Acórdão nº 02605/08.2BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução07 de Setembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XO DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. do Porto, constante a fls.456 a 519-verso do processo físico, a qual julgou procedente a presente impugnação intentada pela associação recorrida, Liga Portuguesa de Futebol Profissional, tendo por objecto mediato liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios, relativas aos anos fiscais de 2003 e 2004 e no valor total de € 763.128,32.

XO recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.533 a 540-verso do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: A-A impugnante é, conforme relata a sentença recorrida, uma “pessoa colectiva privada, regida pelo direito privado, com estrutura associativa, que têm legislação própria a regulá-la, estando sujeita aos estatutos, regulamentos que forem emitidos e pela legislação aplicável, submetendo-se, sem dúvida, ao regime jurídico das associações de direito privado, previsto no Código Civil, sem prejuízo do direito administrativo aplicável, na medida em que actue ao abrigo de poderes jurídico públicos.” B-Contudo mesmo que exercesse funções ao abrigo de poderes públicos, que não exerce, por esses poderes estarem adstritos à FPF, não seria automaticamente considerado uma entidade de direito público.

C-Como bem se diz na jurisprudência do STA no acórdão do processo n.º 01060/13 de 05-04-2017 “Não detém a qualidade de organismo de direito público na acepção do referido artigo 13º uma pessoa que pratica atos na qualidade de autoridade pública, de modo independente, mas que não está integrada na organização da Administração Pública, não podendo, assim, essa qualidade resultar apenas do facto de a atividade em causa consistir na prática de atos de autoridade pública.” D-O art. 13º da Directiva 2006/112/CE de 28 de Novembro de 2006 refere que “1. Os Estados, as regiões, as autarquias locais e os outros organismos de direito público não são considerados sujeitos passivos relativamente às actividades ou operações que exerçam na qualidade de autoridades públicas, mesmo quando, no âmbito dessas actividades ou operações, cobrem direitos, taxas, quotizações ou remunerações. Contudo, quando efectuarem essas actividades ou operações, devem ser considerados sujeitos passivos relativamente às mesmas na medida em que a não sujeição ao imposto possa conduzir a distorções de concorrência significativas.” E-Assim, e nos termos da Directiva Comunitária, embora a LPFP tenha sido criada por um organismo público - FPF - nunca poderia ser equiparada a uma entidade de direito público por não estar devidamente enquadrada na Administração Pública, é uma associação de direito privado, sujeita a regras de direito privado e que prossegue as suas atribuições e objectivos de forma independente.

F-Deste modo, dúvidas não restam que estamos perante uma entidade que não poderia beneficiar da incidência negativa constante do art. 2º n.º 2 do CIVA aplicável ao Estado e demais pessoas colectivas de direito público.

G-A impugnante exerce uma actividade económica, explora comercialmente as competições por si organizadas, actividade essa enquadrável no art. 4º n.º 1 do CIVA e não isenta nem nos termos do art. 10º e nem nos termos do art.º 9º n.º 21 do CIVA e, como tal, as operações por si praticadas são naturalmente tributáveis em sede de IVA, como qualquer outro sujeito passivo de IVA, como se pode verificar pela análise da douta sentença recorrida.

H-Não estamos também perante um organismo sem finalidade lucrativa na justa medida em que os seus associados recebem os resultados da exploração comercial, nos termos constantes do art. 9º n.º 1 alínea f) dos Estatutos da Impugnante.

I-Ou seja, a impugnante realiza prestações de serviço a título oneroso onde se encontra patente o nexo de causalidade entre a contrapartida e o serviço prestado tal como é expressamente referido na douta sentença recorrida “i) explora uma determinada actividade comercial, ii) aproveita-se, inicialmente dos resultados obtidos, procedendo à sua gestão e posterior afectação segundo critérios que livremente estabelece (artigo 6.º, n.º 1, alínea s) dos estatutos) e canaliza o remanescente, descontando as despesas e eventuais reservas que fixa, para os seus associados.” J-Existe assim uma relação jurídica determinável entre prestador e beneficiário do serviço, a impugnante gere os interesses dos clubes associados, cobra receita, quotas, inscrições de atletas, cartões, direitos televisivos, vistorias e débitos de despesas com árbitros.

K-Presta assim serviços de gestão e organização integrada dos interesses dos clubes e como contrapartida recebe valores por essa prestação, é uma actividade comercial pura e simples, enquadrável no art. 4º do CIVA, como prestação de serviços no exercício de uma actividade económica.

L-As operações realizadas pela Impugnante, no âmbito da sua actividade, e alvo de correcção pela AT, têm como suporte documental facturas ou documento equivalente em conformidade com o artigo 28º do CIVA, contudo não contém a menção imposta pelo artigo 35º do CIVA que justifica o facto de não lhe ter sido aplicado a taxa de IVA.

M-Os cálculos efectuados pela inspecção tributária para quantificar os valores obtidos cingiram-se a toda a documentação fiscal apresentada pela impugnante que descrevesse uma concreta prestação de serviço.

N-As prestações de serviço da impugnante aos seus associados são claras nos estatutos da mesma, veja-se art. 5º e 6º enquanto serviços prestados com a correspondente contrapartida para os clubes associados no art. 9º do mesmo estatuto, para o qual aqui remetemos.

O-Como se pode verificar existe um nexo causal entre o serviço prestado pela impugnante e a contrapartida, vantagem obtida pelos clubes associados que entregam toda a gestão, organização e exploração comercial a uma entidade privada que presta serviços a troco de um valor pecuniário.

P-A natureza económica das operações de prestações de serviço estão devidamente identificadas e delimitadas pelos próprios estatutos da impugnante, pelo que a inspecção tributária apenas aplicou a taxa de imposto (promovendo as correcções adicionais) às prestações de serviço decorrentes da actividade económica da impugnante.

Q-Aliás, é admitido em sede decisória que, quando a impugnante exerce a função que lhe é estatuariamente acometida pelos seus associados – exploração comercial de competições por si organizadas -, pelo menos neste último caso, é muito provável que pratique uma ou mais do que uma operação tributada.

R-Ou seja, o Tribunal defende que a impugnante é uma pessoa colectiva de direito privado, dispõe de total autonomia face ao Estado e demais pessoas colectivas públicas, no que concerne ao seu funcionamento e à sua gestão corrente, e encontra-se incumbida, estatutariamente, pelos seus associados, da exploração comercial das competições por si organizadas, obedecendo aos critérios de oportunidade económica e às regras de mercado.

S-Não só defende como assume tal facto como insofismável: “No que diz respeito, em primeiro lugar, à natureza privada a entidade em causa, mesmo que se possa admitir a delegação de alguns poderes de natureza jurídico público, ainda que bastante limitados, não há como recusar a natureza de associação de direito privado à entidade em causa. Em primeiro lugar, cabe precisar que está aqui em causa a natureza da liga portuguesa de futebol e não a federação portuguesa de futebol, a quem é reconhecido o estatuto de utilidade pública”, cf. pág. 90 da sentença.

T-Aliás, tal como é salientado na sentença, a Impugnante não foi criada pelo Estado ou por qualquer outra pessoa colectiva de direito público, realiza a sua actividade em seu próprio nome, sob a sua própria responsabilidade, de forma totalmente independente, e de forma inequívoca explora comercialmente as competições por si organizadas, através de forma, meios e critérios de gestão de mercado, típicos do direito privado, obedecendo aos critérios de oportunidade económica e às regras de mercado, cf. pág. 92 da sentença.

U-Considerando a factualidade provada e analisadas as operações em causa à luz dos objectivos e das características do sistema comum do IVA, não restam dúvidas que estamos perante operações tributáveis, na medida em que os montantes em causa não têm uma natureza voluntária ou aleatória, antes são o cumprimento de uma obrigação contratualmente determinada como contrapartida pelas prestações de serviços assumidas pela impugnante.

V-Ou seja, a Impugnante presta um serviço em sentido amplo, na medida em que se substitui aos clubes e à FPF, no exercício de tarefas que de outro modo teriam de ser exercidas pelos próprios.

W-Por esses serviços cobra um contravalor que tem um nexo directo com as vantagens reais dos clubes e FPF definidas nos estatutos.

X-E nessa medida a Impugnante exerce uma actividade económica, que terá de ser tributada.

Y-A partir do momento que está provado que não se lhe aplica a isenção do artº 9º nº21 e do artigo 10º do CIVA, todas as contraprestações auferidas pela impugnante, constituem remunerações dos serviços que esta presta aos seus associados, e como tal, sujeitas a IVA nos termos do artigo 4º do mesmo código.

Z-De facto, em termos fiscais, a impugnante está enquadrada, para efeitos de IVA, no regime normal de periodicidade mensal com a realização de operações sujeitas a imposto.

AA-Também as operações realizadas pela Impugnante, no âmbito da sua actividade, e alvo de correcção pela AT, têm como suporte documental facturas ou documentos equivalentes em conformidade com o artigo 28º do CIVA, mas que não contém a menção imposta pelo artigo 35º do CIVA que justifica o facto de não lhe ter sido aplicado a taxa de IVA.

Concluindo, BB-Consideramos que a impugnante realiza operações que integram o âmbito de incidência objectiva do imposto em causa conforme está definido na Jurisprudência do TJUE, na medida em que estamos perante uma actividade realizada de forma...

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