Acórdão nº 00435/18.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução27 de Maio de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . MM..., residente na Rua (…), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Mirandela, de 27 de Dezembro de 2021, que, julgando improcedente a acção administrativa, absolveu do pedido a "AUTO - ESTRADAS (...), SA" e "OP---, SA", ambas com sede no Lugar (…), pedido esse que consistia no seguinte: "a) Seja declarado que as Entidades Demandadas, com a sua conduta, constituíram-se solidariamente na obrigação de indemnizar o Autor pelos danos sofridos com o acidente na petição inicial, nos termos dos artigos 483º, 487º, 562º e 566º do Código Civil (CC), em sede patrimonial – artigo 494º do CC e artigo 12º, nº 1, al. b) da Lei nº 27/2007, de 18.07; b) Caso assim se não entenda, seja declarado que as Entidades Demandadas são solidariamente responsáveis pela indemnização dos danos causados ao Autor ao abrigo da responsabilidade pelo risco decorrente do disposto no artigo 500º do CC; c) Por qualquer uma das vias supra invocadas em a) e b), serem as Entidades Demandadas condenadas solidariamente a pagar ao Autor: i) A quantia de 4.866,68€, a título de peças, material e mão de obra já despendidos com a reparação do veículo sinistrado, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento; ii) A quantia de 1.090,49€, a título de despesas com peças, material e mão de obra, que o Autor irá ainda despender, com a reparação do mesmo veículo, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento; iii) A quantia de 1.040,00€, a título de privação de uso do referido veículo, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento; iv) A quantia de 68,00€, a título de despesas com a cobrança deste seu crédito sobre as Entidades Demandadas, desde logo com o pedido do auto de participação de acidente nos serviços da GNR, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento; e v) A quantia de 500,00€, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento".

* 2 .

No final das suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "1.ª O recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto se considera que ocorreu incorreto julgamento da matéria de facto, assim como fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  1. O tribunal recorrido errou notoriamente quanto ao julgamento da matéria de facto, pois, de facto, atentos os circunstancialismos do caso, e a prova testemunhal, por declarações, e documental que foi feita, é de concluir que foi reproduzida prova suficiente, congruente e com razão de ciência no sentido de: i) Dar como provado o ponto de facto referenciado na matéria de facto dada como não provada na Sentença recorrida a letra A.; ii) Dar como provado o ponto de facto referenciado na matéria de facto dada como não provada na Sentença recorrida a letra B., e com a formulação que se sugere “Os contactos do A. junto da oficina para as reparações do veículo iniciaram-se a 29 de Agosto de 2018, sendo certo que todas as reparações do veículo foram faturadas a 2018-10-29”.

  2. Os meios de prova que impunham decisão diversa da recorrida são precisamente: i) a prova por declarações; ii) a prova por testemunhas; iii) a prova documental; e que infra se especifica.

  3. Assim, os meios de prova que impunham decisão diversa da recorrida são precisamente: - As declarações de parte do A.

    MM...

    , referenciadas para dar como provados os factos das alíneas a) e b), da matéria de facto provada, referenciados na Sentença como não provados, declarações prestadas em 05/07/2021, registadas na gravação da audiência, anexa ao SITAF, minutos [00:03:30 a 00:35:00]; - O depoimento de CR...

    para efeitos de prova do facto da alínea a), da matéria de facto provada, referenciados na Sentença como não provados, depoimento prestado em 05/07/2021, e cujas declarações desta testemunha encontram-se registadas na gravação da audiência, anexa ao SITAF, minutos [00:48:05 a 00:53:25]; - O depoimento de EM..., para efeitos de prova dos factos das alíneas a) e b), da matéria de facto provada, referenciados na Sentença como não provados, declarações prestadas em 14/07/2021, registadas na gravação da audiência, anexa ao SITAF, minutos [00:00:00 a 00:15:25]; 5.ª Para justificar a alteração da matéria de facto nos termos requeridos, o recorrente invoca ainda o meio de prova documental, e por referência aos seguintes documentos: Documento N.º 4, junto com a Contestação das RR.

    , de fls. , dos autos, Documento N.º 6 junto com a Contestação das RR.

    , de fls. , dos autos e documentos Números 5, 6, 7, e 8, junto à p.i.

    .

  4. Considerando toda a prova aqui exposta, não podemos concordar com a fundamentação constante da página II da sentença recorrida, e na qual se apresentam as justificações para a falta de prova relativamente aos pontos a) e b). De facto, é inegável que o ramo de madeira se espetou por baixo do veículo do A., e é inegável que o A., após o acidente, ficou com a caixa de velocidades a não meter bem as velocidades, sobretudo a partir da terceira velocidade. Se nunca antes havia o A. sentido qualquer dificuldade com a caixa de velocidades, é razoável que este dano em concreto tenha sido provocado pelo acidente. Não há outra explicação razoável.

  5. Mais a mais, um dano daquele tipo não se configura como um dano normal para um veículo daquele género, sendo certo que se o A. ia a ultrapassar um veículo em plena auto-estrada, certamente que o fazia em 5º ou 6º velocidade, o que significa que a caixa de velocidades funcionava normalmente. Acresce que ninguém vai querer liquidar uma conta como a que o A. liquidou se efetivamente os danos não tivessem existido, e nem as reparações em causa dizem respeito a reparações programadas e conforme o livro de reparações.

  6. Todos os depoimentos prestados estão em consonância com a documentação junta aos autos. É verdade que pode existir algum pequeno desfasamento quanto às datas da reparação, data de entrega do veículo junto da oficina, tempo de privação, tempo de reparação... Contudo, a verdade é uma, quem se vai recordar, em concreto, de datas de há 4 anos atrás? É preciso ter em consideração que o julgamento realizou-se 4 anos depois, já a memória da parte e das testemunhas para datas se dissipou um pouco.

  7. Se a parte e as testemunhas se recordassem em concreto das datas é que seria de estranhar... Ora, não é uma pequena incongruência de depoimentos quanto a datas, e veja-se que mesmo que ela exista é muito pouco relevante, que pode servir para afastar a credibilidade dos demais depoimentos e elementos documentais já referenciados.

  8. O tribunal a quo não podia deixar de atender aqueles danos na caixa de velocidades, pois que são danos previsíveis, e consentâneos com toda a documentação junta aos autos. Todos os factos dados como provados constituem causa daquele dano, e no plano naturalístico, sem aqueles factos o dano não se teria verificado. Sendo certo que, se dúvidas existissem, então sempre poderia o tribunal julgar dentro dos limites que tivesse por provado, fixando a indemnização por equidade.

    Sem prescindir, 11.ª Com base no disposto no art.º 12, nºs 1, 2 e 3 da Lei nº 24/2007 de 18/07, ao contrário do que entendeu o tribunal a quo, competia efetivamente às RR. ilidir a presunção de culpa que impendia sob as mesmas quanto ao incumprimento ou cumprimento defeituoso da obrigação de proporcionar aos utentes da via em causa as condições de segurança indispensáveis ao processamento na mesma do trânsito rodoviário.

  9. Desde logo porque foi no local verificada a causa do acidente pela autoridade policial, não sendo suficiente para afastar a presunção da lei o facto do A. ter deslocado um pouco o automóvel sinistrado para ir ter com a sua esposa que trabalhava na área de serviço logo ali junto ao local do sinistro...

  10. E mesmo que se considere não ter havido no local a verificação pela autoridade policial, o que se rejeita, a verdade é que a matéria de facto é toda consentânea para inferência de que houve um acidente quando o A. embateu contra um ramo de madeira que se encontrava na via.

  11. Mais: quanto à obrigatória confirmação das causas do acidente pela autoridade policial mostra-se comprovado que esta foi chamada ao local e tomou conta da “ocorrência” (cfr. o provado em 8). De facto, a GNR foi ao local, e até informou a 2.a demandada da “ocorrência”! – Cfr. Ponto de facto n.º 8, referenciado como provado. A GNR mais confirmou o local, a hora, o sentido de marcha, as condições da via, a intervenção do veículo, a sinalização vertical, a causa do sinistro... – Cfr. pontos de facto números 1, 2, 8, 9, 10, 11 e 12 da Sentença, e dados como provados. E se a GNR não tivesse ido ao local, e realizado o levantamento da ocorrência, certamente que o A. não teria pago 68,00 € pelo auto de participação do acidente, auto que foi confirmado em tribunal pelo GNR que o levantou. – Cfr. ponto de facto n.º 38, da Sentença, e dado como provado.

    Posto isto: 15.ª Levantar um auto de notícia, “tomar conta da ocorrência” e até informar a 2.º R. da “ocorrência”, não significa outra coisa que não o certificar o que ocorreu nos termos então possíveis.

  12. Termos estes que são os que decorrem do auto elaborado pela GNR no mesmo dia e local, conforme o teor de fls. 18, 19 e 20 dos autos. Neste sentido, foi respeitado o nº 2 do art.º 12 da Lei citada.

  13. Sem prescindir, mais se diga que a obrigatoriedade de confirmação de causas pela entidade policial não é um encargo probatório a cargo do lesado, como a Sentença a quo considera. É antes um procedimento imperativo para a autoridade, que fundamentalmente se destina a auxiliar a entidade concessionária na prova de um evento anómalo e estranho ao cumprimento das suas...

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