Acórdão nº 885/22 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. António José da Ascensão Ramos
Data da Resolução21 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 885/2022

Processo n.º 959/2022

2.ª Secção

Relator: Conselheiro António José da Ascensão Ramos

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), «para declaração da inconstitucionalidade, do artigo 417º, 8 do CPP, na interpretação feita Acórdão no sentido de não ser possível a Reclamação para a Conferência, por tal interpretação constituir violação do 20º CRP.» (cf. fls. 28).

Em concreto, em 8 de junho de 2022, o Tribunal da Relação do Porto decidiu indeferir a reclamação da decisão sumária do mesmo Tribunal que, em 20 de abril de 2022, negou provimento ao recurso apresentado pela recorrente sobre o despacho de não admissão da abertura de instrução (cf. fls. 6-14).

2. Por decisão datada de 28 de junho de 2022, não se admitiu tal recurso, com os seguintes fundamentos, (cf. fls. 29-30):

«(…)

A assistente A. veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, alegando que o faz ao abrigo do disposto no artº 70º nº 1 al. a) da LTC, da interpretação feita no acórdão recorrido do artº 417º nº 8 do CPP, no sentido de não ser possível a reclamação para a conferência.

Dispõe o artº 70º nº 1 al. a) da LTC que "cabe recurso para o Tribunal Constitucional, em secção, das decisões dos tribunais que recusem a aplicação de qualquer norma, com fundamento em inconstitucionalidade.

Como esclarece Lopes do Rego "são dois os pressupostos de admissibilidade deste tipo de recurso: que a decisão recorrida haja recusado efetivamente a aplicação de certa norma ou interpretação normativa, relevante para a dirimição do caso e que tal desaplicação normativa se funde num juízo de inconstitucionalidade do regime jurídico nela estabelecido”.

Ora, como se verifica da simples leitura da decisão recorrida, proferida em 08.06.2022, este tribunal não recusou a aplicação de qualquer norma, muito menos com fundamento em inconstitucionalidade. Com efeito, até considerámos ser de apreciar a reclamação para a conferência ainda que o reclamante não tivesse invocado razões específicas para contrariar o sentido da decisão.

E, por isso, sobre a questão apreciada na decisão sumária, recaiu acórdão proferido em conferência, devidamente subscrito pela relatora, o Sr. Juiz Adjunto e o Sr. Presidente da Secção.

Não se verificando os pressupostos de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, carece o mesmo de objeto, sendo por isso inadmissível.

Pelo exposto, não se admite o recurso interposto para o Tribunal Constitucional – artº. 76º nºs 1 e 2 da LTC.».

3. Notificada de tal decisão, reclamou a então recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 76.º, n.º 4, da LTC, argumentando o seguinte (cf. fls. 32):

«A., Recorrente nos Autos em referência, tendo sido notificada do despacho nº 15888671 não pelo qual se admitiu o Recurso para esse Tribunal, vem do mesmo, e nos termos do artº 643º do CPC

RECLAMAR

Da Retenção do Recurso já identificado, atendendo-se às sumárias razões

doravante expostas

De facto, no modesto entender da ora peticionante, o Recurso interposto, é-o à luz do preceituado na LTC, mormente, o artigo 75º A da mesma lei, mormente no que a diz respeito a decisões surpresa, onde,

A prévia invocação da inconstitucionalidade é dispensada.

Atentas as razões de Direito supra, sem prejuízo do sábio e superior entendimento de V. Exa, deverá ser a presente Reclamação ser considerada procedente, admitindo-se desse modo o Interposto Recurso.»

4. O Ministério Público, junto do Tribunal Constitucional, aderiu aos argumentos constantes da decisão reclamada. Assinalou, ainda, o seguinte (cf. fls. 39-44):

«(…)

16. Caracterizando-se o sistema de fiscalização concreta de constitucionalidade pela normatividade, o objeto normativo constitui a condição essencial do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

17. Não se trata, porém, da única condição. Neste tipo de recursos, exige-se ainda (e exige-se cumulativamente): (i) o esgotamento dos recursos ordinários que no caso cabiam; (ii) a prévia suscitação da questão de inconstitucionalidade normativa (com o específico sentido atrás apontado), “durante o processo” e “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (n.º 2 do artigo 72.º da LTC); e, enfim, (iii) a aplicação, na decisão recorrida, como ratio decidendi, da norma tida por inconstitucional pelo recorrente, na concreta interpretação correspondente à dimensão normativa delimitada no requerimento de recurso, pois “[…] só assim um eventual juízo de inconstitucionalidade poderá determinar uma reformulação dessa decisão” (Ac. TC n.º 372/2015).

18. O sistema de fiscalização concreta da constitucionalidade incide sobre normas, e não é um “contencioso de decisões” seja qual for a sua natureza (cfr., Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, Almedina, Coimbra, 2010, pp. 26, 98; Jorge Reis Novais, Sistema Português de Fiscalização da Constitucionalidade. Avaliação Crítica, AAFDL Editora, Lisboa, 2019, p. 51).

19. A ausência dos dois últimos pressupostos de admissibilidade...

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