Acórdão nº 2/23 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Maria Benedita Urbano
Data da Resolução11 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 2/2023

Processo n.º 1009/2022

1.ª Secção

Relatora: Conselheira Maria Benedita Urbano

Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – RELATÓRIO

1. A., arguido e aqui recorrente, foi, como consta do acórdão a seguir mencionado, condenado “como autor, sob a forma consumada e como reincidente, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelos arts. 14º, n.º 1, 26.º, 75.º e 76.º, do C.P. e 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de janeiro, com referência às Tabelas LA, IB e IC anexas àquele diploma, cujo último ato ocorreu em 30-08-2021, na pena de 3 (TRÊS) ANOS E 6 (SEIS) MESES DE PRISÃO”, tendo recorrido dessa decisão para o Tribunal da Relação do Porto (TRP), formulando as seguintes conclusões:

“1- O arguido foi acusado da prática de um crime p. e p. pelo art.º. 21 do D.L 15/93.

Produzida, examinada e discutida a prova entendeu o douto Tribunal convolar para o crime de tráfico de menor gravidade, art 25 do D.L. 15 /93.

O presente recurso incide sobre:

Medida da pena.

Não valoração de circunstâncias atenuativas mormente a sua condição de consumidor.

A confissão dos factos. Arrependimento manifestado. O tratamento encetado.

O arguido, não tinha bens, provenientes da atividade, mas nos anos que antecedem tem rendimentos do trabalho e na data recebia quantia respeitante ao fundo de desemprego 621 euros que permitia sua subsistência sendo que a companheira trabalhava, ou seja, não vivia da traficância muito pelo contrário.

Da contradição insanável

Da insuficiência da matéria de facto dada como provada

Do vício de fundamentação

2- O grau de pureza do estupefaciente apreendido é manifestamente baixo e revelador de menor,

3- O facto de a droga ter sido apreendida in totum e objetivamente se ter dado como provado que apenas foi vendido a terceiros estupefaciente em quantidade e qualidade não apurada mas cujo custo aquisitivo rondou os 20 euros.

4- Foi excessivamente valorada para a incriminação o teor do CRC, na parte em que se faz referência a condenações anteriores a 2012.

5- Da aplicação da Reincidência:

Tendo em conta que objetivamente se constata a cedência de 20 euros de estupefaciente e o resultado da apreensão conjugado com efetivo exercício de atividade profissional, mais veja se que se dá relevo a factos respeitante a 26 de maio onde o arguido pretende incrementar conhecimentos, para alguém que consome estupefaciente só permite a conclusão que nesta matéria não era expedito, nem experimentado/conhecedor, muito pelo contrário. Ademais, o sucedido ocorre em contexto próprio, numa vinda excecional ao Porto não ocorrem outras vindas para transporte de estupefaciente nos moldes provados o que nos permite defender por uma ocasionalidade/oportunidade de censura que não deve remeter a uma condenação por reincidência. No sentido do ora pugnado, veja-se o decidido pelo Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 07-02-2018 relativo ao processo nº 858/16.1PCLSB.L1-3 em que foi Desembargador a Exma. Senhora Juiz Maria Da Graça Santos Silva

«1-A repetição de crimes não determina sempre uma situação de reincidência, ainda que verificados os pressupostos formais a que se reporta o artº 752/CP.

2- Apenas a pluriocasionalidade fica atestada face à mera constatação da “sucessão” de crimes.

3- A pluriocasionalidade é um menos em relação à reincidência, cuja certificação está dependente de concreta apreciação em sede de decisão judicial, dos pressupostos materiais a que alude a referida norma.

4- A reincidência implica que, além da verificação dos respetivos pressupostos formais, haja factualidade demonstrativa de que o arguido não sentiu as anteriores condenações como suficiente advertência para não delinquir (trata-se fundamentalmente de prevenção especial), exigindo-se ainda que, atentas as circunstâncias do caso, ocorra uma íntima conexão entre os crimes reiterados, adequadamente relevante em termos de censura e de culpa».

6- Não pode o tribunal “a quo” decidir pela possibilidade de suspender ou não a execução da pena única e exclusivamente pelo facto do arguido ter antecedentes criminais. Ocorrendo um vício de fundamentação nos termos do disposto no artº. 374 nº 2 do C.P.P, mais tendo em conta o tratamento encetado podia o tribunal sujeitar o arguido a continuação de tratamento e a fazer prova trimensal de o ter feito, manter se ainda profissionalmente ativo.

No sentido do ora pugnado veja-se o decidido pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 23-05-2018, em que foi Relator o Exmo. Senhor Juiz Desembargador Orlando Gonçalves, no âmbito do processo nº 1162/16.0PCCBR.C1.

7- O arguido confessou a prática do crime pelo qual vinha acusado, demonstrou espírito crítico e arrependimento sincero.

8- Encontra-se inserido social e profissionalmente, tem o apoio incondicional da sua família

9- Radica o douto tribunal em contradição insanável vício do 410º do C.P.P.

Ora se considera que o Telemóvel não é essencial nem determinante para a prática do crime, comos e concluiu que o telemóvel deverá ser declarado perdido.

Vivemos na era das comunicações, qualquer aparelho marca e modelo permite a efetiva comunicação pelo que não se poderá concluir que o aparelho seja essencial para a prossecução do crime, devendo o mesmo ser restituído.

10- Ocorre insuficiência da matéria de facto (violador do disposto no artigo 410º nº 2 a), a única venda que o tribunal considera é de 20 euros, não tendo considerado qualquer outro facto que permita objetivamente transações, pois os pontos que se faz referência ao coarguido e que o tribunal entendeu como conversas relativas a estupefaciente, não logrou a apurar a efetiva transação, nem tão pouco contrapartidas financeiras, integrando na ótica da defesa o vício elencado.

11- Dispõe o normativo do 344º do C.P.P. que o arguido pode declarar em qualquer momento da audiência que pretende confessar os factos que lhe são imputados,

Para haver uma confissão integral e sem reservas tem que o arguido antes da produção da prova confessar todos os factos que vem acusado?

No modesto entendimento da defesa, não!

A confissão do arguido tem é de corresponder à totalidade dos factos que vierem a ser dados como provados.

Entende-se como mais adequada, justa e proporcional a aplicação de uma pena suspensa na sua execução, sujeita a um rigoroso regime de prova que ateste a desvinculação ao consumo de estupefacientes, fator que esteve na base do crime cometido.

Sem prejuízo e caso o entendimento seja diverso, entende-se mais adequado justo e proporcional a aplicação de uma pena que lhe permita o cumprimento em regime de permanência na habitação com recurso a vigilância eletrónica que permita ao arguido continuar a sua atividade profissional de forma a não afastar este arguido da ressocialização que se impõe! (sujeitando-o naturalmente também a um regime de prova que ateste a desvinculação ao consumo de estupefacientes).

Caso o tribunal assim não o entenda, deverá a pena a cominar ser diminuída no seu quantum, pois a cominada é violadora do princípio da proporcionalidade ex vi artº 18º nº 2 da C.R.P. e 70º nº 1 do CP.

Requer-se a realização de audiência nos termos e para os efeitos dos artigos 411º nº 5, para debater os seguintes pontos do recurso, das conclusões de recurso. Pontos 4, 5, 9 10 e 11 das conclusões de recurso.

Normas jurídicas violadas, a saber: 70º e 71º do C.P e 18º nº 2 da C.R.P, 412º nº 3 do C.P.P, 374 nº 2 do C.P.P, 410º nº 2 a do C.P.P, 410 nº 2 alínea a) do C.P.P.”.

2. Por acórdão do TRP, datado de 28.09.2022, decidiu-se “negar provimento aos recursos interpostos pelos arguidos A. e B.”, escrevendo‑se o seguinte:

“[…]

B) QUANTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO A..

Da medida da pena

O recorrente A., aceitando a qualificação jurídica dos factos pelos quais veio a ser condenado, começa por censurar o acórdão recorrido no que concerne à determinação da medida concreta da pena. Segundo ele, o Tribunal a quo não valorou devidamente algumas circunstâncias atenuativas, designadamente a sua condição de consumidor, a confissão dos factos, o arrependimento manifestado e o tratamento encetado. Acrescenta que não tinha bens, provenientes da atividade de tráfico, que nos anos que antecedem tem rendimentos do trabalho e na data dos factos recebia 621 euros de subsídio de desemprego, o que permitia a sua subsistência, sendo que a companheira trabalhava, ou seja, não vivia da traficância muito pelo contrário. Mais acrescenta que o grau de pureza do estupefaciente apreendido é manifestamente baixo, que viveu período depressivo e, por conseguinte, sofreu uma recaída, e que a droga foi toda apreendida. Termina alegando que o teor do CRC, na parte em que se faz referência a condenações anteriores a 2012, foi excessivamente valorado.

Antes de apreciar a questão, importa recordar que os recursos são sempre remédios jurídicos e que também em matéria de pena mantém o arquétipo de recurso-remédio. Com efeito, como refere o Ac. TRE de 16.06.2015, em sede de escolha e de medida concreta da pena, o recurso não deixa de possuir o paradigma de remédio jurídico, no sentido de que a intervenção do tribunal de recurso, também nesta matéria, deve cingir-se à reparação de qualquer desrespeito, pelo tribunal recorrido, dos princípios e normas legais pertinentes, não sendo de modificar penas que, dentro desses princípios e dessas normas, ainda se revelem congruentes e proporcionadas.

A propósito da determinação concreta da pena, como refere o Ac. TRE de 06.06.2017, a doutrina mais representativa e a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça têm sufragado o entendimento de que a sindicabilidade da medida da pena em recurso abrange a determinação da pena que desrespeite os princípios gerais respetivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos fatores de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT