Acórdão nº 184/10.0BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução10 de Novembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade “SISTEMAS M...’S PORTUGAL, LDA” tendo por objeto o deferimento parcial de reclamação graciosa apresentada contra o ato de liquidação adicional de IRC de 2003

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “I

O presente Recurso vem reagir contra a Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação, anulando a liquidação de IRC referente a 2003, que resultou de ação de inspeção realizada pelos serviços de inspeção tributária (SIT) da Direção de Finanças (DF) de Lisboa, sendo que a questão em análise diz respeito à não aceitação da dedutibilidade fiscal do gasto contabilizado referente à aquisição de bilhetes do Sporting Clube de Portugal, no montante de € 43.644,62

II

A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, total e acertada aplicação das normas legais aplicáveis ao caso sub judice e, bem assim, uma correta apreciação da matéria de facto relevante

III

Como resulta do relatório de inspeção tributária, os serviços de inspeção tributária (SIT) solicitaram ao sujeito passivo os elementos referentes às operações comerciais com clubes de futebol relativos à aquisição de camarotes ou ingressos nos estádios de futebol, o sujeito passivo apresentado elementos referentes ao Sporting CP, ao SL Benfica e ao FC Porto (cf a alínea C) dos factualidade provada, página 20 da sentença)

IV

Como resulta do relatório de inspeção, relativamente ao Sporting CP, verificaram os SIT que a ora impugnante, em 1999, celebrou com o Sporting um contrato promessa de arrendamento de um lote de terreno destinado à construção e exploração de um restaurante, tendo a Mc Donalds procedido a um adiantamento de € 498.797,90 (correspondente a 100.000 contos)

V

Em 30-08-2001, tendo como justificação a impossibilidade de concretizar o negócio prometido, de arrendamento de terreno para construção e exploração de restaurante, foi celebrado um acordo entre as partes, em que se estabelece a forma do adiantamento, prevendo-se entre as contrapartidas a atribuição à Mc Donalds, de bilhetes nas épocas de 2001/2002 e 2002/2003, no montante de € 174.579,26, dos quais € 43.644,82 foram contabilizados em 2003 (cf págs 19 do RIT, transcrito a págs 18 da sentença). Este acordo constava em anexo 10 ao RIT, tendo-se verificado que o mesmo não se encontrava junto aos autos, não tendo igualmente sido possível localizá-lo. Não obstante, o sujeito passivo em algum momento suscitou alguma discordância relativamente às cláusulas do acordo mencionadas no relatório de inspeção

VI

Os factos descritos revelam as contrapartidas que se encontravam previstas no acordo celebrado em 2001

VII

A douta sentença recorrida refere-se às duas correntes da jurisprudência, acolhendo a corrente que defendia que a comprovação dos gastos podia fazer-se com recurso a outros documentos que, não contendo embora as específicas solenidades da fatura, indicassem explicitamente as principais características da operação, entendendo a douta sentença, que, à data dos factos, o documento justificativo de um lançamento contabilístico e, em particular, um documento comprovativo de um custo não tinha que ser constituído por uma fatura ou documento equivalente, importando antes que o documento fosse adequado a comprovar a realização da operação e a relacioná-la com a fonte produtora

VIII

A fazenda não pode conformar-se com a douta sentença recorrida que considera que a AT não pôs em causa a materialidade das operações, considerando que apenas terá exigido uma documentação que não era exigível, aceitando que o acordo pudesse justificar o lançamento e a efetividade da despesa

IX

Importa salientar que a contabilização como custo tendo por base o acordo de 2001, não constitui justificação suficiente para o encargo contabilizado em 2003, face à inexistência de fatura ou qualquer outro documento equivalente que comprove o encargo contabilizado e a sua conexão com a atividade e com os factos descritos

X

E, não se trata apenas de exigir uma fatura, mas de aferir da existência de um comprovante do ano de 2003, da realização da despesa e da sua conexão com a atividade da empresa

XI

Com efeito, se o documento do anexo X é de 2001 e mais nenhum outro foi apresentado, nem outra prova foi produzida, cabe perguntar onde está a prova da realização da operação, que a douta sentença recorrida considera estar realizada

XII

Importa salientar que o teor do acordo (anexo X do RIT), descrito no RIT (e não contestado pelo sujeito passivo), não justifica o lançamento do custo em 2003, desde logo porque os termos do acordo contêm obrigações futuras que podem ou não ter sido concretizadas

XIII

Sendo que o relatório de inspeção evidenciou a impossibilidade de aceitação dos lançamentos contabilísticos como custo fiscal baseados no acordo (cf facto C) da sentença, página 36 da sentença), porquanto o acordo corresponde a uma declaração de vontade das partes, manifestada em 2001, sendo que a cedência de bilhetes, o direito à utilização do camarote ou a atribuição do estatuto de patrocinador do Sporting, são prestações de serviços com contrapartidas monetárias, que terão de ser faturadas. Ora, no caso concreto, nem foram faturadas, nem foi efetuada prova por qualquer outro meio, do comprovativo que justifica o lançamento como custo em 2003

XIV

Acresce ainda referir que cabe ao sujeito passivo o ónus de demonstrar a efetividade da operação e o montante do gasto, não podendo servir como comprovante do gasto contabilizado em 2003, um acordo celebrado em 2001. Neste sentido veja-se o acórdão do TCA Sul de 18-01-2005, processo nº 00066/03 (disponível em www.dgsi.pt), esclarecendo que cabe ao contribuinte o ónus da prova

XV

Importa salientar que a ora impugnante também não efetuou a prova por qualquer outro meio, sendo certo que, um contrato celebrado em 2001, não justifica um custo em 2003, tanto mais que não consta da contabilidade qualquer documento que permita a sua contabilização. Os SIT verificaram que foi efetuado por mero encontro de contas, não se encontrando devidamente documentado (cf págs 45 e 46 do RIT, paginas 36 e 37 da sentença)

XVI

Em suma, se o acordo em abstrato prevê que venham a existir certas contrapartidas no futuro, no caso concreto é certo que não se encontra comprovado nem justificado a realização de despesas que possam ser contabilizadas como custo e o seu lançamento como custo. Recorde-se que os lançamentos na contabilidade terão de ter o correspondente documento de suporte

XVII

Sendo que, importa referir que o referido acordo que constitui o anexo X do relatório de inspeção tributária (RIT) não permite extrair que tenham sido atribuídos bilhetes no montante de € 43.644,82 contabilizados em 2003, como decorre desde logo do facto de o mesmo ter data de 30-08-2001. Assim, em face dos factos detetados, a correção efetuada pelos serviços de inspeção revela-se correta e adequada

XVIII

A douta sentença incorre assim em erro de julgamento de facto e de direito, infringindo as normas do artigo 74º da LGT e do artigo 23º do CIRC

XIX

Acresce ainda referir que a douta sentença recorrida condena a Fazenda no pagamento de juros indemnizatórios como decorrência automática da procedência da impugnação, não analisando sequer a existência ou não de erro imputável ao serviço, pressuposto previsto no artigo 43º, nº 1 da LGT para o nascimento da obrigação de juros indemnizatórios

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente

Porém, V. Exªas decidindo, farão a costumada JUSTIÇA

*** A Recorrida apresentou as seguintes contra-alegações: “i.

  1. Deve o recurso interposto pela Fazenda Pública ser rejeitado na parte relativa à matéria de facto, por incumprimento do ónus de alegação previsto no artigo 640.º do CPC

  2. Isto porque, não só não é possível descortinar uma discordância efetiva por parte da Recorrente com a matéria de facto dada como provada, como também não são identificados quaisquer factos novos que, no entender da Recorrente, devessem ser aditados ao probatório

  3. O recurso não merece provimento, pois a Recorrente (i) pretende fundamentar a posteriori o ato tributário; (ii) omite a presunção de veracidade do declarado pelo sujeito passivo e (iii) esquece o disposto no artigo 100.º do CPPT

  4. Como ficou provado nos autos, os SIT consideraram, no Relatório de Inspeção, que o acordo celebrado entre a ora Recorrida e o Sporting em 30.08.2001 (que constava do anexo 10 ao Relatório de Inspeção) não era, em abstrato, um “documento aceite fiscalmente para justificar um custo”, afirmando que faltava a fatura emitida pelo Sporting

  5. Só na decisão da reclamação graciosa é que a AT veio afirmar que a contabilidade da Recorrida deveria ter outros documentos de suporte (mormente, subentende-se, de origem interna)

  6. Decidiu bem o Tribunal a quo, na esteira de jurisprudência agora pacífica, pela inadmissibilidade da fundamentação a posteriori, de quanto resulta que a fundamentação constante da decisão da reclamação graciosa não releva para efeitos de aferição da legalidade da correção e do ato de liquidação postos em crise

  7. Mais andou bem o Tribunal a quo ao decidir que, beneficiando as declarações dos contribuintes de uma presunção de veracidade (cfr. artigo 75.º da LGT), cabia à AT, ora Recorrente, o ónus da prova dos factos por si invocados para sustentar a correção efetuada no Relatório de Inspeção e sindicada nos autos

  8. Com efeito, contrariamente ao alegado pela Recorrente, para pôr em causa as declarações da Recorrida e fundamentar os factos constitutivos da correção efetuada, nos termos dos artigos 74.º e 75.º da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT