Acórdão nº 9573/18.0T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelRITA ROMEIRA
Data da Resolução03 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. Nº 9573/18.0T8PRT.P1 Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia - Juiz 2 Recorrente: AA Recorrida: X... - Companhia de Seguros, S.A.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO A A., AA, viúva, nascida a .../.../1971, com o NIF ..., residente na Alameda ..., ..., ..., Maia, com o patrocínio oficioso do Ministério Público, intentou acção emergente de acidente de trabalho, contra a R., X... - COMPANHIA DE SEGUROS, SA, com sede na Avenida ..., ..., ..., Lisboa, nº...-...-...-Lisboa, pedindo que esta seja julgada procedente e, em consequência: a) ser reconhecida à A. a qualidade de beneficiária legal do sinistrado; b) Ser considerado como de trabalho o acidente descrito nos autos e, consequentemente c) Ser a R. condenada ao pagamento das quantias liquidas e pensões acima peticionadas, com juros, à taxa legal.

Fundamenta o seu pedido alegando, em síntese, que foi casada, até 20/04/2018, com o sinistrado BB, vivendo, até então, com este na mesma habitação, o qual desempenhava, por conta própria, a atividade de construção civil, detendo a categoria profissional de pedreiro e, no dia 20/04/2018, pelas 14H00, na Rua ..., ..., no Porto, quando trabalhava por conta própria, auferindo o salário anual total de € 10.185,00 (€ 727,50 x 14 – salário base), foi vítima de um acidente mortal.

E, alegando que, o acidente sofrido por aquele consistiu numa queda em altura, que ocorreu nas referidas circunstâncias espácio-temporais, quando o sinistrado se encontrava no telhado de um armazém, constituído por telhas de fibrocimento (lusalite), suportadas por vigamento metálico, com o propósito de efetuar um orçamento para a reparação do mesmo, tendente a obstar à ocorrência de infiltrações de água, o qual se destinava a ser entregue a CC.

Mais, alega que, o sinistrado acedeu ao referido telhado, transportando consigo uma pistola de silicone e por razões desconhecidas, quando se deslocava sobre o telhado, no sentido da cumeeira do mesmo, desequilibrou-se, tendo colocado o pé sobre uma telha, que cedeu sob o seu peso, vindo a precipitar-se no solo, a cerca de 10 metros de profundidade, de cabeça tendo-lhe, como consequência direta e necessária dessa queda, resultado as lesões examinadas e descritas no relatório da autópsia, as quais foram causa direta e necessária da morte, que lhe sobreveio, no mesmo dia, em consequência do impacto provocado pela queda.

Por fim, alega que, a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho referente ao sinistrado encontrava-se transferida para a ré seguradora, através da apólice n.º ..., até ao limite do salário anual do sinistrado.

Assim, termina reclamando: a) Que se reconheça a A. a qualidade de beneficiária legal do sinistrado; b) Que o acidente descrito nos autos e sofrido pelo sinistrado, seja qualificado como de trabalho e, consequentemente, c) Seja a R. condenada a pagar à A. viúva a pensão anual e vitalícia acima, no montante total anual de € 3.055,50.

  1. Seja a R. condenada a pagar à A. viúva o subsídio por morte acima peticionado, no montante total de € 5.661,48.

  2. Seja a R. condenada a pagar à A. viúva o subsídio por despesas de funeral acima peticionado, no montante total de € 1.887,16.

  3. Juros à taxa legal, desde a citação, nos termos do disposto nos artºs. 805º e 806º, do C. Civil.

*Citada, a Ré/seguradora contestou, desde logo, dizendo que, atentas as circunstâncias em que o acidente dos autos se verificou, não pode ser responsabilizada pela reparação ao Autor dos danos que aqui reclama, atento o facto de o acidente em discussão ter tido como causa directa, necessária, única e exclusiva, a violação das regras de segurança, que no caso se impunham e cujo incumprimento é imputável exclusivamente ao próprio Sinistrado, que assume a posição de Trabalhador/Empregador.

Alega, em síntese que, no dia 20 de Abril de 2018, pelas 14h00m, o Sinistrado/Falecido encontrava- se a executar um serviço de construção civil numa obra para o qual foi contratado pela Senhora D.ª CC, senhoria das instalações da empresa "S..., Lda.", sita na Rua ..., ..., ..., Porto. O Sinistrado/Falecido efectuava a medição da área a intervencionar e respectiva orçamentação, para correcção das infiltrações detectadas nas instalações da empresa acima identificada. Pelo que o Sinistrado terá averiguado, as infiltrações tinham como origem a acumulação de resíduos nos caleiros da cobertura do armazém contíguo, que se encontrava devoluto e que era igualmente da propriedade da Senhora D.ª CC.

Prossegue, alegando que, o Sinistrado/Falecido juntamente com o seu funcionário, o Sr. DD, acederam ao telhado através de uma janela das instalações da empresa, e posteriormente com recurso a uma escada móvel, subiram para a cobertura do armazém devoluto, entretanto, o Sinistrado/Falecido solicitou ao seu funcionário que descesse para recolher uma fita métrica e, nesse ínterim, o Sinistrado deslocava-se em cima das telhas de fibrocimento (lusalite) na cobertura, quando uma delas partiu e cedeu, provocando a queda de cabeça do Sinistrado em direcção ao solo, a uma altura de cerca de 10 metros, que culminou para o Sinistrado em lesões que provocaram a sua morte.

Alega, ainda, que o sinistrado só sofreu o acidente em apreço, porque, de motu próprio, desenvolveu a sua actividade profissional sem previamente implementar os EPI e EPC convenientes, sabendo que tal conduta apenas poderia resultar na sua queda, dado as características técnicas das telhas de fibrocimento não serem adequadas para suportar pesos excessivos, risco com o qual o Sinistrado se conformou, desrespeitando as regras de segurança, ao invés de actuar com a diligência que lhe era devida e que a situação em causa exigia.

Por fim, alega que o Sinistrado/Falecido não utilizou o equipamento de trabalho adequado à tarefa que visava realizar, nem implementou as concretas medidas de segurança aptas a evitar os riscos inerentes à tarefa que pretendeu realizar, responsabilidade que é atribuída única e exclusivamente a este que assume a posição de Sinistrado/Empregador, sendo o único causador do fatal acidente que sofreu. Nada fazendo para evitar ou minorar as suas consequências.

Conclui que deve ser absolvida, com as legais consequências.

*Nos termos que constam do despacho, de 17.01.2022, foi proferido saneador tabelar, fixados os factos assentes, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.

*Realizada a audiência de discussão e julgamento, nos termos documentados na acta de 01.06.2022, foi ordenada a conclusão dos autos para prolação de sentença que terminou com a seguinte Decisão: “Termos em que julgo a presente ação improcedente e, em consequência, absolvo a Ré dos pedidos formulados.

Custas a cargo da Autora – cfr. art.º 527.º, n.s 1 e 2 do C.P.C. - sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido.

Fixo o valor da presente ação em €50.570,08 – cfr. art.º 520.º do C.P.T..

Registe e notifique.

”.

*Inconformada a A. interpôs recurso, nos termos das alegações juntas, terminando com as seguintes CONCLUSÕES: …………………………………… …………………………………… ……………………………………*A Ré apresentou contra-alegações, as quais terminou com as seguintes Conclusões: …………………………………… …………………………………… ……………………………………*O recurso foi admitido como apelação, com efeito devolutivo e ordenada a subida dos autos a esta Relação.

*O Ministério Público teve vista nos autos, nos termos do art. 87º nº3, do CPT, tendo emitido parecer no sentido de se julgar o recurso integralmente procedente, no essencial, aderindo às alegações do Mº Pº junto da 1ª instância.

As partes, notificadas, não responderam a este parecer.

*Dado cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2 do CPC, cumpre decidir.

*O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, cfr. art.s 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do art. 87º, nº 1, do Código de Processo do Trabalho, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.

Assim as questões a decidir e apreciar consistem em saber, se o Tribunal “a quo” incorreu em: - insuficiente enunciação da matéria de facto dada como provada; e - em errónea valorização e interpretação da factualidade e aplicação do direito.

*II - FUNDAMENTAÇÃO A) OS FACTOS O Tribunal a quo considerou: “Factos Provados (por ordem lógica e cronológica): 1. A Autora foi casada, até 20/04/2018, com o sinistrado BB, vivendo, até então, com este na mesma habitação.

  1. BB desempenhava, por conta própria, a atividade de construção civil, detendo a categoria profissional de pedreiro.

  2. No dia 20/04/2018, pelas 14H00, na Rua ..., ..., no Porto, o sinistrado BB, trabalhando por conta própria, foi vítima de um acidente mortal.

  3. Nas referidas circunstâncias espácio-temporais, o sinistrado encontrava-se no telhado de um armazém, sito naquele local acima indicado, constituído por telhas de fibrocimento (lusalite), suportadas por vigamento metálico, com o propósito de efetuar um orçamento para a reparação do mesmo, tendente a obstar à ocorrência de infiltrações de água.

  4. Aquele orçamento destina-se a ser entregue a CC.

  5. O sinistrado acedeu ao referido telhado, transportando consigo uma pistola de silicone.

  6. O sinistrado juntamente com o seu funcionário, o Sr. DD, acederam ao telhado através de uma janela das instalações da empresa, e posteriormente com recurso a uma escada móvel, subiram para a cobertura do armazém devoluto.

  7. Quando o sinistrado se deslocava sobre o telhado, no sentido da cumeeira do mesmo, desequilibrou-se, tendo colocado o pé sobre uma telha, que cedeu sob o seu peso, vindo aquele a precipitar-se no solo, a cerca de 10 metros de profundidade, de cabeça.

  8. As características técnicas das telhas de fibrocimento indicam fragilidade, pelo que não são adequadas para suportar pesos excessivos dada a sua pouca resistência.

  9. No local não estava instalada linha de vida para utilização...

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