Acórdão nº 502/10.0BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelFREDERICO MACEDO BRANCO
Data da Resolução08 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório I... – I....., S.A., intentou Ação Administrativa Comum contra o Estado Português representado pelo Ministério Público, tendente a obter a condenação do Réu no pagamento da quantia relativa ao “fornecimento de refeições e serviços de bar integralmente efetuados e prestados”, por parte dos Serviços Sociais da Administração Pública (SSAP), titulada pelas faturas emitidas entre janeiro de 2008 e maio de 2009, acrescida dos juros moratórios vencidos e calculados sobre a data de vencimento de cada uma das faturas atá à data de apresentação do requerimento de injunção, no valor total de €22.229,53, acrescido de juros de mora vencidos, desde o dia 12 de janeiro de 2010, e vincendos até integral e efetivo pagamento.

Havia já, entretanto, sido proferido Despacho Saneador que julgou improcedente as invocadas exceções de incompetência absoluta em razão da matéria e de erro na forma de processo, em 5 de março de 2012, o qual tendo sido objeto de Recurso, determinou decisão deste TCAS em 6 de dezembro de 2017, que negou provimento ao mesmo e confirmou a decisão recorrida.

No que aqui releva, inconformado com Sentença proferida em 8 de julho de 2020, através do qual foi julgada improcedente a ação, a I... – I....., S.A.

, veio interpor recurso jurisdicional da referida decisão, proferida em primeira instância no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

Formulou o aqui Recorrente/I...

nas suas alegações de recurso, apresentadas em 29 de setembro de 2020, as seguintes conclusões: 1.ª Não andou bem o Tribunal a quo ao decidir julgar improcedente o pedido formulado pelo Autor, ora Recorrente, por considerar que o contrato celebrado entre aquele e os Serviços Sociais da Administração Pública (SSAP) – tendo como objeto o fornecimento de refeições na cantina do edifício da Secretaria-Geral do Ministério da Economia e da Inovação – SGMEI) - se manteve em vigor/renovou a partir de 1 de janeiro de 2008, não admitindo quaisquer “encargos diretos” a cargo do contraente público; 2.ª Ao contrário do que resulta da fundamentação de direito constante da douta decisão recorrida, os factos provados demonstram que o contrato celebrado, em 15 de dezembro de 2006, entre o Recorrente e os SSAP, cessou a sua vigência no dia 31 de dezembro de 2007 em virtude de o cocontratante (Autor) se ter oposto à sua renovação nos termos previstos na respetiva Cláusula 7.ª; 3.ª Ficou assente na alínea D) do probatório que, através da carta n.º 1642/GA/IF, com data de 28/11/2007, o Recorrente, invocando um resultado económico abaixo do esperado, se opôs válida e oportunamente à renovação do antedito contrato a que alude a alínea C) do probatório, o qual, como tal, deixou de produzir quaisquer efeitos; 4.ª O simples facto de o Recorrente, a pedido dos SSAP e a pretexto da celebração de um novo contrato para o ano seguinte, não ter deixado de prestar serviços a partir do dia 1 de janeiro de 2008, não permite concluir que o contrato a que alude a alínea C) do probatório “se manteve” (ou se renovou), como se sustenta na douta decisão recorrida; 5.ª Como resulta igualmente do probatório, os próprios SSAP conformaram-se com a cessação do contrato por oposição à sua renovação pelo Recorrente; 6.ª Tanto assim é que, como resulta da alínea E) do probatório, os SSAP, em 15 de janeiro de 2008, solicitaram ao Recorrente que apresentasse as condições para o novo contrato; 7.ª A conformação dos SSAP com a não renovação do contrato decorre ainda, de forma cristalina, do conteúdo do documento n.º 3 da contestação e das anotações nele manuscritas pelos SSAP, datadas de 28 de Dezembro 2007 e de 2 de Janeiro de 2008, nas quais, no seguimento da oposição à renovação, se solicita que seja apresentada nova proposta pelo Recorrente para a prestação do serviço em regime de ajuste direto a partir da data da cessação do contrato anteriormente celebrado e, bem assim, se alude à necessidade de “preparar procedimento de ajuste direto para adjudicação da exploração da cafetaria”; 8.ª Em consequência, como resulta da alínea F) do probatório, o Recorrente apresentou a proposta solicitada, comunicando a intenção de continuar a assegurar o fornecimento do serviço nas condições por si propostas através do seu fax de 17 de janeiro de 2008, nas quais se incluíam, na respetiva remuneração, os “encargos indiretos” que o Tribunal recorrido considerou não serem devidos; 9.ª Como igualmente decorre da alínea G) do probatório, os SSAP chegaram mesmo a solicitar ao Recorrente, no seguimento da apresentação daquela proposta, a apresentação de nota justificativa dos encargos com o pessoal, com especificação da categoria profissional, a fim de procederem à análise da proposta apresentada pelo Recorrente; 10.ª Por aplicação do disposto no artigo 236.º do Código Civil, é forçoso concluir que as declarações negociais das partes (Recorrente e SSAP) evidenciam que ambas consideraram cessado, em 31 de dezembro de 2007, o contrato a que se reporta a alínea C) do probatório; 11.ª Não era, pois, possível concluir, como erradamente se concluiu na sentença recorrida, que tal contrato “se manteve” (v.g. se renovou), muito menos com base em meras declarações negociais dos SSAP proferidas cerca de seis meses depois, quando tais serviços decidiram, em 3 de julho de 2008, rejeitar a proposta solicitada ao Recorrente para a celebração de um novo contrato – cfr. alínea J) do probatório; 12.ª Com o maior respeito, padece, assim, de erro o entendimento sustentado pelo Tribunal recorrido no sentido de que o contrato celebrado em 15 de dezembro de 2006 se renovou em 1 de janeiro de 2008, facto claramente contrariado pelas declarações e condutas das partes contraentes, Recorrente e SSAP; 13.ª Não, podem, assim, os direitos reclamados pelo Recorrente considerar-se vedados por uma norma contratual (Cláusula 7.ª do contrato a que alude a alínea C) do probatório) que já não produzia efeitos no período a que respeitam os valores inscritos nas faturas reclamadas nos presentes autos; 14.ª Em face dos factos dados como provados, devia, assim, o Tribunal recorrido ter considerado que o Recorrente passou, a partir de 1 de janeiro de 2008, a C…. | C…. - Advogados de Responsabilidade Limitada Tel.: + ….34 | Fax: + 39 | E-mail: geral@...... -advogados.pt Av. Fontes Pereira de Melo, n.º…., 8.º A, 1050-117 Lisboa | www……. -advogados.pt Página | 21 prestar os serviços de restauração na cafetaria do edifício da SGMEI sem título bastante (contrato escrito) para o efeito, daí extraindo as devidas consequências legais; 15.ª A este respeito, preconiza-se que o entendimento sustentado na douta decisão recorrida viola os princípios da confiança e da boa-fé, ao admitir que os SSAP podiam, sem qualquer consequência, declinar, ao fim de cerca de seis meses de prestação continuada de serviços sem título bastante (contrato escrito), a proposta que solicitaram ao Recorrente para a prestação de serviços no ano de 2008 (que lhes foi prontamente apresentada em janeiro daquele ano); 16.ª É merecedora de tutela, ao abrigo dos princípios da confiança e da boa-fé, a conduta do Recorrente ao dar continuidade à execução da sua prestação em vista da celebração de novo contrato a parti de 1 de janeiro de 2008, tendo para o efeito procedido à apresentação de proposta nos termos programados e solicitados pelos SSAP; 17.ª O Recorrente confiou legitimamente que haveria lugar à celebração de um novo contrato com efeitos a partir daquela data, hipótese que -, apesar da insistência daquele e da advertência (feita em março de 2008) de que, na falta de resposta, faturaria os valores em conformidade com a sua proposta -, só veio a ser declinada pelos SSAP cerca de seis meses depois; 18.ª Ademais, durante todo o período a que se reportam as faturas cujos valores são reclamados nos presentes autos - bem sabendo que inexistia já um título bastante para a contratação de tais serviços pelo Recorrente a partir de 1 de janeiro de 2008 -, os SSAP, não só solicitaram, como nunca rejeitaram a prestação de serviços de restauração pelo Recorrente a partir daquela data, mais precisamente durante o período a que se reportam as anteditas faturas; 19.ª Ao considerar que a pretensão do Recorrente não é merecedora de qualquer tutela, o Tribunal recorrido desconsiderou, desde logo, os princípios da confiança e da boa-fé, pelos quais se deve nortear a conduta da Administração Pública, consagrados no artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa; 20.ª A rejeição pelos SSAP da proposta do Recorrente cerca de seis meses depois – quando tais serviços estavam cientes que o Autor continuava, há vários meses, tal como solicitado, a prestar (sem título bastante), os serviços a contratar a partir de 1 de janeiro de 2008 e, bem assim, que o Recorrente, dadas as dificuldades económicas sentidas, já havia advertido desde março daquele ano que iria faturar os serviços em conformidade com a sua proposta –, configura um comportamento que, com o devido respeito, se afigura desleal e incoerente, podendo mesmo configurar uma situação de abuso de direito; 21.ª A rejeição da proposta do Recorrente constituiu uma conduta inesperada e incoerente, tendo aquele confiado, até pelos esclarecimentos pedidos sobre a sua proposta, que os SSAP manteriam a intenção de celebrar novo contrato, em vez de virem posterior e contraditoriamente, recusá-la e ficcionar uma suposta renovação do contrato extinto; 22.ª Temos, pois, que, ao sancionar a conduta dos SSAP, o Tribunal recorrido desconsiderou os princípios da confiança e da boa-fé, pelos quais se deve nortear a conduta da Administração Pública, consagrados no artigo 266.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa; 23.ª Ao contrário do decidido, devia a conduta dos SSAP, a partir de 3 de julho de 2008, ter sido desconsiderada e bloqueada pelo Tribunal recorrido, por ser inconciliável com a posição que aqueles mesmos serviços...

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