Acórdão nº 11/20.0T9EPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelJ
Data da Resolução26 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO: Nos presentes autos de processo comum, com o NUIPC nº 11/20.0T9EPS, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de ..., Juízo Local de Competência Genérica de Esposende – Juiz 1, com intervenção do tribunal singular, foram submetidos a julgamento os arguidos: “- X, Lda.”, sociedade comercial com o NIPC ........., com sede na Praceta ..., Loja .., …, ... e ..., Esposende, aqui representada pelo seu sócio e gerente, e também arguido; - S. M., com residência no mesmo domicílio; Que estavam pronunciados pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 7.º, nº 1 e 3, 12º nº2, 105.º, n.º 1 e 4 als. a) e b) e 107º, nº 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho.

*Previamente ao recebimento da acusação, decorreu abertura de instrução, requerida por S. M., no decurso da qual foi proferida decisão instrutória a determinar a suspensão provisória do processo quanto àquele, durante 24 meses, mediante sujeição a injunções.

*Prosseguindo os autos para julgamento quanto à sociedade arguida, após realização do julgamento, veio a ser proferida sentença com o dispositivo seguinte: (Transcrição) “(…) Julgar a acusação pública procedente e, em consequência: a) Condenar a arguida X, Lda. como autora material da prática de um crime de abuso de confiança contra a Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos 7.º, n.º 1 e 3, 12º, nº 2, 105º, nº 1 e 4, als. a) e b), e 107.º nº 1, do RGIT, e 11º e 30º, nº 2 do Código Penal, na pena de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de 6,00€ (seis euros), o que perfaz o montante de 1.380,00€ (mil trezentos e oitenta euros); c) condenar a arguida no pagamento das custas processuais, fixando-se em 2 UC’s a taxa de justiça devida (cfr. artigo 513º, nº1, do Código de Processo Penal, e 8º, nº5, do Regulamento das Custas Processuais); d) julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante “INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I. P.” – CENTRO DISTRITAL DE …, em consequência do que decido condenar a X, Lda. no pagamento ao demandante da quantia de €17.989,00 (dezassete mil, novecentos e oitenta e nove euros), acrescida dos juros moratórios sobre cada uma das cotizações em falta – de janeiro de 2017 a dezembro de 2018 -, desde o dia 21 (vinte e um) do mês seguinte àquele a que disser respeito, calculados à taxa legal em vigor em cada momento, até efectivo e integral pagamento; e) condenar a demandada no pagamento das custas civis (cfr. artigo 527º, nºs1 e 2, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 523º, este do Código de Processo Penal).» (…)” *Inconformada com o decidido a arguida “- X, Lda.”, interpôs recurso, no qual rematou com as seguintes conclusões: (Transcrição) “II – CONCLUSÕES 1) Há, por analogia, assimilação, extensão ou equiparação da noção de "morte" das pessoas singulares, às formas de extinção das pessoas coletivas, para os efeitos de determinar a aplicabilidade dos artigos 127.º e 128.º, n.º 1, do Código Penal.

2) Por força do disposto no art.º 141.°, n.º 1, e), art.º 146.°, n.º 2, art.º 160.°, n.º 2, todos do Código das Sociedades Comerciais (CSC), e artigo 234.º, n.º3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) as sociedades comerciais dissolvem-se pela declaração de insolvência.

3) Para efeitos de declaração de extinção da responsabilidade criminal da sociedade aqui arguida, antes da decisão de mérito destes autos haveria que averiguar e decidir se, do registo comercial da arguida, já constava, implícita ou explicitamente, o registo do encerramento da liquidação.

Vejamos: 4) Consta da certidão permanente da sociedade arguida, ora recorrente, a seguinte inscrição: “Insc. 4 AP. 3/20201127 16:31:03 UTC – DECISÃO JUDICIAL DE ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INSOLVÊNCIA FIRMA: X, LDA – EM LIQUIDAÇÃO Data da Decisão: 2020/11/17 Causa; insuficiência da massa insolvente para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas” 5) Sendo esta inscrição precedida do seguinte averbamento: “Av.1 OF. 1 daAP. 3/20201127 –CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE ADMINISTRADOR JUDICIAL ADMINISTRADOR JUDICIAL: Nome/Firma: F. S. NIF/NIPC: .........

Residência/Sede: Rua ..., Porto Causa; Encerramento do processo de insolvência Data: 2020/11/17” 6) O registo da “DECISÃO JUDICIAL DE ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INSOLVÊNCIA” de 17 de novembro de 2020, conjugada com o registo da “CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE ADMINISTRADOR JUDICIAL”, tendo como causa o “Encerramento do processo de insolvência”, com o devido respeito por entendimento diferente, só pode significar que o referido registo contém o encerramento da liquidação, sendo esta pressuposto do encerramento do processo de insolvência.

7) Assim, a decisão final de condenação da arguida, ora recorrente, enferma de nulidade insanável por violação do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 127.º, n.º 1, e 128.º, n.º 1, do Código Penal, art.º 146.º, n.os 1 e 2 do Código das Sociedade Comerciais e art.º 234.º, n.º 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

8) Termos em que, declarando o Tribunal de Recurso a extinção da responsabilidade criminal da recorrente e, consequentemente, a nulidade da sentença, fará inteira JUSTIÇA»*O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo: (Transcrição) “(…) «Em resposta ao recurso apresentado nestes autos pela Recorrente X, Lda., o Ministério Público é do entender que carecem de fundamento as pretensões pela mesma aduzidas, em sede de recurso, não nos merecendo a douta decisão recorrida qualquer reparo.

Efetivamente, contrariamente ao que pretende a recorrente, o registo do encerramento do processo de insolvência não contém o encerramento da liquidação, sendo esta uma fase posterior aquele encerramento.

E, de acordo com o disposto nos art.ºs 146.º, nº 2 e 160.º, nº 2, do Código das Sociedades Comerciais, as sociedades comerciais mantêm a sua personalidade jurídica na fase da liquidação, considerando-se extintas pelo registo do encerramento da liquidação.

Neste sentido se pronunciou o acórdão da Relação de Coimbra de 18.09.2019, proferido no processo 158/16.7T9PBL-AC1, que considerou que “só com o registo formal do encerramento da liquidação perdem essa personalidade, o que determina que o procedimento criminal haja de estar pendente até à extinção da sociedade. E a norma do art.º 127.º, 2, do C. Penal é clara na equiparação dessa “extinção” à “morte” das pessoas singulares” Concluindo, salienta-se que, in caso, não constando da certidão comercial da recorrente o averbamento do registo do encerramento da liquidação, a recorrente mantém a sua personalidade jurídica e consequentemente, a sua responsabilidade criminal.

Neste sentido, e pelos motivos indicados supra, não se vislumbra que a decisão a proferir pudesse ser outra devendo a decisão recorrida ser integralmente confirmada, já que procedeu ao devido enquadramento jurídico e correta aplicação do direito à situação em apreço.

Termos em que deverá ser integralmente mantida a douta decisão recorrida, julgando-se como manifestamente improcedente o recurso interposto pela Recorrente.» *Nesta Relação o Exmo. Senhor Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso interposto pela arguida, concluindo nos seguintes termos: (Transcrição).

“(…) «Respondeu ao recurso a nossa colega na instância recorrida, de forma clara e cabal, analisando detalhadamente e com acerto a questão levantada, defendendo a falta de razão do recorrente e, consequentemente, a manutenção integral da decisão recorrida, posição com que concordamos.

Defende a arguida que “O registo da “DECISÃO JUDICIAL DE ENCERRAMENTO DO PROCESSO DE INSOLVÊNCIA” de 17 de novembro de 2020; E o da “CESSAÇÃO DE FUNÇÕES DE ADMINISTRADOR JUDICIAL”, tendo como causa o “Encerramento do processo de insolvência” por “Insuficiência da massa insolvente para a satisfação das custas do processo e das restantes dívidas”, com o devido respeito por outro entendimento, só pode significar que o referido registo contém o encerramento da liquidação, sendo esta pressuposto do encerramento do processo de insolvência”.

Parece-nos que não tem razão e que, nos termos do disposto no artigo 127º do Código Penal, as pessoas coletivas apenas se extinguem com o registo da dissolução e do encerramento da sua liquidação.

Neste sentido se pronunciou o acórdão do tribunal da Relação de Évora de 26-09- 2017, proferido no processo nº 862/15.7T9EVR.E1, relatado pelo Desembargador José Proença da Costa, in www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: “I – A declaração de insolvência de uma sociedade, embora provoque a sua dissolução, não provoca a sua extinção nem a extinção do procedimento criminal contra ela instaurado.

II – No tocante às sociedades, para efeitos de extinção do procedimento criminal, nos termos do artigo 127.º do CP, apenas o registo da sua dissolução e do encerramento da liquidação fazem extinguir aquelas”.

Bem como os seguintes acórdão nele citados: “ Acórdão da Relação de Guimarães, de 9.02.2009, no Processo n.º 2701/08-1, onde se entendeu que: I - Para efeitos de extinção do procedimento criminal, nos termos do artigo 127.º do Código Penal, não existe qualquer analogia entre a morte de uma pessoa física e a declaração de insolvência de uma sociedade.

II - A declaração de insolvência de uma sociedade, embora provoque a sua dissolução, não provoca a sua extinção nem a extinção do procedimento criminal contra ela instaurado.

III- A sociedade não pode considerar-se extinta enquanto não se mostrar efectuado o registo do encerramento da liquidação.

E o Acórdão da Relação de Coimbra, de 17.12.2014, no Processo n.º 39/10.8IDCBR-A.C1, onde se entendeu que: I - Só a extinção das sociedades - que ocorre com o registo do encerramento da respectiva liquidação e, no caso de insolvência, com o registo do...

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