Acórdão nº 383/08.4BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJORGE CORTÊS
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão Não se conformando com o Acórdão proferido por este TCAS, em 10/02/2022, que negou provimento ao recurso interposto contra a Sentença proferida pelo MMº Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa de 28 de outubro de 2016 que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra o indeferimento tácito do recurso hierárquico interposto do indeferimento da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios do exercício de 1994, F……………..(Estates) Limited deduz incidente de nulidade de Acórdão.

No requerimento de arguição de nulidade, formula as conclusões seguintes: A) Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas, visando, pois, o escrutínio da decisão recorrida na estrita medida das críticas que a estas foram feitas e condensadas nas conclusões do recorrente.

B) O objeto do Recurso conforme delimitado pelas conclusões da recorrente achava-se circunscrito a dois invocados erros de julgamento, passíveis de se reconduzir às seguintes questões: (a) o desfasamento temporal detetado entre o início da disponibilização do empreendimento turístico por parte da recorrente e o pagamento da primeira renda por parte da F ………………. Limited pode impedir o direito à dedução como entendeu o M.mo Juiz a quo? (b) as invalidades contratuais detetadas podem impedir o direito à dedução como entendeu o M.mo Juiz a quo? C) Compulsado o Acórdão de 10.02.2022, verifica-se porém que o âmbito e objeto do recurso se deslocou das questões da relevância ou irrelevância do desfasamento temporal entre o início da disponibilização do empreendimento e o pagamento das rendas e a da relevância ou irrelevância das invalidades contratuais, para as longínquas paragens do regime do IVA nas operações intra- grupo - matéria nunca antes suscitada por nenhum sujeito processual.

D) O TCA levantou o véu da personalidade jurídica (e tributária) autónoma das duas pessoas coletivas em causa - a F ………………… Limited, a recorrente, uma sociedade com sede em Malta, e a F …………………… Limited, uma sociedade com sede na Grã-Bretanha - e determinou a amplitude da capacidade de dedução da recorrente com base no conjunto de operações que apelidou de operações “fora do grupo.” E) Com isso, o TCA manteve o ato impugnado com base num fundamento novo, inédito, que não integrou quer a fundamentação contextual integrante do próprio ato impugnado, quer o julgamento em primeira instância ou mesmo a posição da Fazenda Pública em juízo, quer finalmente as questões suscitadas pela recorrente e balizadas nas conclusões da sua alegação.

F) Com isso, o TCA operou uma verdadeira revolução no sistema comum do IVA, posto que, de forma clara e unívoca, o Tribunal de Justiça já esclareceu que uma sociedade dominada (mesmo a 100%) é uma pessoa coletiva tributada de forma autónoma em IVA relativamente à sociedade sua dominante, sendo que pessoas juridicamente independentes só podem considerar-se como um único sujeito passivo mediante constituição de um Grupo de IVA nos termos do artigo 11.° da Diretiva IVA ou então em casos por natureza excecionais de prática fraudulenta ou abusiva objetivamente indiciada.

G) A fazer jurisprudência, a posição do Acórdão de 10.02.2022 ditaria o fim do IVA entre sociedades em relação de domínio ou de grupo, ao arrepio da Diretiva IVA (nomeadamente do regime dos Grupos de IVA previsto no seu artigo 11.°) e da doutrina consolidada no seio do TJUE há largas décadas.

H) Verifica-se assim nulidade por excesso de pronúncia dado que o TCA se ocupou de uma questão que não integrou o objeto do processo e as questões concretas que lhe foram submetidas pelas partes, mormente as suscitadas pela recorrente em sede recursiva e identificadas nas conclusões do seu recurso.

I) E mesmo que assim se não entendesse, no que não se concede, sempre haveria, no mínimo, uma decisão-surpresa, proferida com violação do princípio do contraditório, o que igualmente determina a nulidade da decisão.

J) Acresce que o Acórdão de 10.02.2022 negou provimento ao recurso inferindo que a recorrente se dedica à venda de timeshare, ao mesmo tempo que manteve como suas premissas, nomeadamente, que as rendas pagas pela F…………..LIMITED foram o único rendimento da recorrente (alínea CE) do probatório), não se tendo provado que a recorrente tenho procedido à venda de títulos de habitação periódica (alínea CI) do probatório).

K) A conclusão que o TCA alcançou - de que “não existe no caso qualquer direito à dedução” porquanto o que corresponde à realidade dos autos é que a recorrente se dedica à venda de títulos de direito de habitação periódica - é claramente a oposta à que logicamente se deveria ter extraído das respetivas premissas, ocorrendo pois a nulidade por prevista na alínea c) do n° 1 do artigo 615.° do CPC (ex vi 666.°) e no n° 1 do artigo 125°. do CPPT.

L) Finalmente, o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, na sua redação atual, seria manifestamente desproporcionado, conforme assim expressamente reconheceu a primeira instância nestes autos, devendo pois a decisão ser reformada no que às custas diz respeito, dispensando-se as partes do remanescente da taxa de justiça e aplicando-se o limite máximo de tributação do processo previsto no RCP, na sua redação em vigor à data em que o mesmo deu entrada (22 de Fevereiro de 2008).

M) Em suma, verifica-se no Acórdão de 10.02.2022: a) Excesso de pronúncia, quanto à questão da tributação dentro e fora de Grupo nunca antes suscitada; b) Oposição dos fundamentos com a decisão, quanto à imputação da venda de timeshare à recorrente, impeditiva do seu direito à dedução, incompatível com todas as premissas antecedentes.» Termina, pedindo que «sejam as sobreditas nulidades reconhecidas e declaradas, sendo assim proferida nova decisão, se a tal nada mais obstar, suprida das concretas irregularidades identificadas em conformidade com o exposto, com as inerentes consequências».

*A contraparte não emitiu pronúncia.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

2.1. Enquadramento 2.2. A arguente invoca contra o Acórdão sob escrutínio os vícios seguintes: i) Nulidade por excesso de pronúncia, dado que o tribunal conheceu de questão de que não lhe cabia conhecer.

ii) Nulidade por preterição do principio do contraditório, dado que o tribunal proferiu decisão com base em argumentação desconhecida dos autos.

iii) Nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, dado que a decisão do tribunal assentou na premissa de que a impugnante se dedica à venda de time sharing o que contraria a matéria de facto assente.

2.2.1. No que respeita ao fundamento do incidente referido em i), cumpre referir que é nulo o Acórdão que conheça de questão de que não cumpre conhecer (artigo 615.º/1/d) ex vi artigo 666.º/1, do CPC).

Apreciação. A sentença julgou improcedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios relativos ao exercício de 1994. Não vislumbrou, no caso, qualquer operação tributável em IVA. Como aí se consigna, «[a] cedência gratuita da exploração e utilização turística de aldeamento por parte da promitente-arrendatária dos membros do seu clube, encontra-se excluída do âmbito de incidência real do IVA, nos termos do artigo 1.º do respectivo Código». A liquidação adicional em apreço tem, assim, arrimo no incorrecto enquadramento fiscal declarado pela impugnante, dado que a mesma não é sujeito passivo de IVA e não pratica operações tributáveis, pelo que não lhe assiste o direito à dedução do imposto, eventualmente, suportado».

A recorrente colocou sob censura o veredicto que fez vencimento na instância. Invocando que recebeu rendas relativas a um contrato de arrendamento, correspondente ao aldeamento turístico F ………………….., pelo que exerceu uma actividade tributável, geradora do direito à dedução do imposto suportado com a construção do mesmo.

A decisão vertida no aresto em crise assentou na refutação da argumentação da recorrente, retomando a fundamentação do acto tributário, o qual, segundo o entendimento que fez vencimento, não enferma de qualquer erro nos pressupostos de facto ou de direito.

Como se refere no aresto sob escrutínio, «Está em causa a liquidação adicional de IVA de 1994, cuja fundamentação é que consta das alíneas AI) a BA), do probatório. A questão que se suscita nos autos reside em saber se a impugnante, pelo facto de ser proprietária de um aldeamento turístico no Algarve, tendo alegadamente, suportado IVA, na sua construção, e tendo, alegadamente, dado o mesmo de arrendamento a outra empresa, com vista à sua exploração, através da venda de direitos obrigacionais de habitação periódica, é sujeito passivo de IVA e como tal, na medida em que pratica operações sujeitas a tributação, tem direito à dedução do IVA suportado na referida construção. // A fundamentação do acto sob escrutínio é a que consta das alíneas AI) a AS), do probatório. // As empresas envolvidas, seja na construção do aldeamento turístico, seja na sua exploração económica pertencem ao mesmo grupo económico, havendo entre elas relações especiais, reportando à empresa-mãe (alíneas A) a K), do probatório). No âmbito das relações intra-grupo, convencionaram realizar a exploração de aldeamentos turístico no Algarve, mediante a venda de direitos de habitação periódica (alíneas R) a AA), do probatório). // Trata-se, pois, de entidades integrantes do mesmo grupo económico, cujo núcleo de actividade é a venda de direitos de habitação periódica em apartamentos situados em aldeamentos turísticos no Algarve, como resulta dos elementos seguintes: i) A F …………… Limited faz parte de uma operação habitação periódica e é detida por um trustee constituído pela F ………………Limited (FNTC) que é subsidiária de uma companhia chamada I……….. Goup Plc que está registado em Dublin e em Londres (alínea A).

ii) A FNTC é a unidade de negócios de timesharing que detém a F……………………...

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