Acórdão nº 151/18.5T8RMZ.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | ISABEL DE MATOS PEIXOTO IMAGIN |
Data da Resolução | 29 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Ré: (…) Recorrida / Autora: Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do (…), CRL Trata-se de uma ação declarativa de condenação no âmbito da qual a A pretende fazer operar a impugnação pauliana, peticionando se reconheça o seu direito de executar o património constituído pelos imóveis alienados no património dos obrigados à restituição na medida do que se mostrar necessário para ressarcimento do seu crédito.
Invocou, para tanto: - ser credora de (…) e de (…) no montante total de € 369.682,39, referente a um contrato de abertura de crédito com hipoteca e fiança e a um contrato de mútuo com hipoteca e fiança celebrados com a sociedade (…) – Instalações Eléctricas, Lda., em 29 de julho de 2010, que por aqueles foram garantidos por fiança; - a sociedade devedora deixou de pagar as prestações devidas no âmbito dos referidos contratos em 29 de outubro de 2011; - foi intentada contra os fiadores (…) e (…) ação executiva; - (…) e (…) eram proprietários do prédio urbano destinado a habitação, sito na Rua da (…), n.º 28, povoação (…), União de freguesias de (…), descrito sob o número (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), com o valor patrimonial tributário de € 32.360,00; do prédio urbano destinado a habitação, sito na Rua (…), n.º 4, povoação (…), cidade e freguesia de Reguengos de Monsaraz, descrito sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), com o valor patrimonial tributário de € 55.690,00; e do prédio rústico denominado “Courela da (…)”, com a área de seis mil duzentos e cinquenta centiares, composto por olival e solo de cultura arvense de olival, sito na União de freguesias de (…), descrito sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), da secção (…), com o valor patrimonial tributário de € 44,75.
- por escritura pública lavrada em 4 de novembro de 2015, (…) e (…) doaram os prédios de que eram proprietários (2 prédios urbanos destinados a habitação sitos em … e o prédio rústico denominado “Courela da …”) a seus filhos, os RR. (…), (…), (…), (…) e aos seus netos, RR. (…) e (…), filhos de (…); - subsequentemente, por escritura pública lavrada em 20 de março de 2018, os aqui RR. (…), (…), (…), (…), (…) e (…) venderam a (…) o prédio urbano destinado a habitação, sito na Rua da (…), n.º 28, em (…); - no património dos Executados (…) e de (…) não se conhecem outros bens passíveis de penhora, pelo que, com a celebração dos mencionados contratos de doação e de compra e venda, os RR. sabiam que estavam a dificultar ou impedir a satisfação da demandante, enquanto credora daqueles.
Regularmente citados, os RR apresentaram-se a contestar.
II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, decidindo: «
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Declarar a ineficácia em relação à A Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do (…), CRL do contrato de doação realizado através da escritura pública celebrada no dia 4 de novembro de 2015, na medida dos créditos da Autora, com o consequente direito de a Autora executar os seguintes imóveis objeto de doação: i) o prédio urbano destinado a habitação, sito na Rua (…), n.º 4, povoação (…), cidade e freguesia de Reguengos de Monsaraz, descrito sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…); ii) o prédio rústico denominado “Courela da (…)”, com a área de seis mil duzentos e cinquenta centiares, composto por olival e solo subjacente de cultura arvense de olival, sito na União de freguesias de (…), descrito sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…), da secção (…).
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Absolver os RR. do demais peticionado pela Autora.» Inconformada, a R. (…) apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que decrete a improcedência da impugnação pauliana. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos: «1- O presente recurso visa a impugnação da matéria de facto e da sentença proferida.
2- O tribunal deu como provado que por carta datada de 11 de fevereiro de 2016, a Autora comunicou à Ré (…), na qualidade de fiadora da sociedade (…) – Instalações Elétricas, Lda. que o empréstimo se encontrava em incumprimento há mais de um ano, encontrando-se em dívida o valor de € 327.608,76, para no prazo de oito dias regularizar o valor em dívida, tudo conforme documento junto a fls. 39, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
3- Resulta da fundamentação da sentença que para prova do ponto 12 considerou-se o teor do documento junto a fls. 39 e 41, uma dita carta registada dirigida Ré e supostamente entregue no destinatário.
4- Acontece que não há prova nos autos que a Recorrente tenha recebido tal carta e, à data em que a mesma teria sido enviada, o seu marido e fiador já falecera.
5- Com efeito cabia à A interpelar a Recorrente e, por isso, sobre ela impendia também o ónus de demonstrar que cumpriu eficazmente essa prestação, o que, no caso, não terminava no envio da carta, mas ainda que impunha a demonstração do seu recebimento pela destinatária, ou que o não recebimento se deveu apenas a culpa desta. Prova que não existe nos autos e como tal é inaplicável o disposto no artigo 224.º, n.º 2, do Código Civil.
6- Termos em que o facto dado como provado sob o n.º 12 deve ser dado por não provado.
7- Ora não sendo demonstrada a interpelação do fiador não pode ser dado como provado que o mesmo ao doar aos seus filhos e herdeiros legitimários pretendeu ou sabia que assim tornava difícil ou impossível a cobrança do crédito da Recorrente.
8- Por outro lado, sendo certo que o falecido (…) estava gravemente doente de tal modo que faleceu 17 dias depois da escritura, sempre seriam os seus herdeiros e, pelas forças da herança, que responderiam pela sua fiança.
9- “I. Constituem requisitos de procedência da ação de impugnação pauliana (artigos 610.º a 612.º do Código Civil): i) a existência de determinado crédito; ii) prática, pelo devedor, de um ato que não seja de natureza pessoal que provoque, para o credor, um prejuízo (a impossibilidade de obter a satisfação integral do seu crédito ou o agravamento dessa impossibilidade); iii) a anterioridade do crédito relativamente ao ato ou, sendo posterior, ter sido dolosamente praticado com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor; iv) que o ato seja de natureza gratuita ou, sendo oneroso, que o devedor e o terceiro tenham agido de má fé. II. Por sua vez, incumbe ao credor a prova do montante das dívidas e ao devedor – ou ao terceiro interessado na manutenção do ato – a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor (artigo 611.º do Código Civil). III. Não obstante a renúncia pelo fiador ao benefício da excussão prévia, por se ter assumido como “principal pagador” (artigo 640.º, alínea a), do Código Civil), tal não acarreta a renúncia ao benefício do prazo de pagamento das prestações ou o afastamento do disposto no artigo 782.º do Código Civil. IV. Assim, a perda do benefício de tal prazo de pagamento no que se refere ao fiador, apenas ocorre quando o mesmo tem conhecimento da interpelação da devedora para cumprir, ou é interpelado pela credora para cumprir em lugar daquela, as prestações vencidas e não pagas e pôr termo à mora, sob pena de se considerarem vencidas antecipadamente as vincendas. V. A ausência de tal comunicação/interpelação não é suprida por via da citação do fiador em ação de impugnação pauliana, tanto quanto é certo que na mesma não é dada a oportunidade ao fiador de proceder ao pagamento das prestações vencidas, evitando a exigibilidade das vincendas. VI. Apresentando o credor um valor indeterminado, sem concretização do montante das prestações efetivamente vencidas e que se mostrem em dívida, tal valor, para além de inexigível, mostra-se ainda ilíquido, em relação ao fiador.
“http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb780257 9ec004d3832/75e53ab2ca56850c8025867100402363 10- A douta sentença dá como provado, por presunção, que a Recorrente e o seu marido tiveram conhecimento da dívida da insolvente e do seu não pagamento pelos seguintes factos tal como consta da fundamentação da sentença.
11- Devedora no mútuo era tão somente a sociedade (…) – Instalações Eléctricas, Lda..
12- Ré (…) não era nem nunca foi devedora, era gerente da insolvente e deu, como garantia do mútuo, hipoteca da sua casa a qual foi executada pela Recorrida e à mesma adjudicada em execução.
13- E sempre esteve convencida que o património da insolvente era suficiente para pagar à CCA como aliás consta do seu depoimento prestado em audiência.
14- O depoimento da...
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