Acórdão nº 84/21.8T8PVL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | EVA ALMEIDA |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO A. C. e O. S., instauraram acção declarativa com processo comum contra X Lda., alegando, em suma, que, por contrato de compra e venda celebrado entre as partes, em Janeiro de 2020, adquiriram à ré um prédio urbano (casa destinada a habitação dos autores). Após a sua aquisição detectaram “infiltrações, humidade e degradação de materiais”. Concluem pedindo que a ré seja condenada a eliminar os defeitos/vícios, que estão na origem dos problemas de infiltrações e humidade, que o prédio apresenta.
* A ré contestou, por excepção, invocando a sua ilegitimidade passiva e a caducidade do direito dos autores, bem como por impugnação. No final requereu a intervenção principal provocada da empreiteira, entretanto declarada insolvente, por isso da massa insolvente, representada pelo respectivo administrador. Ou, subsidiariamente, a sua intervenção acessória.
*Os autores exerceram o contraditório.
*Foi proferido despacho saneador, em que se afirmou a validade da instância e do processado, julgando-se improcedente a excepção da ilegitimidade da ré.
De seguida proferiu-se o seguinte despacho: « 2.2.
Resolvida que se mostra a questão da legitimidade passiva, é manifesto que a pretensão da R. de fazer intervir a título principal a sociedade construtora C. C. – Arquitetura, Engenharia e Construção, Lda. (a fim de assegurar precisamente a alegada - e inverificada - ilegitimidade passiva) tem que ser indeferida, o que se decide – cf. art. 316 do CPC.
2.3.
A fim de se estabilizar subjetivamente a instância, resta apreciar a pretensão da R. de fazer intervir acessoriamente a referida sociedade C. C. – Arquitetura, Engenharia e Construção, Lda. a fim de garantir, se for caso disso, o respetivo direito de regresso (que lhe assistirá, na sua tese, em caso de condenação).
Acontece, porém, que essa sociedade foi declarada insolvente por sentença de 12.8.2020.
E após consulta à base de dados, verifica-se que a aludida sociedade se mostra “dissolvida”.
Qualquer que seja a configuração jurídica de tal “dissolução” não é necessário para a decisão de indeferimento da requerida intervenção a declaração de extinção (e seu registo) da pessoa coletiva.
Na verdade, a admissão de uma massa insolvente (ainda para mais em liquidação, como alega a R.) só deve ser admitida em circunstâncias excecionais – apenas e só a título principal (e se a ação puder correr autonomamente ao abrigo das disposições do CIRE).
Ora, é manifesto que uma intervenção acessória tal como gizada pela R. não cumpre o disposto no art. 322, nº 2, do CPC, nomeadamente por vir a perturbar indevidamente o normal andamento do processo.
Pelo exposto, indefiro a requerida intervenção acessória.»*Inconformada com o assim decidido, a ré interpôs o presente recurso, que instruiu com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões: «I. Vem o presente recurso interposto do despacho proferido em 03/03/2022, o qual indeferiu o incidente de intervenção principal provocada formulado pela R./Recorrente na sua contestação.
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Salvo o devido respeito, a decisão em crise consagra uma incorreta interpretação e aplicação das normas que regulam a intervenção de terceiros e a legitimidade processual.
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Autor e réu são partes legítimas quando têm interesse direto em demandar e em contradizer, respetivamente. O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha. Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida tal como é configurada pelo autor (art. 30.º do Código de Processo Civil).
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Alegam os AA./Recorridos que em 31/01/2020 celebraram com a R./Recorrente um contrato de compra e venda de um imóvel e que em meados de novembro de 2020 começaram a aparecer sinais de infiltrações, humidades e degradação de materiais. Mais argumentam que a R./Recorrente, enquanto entidade que se dedica à compra e venda de bens imóveis, agiu no exercício da sua atividade profissional e eles, Autores, como “consumidores”.
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Por sua vez, a R./Recorrente admite o negócio de compra venda, refutando, contudo, qualquer responsabilidade por eventuais danos no imóvel, desde logo por não ter sido ela quem construiu/edificou o imóvel objeto da compra e venda, mas antes a mencionada C. C. – Arquitetura, Engenharia e Construção, Lda., suscitando a sua intervenção principal provocada do lado passivo.
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No incidente de intervenção deduzido a R./Recorrente sustenta que o imóvel em causa, antes de ser vendido aos AA./Recorridos, foi por si adquirido em janeiro de 2019 à sociedade “C. C. – Arquitetura, Engenharia e Construção, Lda.”, tendo sido esta sociedade quem concluiu a construção do imóvel, atuando como construtor e empreiteiro, vendendo-o e entregando-o à R./Recorrente totalmente acabado e apto a ser habitado, de modo que o imóvel foi transmitido aos AA./Recorridos nas mesmas condições em que foi adquirido pela R./Recorrente, isto é, sem que esta tenha feito qualquer intervenção.
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De acordo com o art. 1225.º do Código Civil, “se a empreitada tiver por objeto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionado, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou por erros na execução dos trabalhos, ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente”.
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Daqui resulta que o empreiteiro, aquele que realizou a obra, é responsável pelos defeitos de construção do imóvel perante o terceiro adquirente. Terceiro adquirente e empreiteiro têm, portanto, legitimidade processual ativa e passiva, respetivamente.
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Apesar de os tribunais não estarem sujeitos às alegações das partes no tocante...
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