Acórdão nº 78789/20.6YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2023
Magistrado Responsável | ALBERTO RU |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, * Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz adjunto………José Vítor dos Santos Amaral 2.º Juiz adjunto……….Luís Filipe Dias Cravo * * Recorrente …………………..
F..., Lda.
com sede na Rua ... – ..., freguesia ..., concelho ....
Recorrida……………………AA, residente na Travessa ..., ... – ..., ... ..., freguesia ..., concelho ....
* I. Relatório
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O presente recurso insere-se numa ação especial de cumprimento de obrigações pecuniárias a qual se iniciou como processo de injunção.
A empresa Autora demanda a ré AA para obter desta o pagamento da quantia de €5.906,90, acrescida de juros desde a citação, quantia que lhe deverá por causa de um barracão que construiu para a Ré, cujo custo, diz, importou em €14.319,78, tendo a Ré pago apenas a quantia de €9.319,78, factualidade esta que a Ré negou, alegando que foi dado pela Autora um orçamento entre €5.000,00 e €6.000,00; que a Autora abandonou a obra sem a concluir; que a mesma apresenta defeitos e que foram aplicados materiais não solicitados, pelo que caso soubesse que a obra poderia custar aquilo que a Autora pede jamais teria contratado, concluindo pela improcedência da ação.
Realizada a audiência de julgamento foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Por tudo o exposto o tribunal julga procedente a presente acção, procedente a excepção e em consequência disso: A. Condena a ré a pagar à autora o valor de €4.925,73, pelos trabalhos realizado na propriedade desta; B. Condena a autora a reparar as infiltrações no barracão, no prazo de 30 dias após o transito em julgado da sentença; C. declara que só será exigível o valor em causa, após a realização das reparações, excepto se não ocorreram por facto imputável à ré.
Custas a cargo da ré.» b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte da Ré, cujas conclusões são as seguintes: «01. A Ré não aceita que sejam dados como provados os factos 2., 5., 6., e 12.
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O Tribunal não se pronunciou quanto ao Abandono da Obra, porquanto, em caso de paragem da obra pela A pelo período de dois anos, sem que se prove que a mesmo prestou à Ré qualquer informação explicativa para tal paragem, é lícito concluir-se que existe um incumprimento definitivo, pois tal traduz-se num comportamento inequívoco de quem não quer ou não pode cumprir.
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Tal omissão de pronúncia consubstancia NULIDADE da actual decisão, nulidade essa que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.
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Existe causa legítima que desonera a Ré no cumprimento do remanescente invocado no requerimento de injunção. - Cfr. Artigo 428º CC.
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O Tribunal a quo, não se pronunciou quanto à Prescrição da Dívida, e que a Ré invocou em sede de oposição e em alegações orais.
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Tendo decorrido mais de dois anos, desde a data em que a A deixou a obra, até à data da propositura da acção, a dívida encontra-se prescrita.
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É a ré, AA que confirma o início e o fim daquelas obras no seu depoimento de 07-07-2022, reportando o seu começo em março de 2018 “Ré min 5:00: Devia ter sido ali em março, por ali”, esclarecendo que terminaram em finais de maio de 2018 Ré min 5:14: Sei lá, lá para fins de maio, ou isso assim, Ré min17:42: Eu não sei, mas lá para fins de maio, depois vieram os homens para a casa, os empreiteiros da casa e eles já lá não andavam Adv. da Ré min 17:48: Portanto, fins de maio de 2018? É isso? Ré min 17:54: Sim.
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Sendo ainda a ré mais esclarecedora quanto ao facto de a Autora nunca mais ter aparecido na obra Adv. da Ré min 17:57: Olhe, depois de maio de 2018, voltou a ser feita mais alguma coisa naquela obra? Ré min 18:09: Então, ele nunca mais lá apareceu.
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Aliás posição confirmada pelo legal representante da Autora no seu depoimento de 07-07-2022 11:12:41, quando a Instâncias do Meritíssimo Juiz relativamente ao facto se na data em recebe o cheque, dezassete de maio de 2018, já não estar na obra Juiz min 23:58: 17.05.2018, altura em que recebe o cheque. Gerente da A min 24:01: Acho que já tinha saído Senhor Doutor. Não tenho agora a certeza quando é que eu acabei, eu acho que sim que já tínhamos acabado.
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É o gerente da Autora quem assume que terminou a obra em maio de 2018 Adv.ª da Autora min 26:03: Oh Senhor BB quando então é que o Senhor acabou mais ou menos a obra? Gerente da Autora min 26:09: Foi em 2018 agora o mês certo… Adv.ª da Autora min 26:11: Em que altura? Gerente da Autora min 26:13: Talvez ao meio do ano, não sei… Adv.ª da Autora 26:24: Foi em Maio? Foi em Maio? Gerente da Autora min 26:27: Sim.
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Não pode admitir-se que o Tribunal “a quo” dê por provado em «2. No decurso dessa actividade e em início de Junho de 2018, foi contactada pela requerida para proceder à construção de uns barracões contíguos à sua casa de habitação.», e em «5. Os trabalhos realizados e materiais fornecidos são os discriminados na factura FT 18/83, emitida e entregue à requerida em 2018-07-12 e com vencimento em 2018-08-11, no valor de €14.319,78.», quando é por demais evidente, que a Autora iniciou a obra em princípios de 2018 (março), e depois de maio de 2018, a Autora não mais prestou qualquer trabalho.
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Deverão os pontos 2 e 5 da sentença ser dado como não provados, devendo passar a constar da matéria dada como assente, que o início das obras remonta a início de 2018 (março), e os trabalhos da autora terminaram em maio de 2018.
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Também a Testemunha, CC, nas suas declarações de 07-07-2022 12:04:54, confirma esta realidade Adv. da Ré min 5:42: Recorda-se em que altura é que eles saíram da obra? CC min 5:48: Então a casa começou em junho, final de maio por aí, início de junho no máximo. CC min 6:00: Talvez final de maio, não sei. Em junho começaram as obras da casa, e nessa altura já lá não andavam, isso recordo-me. Adv da Ré min 12:35: Portanto de maio para lá, não mais o Senhor BB, com a excepção dessa ida desse tal funcionário, se deslocou, procurou inteirar se havia defeitos se não havia defeitos se os havia de reparar se não havia de reparar. O Senhor alguma vez o proibiu de continuar a obra? CC min 12:53: Eu não. A única coisa que eu disse ao Senhor BB foi, eu dei-lhe um esboço, tínhamos combinado exactamente o que era para ele fazer (…) 14. De igual modo, no documento de fls. 11 e 12, e que o gerente da Autora assume, com efeito confessório como sendo da sua autoria, numa comunicação datada de 10 de outubro de 2018, escreve: “A obra foi acabada nos fins de maio…” 15. Tendo a A finalizado os trabalhos em maio de 2018, e tendo a Injunção sido intentada contra a Ré a 24-09-2020, há muito que a dívida prescreveu.
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O Tribunal “a quo” não conheceu, nem se pronunciou sobre a prescrição invocada e alegada pela Ré, o que consubstancia NULIDADE da actual decisão, nulidade essa que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.
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O Tribunal “a quo” ignorou a matéria confessória do legal representante da autora, quer do seu depoimento, quer do documento por si emitido, porquanto, no documento de fls. 11 e 12 é a Autora que confessa “Recebi até à data um total de 11.894,05 €…” 18. Por conseguinte, deve alterar-se o ponto 6 dos factos provados na sentença proferida pelo Tribunal “a quo” devendo ficar a constar que “Por conta da referida factura, a requerida procedeu ao pagamento da quantia de € 11.894,05.
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O Mmo. Juiz “a quo” refere que para julgar como provado os factos o Tribunal fundou a sua decisão no conjunto de provas processualmente adquiridas conjugadas com as regras da distribuição do ónus da prova e da experiência comum, nomeadamente na missiva de fls.11 e 12 que consubstancia a resposta, pela Autora, ao mandatário da ré, cujo teor se dá por reproduzido, logo, é evidente o não acerto da decisão proferida, pois que, é o documento emitido pela A, que assume o recebimento de €11.894, 05, e não, como consta da sentença, € 9.318,78.
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A 1.ª instância fundamentou e decidiu sobre a matéria de facto, de forma errónea, quanto ao ponto 12 dos factos provados.
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No relatório de fls. 43, para o Senhor Perito, o muro em questão aparenta ser ciclópico.
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O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador; o julgador está amarrado ao juízo pericial, sendo que sempre que dele divergir deve fundamentar esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação.
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Em parte alguma da sua fundamentação da sentença, o Mmo. Juiz a quo, justifica ou fundamenta o porque de afirmar que o muro foi realizado em betão armado.
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Para afastar-se do juízo científico, o Tribunal deve motivar com particular cuidado a divergência, indicando as razões pelas quais decidiu contra essa prova ou, pelo menos, expondo os argumentos que o levaram a julgá-la inconclusiva, e cotejando toda a sentença, nada é referido nesse concreto aspecto que possa contrariar o conhecimento técnico ou cientifico do Senhor Perito.
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O Tribunal atribui € 2637,59 por considerar ser o muro em betão armado, quando para o Senhor Perito o valor justificado seriam € 889,61, desde logo porque na sua ótica (fls.43 do relatório pericial), o muro “pela qualidade do betão, aparenta ser ciclópico”.
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Assim deverá o ponto 12 dos factos provados ser alterado, ficando a constar que: No muro de suporte de fundação do edifício do lado pendente da serra, foi despendido o valor de € 889,61, uma vez que, não sendo possível determinar a sua natureza, aparenta ser em betão ciclópico, sendo tal muro essencial para estabilizar o edifício, atendendo á orografia do terreno onde foi o mesmo implantado.
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Sendo alterada a decisão sobre a matéria de facto, no sentido de se considerar NÃO PROVADOS os factos supra transcritos, e dando como provado nos termos explanados é evidente que a Ré nada tem que pagar à autora.
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A dívida encontra-se prescrita.
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Sendo condenada, o que apenas por hipótese académica se admite, nunca no valor a pagar tem qualquer correspondência com o montante fixado na sentença.
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Finalmente, não pode ainda deixar de apontar-se outro evidente erro de direito à decisão de mérito no que...
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