Acórdão nº 1455/21.5YLPRT.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MOREIRA
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: Clarisse B. (A.) apresentou contra P., Ld.ª (R.) procedimento especial de despejo, através de requerimento onde peticiona: - O despejo da R. da fracção autónoma designada pela letra “R” do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito (…) em Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º ..., da freguesia de São Sebastião da Pedreira, e inscrito na matriz sob o art.º ... da freguesia de Avenidas Novas; - O pagamento das rendas vencidas e não pagas, bem como o pagamento da indemnização devida pelo atraso na entrega do locado, ambas acrescidas de juros de mora, vencidos e vincendos desde a data de vencimento de cada uma das rendas até ao seu efectivo e integral pagamento.

Alega, em síntese, que em 21/10/2019 celebrou com a R. um contrato de arrendamento relativo à fracção autónoma em questão e que a R. não procedeu ao pagamento das rendas vencidas entre 1/4/2020 e 1/6/2021, motivo pelo qual, através de notificação judicial avulsa apresentada em juízo em 2/6/2021, resolveu o contrato, pedindo a entrega do locado, a par do pagamento das rendas em atraso. Mais alega que a R. não entregou o locado nem pagou os montantes em dívida.

Notificada a R., apresentou oposição onde, em síntese, confirma a celebração do contrato de arrendamento e alega que destinou o locado à actividade do alojamento local destinado a turistas, mais alegando que em finais de Março de 2020 deixou de pagar as rendas, em razão da pandemia de Covid-19, pois que a sua actividade foi afectada pela inexistência de turistas, passando a apresentar prejuízos na sua actividade. Alega ainda que até ao momento em que recebeu a notificação judicial avulsa foram realizadas várias tentativas de negociação, que se revelaram infrutíferas, e invoca a ilicitude da resolução operada pela A., por alteração superveniente das circunstâncias, abuso do direito e caducidade do direito de acção, concluindo pela subsistência do contrato de arrendamento. Mais pede a condenação da A. como litigante de má fé, por ter usado indevida e abusivamente o procedimento especial de despejo.

Tendo os autos sido distribuídos como acção especial de despejo, a A. exerceu o contraditório quanto às excepções peremptórias suscitadas na oposição da R., bem como quanto ao incidente de litigância de má fé, concluindo pela improcedência daquelas e deste.

Após realização da audiência final foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “Nestes termos, julga-se parcialmente procedente o presente procedimento especial de despejo e, em consequência decide-se:

  1. Decretar o despejo da Ré (…) da fracção autónoma designada pela letra “R” do prédio urbano subordinado ao regime de propriedade horizontal, (…), condenando-se a mesma à entrega do locado, devoluto de bens; b) Condenar a Ré (…) no pagamento da quantia de € 18.499,95 (dezoito mil quatrocentos e noventa e nove euros e noventa e cinco cêntimos) a título de rendas vencidas e não pagas respeitantes às rendas que se venceram desde Abril de 2020 até Junho de 2020 [rectificado para Junho de 2021, nos termos adiante referidos].

    c) Relativamente às rendas vencidas nos meses de Maio a Novembro de 2020 e Abril a Junho de 2021 condenar a Ré (…) no pagamento de juros de mora à taxa legal civil em vigor desde o seu vencimento até efectivo e integral pagamento; d) Relativamente às rendas vencidas nos meses de Abril de 2020, Dezembro de 2020 e Janeiro a Março de 2021 condenar a Ré (…) no pagamento de juros de mora à taxa legal civil em vigor desde o dia 01/07/2021 até efectivo e integral pagamento; e) Condenar a Ré (…) no pagamento de € 9.866,64 (nove mil oitocentos e sessenta e seis euros e sessenta e quatro cêntimos) pela indemnização ao abrigo do artigo 1045.º do Código Civil f) Condenar a Ré (…) a pagar à Autora mensalmente, a título de indemnização nos termos do artigo 1045.º do Código Civil, o valor da renda estipulada (€ 1.233,33), até ao momento da efectiva restituição e entrega do locado.

    g) Absolver a Autora (…) como litigante de má-fé.

    (…) Custas pela Autora e Ré, na proporção do decaimento, fixado em 1% e 99% respectivamente.

    Custas pelo incidente de litigância de má-fé pela Ré (…) no mínimo legal de 1 (um

  2. UC”.

    A A. recorre desta sentença, com respeito às al. e) e f) do dispositivo respectivo, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem na íntegra: 1ª Vem o presente recurso interposto da decisão que, entre o mais, condenou a Ré (…) no pagamento de 9.866,64 € (nove mil, oitocentos e sessenta e seis euros e sessenta e quatro cêntimos), a título de indemnização devida à Autora por força do disposto do artigo 1.045º do Código Civil, (alínea e) da Decisão) e, outrossim, que, seguindo o entendimento que conduziu à predita condenação, condenou a Ré (…) a pagar à Autora, mensalmente, a título de indemnização nos termos do artigo 1.045º do Código Civil, o valor da renda estipulada (1.233,33 €), até ao momento da efectiva restituição e entrega do locado (alínea f) da mesma Decisão).

    1. Não obstante a questão fundamental que pretende submeter-se à cognição deste Tribunal Superior seja a da fixação do quantum indemnizatório devido à Autora em consequência do incumprimento culposo da Ré da obrigação de restituição do locado, impõe-se, contudo, tratar previamente da questão atinente à correcção do lapso material de que a sentença agora posta em crise padece, desta feita através da correcção do lapso material traduzido na inscrição do mês de Junho de 2020 no texto decisório vertido sob a alínea b), dele devendo passar a constar a indicação de Junho de 2021.

    2. Com efeito, a pronúncia quanto à condenação da Ré no pagamento de tais rendas foi vertida sob a alínea b) do segmento decisório que compõe a sentença proferida nos autos, sendo que, ao invés de ali se escrever que a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 18.499,95 € diz respeito às rendas vencidas e não pagas desde Abril de 2020 até Junho de 2021, conforme resulta da conjugação da factualidade dada como provada sob os pontos 5, 8 e 10 do correspondente acervo, se escreveu, por mero lapso como bem evidenciam os demais termos da mesma, que as rendas vencidas e não pagas seriam as de Abril de 2020 até Junho de 2020.

    3. O inconformismo da Autora circunscreve-se, como se referiu, à componente decisória vertida sob as alíneas e) e f) da decisão proferida pelo Tribunal a quo, desta feita quanto à concreta questão da indemnização devida à Autora a partir da data em que, validamente produzidos os efeitos da resolução contratual promovida através de notificação judicial avulsa, a Ré incumpriu culposamente a obrigação de restituir o locado.

    4. A questão que importa dilucidar é, pois, a da determinação do quantum indemnizatório que, por força do disposto no artigo 1.045º do Código Civil, se mostra devido na situação que constitui o objecto dos presentes autos.

    5. Nos termos do disposto no artigo 1.022º o contrato de arrendamento é o acordo mediante o qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição; do qual emergem, para cada uma delas, obrigações, de entre as quais avultam, para o senhorio, a de entregar a coisa e assegurar o gozo desta para os fins a que se destina prevista no artigo 1.031º e para o arrendatário, a de restituir a coisa locada findo o contrato prevista sob a alínea i) do artigo 1.038º.

    6. O nº 1 do artigo 1.081º preceitua que “A cessação do contrato torna imediatamente exigível (...) a desocupação do local e a sua entrega”, sendo que uma tal desocupação do locado, nos termos do artigo 1.087º “é exigível após o decurso de um mês a contar da resolução (...)”.

    7. Os fundamentos de resolução em matéria de arrendamento de prédios urbanos encontram-se vertidos sob o artigo 1.083º, sendo que, tal como previsto no nº 2 do artigo 1.084º, no caso da resolução pelo senhorio fundada na causa prevista no nº 3 do dito artigo 1.083º aquela opera por comunicação à contraparte onde fundadamente se invoque a obrigação incumprida, isto é, os efeitos da resolução promovida pelo senhorio produzem-se no momento da comunicação feita ao arrendatário com observância da disciplina prevista no artigo 9º do NRAU.

    8. Em consequência da predita resolução extrajudicial do contrato, o arrendatário pode continuar a ocupá-lo, sem incorrer em mora quanto à obrigação de restituição do mesmo, durante o período previsto no artigo 1.087º - período de ocupação pelo qual será devido ao senhorio, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 1.045º, o valor correspondente ao da renda.

    9. Se, entretanto e decorrido que seja o período previsto no artigo 1.087º, o arrendatário não proceder à entrega voluntária do locado, antes mantendo a sua ocupação, mostra-se configurada uma situação de mora quanto à obrigação de restituição do locado, o que determina - atento o estatuído no nº 2 do mencionado artigo 1.045º - o vencimento de uma indemnização equivalente ao dobro do mês de renda.

    10. Quer a Jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, quer a mais avalizada Doutrina doutamente produzida sobre a questão preconizam, sem hesitações, que a indemnização em valor correspondente ao dobro da renda contratualmente estabelecida prevista no nº 2 do artigo 1.045º se distingue da prevista no nº 1 em consequência de naquela se estar perante uma situação de mora culposa do arrendatário na restituição do locado, enquanto nesta se estabelece tão somente uma específica medida de compensação pecuniária, que afasta a necessidade de recurso às regras do enriquecimento sem causa.- Cfr. Acórdão do STJ de 12.06.2012, Revista nº 14/06.7TBCMG.G1.S1 – 6ª, www.stj.pt Sumários de Acórdãos; Acórdão TRL de 19.11.2020, Processo nº 5.508/20.9T8SNT-AL1-2, www.dgsi.pt e Maria Olinda Garcia in “Arrendamentos para Comércio e fins equiparados, Coimbra Editora, 2006, página 59.

    11. Da factualidade dada como provada sob os pontos 3, 5, 8 e 10 do...

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