Acórdão nº 6208/09.6TBBRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução07 de Julho de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e BB, que por terem falecido na pendência da acção foram substituídos pelos sucessores habilitados CC e DD intentaram contra EE e FF, funcionários bancários, e Caixa Geral de Depósitos, acção declarativa, sob a forma ordinária (ainda à luz do Código Processo Civil de 1961), pedindo a condenação solidária dos réus a restituir-lhes a importância de 4.735.000,00€ (quatro milhões setecentos e trinta e cinco mil euros) ou, se assim não se entender, a indemnizá-las no mesmo montante, com juros vencidos e vincendos até integral pagamento.

Para tanto, alegaram, em síntese, que: A autora AA é viúva de GG, falecido em .../.../2004, e a Autora BB é filha do ex-casal composto pela autora AA e pelo falecido GG, sendo ambas as únicas e universais herdeiras deste; O primeiro réu EE foi nomeado, no princípio do ano de 2003, subgerente da ré CGD, tendo convencido o GG e a primeira autora AA a transferir para aquela instituição de crédito o montante de 5.365.586,37€ (cinco milhões trezentos e sessenta e cinco mil quinhentos e oitenta e seis euros e trinta e sete cêntimos), que ficou, em 12/09/2003, depositado na conta com o nº ...00; A partir de agosto de 2003, o réu EE iniciou um relacionamento de proximidade com o GG e, estando este já incapacitado desde 02/09/2003, fazendo uso do seu estatuto profissional de subgerente, convenceu as autoras a fazer aplicações de 5.000.000,00€ (cinco milhões de euros) em cinco apólices da Companhia de Seguros ..., onde seriam mais rentáveis; De todas as verbas postas à disposição do primeiro réu marido, e respectivos juros, as autoras, especialmente a segunda, apenas têm conhecimento da existência de 2 (dois) depósitos bancários em seu nome, um na CGD em ..., no valor de 40.000,00€ (quarenta mil euros), e outro no ... em ..., no valor de 360.000,00€ (trezentos e sessenta mil euros); As autoras desconhecem como é que os primeiros réus fizeram a administração dos depósitos em dinheiro que lhes foram confiados, certo sendo que o primeiro réu ia transferindo esses depósitos para os balcões da CGD nos locais onde prestava serviço, designadamente em ..., ... e ...; A ré CGD tem conhecimento do destino que foi dado aos falados depósitos; A primeira autora, detentora de três quartos do património do casal, tem 94 (noventa e quatro) anos de idade e sempre aceitou que fosse a segunda autora, sua filha única, a contactar com os réus sobre estes factos; Do montante que foi depositado na CGD, as autoras, para além de despesas de pouco significado, gastaram apenas a quantia de 600.000,00€ (seiscentos mil euros), na compra de um andar na Avenida ..., ..., de um apartamento na cidade ... e de um veículo automóvel; Os primeiros réus têm em seu poder cerca de 4.735.000,00€ (quatro milhões setecentos e trinta e cinco mil euros), que integraram no seu património, desconhecendo o destino que lhe foi dado; Os primeiros réus ostentam uma vida faustosa, denunciando um súbito enriquecimento, sendo os principais responsáveis pela descrita situação das autoras; A CGD é solidariamente responsável pela indemnização reclamada, por responder civilmente pelos actos e omissões dos seus representantes, já que o primeiro réu actuou na qualidade de subgerente, no exercício das funções que lhe estavam atribuídas.

Contestaram os réus, sustentando a improcedência da acção.

A ré CGD (além de excepções dilatórias, já decididas) alegou, em resumo: Desconhecer a matéria relativa à situação económica das autoras e as circunstâncias em que foi efectuada a transferência de valores para si (CGD), confirmando que, em 15/09/2003, foi creditada, na conta com o n.º ...00, a quantia de 5.355.000,00€; Ter sido feita (isso admitindo) a subscrição pela segunda autora de cinco contratos de seguro de capitalização Caixa Seguro Rendimento – Série A (...), em 15/09/2003, por débito da conta ...00, titulada pelas autoras, que deu origem a cinco apólices, cada uma de 1.000.000,00€ (um milhão de euros); Terem existido (nisso assentindo) autorizações sem restrições ao 1º réu EE relativamente às contas com os nºs ...00, ...00, 0171.93..., ...66, ...61 e ...65; Que a prestação de autorização à movimentação das contas, por parte das autoras, nada teve a ver com as competências do funcionário bancário primeiro réu, pois que não constitui um serviço que o Banco preste ou tenha de prestar para o cumprimento das obrigações que lhes advêm para com os clientes; ao invés, o facto das autoras terem autorizado o réu a movimentarem sem restrições as contas que titulavam na CGD deveu-se à relação de amizade e à confiança que nele depositavam, transcendendo o que é normal e expectável no normal relacionamento entre um funcionário bancário e um cliente; Não lhe estar (CGD) confiada a administração dos depósitos efectuados, apenas estando incumbida de guardar o dinheiro que lhe foi depositado e de cumprir as ordens de saque, de levantamento e de transferência que lhe foram dirigidas pelos titulares das contas ou autorizados, o que fez relativamente às tituladas pelas autoras (juntando listagem das movimentações sobre elas efectuadas, no período em questão); Não aceitar que as autoras não pudessem aceder às contas, até porque, independentemente de as cadernetas estarem em poder do réu (o que impugnou por desconhecimento), dispunham de cartões multibanco e tinham aderido ao serviço Caixa Direta On Line, o que facultava esse acesso, acrescentando que da doença bipolar não resulta, de forma obrigatória, a diminuição das capacidades cognitivas e o normal discernimento de um homem médio.

Os primeiros réus, além de arguirem a excepção dilatória já decidida, sustentaram, em síntese, Nunca ter o primeiro réu gerido, administrado ou disposto dos depósitos efectuados pelas autoras na CGD, argumentando antes que apenas deu conselho sobre novos produtos ou aplicações financeiras; Que o produto apólices de seguro foi apresentado pelo primeiro réu ao falecido GG, na presença das autoras, tendo todos entendido e decidido realizar a aplicação; Que, após a morte do marido e pai da primeira e segunda autoras, respectivamente, passaram a ser estas a fazer a movimentação das contas de que aquele havia sido titular; Que as autorizações ao primeiro réu foram prestadas na sequência de inúmeros pedidos e insistências nesse sentido, que a ele foram dirigidas, verbalmente e por escrito; Que não obstante essas autorizações, nunca efectuou qualquer movimento nas contas das autoras, sendo ao invés a segunda autora quem movimentava as contas, por meio de cheques, caderneta e cartão multibanco, ascendendo os levantamentos que fazia a valores muitíssimo elevados, o que a levou a dirigir uma carta ao primeiro réu a justificar esse procedimento; Que além dessa carta, a segunda autora exibiu ao primeiro réu um relatório de avaliação intelectual, datado de 18/07/2006, de acordo com o qual os quocientes intelectual verbal, intelectual de realização e intelectual situavam-se na classe muito superior, refutando ainda os primeiros réus que soubessem que a segunda autora padecia de doença bipolar e que tenha sido esse o motivo da sua reforma antecipada; Que não actuaram, no tratamento concedido às autoras, com a intenção de se apropriarem de quaisquer valores, sustentando, pelo contrário, que os convites e a deferência dispensada àquelas era recíproca, tendo a 2ªautora outorgado procuração ao primeiro réu conferindo-lhe poderes para reger e gerir todos os seus bens e direitos, incluindo o de vender, trocar ou hipotecar os seus bens, o que aquele jamais utilizou; Que foram as autoras as beneficiárias dos movimentos subsequentes aos resgates das apólices; Que a 2ª autora declarou, em 10/10/2008, perante Notário, para todos os efeitos legais, que ‘todos os movimentos efectuados nas suas contas bancárias à ordem, a prazo ou sob qualquer outra forma, quer a débito, quer a crédito, bem como todos os movimentos de subscrição e resgate de títulos ou de participações em fundos de investimento, ordens de compra e venda de títulos mobiliários onde, expressamente, se incluem acções, obrigações, futuros e opções, efectuadas pelo Senhor EE, (…), o foram sempre no cumprimento de ordens expressas da signatária’, mais declarando aí ‘que, muito embora obtenha e tenha em consideração o conselho e a opinião do referido senhor EE, sempre tomou e toma livremente as decisões de investimento e desinvestimento do seu património, nos termos e condições que considera mais convenientes’; Que a 2ª autora ofereceu a cada um dos réus (ao 1º réu, no natal de 2005 e à 1ªprimeira ré, no aniversário de 2007) um veículo de alta gama, assim como, a ambos, um quadro da autoria de ....

Houve réplica.

As Autoras apresentaram as autoras articulado superveniente alegando, em súmula: - ter sido subscrito, com data de 24/09/2004, pelo punho da segunda autora BB, o cheque n.º ...43, no montante de 555.000,00€ sacado sobre a conta D/O na Ré CGD n.º ...90; - tendo tal cheque sido sacado a favor dela própria, foi o mesmo depositado, juntamente com outros valores (cheques nos valores de 62.600,00€ – sessenta e dois mil e seiscentos euros – e de 75.000,00€ – setenta e cinco mil euros), na conta n.º ...07 do banco ..., balcão de ..., da qual são titulares a segunda autora BB e o primeiro réu marido, somando esses valores um total de 692.600,00€ (seiscentos e noventa e dois mil e seiscentos euros); - que a 24/09/2004 foi levantada dessa conta do ... a importância de 62.600,00€; - que a abertura da conta e o levantamento desta quantia foram feitos pelo primeiro réu marido; - que a 30/09/2004 foi feita a transferência dos ...00, ...0€ restantes, ordenada pelo primeiro réu marido, para a conta n.º ...90, do ... (...), da qual ele é o único titular; - que a morada constante da proposta de abertura da conta nº ...07 do ... é a da residência dos primeiros réus, assim como o contacto indicado corresponde ao telemóvel do primeiro réu (...74); - que o domicílio dessa conta corresponde ao do endereço do balcão da...

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