Acórdão nº 150/22.2BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução02 de Novembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório A…, Diretor Geral da Varzim Sport Club – Futebol, SDUQ, Lda, intentou no Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), em simultâneo com a ação arbitral, uma providência cautelar contra a Federação Portuguesa de Futebol, pedindo a suspensão da eficácia da decisão do acórdão de 12.7.2022 da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, na parte em que foi condenado pela prática, em cúmulo material, de uma infração disciplinar p. e p. no artigo 126º, nº 1, 2 e 4 do RDFPF20 [incitamento à indisciplina e comportamento incorreto] e de uma infração disciplinar p. e p. no artigo 130º, nº 2, al b) do RDFPF20 [ameaças e ofensa à honra, consideração ou dignidade], na sanção de suspensão de 100 dias e uma multa de 20 UC, a que corresponde o montante de EUR 2040,00.

Por acórdão de 4.8.2022, o TAD julgou improcedente, por não provado, o procedimento cautelar.

Inconformado com a decisão do TAD, o requerente interpôs recurso jurisdicional para este Tribunal Central, tendo na sua alegação formulado as seguintes conclusões: A) O presente recurso vem interposto da decisão proferida a 04.08.2022 pelo TAD e nos termos da qual foi julgado improcedente, por não provado, o procedimento cautelar, tendo-se assim indeferindo a providência cautelar de suspensão dos efeitos da decisão condenatória proferida pela Recorrida.

B) Entende o Recorrente que a referida decisão é, nos termos do art 615º, nº 1, al d) do CPC, nula por omissão de pronúncia, uma vez que o tribunal a quo não se pronunciou sobre questões que dizem diretamente respeito ao preenchimento dos pressupostos de que dependia o decretamento da pretensão cautelar visada pelo Recorrente, e melhor identificadas nos arts. 18 a 19 do presente recurso, sendo certo que tais questões não se encontravam prejudicadas pela solução dada às outras questões ali apreciadas.

C) Deve a decisão recorrida ser revogada uma vez que incorre em erro de julgamento ao dar como não verificado o pressuposto do fumus boni iuris, já que no âmbito da providência cautelar o Recorrente alegou, numa primeira linha argumentativa, ser titular do direito ao acesso à justiça, traduzido no direito ao recurso e à reapreciação da decisão proferida e na obtenção de uma decisão suscetível de produzir efeitos práticos e ainda ser titular do direito ao trabalho e ao livre exercício da sua profissão.

D) O Recorrente, no seu Requerimento Inicial, invoca desde logo a nulidade da decisão proferida pelo Conselho de Disciplina da Recorrida por violação do direito de defesa, na medida em que: (i) em momento algum da tramitação processual foi o Recorrente notificado para apresentar uma pronúncia, defesa ou contestação escrita; (ii) não foi notificado para estar presente aquando da tomada de declarações do Sr. N…, o qual se veio a revelar a testemunha fulcral para a condenação do Recorrente, não tendo assim tido a oportunidade de o questionar ou contraditar; (iii) falta de notificação dos elementos e factos que traduzem a imputação subjetiva, não tendo a mesma sequer resultado provada na decisão recorrida no que respeita a uma das infrações pelas quais veio condenado; E) Além disso, invoca ainda o Recorrente a manifesta ausência de prova substancial para prova dos factos de que vem acusado, o que, no seu entender, deveria ter conduzido à sua absolvição em respeito pelo princípio da presunção de inocência já que a decisão recorrida deu como provados factos com base no depoimento prestado nos autos pela testemunha N…, à data dos factos presidente do Vitória Futebol Clube, sendo certo que não só era o mesmo parte interessada no desfecho do processo disciplinar, o que evidentemente afeta a sua credibilidade como testemunha, como não vem tal depoimento corroborado por qualquer outro elemento de prova junto aos autos, seja a propósito das alegadas expressões proferidas pelo Recorrente ou de alegadamente ter saltado da bancada e ter invadido o terreno de jogo, pois que nada vem descrito nos vários relatórios dos autos, em especial do relatório do Delegado ou do Relatório de policiamento.

F) Sustenta ainda o Recorrente no seu Requerimento Inicial que a sanção aplicada pela decisão condenatória deve ser reduzida, porquanto: (i) é excessiva e desproporcionada face aos factos e circunstâncias ali apurados (ii) não são tidas em conta quaisquer circunstâncias atenuantes em prol do Requerente, nomeadamente o facto do Requerente ter sido provocado durante todo o jogo.

G) É assim, de prever que a composição final e definitiva do litígio no processo principal possa vir a ser favorável ao Recorrente, termos em que se encontra preenchido o primeiro requisito de que depende a providência cautelar, devendo por isso ser revogada a decisão recorrida.

H) Por outro lado, a execução da sanção de suspensão aplicada pela decisão recorrida — até pelo seu quantum rigoroso e longevo de cerca de três meses — terá como consequência prática o esvaziamento do conteúdo útil das funções que o Recorrente exerce profissionalmente na Varzim Sport Club - Futebol, SDUQ Lda., sendo assim este titular de um direito que se encontra ameaçado caso não venha a ser decretada a providência cautelar requerida.

I) E tanto basta, num juízo de prognose de summaria cognitio - que é o que aqui se impõe para que se possa concluir pela verificação de uma titularidade séria do direito invocado pelo Recorrente, pelo que se encontra assim também preenchido o requisito do fumus boni iuris.

J) O acórdão proferido a 12.07.2022 e que condenou o Recorrente a uma sanção de suspensão pelo período de 100 (cem) dias encontra-se a produzir os seus efeitos, encontra-se este suspenso desde essa data, nos termos do art. 37º do RDFPF, e assim permanecerá até que seja proferida decisão final no âmbito da ação principal, ou até que decorram 100 (cem) dias da suspensão que lhe foram aplicados.

K) Sendo certo que, caso o Requerente venha a obter procedência na ação recursiva interposta, a mesma perderá todo o seu efeito útil, uma vez que não é expectável que a mesma venha a ser decidida antes do cumprimento integral da sanção de 100 (cem) dias aplicada.

L) De acordo com os factos alegados pelo Recorrente no seu Requerimento Inicial, em conjugação com as regras da experiência, o cenário de impossibilidade do exercício efetivo e pleno das funções que o Requerente desempenha, pelo período que ainda falta transcorrer até ao terminus da sanção de suspensão, constitui, em si, um prejuízo grave e de difícil reparação.

M) Da mesma forma que resulta das regras da experiência que o cumprimento de uma sanção de suspensão na pendência da ação principal com a qual se visa a sua revogação, constitui também ele, um prejuízo grave e de difícil reparação, pois que caso a mesma venha a ser julgada procedente, perderá todo e qualquer efeito útil para o Recorrente.

N) Tal circunstância resulta do senso comum, sendo por si mesma suficiente para determinar a verificação do requisito do periculum in mora, pois que de outro modo criar-se-ia uma situação de facto consumado, irreversível e irreparável na esfera jurídica do Recorrente, que se veria coartado no seu direito ao recurso, dado o risco de ainda que seja procedente a sua pretensão na ação principal, os seus efeitos serem completamente inexistentes.

O) Os concretos danos alegados pelo Recorrente - por um lado, a perda do efeito útil do recurso apresentado sobre a decisão condenatória e, por outro, a limitação ao exercício das funções para as quais foi contratado - correspondem prejuízos de natureza imaterial ou moral, que jamais poderão vir a ser reconstituídos, pois que não será possível "devolver" ao Recorrente, em caso de procedência da ação principal, o tempo durante o qual esteve suspenso, termos em que se encontra preenchido o segundo requisito de que depende a providência cautelar, devendo por isso ser revogada a decisão recorrida.

P) Acresce ainda que nada impede a Requerida de aplicar a sanção nos mesmos termos em que foram determinados na decisão condenatória, caso venha a ser negado provimento ao recurso apresentado pelo Recorrente, pelo que entende este que se mostra verificado igualmente o presente requisito, devendo em consequência ser determinada a procedência da providência cautelar por si requerida pois só assim se fará JUSTIÇA! Nestes termos, … requer-se a V. Exa. que se digne julgar totalmente procedente o presente recurso e, em consequência, revogar a decisão arbitral proferida pelo TAD a 04.08.2022 no âmbito da providência cautelar.

A Federação Portuguesa de Futebol contra-alegou o recurso e concluiu: 1. O presente recurso, interposto por A…, tem por objeto o Acórdão do Tribunal Arbitral do Desporto proferido em 4 de Agosto de 2022, que considerou improcedente por não provado, o procedimento cautelar, com vista à suspensão de eficácia da sanção de suspensão do Recorrente, por um período de 100 (cem) dias e em multa de 20 (vinte) UC, a que corresponde o montante de 2040,00€ (dois mil e quarenta euros), proferida pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, pela prática em cúmulo material, de uma (1) infração disciplinar p. e p. no artigo 126º, nº 1, 2 e 4 do RDFPF20 [Incitamento à indisciplina e comportamento incorreto] e de uma (1) infração disciplinar p. e p. na alínea b) do nº 2 do artigo 130º do RDFPF20 [Ameaças e ofensas à honra, consideração ou dignidade]; 2. Entende a Recorrente que o Tribunal a quo andou mal ao considerar improcedente por não provado o referido procedimento cautelar, porquanto, na sua opinião: (i) Verifica-se a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia; (ii) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao considerar não verificado o requisito do fumus boni iuris; (iii) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, ao considerar não verificado o requisito do periculum in mora; 3. Porém, o Acórdão recorrido não é passível de qualquer...

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