Acórdão nº 206/09.7 BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelFREDERICO MACEDO BRANCO
Data da Resolução22 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório A I... – G.... SA, no âmbito da Ação Administrativa Especial que intentou contra o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, sendo contrainteressados a FETESE – Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e Outros Trabalhadores não filiados em qualquer Associação, representados pelo Ministério Público, com vista a “obter a declaração de ilegalidade da Portaria nº 1519/2008, publicada no Diário da República, 1ª série, de 24.12.2008, a qual determina a extensão da Convenção Coletiva de Trabalho celebrada entre a APFS e a FETESE (publicada no BTE nº 15, de 22.4.2008)”, inconformada com o Acórdão proferido em 28 de janeiro de 2011, que julgou “a presente ação improcedente e, em consequência, absolveu a Entidade Demandada e os contrainteressados do pedido de declaração de ilegalidade da Portaria nº 1519/2008, publicada no Diário da República, 1ª série, nº 248, de 24.12.2008, a qual determina a extensão do CCT celebrado entre a APFS e a FETESE, publicado no BTE nº 15, de 22.4.2008, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

Formula a aqui Recorrente/I.... SA nas suas alegações de recurso, as seguintes conclusões: “1 - No âmbito do presente processo, a ora recorrente veio requerer a declaração de ilegalidade da Portaria n° 1519/2008, publicada no D.R., 1ª série, n° 248, de 24 de Dezembro de 2008.

2 - Esta Portaria procede à extensão do CCT celebrado entre a APFS e a FETESE, publicado no B.T.E. n° 15 de 22 de Abril de 2008.

3 - A recorrente não contesta propriamente o ato de extensão, insurge-se apenas contra a atribuição de eficácia retroativa (a Janeiro de 2008) às tabelas salariais.

4- 0 Tribunal a quo considerou que a mencionada Portaria não é nem ilegal nem inconstitucional.

5 - No que concerne à inconstitucionalidade o Tribunal a quo refere que o art. 553°, n° 1, alínea c) do Código do Trabalho não foi, até ao momento, considerado inconstitucional.

6 - Mais, refere que: ”a Autora esquece-se que a Portaria procede à extensão do Contrato Coletivo de Trabalho que a associação de empregadores de que é filiada celebrou, apenas é certo, com a FETESE, mas que desde logo previa, na cláusula 2ª, n° 2 que as tabelas salariais e as cláusulas de natureza pecuniária referentes à retribuição entram em vigor e produzem efeitos desde 1 de Janeiro até 31.12.2008”. O que nos leva a dizer", como o Contrainteressado STAD, que a retroatividade prevista no art. 2º, n° 2 da Portaria n° 1519/2008 de 24.12, não foi criada por aquela Portaria, mas antes pela APFS e pela FETESE, quando outorgaram o Contrato Coletivo de Trabalho. Foram as partes outorgantes daquele CCT, que fazendo uso do art. 533, n° 1, alínea c) do CT, criaram aquela retroatividade a 1.1.2008. A Portaria n° 1519/2008, de 24.12, apenas determinou a extensão daquele CCT, incluindo a retroatividade salarial que o mesmo previa. ” 7 - A recorrente não se conforma com este entendimento.

8 - Caso a Portaria n° 1519/2008 não tivesse existido, a recorrente não estava obrigada a pagar aos trabalhadores não filiados na FETESE quaisquer retroativos.

9 - A retroatividade constante do art. 2º n° 2 da Portaria não foi criada pela recorrente.

10 - O facto das tabelas salariais deste CCT produzirem efeitos, desde 1 de Janeiro de 2008 até 31 de Dezembro de 2008, tem de ser interpretado no contexto das negociações levadas a cabo entre a APFS e a FETESE, que culminaram com a celebração do CCT.

11 - Estas negociações decorreram durante o ano de 2007, tendo sido concluídas no final do ano.

12 - As partes esperavam que a publicação do CCT ocorresse logo no início do ano.

13 - O que apenas não sucedeu por questões formais e burocráticas relacionadas com a publicação dos instrumentos de regulamentação coletiva, questões estas que transcenderam a APFS e a FETESE.

14 - Não era intenção das partes criar qualquer retroatividade, muito pelo contrário.

15 - E tanto que assim é que o pedido de portaria de extensão, formulado pela APFS e FETESE, refere que a mesma apenas deve operar para o futuro, ressalvando-se expressamente que não é intenção das partes que sejam atribuídos efeitos retroativos às tabelas salariais.

16 - O CCT acabou por ser publicado em Abril.

17 - Desde a sua assinatura que as partes já sabiam que tinham de remunerar os trabalhadores filiados de acordo com as tabelas salariais constantes do CCT.

18 - E sabiam que tinham de o fazer desde Janeiro de 2008.

19 - Pelo que, com base nessa expectativa negociaram preços e contratos com os seus clientes.

20 - O mesmo não sucedeu em relação aos trabalhadores não filiados.

21 - A relações estabelecidas com estes continuavam a reger-se pelo CCT do STAD, o a qual tinha Portaria de Extensão e permanecia em vigor.

22 - A recorrente não podia razoavelmente contar com a atitude do Ministério do Trabalho, que veio estabelecer uma retroatividade de 12 meses, retroatividade esta com efeitos em contratos (de prestação de serviços com cliente) já celebrados, muitos dos quais terminados (portanto com reflexos em situações jurídicas já constituídas e consolidadas).

23 - Não é verdade que por força do princípio da igualdade salarial, a recorrente estivesse a aplicar o CCT da FETESE, a todos os seus trabalhadores, desde a data da respetiva publicação.

24 - No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da (dupla) filiação e, por via do mesmo, os CCT só são aplicados aos empregadores e trabalhadores filiados nas associações signatárias do CCT.

25 - O âmbito pessoal de aplicação das convenções coletivas afere-se, portanto, pela dupla e simultânea conexão com os seus destinatários - trabalhadores e patrões, individualmente considerados.

26 - O próprio Ministério do Trabalho recorrido reconhece que aos trabalhadores do STAD era aplicável outro CCT.

27 - O empregador filiado numa determina associação que subscreve um determinado CCT não está obrigado a aplicá-lo à generalidade dos seus trabalhadores, mas apenas que aqueles que estão filiados no sindicato que também outorgar este CCT.

27 (nº repetido) - O facto de serem aplicados na empresa diversos CCT’s com conteúdo diverso e/ou o facto de ser aplicado um CCT a um determinado número de trabalhadores filiados num determinado sindicato, não sendo este aplicado aos demais, precisamente por não serem filiados, em nada contende com o princípio da igualdade retributiva.

28 - Conforme decidiu doutamente o Supremo Tribunal de Justiça (Ac. de. 21/10/2009, disponível para consulta em www.dgsi.pt): “I - O art.º 59.°, n° 1, dl. a) da CRP confere um direito fundamental aos trabalhadores que se cifra em eles, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, serem retribuídos pelo seu trabalho segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual.

II - Este princípio está ancorado no princípio, mais amplo, da igualdade, consignado no art.013.° da CRP e, dada a sua natureza, não obstante a respetiva inserção no Título III, postula não só uma natureza negativa (no sentido de proibição da respetiva violação), como ainda uma aplicabilidade direta em moldes similares aos direitos, liberdades e garantias incluídos nos Títulos I e II da sua Parte I, impondo-se a sua aplicação e vínculatividade às entidades públicas e privadas, como comanda o n° 1 do art.018°.

III - Neste contexto, vem sendo defendido que quando se deparam situações em que se patenteia, sem mais, que um dado trabalhador não beneficiou de um aumento salarial idêntico àquele que foi conferido a outros trabalhadores que na mesma empresa desempenham tarefas absolutamente semelhantes em qualidade, quantidade, duração, intensidade, dificuldade, penosidade e perigosidade, têm a mesma categoria profissional e detêm as mesmas qualificações profissionais, só pela circunstância de ele pertencer a uma organização sindical que não assinou o acordo de empresa ou não ser sindicalizado, tal implicava a postergação do direito consignado no art.0 59.°, n° 1, al. a) da CRP.

IV ~ Contudo, como decorre do apelo à paridade de circunstâncias, mister é que a razão da diferenciação resida, tão só, no facto de o trabalhador não beneficiado pelos aumentos em condições idênticas às desfrutadas por outros não ser associado da organização sindical ou das organizações sindicais que outorgaram o acordo de empresa, ou não ser sindicalizado. (...) VIII - A concessão de aumento salarial que a R. atribuiu aos seus trabalhadores associados dos sindicatos federados na confederação sindical que veio a celebrar um instrumento de regulamentação coletiva de trabalho com a R. ou que, não o sendo, vieram a aderir a esse instrumento, resultaram dessa mesma forma de normação privada, necessariamente de âmbito mais vasto de que aquele meramente incidente sobre os ditos valores.

IX - Não existe discriminação do A por a R. não lhe ter concedido aumentos salariais nos anos de 2003, 2004 e 2005 quando está demonstrado que a R procedeu a esses aumentos salariais por força do acordo de empresa celebrado com diversas associações sindicais, aumentos esses que resultaram da aplicação de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho celebrado entre si e a FETESE e outros sindicatos, aumento esse que a R aplicou aos trabalhadores filiados nas associações sindicais outorgantes e a todos os restantes trabalhadores que a ele pretendessem aderir, mediante declaração para o efeito e, está, ainda, demonstrado que o A era filiado num sindicato que com a R mantinha um outro instrumento de regulamentação que entendeu não aderir aquele e, ele próprio, não aderiu à sua aplicabilidade 29 - A interpretação feita pelo Tribunal a quo da situação colocada à sua apreciação, assume contornos mais graves, se tomarmos em consideração que a mesma preconiza a...

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