Acórdão nº 1188/19.2T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução03 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO [1] Os autores M. D. e esposa C. F., residentes em França, intentaram, em 04-12-2019, no Tribunal de Fafe, uma acção declarativa, na forma de processo comum, contra os réus M. C. (irmão daquele) e esposa M. A. (cunhada), indicando, como sua residência, “quando em Portugal na Rua ... nº … – Fafe”.

Nela formularam o seguinte pedido: “…deve a presente ação ser julgada procedente por provada, e, em consequência, a) condenar os Réus a pagarem aos Autores a quantia de 50.000,00€ (cinquenta mil euros) acrescidos de juros desde a sua citação e até efectivo e integral pagamento, b) Custas e Procuradoria Condigna.”.

Na petição inicial, alegaram, além do mais, o seguinte [2]: “I. Dos Factos: 1º Os Autores são irmão e cunhada dos RR. respetivamente.

  1. Encontram-se a trabalhar em França, tendo uma vida estável.

  2. Por sua vez o Réu e esposa também se encontram a trabalhar em França, tendo conhecimento que os mesmos se deslocarão a Portugal na época natalícia que se aproxima, daí indicar-se a morada portuguesa.

  3. Sucede que o Réu marido e esposa por volta do ano de 2000, começaram a construir uma habitação sita em ..., actualmente na União de freguesias de ... e ..., sita na morada supra referida.

  4. Certamente, atravessando dificuldades financeiras, porque tinham uma casa em França também que haviam adquirido, começaram a pedir emprestado aos AA.

  5. Tendo os mesmos e por diversas vezes ao longo dos anos de 2000 até 2016 mutuado em várias fases a quantia total de 50.000,00€ (cinquenta mil euros), os quais se comprometeram a devolver-lhes sem quaisquer juros ou contrapartidas.

  6. Quantia essa, que os RR. até à presente data não devolveram, nem se entende que venham a devolver voluntariamente.

  7. Tanto assim é que os AA. tiveram conhecimento que os RR. se encontravam incompatibilizados e com pretensão de se divorciarem, 9º O que por si só torna o pagamento de forma voluntária mais difícil.

  8. Ainda assim, em meados de Setembro do corrente ano, o A. entrou em contacto telefónico com o Réu marido, seu irmão para o exigir o montante em dívida.

  9. O mesmo referiu que actualmente não o poderiam fazer, que teriam de aguardar.

  10. Demonstrando, desta forma, o seu intuito de não cumprir o pagamento dos montantes ou de cumprir apenas quando entendesse e conviesse.

  11. Ainda com o intuito de recuperar o montante em dívida, e numa tentativa desesperada, dado os acontecimentos descritos nos artigos anteriores, o A. telefonou à mãe do Réu marido e sua mãe, explicando-lhe a situação, para que intercedesse junto daquele para obter o pagamento.

  12. Até à data, os RR. nada pagaram aos AA.

  13. Os empréstimos, referidos nos artigos anteriores desta Petição Inicial, foram realizados sempre em dinheiro, não possuindo os AA. qualquer documento que titule essa dívida, mas que o RR. reconhecem ter para com os AA.

  14. Tal sucedeu devido à relação familiar entre os intervenientes.

    1. Do Direito 17º Os Autores e os Réus celebraram entre si um contrato de mútuo, nos termos do disposto no art.º 1142, do CC, que prevê “Mútuo é o contrato pelo qual uma das partes empresta à outra dinheiro ou outra coisa fungível, ficando a segunda obrigada a restituir outro do mesmo género e qualidade”.

  15. Tendo em conta, que nenhum dos montantes mutuados, por si só, ascendeu o valor de 10.000,00€, o contrato de mútuo não necessitava de ser celebrado sob forma legal especial, conforme dispõe o art.º 1143, do CC, a contrario.

  16. Conforme prevê o art.º 1148, nº 1, do CC, “na falta de estipulação de prazo, a obrigação do mutuário, tratando-se de mútuo gratuito, só se vence trinta dias após a exigência do seu cumprimento”.

  17. Como já alegado acima, o Autor exigiu restituição das quantias mutuadas, se não antes, pelo menos, quando entrou em contrato telefónico com o Réu, com esse fim, em meados de Setembro do corrente ano.

  18. Uma vez que, desde a data em que o Autor entrou em contacto com o Réu para exigir o cumprimento da obrigação, até ao momento, decorreram mais de 30 dias, a obrigação já se encontra vencida.

  19. Em consequência, a partir dessa data, os Réus encontram-se em incumprimento perante os Autores, num montante mutuado no valor de 50.000,00€, incumprimento que persiste até à presente data.

  20. A obrigação de pagamento pelos devedores é solidária e para tanto respondem cada um dos RR. pela prestação integral nos termos do disposto no art. 512º, 516º e 517º do C.Civil.

  21. Ao montante em dívida acrescem juros de mora legais, desde a data do vencimento da dívida, até à efetivo e integral pagamento, de acordo com os arts.º 559º, 804º, 805º e 806º, todos do Código Civil.

    ” Como meios de prova, indicaram, apenas, três testemunhas, requereram o depoimento de parte, somente, do réu marido e protestaram “juntar declaração de reconhecimento de dívida.” [3] Face à indicação dada na petição, as duas cartas registadas em 05-12-2019, para citação de cada um dos réus foram endereçadas para “Rua ... Nº … - União de Freguesias de ... e ... FAFE”, tendo sido entregues, em 09-12-2019, a pessoa que assinou ambos os “avisos de recepção” com o nome “J. C.

    ”, motivo porque a cada um dos réus, para o mesmo domicílio, foram remetidos, pela Secretaria Judicial, avisos registados da citação feita em terceira pessoa (artº 233º, CPC).

    Por despacho de 04-02-2020, a Mª Juíza titular do processo determinou que se pesquisasse nas Bases de Dados disponibilizadas ao Tribunal se aquele domicílio onde foi realizada a citação correspondia ao dos réus.

    Em resultado das pesquisas efectuadas, a Secretaria informou que “foram encontradas moradas diferentes daquelas onde se concretizou a citação dos réus, nomeadamente do réu M. C. que tem morada no estrangeiro - França. Quanto à ré, M. A. apenas o nº de porta não coincide.

    ” Na sequência, por despacho de 06-02-2020, ordenou-se a notificação dos autores “para esclarecerem, em 10 dias, o que tiverem por conveniente quanto à morada por si indicada, sendo que, nada dizendo, se diligenciará pela citação dos Réus nas moradas ora conhecidas.” Em requerimento de 11-02-2020, os autores alegaram: “A morada indicada pelos AA. para efeitos de citação da presente ação contra os RR. foi a Rua ... nº … União de Freguesias ... e ..., Fafe pois, atendendo à data da interposição da ação (4/12/2019), e o facto dos RR., tal como os AA. serem emigrantes, estavam convictos que os mesmos iriam passar o período de férias (Natal e Ano Novo) em Portugal, daí ter-se indicado para efeitos de citação a casa de morada dos mesmos quando em Portugal.

    Contudo, sempre se dirá que, cfr. resulta dos autos, designadamente dos avisos de recepção, as citações dos RR. foram recebidas por M. C.

    [4], a qual é mãe do Réu marido e sogra da Ré esposa, sua procuradora e representante fiscal.

    Citações essas que foram devidamente recebidas nos termos do previsto no artigo 233º do CPC, não tendo os mesmos deduzido contestação no prazo legalmente admissível, devendo considerar-se confessados os factos alegados e ser proferida sentença.

    ”.

    Por despacho de 13-02-2020, determinou-se nova citação: “Não obstante o alegado pelos Autores no requerimento que antecede, o certo é que a morada indicada pelos Autores na p.i. como sendo a morada dos Réus em Portugal, não coincide (o nº de porta) com o teor das bases de dados oficiais.

    As cartas de citação foram recebidas por pessoa que, segundo os Autores, é mãe e sogra dos Réus e, como tal, igualmente mãe e sogra dos Autores.

    Nos termos do art. 566º, CPC, em caso de revelia absoluta, o Tribunal deve verificar a regularidade da citação e, sendo o caso, ordenar a sua repetição.

    De acordo com o art. 228º, nº1, CPC, a citação postal é endereçada para a residência ou local de trabalho do citando.

    No caso dos autos, não se afigura que a morada indicada pelos Autores (com aquele nº de porta) seja a da residência – ainda que temporária – dos Réus e, como tal, não pode considerar-se válida e regular a citação efetuada e operante a revelia.

    Nessa sequência, repita a citação dos Réus, para as moradas conhecidas, em França, onde os mesmos residem, tal como resulta da própria alegação dos Autores.”.

    Na sequência disso, foram dirigidas cartas de citação para a morada comum dos réus em França, mostrando-se ambos os “AR´s” recebidos por “C.

    ”, o do réu com data de 22-02-2020 e, o da ré, sem data mas com a menção de que fora deixado aviso para a correspondência ser levantada na estação postal, tendo o primeiro retornado ao Tribunal de Fafe em 27-02-2020 e, o segundo, em 16-03-2020.

    O réu não contestou.

    A ré contestou, dizendo no seu articulado: “1º- São verdadeiros os factos alegados em 1º, 3º parte inicial, 4º e 8º.

  22. - São falsos os factos alegados nos artigos 3º, segunda parte, 5º, 6º, 7º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º e 16º da douta petição.

  23. - Repondo a verdade, é totalmente falso que os AA. tenham mutuado qualquer quantia aos RR.

  24. - A R. tal como o seu marido sempre trabalharam por forma a suportar todas as suas despesas.

  25. - Nunca necessitaram de pedir qualquer empréstimo a quem quer que seja, muito menos aos AA.

  26. - Tal ação não passa de um esquema orquestrado entre o R. marido e os AA., seu irmão e cunhada com o intuito de prejudicar a R. em sede de partilhas.

    Com efeito, 7º- Os RR. encontram-se em processo de divórcio desde 26 de Agosto de 2019, conforme doc. n.º 1.

  27. - Ora, desde logo a indicação da morada para citação dos RR. em Portugal teria como único intuito impedir a que a R. tivesse conhecimento de tal ação e assim não contestar a mesma.

  28. - A R. mulher há mais de 30 anos que não reside em Portugal.

  29. - Bem sabiam os AA. que a R. mulher não vinha a Portugal no Natal, e que sempre qualquer citação para aquela morada seria recebida pela mãe do seu ainda marido (sua sogra) com quem se encontra de relações cortadas há mais de 2 anos.

  30. - Para culminar toda esta situação, na citação efetuada em França, o R. marido por forma a evitar que a R. mulher tivesse conhecimento da presente ação levantou, sem...

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