Acórdão nº 82/17.6T8VPC-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução10 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório O Ministério Público propôs a acção de inibição do exercício das responsabilidades parentais, contra J. P.

, pedindo se decrete a inibição total do exercício das responsabilidades parentais do requerido relativamente ao seu filho menor G. F., nascido em -.05.2010, em Bragança, residente na Rua …, n. º.., ….

Alega, quanto a factos relevantes para decisão da causa que: a) o menor G. F., a sua mãe D. M. e o pai viveram juntos até ao dia 20 de Maio de 2016, data em que a mãe do menor e este se refugiaram numa casa abrigo, por força das agressões perpetradas, em ambos, pelo progenitor; b) na sequência das ditas agressões, a progenitora apresentou queixa e foi instaurado o competente processo crime, que correu termos sob o n.º207/16.9PBCHV no Tribunal Judicial de Chaves, no qual foi o requerido condenado, por sentença já transitada em julgado, na pena de 3 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de violência doméstica na pessoa de D. M., mãe do G. F. e na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, pela prática de um crime de violência doméstica, na pessoa do seu filho G. F., e na pena acessória de proibição de contactos com o seu filho G. F., pelo período de 2 anos; c) que desde Maio de 2016 até à presente data que o menor não tem qualquer contacto com o seu pai; crescendo e vivendo aos cuidados da sua mãe e da sua avó paterna, M. B., com quem reside, onde se encontra integrado, sendo estas que lhe proporcionam as necessárias condições de saúde, educação e equilíbrio emocional; que o requerido nunca fomentou o desenvolvimento físico, intelectual e moral do filho G. F., antes pelo contrário, agredindo-o e insultando-o com frequência, o que configura uma infracção culposa dos seus deveres para com o seu filho, com grave prejuízo deste, sendo evidente que o mesmo não tem condições, no futuro, de cumprir com esses mesmo deveres.

Juntou documentos e arrolou testemunhas.

O réu, devidamente citado, apresentou contestação, juntou documentos e arrolou testemunhas.

Realizou-se a audiência de julgamento.

A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e em consequência absolveu o requerido do pedido.

Inconformada com esta decisão, D. M.

, progenitora do menor G. F. dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito suspensivo (artigos 627º, 629º,1, 644º,1, 645º,1,a, e 647º,3,a, todos do Código de Processo Civil, e artigo 32º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível).

Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 1.

A recorrente, tendo em consideração toda a prova produzida, avaliada no seu todo e de forma criteriosa, não concorda com a Douta decisão proferida pelo Tribunal “ad quo”.

  1. Com efeito, tendo em consideração a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento e bem assim a prova documental carreada para os autos em apreço, entendemos, salvo o devido respeito por opinião divergente que sempre se respeitará, que a Sentença a proferir deveria ser em sentido inverso à que foi efectivamente proferida pelo Tribunal “ad quo”.

  2. Verifica-se no caso “sub iudice”, que o Tribunal “ad quo”, não valorou e ignorou o conteúdo plasmado nos relatórios sociais constantes nos autos, mormente os relatórios periciais relativos ao requerido J. P. e ao menor G. F.; 4.

    Compulsado o conteúdo vertido nos sobreditos relatórios periciais, resulta de forma clara e objectiva que o recorrido não reúne as condições necessárias e indispensáveis para o exercício das responsabilidades parentais, conforme se pode corroborar pelo conteúdo que infra se transcreve: “Considerando a análise integrativa dos dados, entendemos mais prudente a manutenção da Inibição e Limitação ao Exercício das Responsabilidades Parentais do progenitor, assim como a não alteração das Responsabilidades Parentais.” (vide Relatório do recorrido). “No domínio afectivo e relacional, a sistematização e articulação dos dados clínicos obtidos sugerem, ainda, que o examinando, apesar de calmo, evidencia alguma fragilidade emocional reactiva à reactivação das memórias relacionadas com o progenitor, assim como em relação aos episódios de perseguição deste. Evidencia marcada angústia perante a Possibilidade de ter de voltar a conviver com o progenitor.” “No seu conjunto, estas características condicionam o examinando na gestão de relações de maior proximidade (nomeadamente com a mãe e com a sua família nuclear) e em situações sociais, uma vez que o menor adopta sempre uma postura de evitamento/fuga de todas as situações em que se sente inseguro e ameaçado pela hipotética Possibilidade de ter contacto com o progenitor”. “Em termos emocionais, o examinando revela níveis normativos de ajustamento psicológico. Ao longo do processo avaliativo, demonstrar-se bastante inquieto e angustiado com este processo e com a Possibilidade de ter de voltar a conviver com o progenitor.” (vide relatório do menor).

  3. Ora, os identificados relatórios periciais foram elaborados de forma isenta, objectiva e imparcial por técnicos independentes, tendo merecido a credibilidade do Tribunal “ad quo”, tendo dado como matéria factual provada o conteúdo neles vertido, daí que não se alcance a razão pela qual a Meritíssima Juiz “ad quo” não os tenha considerado e valorado na decisão proferida.

  4. Mais se dirá, que o Tribunal “ad quo” não valorou de forma criteriosa e objectiva os depoimentos prestados pelas testemunhas arroladas e inquiridas em sede de audiência e julgamento.

  5. Assim, resulta do depoimento da psicóloga A. C., que acompanha o menor em consulta desde o Dezembro de 2021, relatou de forma, concisa, clara e objectiva o estado de fragilidade emocional do menor, testemunho, esse, completamente imparcial, técnico e isento, que não foi posto em causa pelo Tribunal “a quo”, do qual se conclui que de forma nenhuma o G. F. deve estar neste momento, com o pai, uma vez que isso irá certamente destabilizá-lo emocionalmente, podendo ter um impacto negativo no seu desenvolvimento pessoal e escolar.

  6. Mais, em audiência de discussão e julgamento foi também ouvido o menor G. F. que apesar de todo o nervosismo adjacente ao facto de estar em tribunal disse claramente ter medo do pai e não querer estar com este de forma nenhuma. O Tribunal que proferiu a sentença ficou, ainda assim, com dúvidas relativamente às memórias do menor quanto à violência doméstica perpetrada contra si e contra a sua mãe pelo progenitor, contudo a psicóloga, que o acompanha, esclareceu que o G. F. tem muitas memórias que inclusive algumas delas lhe foram confidenciadas em consulta.

  7. Relativamente ao testemunho da mãe e da avó o tribunal “ad quo” entendeu que poderia existir uma certa parcialidade e emoção, contudo não considerou a mesma parcialidade relativamente às testemunhas apresentadas pelo requerido que são seus familiares e amigos, para prova de que o requerido está inserido, e é tido como pessoa respeitadora e cuidadora.

  8. Ora, a propósito do vertido no número anterior, importará ter presente que o juiz está obrigado a concretizar o motivo que o levou a dar mais credibilidade a uma testemunha do que a outra, relativamente aos mesmo factos, caso assim não seja estaremos perante uma arbitrária apreciação da prova, e no caso em concreto não conseguiu fundamentar a Meritíssima Juiz “ad quo” a razão de considerar como relevantes os depoimentos das testemunhas do requerido, não os considerando parciais, mas já o testemunho da mãe e da avó do G. F. foram tidos como parciais, com as necessárias e conhecidas consequências da parcialidade.

  9. Somos a concluir, salvo o devido respeito por opinião contrária, que sempre se respeitará, que no caso em apreço se verifica, conforme resulta do conteúdo plasmado na Douta Sentença recorrida contradição relativamente aos factos dados como provados e à respectiva fundamentação e motivação inserta na decisão.

  10. Com efeito, a Meritíssima Juiz “ad quo” deu como provados factos constantes nos relatórios de perícia médico legal realizada ao progenitor J. P., bem como ao menor, factualidade, essa, que não foi em momento nenhum colocada em crise pelo Tribunal “ad quo” por considerar estes relatórios credíveis, quer pela sua fonte metodologia quer pela isenção de quem os elaborou.

  11. Verifica-se ainda em relação aos relatórios sociais que foram dados como factos provados e que concluem de forma clara e explicita que devem ser inibidas as responsabilidades parentais do requerido.

  12. Contudo e apesar de na sua motivação o Tribunal “ad quo” afirmar que formou a sua convicção também nos documentos junto aos autos, o certo é que decidiu precisamente em sentido contrário, ou seja, não inibiu a responsabilidades parentais do recorrido.

  13. Bem sabemos que segundo o princípio da Livre apreciação da prova consagrado no artigo 607.º n.º 7 do Código de Processo Civil que dispõe o seguinte: “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”, nunca podendo o julgador de forma arbitrária julgar os factos, ou não identificar os meios probatórios em que se baseou para decidir em determinado sentido, exigindo-se assim, que sejam especificados os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do julgador.

  14. Tal com está estipulado no artigo 607.º nº 4 que dispõe o seguinte: “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e não provados, analisando criticamente a prova, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.” 17.

    Assim, face ao supra alegado, podemos concluir que o juiz está vinculado a identificar quais os concretos meios probatórios que serviram para formar a sua convicção, não se verificando no caso em apreço, conforme resulta do conteúdo da douta sentença recorrida, quais os meios de prova que sustentam a sua decisão, aliás numa...

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