Acórdão nº 2594/19.8T9VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelBELMIRO ANDRADE
Data da Resolução29 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO No despacho a que se reporta o art. 311º do CPP (despacho de 19.01.2022, ref. Citius 89640701) a Mª Juíza, ponderando que “inexistindo queixa tempestiva por quem tinha legitimidade para a apresentar, falta um requisito de procedibilidade da acção, carecendo o MP de legitimidade para deduzir acusação contra o arguido, pela prática dos factos e do referido ilícito penal de natureza semipública, o que obsta à apreciação do mérito da causa”, decidiu: - rejeitar a acusação pública por falta de legitimidade do Ministério Público para promover e prosseguir o processo penal contra o arguido AA.

* Inconformada com tal despacho, dele recorre a digna magistrada do MºPº, formulando, na respetiva motivação, as seguintes CONCLUSÕES: 1- Nos presentes autos foi proferida decisão de rejeição da acusação pública deduzida, por falta de legitimidade do Ministério Público para promover e prosseguir o processo penal, uma vez que a participação criminal apresentada pela mandatária constituída da ofendida não se encontrava por aquela assinada; 2- Concluiu o tribunal a quo que “No caso vertente constatamos que a queixa que foi apresentada em 19.11.2019 no apenso A a fls. 3 e segs. não se mostra assinada manualmente pela sua subscritora, nem contém qualquer assinatura digital certificada cronologicamente validada, sendo a mesma insusceptível de produzir quaisquer efeitos jurídicos, o que equivale à sua inexistência. Acresce a ratificação de tal queixa pelo legal representante da ofendida, BB, apenas ocorreu em 12.12.2019 (cfr. fls 48 a 49 do apenso A), ou seja, já após o prazo dos 6 meses mencionados no art.º 115.º, n.º 1, do Código Penal. Assim, e em inexistindo queixa tempestiva por quem tinha legitimidade para a apresentar, falta um requisito de procedibilidade da acção, carecendo o MP de legitimidade para deduzir acusação contra o arguido, pela prática dos factos e do referido ilícito penal de natureza semi-pública, o que obsta à apreciação do mérito da causa.” 3- Contudo tal solução não se mostra consentânea com a legislação em vigor, nomeadamente por violação dos Artigos 113.º; 115.º, 259.º, n.º 1 e 4, todos do Código Penal e Artigos 48.º, 49.º, 53.º, n.º 2, al. a), b) e c), 283.º, 311.º do Código de Processo Penal; Artigo 4.º do Código de Processo Penal; Artigo 268.º, n.º 2, do Código Civil; e Artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa.

4- O Tribunal a quo considerou que a queixa apresentada é inexistente, por falta de assinatura da mandatária judicial subscritora. Contudo, e salvo melhor opinião, não podemos concordar com tal posição, porquanto, a “inexistência” é a mais grave das consequências de um acto, pois nem sequer é considerado pela ordem jurídica, é como se – perdoe-se o pleonasmo – o acto não existisse. O que não é o caso.

5- Com efeito, embora a queixa não se mostre assinada pela Il. Mandatária subscritora, certo é que a mesma teve a virtualidade de transmitir ao Ministério Público a notícia do crime e desencadear a instauração de inquérito e a dedução de acusação pública.

6- E note-se que a queixa foi remetida pela ilustre advogada através de endereço de correio eletrónico da Ordem dos Advogados, sendo que a queixa que se anexava apresentava timbre identificativo da casuística, pelo que se deveria entender que nenhuma dúvida havia acerca do autor dessa peça processual.

7- O que, em conjugação com a procuração forense outorgada a favor da Il. Mandatária subscritora, a 19.11.2019, à qual eram conferidos “(…) poderes para, em seu nome e em representação, apresentar queixa crime contra o Sr. AA e/ou a condómina proprietária da Fração C.”, torna inequívoco que a queixosa pretendia procedimento criminal.

8- Mesmo que assim não se entendesse, e sendo permitida a prática de actos através de remessa por correio-electrónico, sempre deveria ter o tribunal notificado a Il. Mandatária da queixosa para vir aos autos juntar o original da queixa-crime, devidamente assinada.

9- Na realidade, paralelamente, podemos concluir que nem a sentença em que falte a assinatura do juiz é considerada inexistente.

10- Pois que nem a falta de assinatura da sentença é culminada com a inexistência ou nulidade insuprível, por maioria de razão, também a queixa apresentada por mandatário forense ainda que não assinada, remetida por endereço de correio eletrónico oficial da ordem dos advogados, não pode ser considerada inexistente.

11- A queixa apresentada não tinha qualquer assinatura aposta, nem autografa nem digital e, nessa medida, dispõe o Artigo 10.º do mesmo diploma que “À apresentação de peças processuais por correio electrónico simples ou sem validação cronológica é aplicável, para todos os efeitos legais, o regime estabelecido para o envio através de telecópia.”.

12- No caso da telecópia, cujo regime legal aqui se tem que ter como aplicável, tal objectivo é assegurado ou pela utilização do respectivo serviço público ou do equipamento do advogado ou solicitador, cujo número tinha que constar das listas organizadas pela respectiva Ordem ou Câmara dos Solicitadores. Crê-mos que o mesmo sucede com o envio do requerimento através de endereço de correio-electrónico oficial da ordem dos advogados, como foi o caso.

13- Em todo o caso, e para cumprimento do disposto no n.º 3, do Artigo 4.º, do Decreto-Lei 28/92, de 27/02, entendemos que a Ilustre Mandatária da queixosa deveria ter sido “convidada” para vir juntar aos autos o original da participação criminal, devidamente assinada, o que não foi até ao momento da prolação do despacho do qual se recorre.

14- Não se entendendo assim, tal posição é inconstitucional porque violadora dos princípios de acesso aos...

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