Acórdão nº 25603/21.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO PINTO OLIVEIRA
Data da Resolução19 de Janeiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1.

AA intentou acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum, contra a Embaixada de Angola em Portugal, com sede na Av. República, 68, 1069-213 Lisboa, pedindo que seja a Ré condenada: I - A ressarcir o A. de todos os danos e prejuízos causados, os quais deverão ser fixados equitativamente, porém não em valor inferior a 30.000 Euros, considerando a gravidade da conduta da Ré, o estado de saúde frágil em que o A. se encontrava, a sua idade, a necessidade do tratamento médico e a privação repentina a que foi sujeito; II. - Na entrega ao A., do valor do apoio que deixou de receber desde 29.07.2019 e até a data em que lhe seja dada alta médica, acrescido de juros vencidos e vincendos, valor que totaliza presentemente, a quantia de 13.500 Euros, acrescida de 1.080 Euros de juros vencidos, no total de 14.580 Euros; III. - No pagamento de todas as custas, taxas moderadoras, despesas hospitalares, médicas e medicamentosas, quer as presentemente devidas pelo A., no valor de 1.005,37 euros, quer as posteriores até a data da sua alta médica, no seguimento dos tratamentos ainda necessários.

IV. - Por último, deverá a Ré ser condenada e, caso ainda venha em tempo útil, no restabelecimento da junta médica do A., deforma a assegurar os tratamentos, consultas, exames e medicamentos necessários, até a data da sua alta médica.

  1. A Ré Embaixada de Angola em Portugal não contestou, pelo que foi proferido o despacho seguinte: “A Ré, apesar de ter sido regularmente citada ( cfr. aviso de recepção junto aos autos no dia 30-12-2021), e decorrido o prazo legal, não veio deduzir contestação, nem constituir Mandatário.

    Posto isto, consideram-se confessados os factos, susceptíveis de confissão, articulados pelo Autor, nos termos do artigo 567.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, porquanto não se verifica nenhuma das excepções previstas no artigo 568.º do Código de Processo Civil.

    Pelo exposto, concede-se ao Autor o prazo 10 dias para vir juntar aos autos as suas alegações escritas, ao abrigo do disposto no artigo 567.º, n.º 2 do Código de Processo Civil”.

  2. O Tribunal de 1.ª instância proferiu despacho saneador-sentença, julgando a acção improcedente.

  3. O dispositivo do despacho saneador-sentença é do seguinte teor: “Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, julga-se a acção totalmente improcedente e, em consequência, decide-se:

    1. Absolver Ré EMBAIXADA DA REPÚBLICA DE ANGOLA EM PORTUGAL do pedido; b) Condenar o Autor AA no pagamento das custas processuais, sem prejuízo do apoio judiciário de que o mesmo beneficia.

    Fixa-se à causa do valor de 45.585,37 € (quarenta e cinco mil quinhentos e oitenta e cinco euros e trinta e sete cêntimos), nos termos das disposições conjugadas dos artigos 296.º, n.º 1, 297.º, n.ºs 1 e 2 e 306.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil.

    Registe e notifique.”.

  4. Inconformado, o Autor AA interpôs recurso de apelação.

  5. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: A. Intentou o A. a presente acção, no seguimento do cancelamento da junta médica que lhe tinha sido concedida pelo Estado Angolano, enquanto se encontrava a receber tratamentos pós operatórios por um carcinoma na próstata.

    1. O ora recorrente foi informado no Hospital ... onde decorriam os seus tratamentos, que os mesmos não poderiam ter continuidade.

    2. O recorrente não teve alta médica e não obstante a Embaixada de Angola em Lisboa, decidiu de forma unilateral cancelar a sua junta médica, sem qualquer justificação e sem prévia ou mesmo posterior comunicação.

    3. Sucede que, apesar de todos os factos terem sido considerados provados, perante a falta de contestação da Ré, a Exma. Juiz do Tribunal a Quo, absolveu a mesma do pedido.

    4. A Douta sentença de que se recorre, considerou provados todos os factos vertidos na p.i. e ao mesmo tempo, que « O Visto de Permanência/autorização temporária de residência do Autor expirou no dia 15 de Maio de 2019. Assim, verifica-se que a junta de saúde do Autor foi cancelada, pelo menos, no dia 29 de Julho de 2019, ou seja, posteriormente ao visto ter caducado. No documento assinado pelo Autor, no dia 01 de Agosto de 2018, consta expressamente que é um dos deveres dos doentes “é responsabilidade do doente e acompanhante, informar com 30 dias de antecedência a data do término do visto, passado o prazo o Sector não se responsabiliza pelas coimas/despesas.» F. Assim, é fundamentada a decisão de 1ª Instância, com a falta de cumprimento da obrigação não procedeu de culpa da Ré, pelo que fica afastada a presunção de culpa prevista no n.º 1 do artigo 799.º do Código Civil. Não tendo ficado provada a culpa da Ré, tem necessariamente que improceder a acção (cfr. artigo 798.º a contrario do Código Civil). Concluindo, fica prejudicado o conhecimento dos pedidos do Autor, porquanto a acção tem que improceder, conforme referido, julgando-se a acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolvendo a Ré EMBAIXADA DA REPÚBLICA DE ANGOLA EM PORTUGAL do pedido.

    5. Discorda porém o recorrente desta mesma Decisão.

    6. Com o devido respeito, o Tribunal a Quo formulou conclusões erradas, sem procurar indagar ou solicitar os devidos esclarecimentos ao A. quanto à renovação do visto e, tendo apenas por base um documento referente aos Direitos e Deveres do A. inerente à junta médica que lhe foi concedida, sem outro qualquer suporte probatório.

      I. Este mesmo Documento que serviu de base à total improcedência da presente acção, apenas respeita à irresponsabilização por parte do sector de Saúde da Embaixada de Angola em Lisboa, pelo pagamento de eventuais Coimas ou despesas devidas com o término ou prorrogação do visto do A.

    7. Porém, tais deveres nada tem a ver com o cancelamento da junta médica do A., já que só poderia ter lugar com a respectiva alta médica ou com o cancelamento unilateral por parte da Embaixada, como é o presente caso.

    8. Com efeito o A. tentou renovar o seu visto de estadia temporária, procedendo ao seu pedido de agendamento.

      L. No dia 04 de Abril de 2019 o Recorrente foi notificado pelo SEF, de que deveria comparecer no dia 21.06.2019 para a prorrogação do seu visto, conforme Documento 1 que se junta e cuja admissão se Requer, tendo em conta tratar-se de matéria da Douta sentença em crise.

    9. Sucede que, a renovação do visto em causa, carece da entrega de Declaração ( Termo e Responsabilidade ) por parte do Sector de Saúde da embaixada de Angola em Lisboa.

    10. Tal matéria não foi levada aos autos apenas por entender o A. ser de menor importância, tendo em conta a gravidade dos factos que foram levados aos autos.

    11. De igual modo entendeu o recorrente, não se prender directamente com o objecto do litígio.

    12. É sabido que as marcações no SEF suspendem a data de validade e de cancelamento dos vistos, tendo em conta os atrasos nos agendamentos e a absoluta impossibilidade de resposta aos interessados por parte daquela entidade, em tempo útil.

    13. No dia seguinte a ter sido notificado da data, o recorrente dirigiu-se ao Sector da Saúde da Embaixada comunicar o agendamento.

    14. Nos serviços administrativos, foi pedido ao recorrente para voltar alguns dias antes da data agendada, de forma a levantar o competente Termo de Responsabilidade, como é regra, para apresentar ao SEF, no acto da renovação.

    15. Sucede que, o recorrente deslocou-se várias vezes à Embaixada, sendo consecutivamente informado que o termo não estava assinado pelo Chefe da Secção, por ter viajado a Angola.

    16. No dia agendado, o recorrente compareceu aos serviços do SEF, onde aguardou pelo responsável do Sector da Saúde, tal como tinha combinado com os serviços administrativos da Embaixada, sem porém ter recebido o Termo de Responsabilidade.

    17. Desta forma, o recorrente ficou impedido de renovar o visto naquela data.

      V. Posteriormente, o Recorrente teve conhecimento do cancelamento da sua junta médica.

    18. Com o devido respeito, a sentença a Quo tratou de forma leviana a matéria objecto dos presentes autos, não enquadrando a difícil e debilitada situação de alguém submetido em estado de pós operatório por carcinoma e que se encontrava em tratamentos a realizar tratamentos quimioterapia, sabendo a agressividade que isso representa.

      X. Ainda assim, o recorrente tentou por todos os meios, no meio dos seus tratamentos, diligenciar pelo agendamento para renovar o seu visto/autorização de residência temporária, bem como de estabelecer todos os contactos necessários com o respectivo Sector da Embaixada, em cumprimento ao procedimento administrativo de permanência em território nacional.

    19. Nada mais havendo ao seu alcance.

    20. Por todo o exposto, considera o recorrente que, a Exma. Juiz do Tribunal de primeira Instância, pronunciou-se com base em factos que não procurou conhecer de forma devida, decidindo de forma contrária ao que seria exigido, tendo em conta todos os factos dados como provados, o que não permitia outra decisão senão condenar a Ré nos termos peticionados.

      Termos em que, nos melhores de Direito, Doutamente supridos por Vªs Excias., deverá a sentença de primeira Instância ser substituída por sentença em que a Ré seja condenada: I. A ressarcir o A. de todos os danos e no valor de 30.000 Euros, considerando a gravidade da conduta da Ré, o estado de sáude frágil em que o A. se encontrava, a sua idade, a necessidade do tratamento médico e a privação repentina a que foi sujeito.

      II. Entregar ao A., do valor do apoio que deixou de receber desde 29.07.2019 e até a data em que lhe seja dada alta médica, acrescido de juros vencidos e vincendos, valor que totaliza presentemente, a quantia de 13.500 Euros, acrescida de 1.080 Euros de juros vencidos, no total de 14.580 Euros; III. No pagamento de todas as custas, taxas moderadoras, despesas hospitalares, médicas e medicamentosas, quer as...

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