Acórdão nº 55/22.7 BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 22 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO NUNO FIGUEIREDO
Data da Resolução22 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul I. RELATÓRIO M... e M..... interpuseram providência cautelar visando a suspensão de eficácia da deliberação n.º 74/2022 da Câmara Municipal de Setúbal, por via do qual se decidiu desfavoravelmente o pedido de informação prévia (PIP) que apresentaram e a emissão de decisão judicial que o aprove, devendo considerar-se verificados os requisitos de que a lei faz depender a concessão da tutela cautelar.

Por sentença datada de 03/05/2022, o TAF de Almada decidiu indeferir a providência cautelar requerida.

Inconformadas, as autoras interpuseram recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem: “I. O presente recurso incide sobre a matéria de facto e sobre a matéria de direito.

  1. Não só a matéria de facto dada como provada na decisão recorrida é insuficiente, como se revela incorreta a aplicação do Direito ao caso vertente, por manifesta contradição entre os factos dados como assentes e a conclusão, adotada na decisão recorrida, de que a decisão de indeferimento do PIP não foi sustentada exclusivamente na vigência do PMDFCI e no artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28.06; III. A incorreta aplicação do Direito prende-se ainda com a adesão, por parte do Tribunal recorrido, ao entendimento perfilhado pelo ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) em manifesta contradição com os normativos legais aplicáveis e em vigor.

  2. No elenco dos factos dados como Assentes, não consta o alegado sob o artigo 56 do Requerimento inicial, ou seja, o de que a decisão final de indeferimento, tomada por via da Deliberação n.º 74/2022, na reunião de Câmara n.º 1/2022, de 05.01.2022, teve como único fundamento a inserção do prédio objeto do PIP em zona de perigosidade de incêndio alta e muito alta, por força do PIDFCI e do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006.

  3. Tal facto resulta evidenciado no Documento n.º 8 junto pelas Requerentes com o seu Requerimento inicial, decorrendo, ainda, dos documentos que serviram de base aos factos Assentes que constam das alíneas AC, AL, e AN.

  4. Bem assim, por ser um facto público e notório, do conhecimento oficioso do Tribunal, deve ser aditado, aos Factos Assentes, o seguinte, alegado pelas Requerentes no artigo 98.º do Requerimento Inicial: Na data de entrada em juízo da Providência Cautelar, no site do ICNF, consta expressamente a menção de que o PMDFCI para Setúbal não se encontra em vigor - Consulta PMDFCI (icnf.pt).

  5. Pelo que, nos termos do disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi n.º 3 do artigo 140.º do CPTA, deverá este TCA alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, aditando aos factos Assentes e dados como provados os seguintes: AQ - “A decisão final de indeferimento, tomada por via da Deliberação n.º 74/2022, na reunião de Câmara n.º 1/2022, de 05.01.2022, teve como único fundamento a inserção do prédio objeto do PIP em zona de perigosidade de incêndio alta e muito alta, por força do PIDFCI e do n.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006”; AR - “Na data de entrada em juízo da Providência Cautelar, no site do ICNF, consta expressamente a menção de que o PMDFCI para Setúbal não se encontra em vigor - Consulta PMDFCI (icnf.pt).” VIII. Dos factos invocados e dados como Assentes nas alíneas C), K), N) AC), AL) e AN) nunca poderia resultar a conclusão, de que a decisão de indeferimento do PIP não foi sustentada, exclusivamente, na alegada vigência do PMDFCI e no artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28.06.

  6. Antes resultando que, tendo começado por existir dois fundamentos de indeferimento do Pedido de Informação Prévia apresentado, veio, na realidade, a subsistir apenas um, na decisão final que constitui o ato suspendendo nos presentes autos: o que se refere à alegada inserção do prédio objeto de PIP em zona de perigosidade de incêndios alta e muito alta, de acordo com o PMDFCI e o artigo 16.º do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28.06.

  7. Esta oposição entre os fundamentos e a decisão resulta evidenciada na p. 59 da decisão recorrida, na qual, resulta patente, salvo o devido respeito, que o Tribunal a quo confunde as várias servidões administrativas e restrições de utilidade pública que incidem sobre o prédio alvo do PIP com aquelas que, no entender do Município de Setúbal, constituem fundamento para o indeferimento do mesmo.

  8. Entendeu o Tribunal a quo, quanto ao Direito, ser de aplicar, ao caso vertente, por um lado, o entendimento perfilhado pelo ICNF, e por outro, a norma transitória contida no artigo 79.º do Decreto-Lei n.º 82/2021, de 13.10.

  9. A posição do ICNF, entidade envolvida na situação carecida de regulação – a de verdadeira ausência de um Plano Municipal de Defesa da Floresta contra Incêndios, em Setúbal, desde 31.12.2020 – não constitui um entendimento jurisprudencial ou doutrinal perfilhável por um órgão jurisdicional, independente e administrador da justiça.

  10. Tanto mais que a mesma foi manifestada a propósito de um pedido concreto, face a uma solicitação casuística, não sendo do conhecimento geral nem correspondendo, de todo em todo, à informação disponibilizada e dada ao conhecimento público, o que sempre seria exigível e até expectável, tratando-se de matéria tão relevante como a da vigência de um Plano de Defesa da Floresta contra Incêndios.

  11. Nem o entendimento do ICNF é admissível, muito se estranhando que o Tribunal o perfilhe, quando o mesmo não encontra acolhimento e até colide com as normas legais aplicáveis, nem, o mencionado artigo 79.º do Decreto-Lei n.º 82/2021 tem aplicação in casu.

  12. À data de apresentação do PIP subjacente aos presentes autos (28.05.2020), e, bem assim, à data de entrada em juízo da Providência Cautelar que está na base dos presentes autos, encontrava-se (e encontra-se) em vigor o Plano Diretor Municipal de Setúbal aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 65/94, publicada no D.R., 1.ª Série-B, n.º 184, de 10.08.1994), na redação resultante do Aviso n.º 6619/2018, publicada no D.R., 2.ª Série, n.º 95, de 17.05.2018 (alteração por adaptação). XVI. Ao abrigo deste instrumento de Gestão Territorial, a área abrangida pelo PIP está classificada como Espaço Cultural e Natural, e, dentro desta, na área de quintas de Setúbal e Azeitão, aplicando-se à mesmo o disposto no artigo 18.º do Regulamento do PDM.

  13. Bem assim, a operação urbanística que se pretende levar a efeito localiza-se em área de RAN (aplicando-se o Decreto-Lei n.º 73/2009, de 31 de março, na sua atual redação, bem como às disposições da Portaria n.º 162/2011, de 18 de abril).

  14. O pedido apresentado prevê, como também decorre dos factos Assentes, uma utilização não agrícola de solo RAN que respeita todos os pressupostos previstos nos aludidos instrumentos normativos, razão pela qual mereceu Parecer Favorável da ERRALVR (cf. o Ofício n.º OF/319/2020/ERRALVT/DRAPLVT, datado de 18.06.2020, por referência ao processo n.º 146/ERRALVT/2020, acima também já mencionado e que integra o processo instrutor).

  15. À data de apresentação do PIP, encontrava-se também em vigor o Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, e, de igual modo, o Plano Intermunicipal de Defesa da Floresta contra Incêndios para Setúbal, Palmela e Sesimbra, na versão revista do mesmo, decorrente do Aviso n.º 1209/2020, publicado no D.R. n.º 16, de 23.01.2020.

  16. De acordo com o DL n.º 124/2006, redação em vigor à data de apresentação do PIP, os PMDFCI eram elaborados pelas câmaras municipais, sujeitos a parecer prévio da respetiva CMDF e a parecer vinculativo do ICNF, sendo aprovados pela assembleia municipal, em consonância com o PNDFCI e com o respetivo planeamento distrital de defesa da floresta contra incêndios, sendo as regras de elaboração, consulta pública e aprovação e a sua estrutura tipo estabelecidas por Regulamento do ICNF, I. P., homologado pelo membro do Governo responsável pela área das florestas.

  17. A coordenação e a gestão dos PMDFCI competiam aos Senhores Presidentes das Câmaras Municipais, sendo que a elaboração, execução, avaliação anual da execução e atualização dos PMDFCI revestiam carácter obrigatório.

  18. Os PMDFCI, de âmbito municipal ou intermunicipal, são tornados públicos, com o teor integral, por publicação em espaço próprio da 2.ª série do Diário da República e por inserção no sítio na Internet do respetivo município, das freguesias correspondentes e do ICNF.

  19. O Regulamento acima referido é, ainda atualmente, o Regulamento aprovado pelo Despacho n.º 4 43-A/2018, publicado no DR de 09.01.2018, na versão que lhe foi dada pelo Despacho n.º 1222-B/2018, publicado no DR de 02.02.2018 (tendo revogado o Regulamento aprovado pelo Despacho n.º 4345/2012).

  20. Da leitura deste Regulamento, decorre com clareza que os PMDFCI deveriam ser aprovados para um período de 10 anos de vigência, e já não de 5 anos.

  21. No artigo 8.º do Despacho n.º 443-A/2018 refere-se ainda, expressamente, que os PMDFCI à data em vigor mantinham o seu período de vigência de 5 anos, findo o qual deveria ser apresentado um novo PMDFCI, esclarecendo o n.º 2 que, para evitar situações de ausência de novo Plano, devem estes ser elaborados com a necessária antecedência.

  22. Ou seja, este diploma previa, expressamente, as situações de ausência de PMDFCI, visando acautelar que tal não sucedesse, XXVII. Como veio a suceder, precisamente, com o PIDFCI de Palmela, Sesimbra e Setúbal, o qual cessou sua vigência a 31.12.2020, como decorre, de resto, expressamente, do texto do Aviso n.º 1209/2020 - Revisão do Plano Intermunicipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios dos Municípios de Palmela, Sesimbra e Setúbal 2016-2020, no qual se refere expressamente que este PIDFCI tinha um período de vigência de 2016 a 2020.

  23. O entendimento de que o PIDFCI para Setúbal, Palmela e Sesimbra “tinha um cronograma estabelecido” até 29.08.2021” não encontra qualquer suporte legal ou regulamentar, tendo inexistido qualquer Despacho ou Aviso que...

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