Acórdão nº 7883/18.6T8CBR.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA ABREU
Data da Resolução10 de Novembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1.

AA propôs contra o Banco BIC Português, S.A. ação onde pede a condenação deste a pagar-lhe €50.000,00 correspondente ao reembolso do capital inicialmente investido acrescido de juros remuneratórios dos cupões vencidos e em incumprimento referentes a 8/11/2015 e a 8/5/2016 no valor de €785,28, e juros moratórios vencido no valor de €4.909,59 à taxa legal de 4% desde a data em que o capital deveria ter sido reembolsado seja 9/5/2016, mais juros vincendos a igual taxa até efetivo e integral pagamento e €5.000,00 a título de danos não patrimoniais.

Articulou, com utilidade, que: Em Abril de 2006 a Autora deslocou-se à agência bancária sita no ... em ... do então Banco Português de Negócios e subscreveu uma obrigação com o valor nominal de 50 mil euros que respeitava a obrigações subordinadas a 10 anos da SLN 2006, produto que consistia em obrigações subordinadas ao portador sob a forma escritural, com o valor nominal de 50 mil euros em que o mínimo de subscrição era de uma obrigação com prazo de maturidade a 10 anos e reembolso a 9/5/2016; Aquando da subscrição a Autora foi informada pelo gerente da agência em questão, de que o reembolso do capital era garantido, característica sem a qual a Autora jamais teria adquirido o produto em questão, a par de que a remuneração do capital proporcionava juros a serem pagos semestralmente, sendo que o boletim de subscrição dado a assinara à Autora encontrava-se emitido em papel timbrado e certificado do então BPN, indicando a sua designação comercial e sede social, criando na Autora, a expectativa que estava a subscrever um produto do próprio banco, ora réu, e não de uma entidade externa, constando do boletim que as obrigações subscritas serão creditadas na respetiva conta de valores mobiliários escriturais aberta junto do BPN, todavia, não obstante a Autora ser uma pessoa de conhecimento médio, não tem conhecimentos específicos nem particulares quanto aos produtos bancários comercializados pela banca, desconhecendo as suas especificidades e considerações, confiando nas sugestões do seu gestor de conta, de que o produto tem capital garantido e elevadas taxas de remuneração, fazendo Ré crer aos seus clientes, o que conseguiu com a Autora, que o reembolso de capital era absolutamente garantido sendo que mais tarde veio a negar essa informação; no momento da subscrição do produto de investimento pela Autora a entidade emitente das obrigações era a SLN mas após a crise económica instalado sobre o BPN e que levou à sua nacionalização a SLN foi extinta e os seu nome a imagem foram alteradas para Galilei SGPS S.A. que em 21/8/2015 se apresentou a PER, tendo posteriormente sido declarada insolvente, tendo a Autora sido citada para efeitos de reclamação dos seus créditos, tendo nesse momento a informação de que o investimento financeiro que havia realizado não se encontrava aplicado no banco, ora réu, mas sim numa entidade terceira, e nada mais foi pago a título de juros à Autora; a atuação do Réu impediu a Autora de usar o seu dinheiro como bem entendesse colocando-a num constante estado de preocupações com o receio de não reaver ou de não saber quando ia reaver o seu dinheiro andando permanentemente em stress dente e sem alegria de viver.

2.

Regularmente citado, contestou o Réu/Banco, o qual, para além de excecionar a incompetência relativa do Tribunal de Coimbra, onde a ação foi proposta, a par da prescrição, impugnou os factos alegados pela demandante.

3.

Em resposta, pugna o Autora pela improcedência das exceções invocadas, concluindo pela procedência da demanda.

4.

Foi apreciada a deduzida exceção de incompetência, tendo-se concluído pela remessa dos autos aos Juízos Centrais Cíveis de Lisboa.

5.

Com dispensa da audiência prévia foi proferido despacho saneador onde se relegou o conhecimento da exceção da prescrição para final, outrossim, fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova.

6.

Calendarizada e realizada a audiência final, foi proferida sentença que decidiu julgar improcedente a exceção de prescrição invocada e a ação parcialmente procedente pedido totalmente procedente e, consequentemente, condenou o Réu a reembolsar a Autora do capital inicialmente investido de €50.000,00, condenando o Réu ainda a pagar à Autora, juros remuneratórios dos cupões vencidos e em incumprimento, referentes a 8/11/2015 e a 8/5/2016 no valor de €785,28, os juros moratórios vencidos no valor total de €4.909,59 e os vincendos desde a citação até integral pagamento e ainda €3.000,00 a titulo de compensação por danos não patrimoniais.

7.

Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o Banco/Réu, tendo a Relação proferido acórdão que confirmou o sentenciado em 1ª Instância.

8.

Novamente inconformado o Recorrente/Réu/Banco BIC Português, S.A. interpôs recurso de revista excecional, com fundamento na alínea a) do n.º 1 do art.º 672º do Código de Processo Civil, aduzindo as seguintes conclusões: “1. O douto acórdão da Relação de Lisboa violou e fez errada aplicação e interpretação do disposto nos arts. 7º, 290º nº 1 alínea a), 304º-A e 312º a 314º-D e 323º a 323º-D e 327º do CdVM e 4º, 12º, 17º e 19º do D.L. 69/2004 de 25/02 e da Directiva 2004/39/CE e 364º, 483º e ss., 563º, 628º e 798º e ss. do C.C.

2. A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado tem que ver com o facto do Tribunal considerar que, a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao Autor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, configura a prestação de uma informação falsa.

3. Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.

4. Não adianta aliás o douto Acórdão qual o risco que associa às Obrigações SLN e que entende deveriam ter sido informado à Autora, sendo que não podemos deixar de entender que se refere ao verificado incumprimento do reembolso… 5. O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.

6. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado risco geral de incumprimento! 7. A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos! 8. Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2016, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica no momento da subscrição! 9. A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.

10. O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.

11. E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco! 12. A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.

13. O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente! 14. A única diferença consiste no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.

15. O que retira qualquer relevância à transmissão da característica no momento da decisão de investimento.

16. A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.

17. A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação… 18. A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garanta de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do título e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido! 19. A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos finanveiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.

20. Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave! 21. O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo sua obrigação assegurar-se de que o cliente compreendeu a af‌irmação.

22. A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptível de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.

23. A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.

24. Acresce que a expressão garantido pelo Banco era também ela consentânea com a...

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