Acórdão nº 638/20.0PBFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução22 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Faro – Juiz 2, no âmbito do Processo 638/20.0PBFAR foram os arguidos AA, BB e CC submetidos a julgamento em Processo Comum (Tribunal Singular).

Após realização da audiência de discussão e julgamento, o Tribunal, por sentença de 11 de maio de 2022, decidiu: A. Absolver o arguido AA da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 132.º, n.º 2, alínea h), todos do Código Penal; B. Condenar o arguido BB pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 132.º, n.º 2, alínea h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão efetiva; C. Condenar o arguido CC pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 132.º, n.º 2, alínea h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão efetiva.

* Inconformado com a decisão, o arguido CC interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: a.O presente recurso tem como objeto impugnar a decisão proferida no que concerne à matéria de direito por aplicação de uma pena de prisão desadequada e desproporcional não sujeita ao instituto da suspensão da execução da pena de prisão.

b. O ora recorrente foi condenado, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 143.o, n.º 1, 145.o, nº 1, alínea a), e n.º 2, e 132.o, n.º 2, alínea h), todos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão efectiva, entendendo o Tribunal a quo, aplicar uma pena de prisão distinta aos dois arguidos, sem, no entanto, atribuir ao ora recorrente um juízo de especial censurabilidade e/ou outro apto a justificar a aplicação de uma pena distinta, em prejuízo do ora recorrente.

c. É inevitável concluir que na determinação da medida da pena aplicada ao ora recorrente, CC, quando em termos comparativos se demarca por excesso da pena aplicável ao co-arguido, é manifestamente excessiva, e viola o previsto no artigo 71.º do Código Penal, tal como plasmada na decisão sobre a matéria de direito.

d. A medida da pena aplicada ao ora recorrente, afigura-se injusta e ilegal, superando em muito a adequação, necessidade e proporcionalidade exigidas na determinação da medida da pena a aplicar ao ora recorrente, considerando a sua contribuição e participação para a prática dos factos apurados partir de toda a prova produzida, que não é reputada de essencial e/ou especial comparativamente a qualquer outro co-arguido.

e. Na concreta determinação da medida da pena, o Tribunal “a quo”, desconsiderou em prejuízo do aqui recorrente a seguinte factualidade: i. A dinâmica relacional familiar do ora recorrente, CC, que surge caracterizada como pautada por consistentes sentimentos de pertença e de cooperação familiar, plasmados no relatório social e no depoimento da testemunha DD, aliás totalmente desconsiderado na Sentença ora recorrida.

ii. A inserção laboral do ora recorrente, CC, que nas circunstâncias de tempo anteriores à sua detenção se encontrava com um percurso profissional estável desempenhando a actividade profissional de mariscador.

iii. A inserção social do aqui recorrente, CC, designadamente o facto do ora recorrente ter o seu quotidiano estruturado primacialmente pela actividade laboral, e pela vida familiar, que surge em termos sociocomunitários positivamente referenciado, inexistindo indicadores de comportamentos de risco.

iv. O facto do ora recorrente, CC, no decurso da sua reclusão ter encetado um comportamento globalmente positivo, quer ao nível do cumprimento das normas e regras institucionais, quer no relacionamento interpessoal, assumindo ainda uma postura activa no desenvolvimento de actividades ocupacionais.

v. O facto do ora recorrente, CC, contar com um consistente suporte familiar, designadamente progenitora e irmãs, circunstância alias totalmente desconsiderado na Sentença ora recorrida.

vi. O facto do aqui recorrente, CC, ser um jovem com 23 anos de idade, à data dos factos com 21 anos e, consequentemente, passível à aplicação do Regime Penal Aplicável a Jovens Delinquentes, introduzido pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro.

f. Ao ter sido aplicada ao ora recorrente, CC, uma pena de prisão efectiva de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, desconsiderando em absoluto o enquadramento familiar, labora e social do ora recorrente, sem prejuízo aliás da pena distinta aplicada ao co-arguido em desfavor do ora recorrente, inevitavelmente conclui-se que a pena de prisão concretamente aplicada ao ora recorrente é excessiva e violadora do previsto no artigo 71.º do Código Penal.

g. À pena de prisão efectivamente aplicada ao ora recorrente é legal e formalmente admissível a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão, nos termos do disposto no artigo 50.º e seguinte do Código Penal.

h. Nos termos do disposto no artigo 50.º n.º 1 do Código Penal, a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão depende da verificação de um pressuposto material e um formal.

i. Pressuposto formal – pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos.

ii. Pressuposto material – a personalidade do agente e circunstâncias do facto como sendo passiveis de juízo de prognose favorável.

i. O recorrente, encontra-se familiar e laboralmente enquadrado, dispondo de um contexto familiar francamente positivo e propicio a um juízo de prognose favorável ao comportamento a adoptar pelo recorrente uma vez posto em liberdade, nada levando o Tribunal “a quo” a concluir que o ora recorrente volte a praticar factos de idêntica natureza ao quais veio vem condenado.

j. O Recorrente assume uma posição assertiva em relação aos factos em juízo e à consequência dos mesmos, devendo-lhe reconhecido um juízo de prognose favorável em relação ao comportamento futuro.

k. O ora recorrente em ambiência prisional tem adoptado um comportamento globalmente positivo, quer ao nível do cumprimento das normas e regras institucionais, quer no relacionamento interpessoal, assumindo ainda uma postura activa no desenvolvimento de actividades ocupacionais, ademais demonstrativa do juízo de censura que faz sobre as suas condutas, não transigindo nem desculpabiliza o seu comportamento.

l. O consistente suporte familiar do recorrente que se encontra familiarmente enquadrado por uma estrutura familiar nuclear definida e estável, permite um juízo de prognose favorável ao ora recorrente.

m. A não aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, afigura-se como violador do previsto no artigo 50.º do Código Penal.

Deve, pois, ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser reformada a sentença condenatória, modificando a decisão da matéria de direito, designadamente a aplicação de uma pena de prisão inferior a 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, sempre sujeita a aplicação do instituto da suspensão da execução da mesma.

Vossas Excelências, porém, melhor decidirão como for de JUSTIÇA!*O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pugnando pela respetiva improcedência e concluindo assim: 1. Atendendo aos fundamentos da decisão recorrida e às circunstâncias do caso concreto, verifica-se que a escolha e a dosimetria da sanção imposta foram levadas a cabo com ponderação da matéria fáctica apurada e respeito pelos critérios legais aplicáveis (estatuídos nos artigos 40.º, nºs 1 e 2, 70.º e 71.º todos do Código Penal).

  1. Da análise da Sentença não resulta fundamento válido para o pretendido regime probatório de suspensão, ou mesmo substituição por multa, porquanto o grau de ilicitude dos factos é elevado - considerando os atos praticados pelos arguidos (vários murros e pontapés na cabeça e nos braços do ofendido) – e não se apuraram fatores que beneficiem o recorrente/arguido ou suscitem maior benevolência.

  2. A personalidade do recorrente/arguido, as condições da sua vida e conduta anterior ao crime são reveladoras de elevadas exigências de prevenção especial, não permitindo concluir – com seriedade – que a simples censura do facto e a ameaça da prisão ou a prestação de trabalho comunitário realizariam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cf. os artigos 50.º, nº1, e 58.º, nº1, do Código Penal).

  3. O passado criminal do recorrente/arguido (que na data dos factos detinha 21 anos, já somava cinco condenações, sendo pelo menos uma dessas condenações anteriores, já em pena de prisão, embora suspensa na sua execução), contraria firmemente um juízo de prognose social favorável, refletindo-se necessariamente na escolha da efetividade da sanção.

  4. O recorrente/arguido tem uma enorme dificuldade em adotar um estilo de vida conforme à lei, tendo até, já sido alvo de aplicação da medida de quatro dias de permanência obrigatória no alojamento em meio prisional, o que patenteia fortíssimas exigências de prevenção especial.

  5. Não se encontram preenchidos os pressupostos do artigo 50.º do Código Penal, porque ao caso concreto se impõe a efetividade da pena.

  6. Ressalta da fundamentação da decisão recorrida, que o tribunal a quo ponderou não só os factos objetivos mas também, como lhe competia, os antecedentes, a personalidade e as condições de vida de cada um dos arguidos, assim observando os critérios que presidem à fixação da pena concreta, de harmonia com o disposto no artigo 71.º n.ºs 1 e 2, do Cód. Penal.

  7. A gravidade...

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