento de mais de 50% do custo, o que a Autora não aceitou.

Foi proferido despacho-saneador, foi admitida a reconvenção e proferido despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.

Efetivada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Pelo exposto, o Tribunal decide julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, condena a ré a pagar à autora: a) a quantia de € 199.625,00€ (cento e noventa e nove mil, seiscentos e vinte e cinco euros) a título de danos patrimoniais, acrescer de juros de mora, à taxa legal aplicável às sociedades comerciais, a contar desde a citação e até integral pagamento; b) a quantia que se vier a apurar em sede de execução de sentença relativa aos prejuízos imputados à autora por força do incumprimento contratual com a O..., incluindo os danos de imagem; c) absolver a ré de tudo o demais peticionado, mormente da indemnização peticionada a titulo de danos não patrimoniais (de € 10.000,00).

O Tribunal julga ainda o pedido reconvencional totalmente improcedente e, em consequência, absolve a autora do pedido indemnizatório contra si deduzido.

Custas pela autora e ré, na proporção do decaimento tomando apenas em conta os valores referidos em a) e c).

Registe e notifique.” Inconformada, veio a Ré apelar da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “A. O presente recurso vem interposto da decisão recorrida, proferida pelo Tribunal de 1.ª instância em 6 de Maio de 2022, mediante a qual foi a Ré/Recorrente condenada a pagar à Autora/Recorrida a quantia de 199.625,00€ (cento e noventa e nove mil, seiscentos e vinte cinco euros), bem como o valor que se vier a apurar em sede de execução de sentença, referente aos prejuízos imputados à Autora/Recorrida, por força do incumprimento contratual com a O..., incluindo danos de imagem.

  1. Inconformada com a referida decisão, vem a Ré/Recorrente interpor o presente recurso de apelação, o qual é independente, sobe de imediato, nos próprios autos requerendo que o mesmo tenha efeito suspensivo.

  2. Tiveram os presentes autos origem num acordo de subempreitada, nos termos do qual a Ré/Recorrente se obrigou à produção de moldes e subsequente fornecimento de peças – adiante designados por “bodykits” - para a instalação pela Autora/Recorrida em veículos automóveis da marca ....

  3. Em suma, a Autora/Recorrida veio peticionar o pagamento de uma indemnização pelo alegado incumprimento do contrato de subempreitada, alegando a existência de defeitos nas peças fornecidas pela Ré/Recorrente, bem como a derrapagem dos prazos acordados entre as partes.

  4. Sublinhe-se que a Autora/Recorrida havia celebrado um contrato com uma outra empresa estrangeira “O..., Ltd”, em 13 de outubro de 2019, nos termos do qual se obrigava a produzir e equipar 60 (sessenta) veículos com os mencionados “bodykits”, no decurso do ano de 2020, à razão de cinco carros por cada mês.

  5. A Ré/Recorrente apresentou a contestação, alegando, concretamente, que: o número de moldes e, consequentemente, de peças que se veio a verificar ter que produzir era muito superior ao inicialmente contratado, o que gerou um aumento exponencial da complexidade do processo produtivo e que não existiam concretas especificações no que respeita à qualidade dos produtos e tolerâncias admitidas.

  6. Entende a Ré/Recorrente que a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto, devendo ser alterada nos termos do artigo 662.º do Código de Processo Civil, bem como quanto à matéria de Direito.

  7. Assim, o presente recurso tem por objeto tanto a matéria de direito, como a reapreciação da matéria de facto – daqueles que foram considerados provados e não provados pelo Tribunal a quo. Comecemos pela matéria de facto.

    Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto: I. Quanto à decisão da matéria de facto, observado que se mostra na motivação do presente recurso o cumprimento do exigido nos n.ºs 1 e 2 do artigo 640.º do CPC – e que aqui se dão por reproduzidos atenta a sua extensão – conclui-se que o Tribunal a quo efetuou uma errada apreciação e valoração dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, cujos excertos transcrevemos no presente articulado, desvalorizando toda a prova produzida pela Ré/Recorrente e valorando, erradamente, muita daquela que foi produzida pela Autora/Recorrida.

  8. Reapreciada a prova de acordo com o constante nas presentes alegações de recurso, caberá aos Venerandos Desembargadores alterar as respostas à matéria de facto. Vejamos de que forma: Factos Provados: K. Antes do demais, cumpre salientar que existiu um claro e evidente erro na valoração do depoimento da testemunha AA, porquanto jamais poderia ter sido o seu depoimento considerado isento, credível e objetivo, como o foi pelo Tribunal a quo.

    L. É que o Sr. AA tem uma relação de proximidade e afinidade com o legal representante da Autora, dado serem sócios de uma outra sociedade Portuguesa- O...

  9. Não obstante a testemunha ser um terceiro na relação jurídica processual aqui em causa, não o é na relação material subjacente, dado que revela um interesse no desfecho da ação de igual dimensão ao...

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