Acórdão nº 1511/15.9T8CLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA MARIA ROBERTO
Data da Resolução24 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação n.º 1511/15.9T8CLD.C1 Acordam[1] na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório AA deduziu o incidente de liquidação da sentença proferida nos presentes autos contra: P..., Ldª alegando, para tanto, que recebeu da Ré, a título de ajudas de custo, o total de € 52.780,00, no entanto, por força do CCTV deveria ter recebido de cláusula 74.ª, prémio TIR, alimentação, trabalho complementar e diuturnidades, o total de € 81.166,35, pelo que, dada a nulidade do acordo celebrado entre as partes, liquida a diferença a receber da Ré em € 28.386,35.

Termina, requerendo a notificação da Ré para deduzir oposição, querendo, seguindo-se os demais termos da lei, designadamente os previstos no artigo 360.º do CPC.

* A Ré deduziu oposição alegando, em síntese, que: Uma vez que o A. não consegue provar que despendeu o montante que alega em alimentação, a Ré deve ser absolvida do pedido; o A. não realizou trabalho suplementar e, por isso, a Ré deve ser absolvida do pagamento de qualquer quantia a este título.

Termina, requerendo que se considere procedente a presente oposição e, em conformidade, a Ré seja absolvida do pagamento de qualquer quantia ao A., confirmando a decisão da 1ª instância, “declarando que o regime remuneratório acordado entre as partes era, afinal, mais favorável para o trabalhador.” * Foi proferido o despacho saneador de fls. 44 e segs., fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

* Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.

* De seguida, foi proferida sentença que foi objeto de recurso decidido por acórdão deste tribunal constante de fls. 107 e segs. e que anulou a decisão recorrida a fim de o tribunal de 1ª instância proferir uma nova decisão nos termos enunciados.

* Foi, então, proferida a sentença de fls. 125 e segs., cujo dispositivo tem o seguinte teor: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado, o presente incidente de liquidação e, em consequência: - é nulo o sistema remuneratório acordado entre o A. e a R. em substituição do previsto no CCTV; - liquido em € 15.000,00 (quinze mil Euros) o montante devido ao A. a título de prestações retributivas fixadas no CCTV (cláusula 74.ª, n.º 7, prémio TIR, alimentação, trabalho suplementar, diuturnidades).

” * A Ré, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: “1. O Venerando Tribunal da Relação de Coimbra havia decidido … “– Declarar nulo o sistema remuneratório acordado entre as partes em substituição do previsto no CCTV se aquele sistema se revelar menos favorável ao autor em comparação com este, caso que, deverão ser restituídas todas as quantias pagas e recebidas na execução desse acordo, relegando-se para liquidação de sentença a quantificação do pago e recebido com vista ao apuramento da favorabilidade ou não favorabilidade desse acordo remuneratório.

” (sublinhado e negrito nossos) 2. Mais afirmou o douto acórdão que, no cálculo a efectuar, “deve atender-se… (IV) ao pagamento das refeições à factura, quando deslocados no estrangeiro, nos termos da cláusula 47ª-A” e ao acréscimo da remuneração em 200% aquando da prestação de trabalho em dias feriados ou dias de descanso semanal ou complementar… bem como ao descanso compensatório… . (sublinhado e negrito nossos).

  1. A douta sentença que decidiu o incidente de liquidação contém diversos pontos incorrectamente julgados o que se traduz na nulidade da sentença que urge corrigir 4. O douto tribunal não teve em consideração toda a matéria de facto alegada na oposição ao incidente por parte da ora Recorrente.

  2. A sentença não poderia referir que “não há factos não provados”.

  3. A ser assim (não há factos não provados), então os factos alegados pela R. teriam de ser dados como provados no ponto 2.1 da fundamentação da sentença.

  4. A sentença é nula quando refere que “não há factos não provados”.

  5. As questões acima referidas foram submetidas pela ora Recorrente para apreciação do tribunal nos termos do art.608º/2 do CPC.

  6. De acordo com o art.615º/1/d) do Código de Processo Civil (CPC), é nula a sentença quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar».

  7. Tendo em consideração que, do ponto de vista da Recorrente existe omissão de sentença, neste ponto, a mesma é, no mínimo obscura, o que desde já se alega.

  8. Nos autos principais ficou dado como provado que o trabalhador trabalhava de segunda à sexta-feira.

  9. A douta sentença do incidente de liquidação refere na sua fundamentação que “parece também adequado considerar-se 3 dias por mês de trabalho em Sábados, Domingos e feriados”.

  10. A sentença é igualmente nula porque contém uma contradição na matéria de facto dada como provada nos autos e nesta sentença do incidente de liquidação.

  11. Salvo o devido respeito, que é muito, a sentença é nula nos termos do disposto no art.615º/1/c) do CPC uma vez que a sua fundamentação está em oposição com a matéria que já havia sido decidida e dada como provada nos autos.

  12. Urge declarar a presente nulidade, o que desde já se alega para os devidos efeitos legais.

  13. A douta sentença contém ainda um vício intransponível.

  14. A douta sentença ora proferida no incidente de liquidação não respeitou a decisão superior do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra.

  15. Este colendo tribunal ordenou no seu acórdão o pagamento da alimentação do Autor mediante a apresentação das respectivas facturas comprovativas dessas despesas, uma vez que o A. fazia percursos internacionais a Espanha no trabalho realizado para a R. (ora Recorrente).

  16. Não foram apresentadas quaisquer facturas pelo trabalhador no incidente de liquidação.

  17. O douto tribunal a quo, apesar da total ausência de prova sobre esta matéria por parte do trabalhador entendeu declarar que este tinha um gasto médio de 25,00€/dia de alimentação.

  18. A sentença não respeitou, do ponto de vista da Recorrente, a decisão superior anterior que ordenava a que, na análise acerca da maior favorabilidade do regime em vigor na empresa, fossem tidas em contas as refeições à factura.

  19. Uma vez que não foi respeitada a decisão anterior do Venerando TRC, terá de ser esta instância superior a repor a sua própria decisão já transitada nos autos e em consequência anular a sentença e manter a decisão inicial da primeira instância, no sentido de reconhecer que o sistema remuneratório em vigor na empresa era, de facto, mais favorável para o trabalhador.

  20. O julgamento com recurso à equidade não obedece, nos presentes autos, ao principio da Justiça.

  21. Da prova testemunhal resulta que o custo das refeições em Espanha, na altura, eram 2,50€ a 3,00€ por pequeno-almoço e cerca de 10,00€ a 11,00€ por menu completo de almoço, ou seja, cerca de 14,00€/dia (3,00€ pequeno-almoço + 11,00€ almoço) 25.A maior parte do trabalho desenvolvido pelo trabalhador foi em Portugal e apenas ocasionalmente em Espanha.

  22. Os eventuais montantes a pagar por refeições do trabalhador no estrangeiro são uma fracção daquele referido na sentença condenatória.

  23. Fica demonstrado, uma vez mais, que o sistema remuneratório em vigor na empresa era, de facto, mais favorável para o trabalhador.

  24. Mas se assim não for entendido, o montante condenatório referido na sentença do douto tribunal a quo, deverá ser reduzido consideravelmente.

  25. A douta sentença não explica que cálculos realizou para condenar a R. no montante de 15.000,00€.

  26. A decisão agora em crise padece de falta de fundamentação, pois a mesma não demonstra o raciocínio que o julgador elaborou para considerar que o sistema remuneratório em vigor na empresa não era mais favorável para o trabalhador.

  27. Esta falta de fundamentação, tem como consequência a nulidade da sentença, nos termos do disposto no art.615º/1/b) do CPC, uma vez que a mesma não especifica os fundamentos de facto que levaram à decisão final.

Pelo exposto, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser declarada a obscuridade e a nulidade da sentença proferida em sede de incidente de liquidação e em consequência ser confirmado que o regime remuneratório acordado entre as partes era, afinal, mais favorável para o trabalhador, com a total absolvição da ora recorrente.

Subsidiariamente e sem prescindir, deverá ser consideravelmente reduzido o montante condenatório com recurso à critérios de equidade.” * O Autor não apresentou resposta a este recurso.

* O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 157, no sentido de que “deve ser anulada a sentença a fim de que seja suprido o vício de falta de fundamentação acima referido”.

* Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* II – Questões a decidir: Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do C.P.C.), com exceção das questões de conhecimento oficioso.

Assim sendo, são as seguintes as questões que cumpre apreciar: 1ª – Se a sentença recorrida é nula por conter factos incorretamente julgados.

  1. – Se a sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia quando refere que “não há factos não provados”.

  2. – Se a sentença recorrida é nula porque a sua fundamentação está em oposição com a matéria que já havia sido decidida e dada como provada nos autos.

  3. – Se a sentença recorrida é nula por falta de fundamentação 5ª – Se a sentença recorrida não respeitou o acórdão deste tribunal da Relação, devendo declarar-se que o sistema remuneratório em vigor na empresa era mais favorável para o trabalhador. 6ª – Se o montante em que que a Ré foi condenada deve ser consideravelmente reduzido.

    III – Fundamentação a) - Factos provados constantes da sentença recorrida: 1.

    Por acórdão proferido, nos autos principais, em 23/2/2017, pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, foi decidido: «a) Declarar nulo o sistema remuneratório acordado entre as partes em substituição do previsto no CCTV se aquele sistema se revelar menos favorável ao autor em comparação com este, caso em que, deverão...

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