Acórdão nº 509/18.0T8ELV-F.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelRUI MACHADO E MOURA
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

P. 509/18.0T8ELV-F.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: AA veio intentar contra BB, a sua Massa Insolvente (representada pelo Administrador de Insolvência) e todos os Credores da Massa Insolvente (identificados nos autos principais), a presente acção para separação e restituição da sua meação em dois bens imóveis apreendidos da massa insolvente (devidamente identificados no processo), pedindo, a final, que seja decretada a aludida separação e ordenada a sua restituição e, em consequência, que se não proceda à liquidação dos bens enquanto não houver decisão judicial transitada em julgado, o que fez ao abrigo do disposto nos artigos 143.º, 146.º e 160.º, n.º 1, todos do C.I.R.E.

Alegou, em resumo, que foi casada, no regime da comunhão de adquiridos, com o insolvente entre 30-07-1977 e 16-12-2019, não tendo sido declarada insolvente no âmbito dos autos principais, nos quais vieram, todavia, a ser apreendidos todos os bens comuns do extinto casal, designadamente os melhor identificados no artigo 1º da petição inicial, circunstância que lesa o seu direito de propriedade sobre tais imóveis, designadamente o seu direito à meação.

Regularmente citados os RR., nem o insolvente, nem os credores da insolvência contestaram a presente acção. No entanto, a Ré Massa Insolvente de BB veio contestar, alegando, em suma, que a Autora, tendo sido notificada pelo Administrador de Insolvência para requerer a separação de bens ou demonstrar que já havia sido requerida, nada demonstrou quanto a tal requerimento, sendo que a presente acção, desacompanhada do comprovativo da instauração do competente processo de inventário para partilha do património comum do extinto casal, não é meio processualmente idóneo para proceder à pretendida separação, pugnando, a final, pela improcedência da presente acção. Mais alegou que, não obstante a Autora não assumir a qualidade de insolvente, todas as dívidas reconhecidas no âmbito do processo de insolvência são também da sua responsabilidade, seja porque contraídas no exercício de actividade comercial durante a constância do seu matrimónio com o insolvente, seja porque por elas é solidariamente responsável por via contratual, pelo que, respondendo pelas dívidas comuns do casal o seu património comum, a apreensão deve manter-se.

Facultado à Autora o exercício do contraditório quanto à matéria de cariz exceptivo alegada na contestação da Ré Massa Insolvente, veio esta apresentar resposta, sustentando, no essencial, que a presente acção configura meio processual idóneo para requerer a separação de bens, sendo a tese inversa entendimento de uma franja minoritária da jurisprudência e da qual a dita Ré faz uma interpretação incorrecta e, bem assim, que as dívidas à Fazenda Nacional e ISS, I.P., ao contrário do alegado, não são comuns, mas exclusivas do insolvente, sendo que a dívida à Caixa Geral de Depósitos, S.A., ainda que da sua responsabilidade, não pode ser ressarcida no âmbito dos presentes autos, nos quais apenas se «executam» as responsabilidades do insolvente.

Por entender que o processo continha todos os elementos para a conhecer do mérito da causa foi proferido pela M.ma Juiz “a quo” o respectivo saneador-sentença, nos temos do art.595º nº1 alínea b) do C.P.C., no qual veio a julgar a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, não reconheceu o direito da A. à separação da sua meação nos bens apreendidos para a massa insolvente, melhor identificados no respetivo auto de apreensão e cuja liquidação deverá, por isso, prosseguir os seus termos ulteriores.

Inconformada com tal decisão dela apelou a A., tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões (devidamente sintetizadas nos termos do artigo 639.º, n.º 3, do Código de Processo Civil): I. O direito à separação e restituição de bens apreendidos para a massa insolvente pode ser reconhecido, e exercido a todo o tempo, por meio de ação proposta contra a massa insolvente, contra os credores e o devedor, como expressamente prevê o artigo 146.°, nºs 1 e 2, do CIRE.

  1. O meio previsto nos artigos 146.° a 148.° do CIRE permite (ainda que esgotadas as possibilidades de reclamação) fazer valer os direitos à separação da massa insolvente da meação nos bens comuns.

  2. Desde que exercido de acordo com o estabelecido no artigo 146.° do CIRE, e previamente à liquidação, o direito à separação ou restituição de bens não preclude, pelo que se pode, a todo o tempo, fazer uso do direito à separação ou restituição de bens.

  3. O direito à separação ou restituição de bens pode ser exercido por meio da propositura de ação contra a massa insolvente, contra os credores e o devedor, nos termos do artigo 146.° do CIRE, através de ação declarativa, por apenso aos autos de insolvência, sob a forma de processo comum, não havendo obrigatoriedade de propor inventário, nem estando prevista qualquer exceção no referido preceito por conta do processo de inventário.

  4. Houve uma correta utilização da forma de processo nos presentes autos, pelo que não andou bem o tribunal a quo ao decidir pelo erro na forma de processo e, em consequência, nenhuma nulidade se infere de todo o processado.

  5. A propositura da ação para verificação ulterior do direito à separação e restituição de bens suspende a liquidação dos bens enquanto não houver sentença transitada em julgado.

  6. A existência de dívidas comuns do ex-casal garantidas pelo património comum não impede a determinação da separação da meação da recorrente nos bens comuns, encontrando-se um dos créditos hipotecários reclamados no presente processo de insolvência e no processo de execução instaurado contra a recorrente e o outro crédito hipotecário encontra-se em situação regular de cumprimento pela recorrente.

  7. A existência de património comum garante de dívidas comuns do ex-casal não impede a suspensão da liquidação dos mesmos bens face à propositura da ação nos termos do artigo 146.° do CIRE.

  8. As dívidas restantes são da responsabilidade exclusiva do ex-cônjuge da Recorrente pelo que não pode a Recorrente, que não é, de todo, parte da ação de insolvência, ver a sua meação dos bens comuns ser integrada na massa insolvente.

  9. Não há assim qualquer impedimento ao exercício do direito à separação ou restituição da meação dos bens comuns por parte da Recorrente através da presente ação declarativa, sob a forma de processo comum de verificação ulterior do direito à separação e restituição de bens.

  10. Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deverá o recurso de apelação merecer provimento e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida, substituindo-se a mesma por outra que satisfaça a pretensão jurídica da Recorrente, tudo com as devidas e necessárias consequências legais.

Pelo Ministério Público, em representação do credor Estado (Autoridade Tributária), foram apresentadas contra alegações de recurso, nas quais pugna pela manutenção da decisão...

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