Acórdão nº 151/14.4JASTB-B.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 29 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MOREIRA
Data da Resolução29 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: Por apenso à execução de sentença instaurada por Sandra A. contra José P., veio a exequente, em 1/7/2019, deduzir incidente de habilitação contra Maria G., alegando para tanto que o executado faleceu no estado de viúvo de Soledad P., deixando como única e universal herdeira a requerida, na qualidade de sua filha. Conclui pedindo que a requerida seja considerada habilitada na posição do executado falecido, prosseguindo a execução de sentença contra a mesma. Com o requerimento inicial a requerente juntou as certidões de participação de ambos os óbitos, para efeitos de liquidação do imposto de selo sobre transmissões gratuitas.

A requerida apresentou contestação, com a qual juntou cópia da escritura outorgada em 14/10/2019, onde declarou repudiar a herança aberta por óbito do executado, e concluiu pela improcedência do incidente.

Por despacho de 12/6/2020 foi determinada a notificação da requerida para se pronunciar, querendo, “quanto à apontada aparente contradição de declarações vertida na escritura”, a tornar “ineficaz o repúdio”, nada tendo dito a requerida.

Seguidamente foi proferida decisão final pela qual o incidente foi julgado procedente, sendo a requerida julgada herdeira do falecido executado e admitida a intervir nos autos da execução, como sua representante, para com ela a mesma execução prosseguir.

A requerida recorre desta decisão final, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: A. Para que se perceba o que está subjacente neste processo, e para que dúvidas não existam, é necessário esclarecer V. Exas., que a Requerida ora Recorrente é a única herdeira de seus pais, ambos já falecidos, SOLEDADE (…) e JOSÉ (…), B. Os quais deixaram como únicos bens uma viatura ligeira de passageiros, marca Ford, (…), e uma fracção autónoma (…), bens esses, devidamente identificados nos autos.

  1. Assim a 04/01/2006, faleceu SOLEDADE (…), mulher do executado JOSÉ (…) e mãe da Requerida ora Recorrente, sendo estes os únicos herdeiros dos bens supra identificados.

  2. O que significa que após morte da SOLEDADE (…), o seu marido JOSÉ (…), executado nos presentes autos, é seu herdeiro de ½ de 50% dos bens da herança de sua mulher; E. Sendo a filha MARIA (…), também herdeira por morte da sua mãe, tendo direito a 25% da quota-parte desses bens.

  3. Tendo o executado falecido a 23/11/2016, deixando como única herdeira a sua filha MARIA (…), aqui Requerida ora Recorrente.

  4. Consta dos autos, a 14/10/2019, que a Requerida ora Recorrente, realizou uma escritura de Repúdio.

  5. Nos termos da qual a Requerida declarou que: “o seu pai faleceu sem ter aceitado a herança por óbito do cônjuge Soledade (…), e que : a) nos termos do artigo 2058.º do Código Civil aceita aquela herança por óbito de sua mãe Soledade (…), em direito de transmissão, e que b) repudia a herança deixada por óbito de seu pai.”.

    I. A Requerida ao realizar essa escritura aceitou a quota-parte dos bens deixados por óbito da sua mãe, (os 25%, de ½ dos bens da herança por óbito da sua mãe).

  6. Assim, e não tendo o executado JOSÉ (…), aceite a quota-parte da herança, por óbito da sua mulher SOLEDADE (…), discute-se, se a ora Requerida e Recorrente, terá direito para além dos 25% da quota-parte por óbito da sua mãe, ainda aos 25% que caberiam ao seu pai, por óbito da sua mulher? K. Sendo esta a questão que se levanta para a ora Requerida e Recorrente.

    L. Considerando que o Tribunal “a quo”, à luz da factualidade elencada, aferiu que a Requerida ora Recorrente deve ser considerada habilitada e prosseguir na execução enquanto sucessora do executado, M. Em nosso entendimento a Requerida, não deve esta, ser habilitada nos presentes autos, porquanto repudiou à herança do seu pai, no que respeita à meação de 50%, a que o mesmo tinha direito, aquando da morte de sua mãe.

  7. Tendo sido este repúdio que ficou consignado na escritura que lavrou em 14/10/2019, e que afasta a sua qualidade de executada.

  8. Dispõe o artigo 2058.º do Código Civil que: “n.º 1. Se o sucessível chamado à herança falecer sem a haver aceitado ou repudiado, transmite-se aos seus herdeiros o direito de a aceitar ou repudiar.” P. A transmissão só se verifica se os herdeiros aceitarem a herança do falecido, o que os não impede de repudiar, querendo a herança a que fora chamado.” Q. O instituto do direito de transmissão, não se trata de uma forma especial de suceder, antes da aplicação normal das regras da transmissibilidade mortis causa. Não há direito de transmissão, mas transmissão de um direito.

  9. Este instituto que não se confunde com o do direito de representação previsto nos artigos 2039.º e seguintes do Código Civil e tão pouco com o direito de acrescer previsto nos artigos 2301.º e seguintes do Código Civil.

  10. Podemos entender que o direito de transmissão previsto no artigo 2058.º do Código Civil é uma representação, mas no sentido que lhe atribui o artigo 258.º do Código Civil – o de praticar actos em nome alheio.

  11. Assim, temos que se alguém é chamado à herança de outrem e reúne todos os pressupostos da vocação, a titularidade da designação prevalente, a sobrevivência ao de cujus e a capacidade sucessória, temos que para que efectivamente suceda é necessário apenas que aceite a herança, expressa ou tacitamente, retroagindo os efeitos da aceitação, por força de ficção jurídica, à data da abertura da sucessão.

  12. A alternativa, i.e., o repúdio da herança – que tem que ser expresso, consentido pelo cônjuge do chamado casado num regime de comunhão e que também retroage à data da abertura da sucessão – accionará o direito de...

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