Acórdão nº 860/18.9T8CLD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I.

Forma de julgamento do recurso.

Dado que a questão objecto do recurso não é complexa, mas é urgente, declaro que este será julgado, liminar, sumária e singularmente (art.ºs 652.º, n.º 1, c), e 656.º do CPC) II.

Julgamento do recurso.

  1. Relatório.

    Por despacho de 23 de Dezembro de 2021, o Senhor Juiz de Direito do Juízo de Família e Menores ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., decidiu, sob promoção do Ministério Público – com fundamento em que nenhuma outra medida das legalmente elencadas se afigurar adequada a debelar o perigo verificado, e muito menos a sua mera cessação o lograria minimamente – prorrogar a medida de acolhimento residencial a título cautelar aplicada AA, nascida no dia .../.../2021, pelo período de três meses computados desde 4 de Dezembro de 2021, na casa de acolhimento em que a criança presentemente se encontra e determinar que se aguardasse o debate judicial, momento em que o Tribunal, a requerimento ou promoção, se pronunciará sobre a necessidade de revisão da medida ora prorrogada.

    O Tribunal Colectivo Misto deliberou, por acórdão, publicado no dia 10 de Fevereiro de 2022, aplicar em benefício da criança AA, nascida no dia .../.../2017, a medida de confiança a instituição com vista a futura adopção, mantendo-se a criança na instituição em que se encontra acolhida, "A ...", declarar os progenitores inibidos do exercício das responsabilidades parentais assim como cessar todas as visitas à AA por parte de qualquer membro da família biológica e designar como curador provisório da AA o Sr./Sr.ª Diretor/a da instituição em que a criança se encontra acolhida[1].

    O Exmo. Patrono da criança logo interpôs recurso deste acórdão, no qual – sem impugnar a matéria de facto nele considerada provada – pede a sua revogação e substituição por outro que reabra o debate judicial e equacione a aplicação da medida de apoio junto de outro familiar (alínea b) ou a da confiança a pessoa idónea previstas no artigo 35º nº 1 – c) e 43º da LPCJP, seja aos avós paternos seja aos futuros padrinhos, cumprindo assim com o princípio do primado da família biológica e natural em detrimento da solução artificial e inadequada da adoção[2] - recurso que foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo.

    O Exmo. Patrono da criança, requereu, depois, a cessação da medida de acolhimento residencial e a repristinação da medida de acolhimento junto dos avós paternos, bem como a autorização de visitas de familiares, nos termos anteriores ao decretamento da medida de acolhimento residencial.

    Fundamentou esta pretensão no facto de a criança ter estado sujeita a medida cautelar de acolhimento residencial, por períodos prorrogáveis de três meses, revista a 23 de Dezembro de 2021, com fim a 4 de Março de 2022, de, tendo ocorrido o termo daquela medida há quase dois meses, não se perspectivar que haja decisão nos próximos meses, já que estão pendente três recursos, relativos ao indeferimento do baptizado da criança, ao indeferimento de realização de novo debate judicial e á decisão final de confiança daquela a pessoa selecionada para adopção, não tendo a mãe sido notificada do acórdão nem se sabendo quando o será, atenta a dificuldade em notificá-la, pelo que entende que deverá ser entregue aos cuidados dos avós paternos, dado que o afastamento há demasiado tempo da família biológica, proibida de contactar consigo, lhe poderá causar danos psicológicos irreparáveis, de o acórdão que inibiu os pais do exercício das responsabilidades parentais e ordenou a cessação das visitas por parte da família biológica, não ter transitado em julgado, estando em aberto a reversão da decisão, sendo de novo autorizadas as vistas dos familiares podendo até ser a confiada a um deles ou a pessoa idónea, o que, se vier a suceder, já terá decorrido demasiado tempo sobre a última visita e a nova situação familiar, podendo ficar comprometido o reatar dos laços de afecto com aqueles familiares, e de existir o risco de a futura família adoptiva não a querer baptizar, dado que vindo de uma família de matriz católica é natural que a família biológica pretenda que essa cerimónia seja realizada quanto antes.

    Sobre este requerimento, ouvido o Ministério Público, recaiu este despacho do Sr. Juiz de Direito: Compulsados os autos verifica-se que a progenitora ainda não foi notificada do teor do acórdão proferido em 10Fev2022. Tendo em conta a razão dessa falta de notificação e o teor do dispositivo do referido acórdão, mostra-se inadmissível o protelamento da situação vigente o que impede na prática, a implementação da decisão e o seu trânsito em julgado e/ou tramitação de recurso interposto.

    Assim, tendo-se em conta a específica informação de rei. ...09, solicite-se nova tentativa de notificação da progenitora através de OPC, sendo certo que, gorando-se a mesma, será a mesma notificada por via edital, o que desde já se determina.

    A ref. 8662991 veio o li. patrono da menor requerer que a menor seja entregue aos cuidados dos avós paternos com quem se encontrava a residir até à aplicação da presente medida cautelar que, refere já se mostrar esgotada no seu prazo.

    Pronunciou-se o Ministério Público a ref. 100356541 promovendo no sentido do seu indeferimento.

    Cumpre apreciar e decidir.

    O li. patrono da menor, como vem sendo hábito a partir de Outubro do ano transacto, vem apresentando recorrentemente requerimentos nos quais prima por articular apenas as partes factuais e legais que enviesadamente aportem ao vencimento do que vem requerendo, olvidando concomitante e selectivamente, quer os factos, quer as disposições legais que dispõem precisamente em contrário.

    ln casu, vem referir - numa interpretação a roçar a má-fé - que era com os avós paternos que a menor se encontrava a residir (o que provadamente apenas se verificou em parte do mês de Agosto de 2021, nunca tendo acontecido antes, nem depois) assim como que a menor se encontra sujeita à medida cautelar de acolhimento residencial, tentando obnubilar de forma absurda, que a decisão, ainda que recorrida, aplicou medida diversa.

    Ademais, o teor do art. 62° A LPCJP expressamente dispõe no seu nº 1 e 2 que "a medida de confiança a (. . .) instituição com vista a adopção, dura até ser decretada a adoção" e só será excepcionalmente revista caso a sua execução se mostre manifestamente inviável. A inviabilidade a que a lei se refere não é concerteza por falta de notificação da progenitora, uma vez que em nada tem essa falta de notificação impedido a execução da medida determinada e aplicada (não a adopção mas a confiança com vista à adopção, entenda-se).

    Por outro lado, ainda, refere nº 6 do mesmo artigo, igualmente ignorado pelo requerente, que "aplicada a medida prevista no nº 1, não há lugar a visitas por parte da família biológica ou adaptante".

    O li. patrono pretende, por conseguinte, que a medida aplicada judicialmente - e os efeitos da mesma - simplesmente não se produzam porque a progenitora não se mostra notificada por culpa que não pode ser assacada senão a ela própria. Pretende que apesar de legalmente proibidas as visitas, candidamente, a menor seja entregue aos avós com quem - pretensamente - vivia. E continua a insistir pelo baptismo da menor enquanto decisão a ser tomada por quem não tem a menor legitimidade para o efeito conforme decorre da decisão proferida e como se esta - e a factualidade em que se estriba – nunca houvesse sequer sido proferida.

    Trata-se, em suma, de requerimento tão temerário, quanto infundado, que simplesmente aposta numa menorização mental deste Tribunal, pelo que se indefere in totum o requerido.

    É este despacho que o Exmo. Patrono da criança impugna no recurso, no qual pede a sua revogação e substituição por outro que autorize as visitas e os contactos da criança com os seus familiares, determine a realização de relatórios sociais pata apurar as condições pessoais, sociais e logísticas, quer dos avós quer dos futuros padrinhos, e autorize o baptizado da criança.

    O recorrente condensou a sua alegação nestas conclusões: 29. O douto despacho recorrido viola o artigo 62º da LPCJP na medida em que, prematuramente, está a aplicar a medida prevista no artigo 62º-A (medida de confiança para adoção) quando, em boa verdade, a decisão que a aplicou ainda não transitou em julgado e até poderá nem sequer transitar.

  2. Não tendo havido trânsito em julgado, não poderá produzir efeitos.

  3. Tendo terminado o prazo pelo qual foi decretada a medida cautelar de acolhimento residencial em instituição e não tendo a mesma sido revista e prorrogada, deverá ser tomada outra decisão quanto à Menor enquanto se encontrarem pendentes os três recursos de decisões tomadas nestes autos.

  4. Ao não dar como cessada nem revista a medida cautelar de acolhimento da menor, o douto despacho recorrido violou o artigo 62º nº 1 e nº 2 da LPCJP.

  5. Entende a Menor que a comunicação à Casa de Acolhimento da decisão de confiança para adoção e proibição dos contatos entre a criança e os seus familiares foi prematura, atento o facto de o acórdão ainda não ter transitado em julgado.

  6. Destarte, deverá a decisão de comunicação à Casa de Acolhimento ser revogada e substituída por outra que autorize os contatos e visitas nos moldes anteriores.

  7. Deverá igualmente ser pedido à Segurança Social que elabore um relatório acerca das condições pessoais, sociais e logísticas dos avós paternos e do casal que a fls. 488-489 manifestou disponibilidade para acolher a Menor porquanto, cessada a medida de acolhimento residencial, haverá que equacionar alternativas enquanto a decisão de confiança para adoção estiver pendente de recurso e, portanto, não puder produzir efeitos.

  8. Deverá ser autorizada a realização da cerimónia de batismo da Menor com a presença dos seus familiares próximos porquanto é no superior interesse da Menor que tal evento decorra, conforme ponderação e avaliação feita pelo ora signatário.

  9. Assim, deverá o douto despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que...

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