Acórdão nº 00482/17.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . O MINISTÉRIO da SAÚDE, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 24 de Abril de 2020, que julgando procedente a acção administrativa, instaurada pelo A./Recorrido AA..., médico especialista de medicina interna, assistente graduado e residente na Rua (…), decidiu anular o despacho de 21/11/2016 da Sr.ª Secretária Geral do Ministério da Saúde e, em consequência, manter na ordem jurídica a deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Porto, de 9/3/2016, com as legais consequências.

* Nas suas alegações, o recorrente Ministério da Saúde formulou as seguintes conclusões:

a) O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida nos autos que anulou o despacho da Senhora Secretária-Geral de 21.11.2016 que, por sua vez, anulou a deliberação Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Porto, E.P.E., de 9.03.2016.

b) Esta deliberação homologou a lista de classificação final do procedimento concursal para a categoria de Assistente Graduado Sénior de Medicina Interna do respetivo mapa de pessoal, aberto pelo Aviso n.º 11987/2015, publicado no D.R., 2.ª Série, de 19.10.2015.

c) A deliberação homologatória foi anulada porque foi entendido que procediam vícios invocados em sede de recurso administrativo interposto por BB..., opositor ao concurso em apreço.

d) Um dos vícios apontados à deliberação homologatória resulta de o aviso de abertura violar as normas em vigor, por indicar, no ponto 13, a composição do júri com cinco membros quando, à data da publicação do aviso de abertura, já vigorava e era aplicável ao concurso, a nova redação da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, que prevê a composição do júri com três membros.

e) A deliberação do Conselho de Administração de 13.05.2015, que autorizou a abertura do concurso sub judice ocorreu na vigência do texto inicial da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, cujo artigo 7.º, n.º 1, determinava que o júri era composto por um presidente e por quatro vogais efetivos.

f) Porém, à data da publicação do aviso de abertura, em 19 de outubro de 2015, já vigorava a portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, que deu nova redação à portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, cujo artigo 7.º, n.º 1, determina que o júri é composto por 3 membros: um presidente e dois vogais efetivos.

g) A nova redação da portaria aplica-se ao concurso em apreço, cujo aviso de abertura ainda não tinha sido publicado à data da sua entrada em vigor.

h) Na verdade, em 4 de agosto entrou em vigor a portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, que determina, no artigo 5.º, que a nova redação é aplicável aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor.

i) Aliás, a portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, também determina, no artigo 31.º, que se aplica “aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor.” j) Constata-se e sublinha-se a determinação textual de que a nova redação da portaria se aplica aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor.

k) Acresce que, a portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, consagra no Capítulo III, “Disposições finais e transitórias”, e estipula no artigo 31.º, com a epígrafe “Aplicação no tempo” que se aplica “aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor.” l) Acontece que, à data da publicação do aviso de abertura, em 19 de outubro de 2015, já vigorava a portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, cujo artigo 7.º, n.º 1 determina que “O júri é composto por um presidente, por dois vogais efetivos e por dois suplentes.” m) Portanto, a redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, entrou em vigor em 4 de agosto, e aplica-se ao concurso em apreço, cujo aviso de abertura ainda não tinha sido publicado.

n) Quando o legislador afirma que a redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, à portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, se aplica “aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor”, pondo a tónica no momento-fronteira da publicitação do concurso, só pode significar que já se aplica à publicitação do concurso, isto é, ao aviso de abertura.

o) A interpretação da lei é feita de acordo com o artigo 9.º do Código Civil, nos termos do qual o intérprete não deve cingir-se à letra da lei, mas não pode considerar o intérprete o pensamento legislativo que não tenha um mínimo de correspondência verbal, devendo o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.

p) Em matéria de vigência e interpretação das leis, Baptista Machado entende que “o princípio da não retroatividade não tem atualmente (...) assento na Constituição e, daí, que o artigo 12.º (CC) se imponha ao juiz mas não ao legislador.” q) Nesta matéria, Vaz Serra é muito elucidativo e afirma que “A regra suprema em matéria de aplicação das leis no tempo é a da interpretação da lei em questão, visto que, não tendo natureza constitucional o princípio da não retroatividade das leis, depende da interpretação de cada uma delas a determinação da sua eficácia temporal.” r) O legislador optou por fixar uma “Disposição transitória” sobre “Aplicação no tempo” na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de Agosto, ao artigo 31.º que determina que se aplica “aos procedimentos concursais que sejam publicitados após a data da sua entrada em vigor”, e coloca a fronteira no momento da publicitação do concurso através do aviso de abertura.

s) E escolhe esse momento por ser aquele em que é dado a conhecer o concurso, em que passa a ser público e para que o aviso de abertura seja elaborado de acordo com as normas que vão ser aplicadas ao longo de todo o procedimento concursal.

t) Pretende o legislador que as mesmas normas sejam aplicadas a todo o procedimento concursal, desde a publicação do aviso de abertura, inclusive, e até final.

u) Neste sentido, o Acórdão do STA, de6.03.2008, Processo n.º 0560/07 refere que “Não obstante (... o princípio da não retroatividade), por vezes os problemas da sucessão das leis no tempo suscitados pela entrada em vigor de uma lei nova, podem, pelo menos em parte, ser diretamente resolvidos por esta mesma lei, mediante disposições para o efeito formuladas, denominadas disposições transitórias.” v) Sendo a redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de Agosto, de aplicação imediata, a partir do dia seguinte, aplica-se a todos os atos do procedimento concursal a partir dessa data, incluindo ao aviso de abertura que foi publicado após a data de entrada em vigor da portaria.

w) Logo, do aviso de abertura devia constar um júri com 3 elementos e não com 5, em cumprimento do disposto no artigo 7.º, n.º 1, da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto.

x) Razão pela qual o aviso de abertura do concurso viola o artigo 5.º da portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto, e os artigos 7.º, n.º 1 e 31.º da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto.

y) E não se esgrima, em defesa da tese contrária, com o texto do artigo 163.º, n.º 5, alíneas b) e c), do CPA/2015, pois o regime da anulabilidade não é aplicável ao caso presente! z) Contrariamente ao afirmado pelo A. da ação (no artigo 45.º da PI), não houve violação do citado artigo 164, n.º 5, do CPA, que, aliás, faz a ressalva “Desde que não tenha havido alteração ao regime legal (...).” Todavia, neste caso existiu alteração do regime legal.

a

a) Foi entendido, em sede de recurso administrativo, que procedia também um outro vício assacado ao procedimento concursal, que inquinou a deliberação homologatória, por o júri nomeado ter alegadamente reunido pela 1.ª vez em 30.06.2015, para deliberar sobre a “fixação dos parâmetros de avaliação, a sua ponderação e a grelha classificativa e o sistema de valoração final de cada método de seleção”, sem terem estado presentes todos os membros efetivos do júri.

bb) Na ata n.º 1 consta que no dia 30 de junho de 2015, no Centro Hospitalar do Porto, reuniu o júri e que estiveram presentes o presidente e os quatro vogais efetivos, mas tal não corresponde à verdade.

cc) Consta da ata n.º 2 que no dia 7 de janeiro de 2016, pelas 18 horas no, Serviço UIC do Centro Hospitalar do Porto, reuniu o júri do concurso em apreço e que estiveram presentes o presidente e os quatro vogais efetivos, tendo a reunião como ponto da ordem de trabalhos “ratificar” as deliberações da reunião anterior constantes da ata n.º 1, considerando que “esta ratificação se mostra necessária dada a circunstância de a ata n.º 1 documentar e se reportar a uma reunião que não contou com a presença física, no mesmo espaço, de todos os membros do júri (...)”. Sic.

dd) Verifica-se, assim, que em 30.06.2015, os membros do júri não estiveram todos presentes nessa 1.ª reunião, para ali deliberar e votar conforme determina o artigo 9.º, n.º 1, da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, quer na redação anterior, quer na redação dada pela portaria n.º 229-A/2015, de 3 de agosto.

ee) A relevância resulta do facto de o artigo 9.º, n.º 1, da portaria n.º 207/2011, de 24 de maio, determinar, sobre o funcionamento do júri, que o “júri delibera com a participação efetiva e presencial de todos os seus membros, devendo as respetivas deliberações ser tomadas por maioria e sempre por votação nominal.” ff) Donde, as deliberações que constam da 1.ª ata não são válidas, são nulas, pois resultam de uma “reunião que não ocorreu”, uma “reunião” com preterição de formalidades, em violação da lei, declarando a ata que todos...

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