Acórdão nº 0938/14.8BALSB 0938/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução23 de Junho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A BP Portugal, S.A., com os sinais dos autos, instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC de Lisboa), em 7 de Julho de 2000, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra o Estado Português, para pagamento das seguintes quantias liquidadas: - Esc. 5.426.000.000$00 (valor corrigido) (€27.064.773,90), pelos prejuízos suportados em consequência da cessação de toda a actividade nas suas instalações de Santa Iria da Azóia e pelo prejuízo concorrencial decorrente desta situação, - Esc. 219.800.000$00 (€1.096.357,78), pelos encargos adicionais que suportou com a antecipação do encerramento das suas instalações sitas em Santa Iria da Azóia de 31.3.1998 para 31.7.1997, - E, adicionalmente àquelas quantias liquidadas, a pagar-lhe juros sobre as mesmas, à taxa legal de 7%, até ao seu efectivo pagamento; E ainda a condenação do Estado no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de 5% sobre o montante indemnizatório, prevista no artigo 829.º-A, n.º 4 do Código Civil, a qual deveria acrescer aos juros moratórios devidos.

2 – Na contestação apresentada em 20 de Novembro de 2000, o Ministério Público, em representação do Estado, além de impugnar os factos alegados pela A., alegou também existir prescrição do direito à indemnização desde finais de 1999.

3 – No despacho saneador de 20 de Outubro de 2004, o TAC de Lisboa julgou a excepção da prescrição improcedente.

4 - Inconformado, o Ministério Público, em representação do Estado, recorreu do despacho saneador, formulando as seguintes conclusões «[…] 1. A Autora intentou a 7 de Julho de 2000 contra Estado Português, acção declarativa de condenação, com processo ordinário "de responsabilidade civil nos termos do disposto no art.º 22.º e 268.º, n.º 4, da CRP, Decreto-Lei n.º 48.051, de 21 de Novembro de 1967 e art.ºs 51.º , n.º 1, alínea h), 52.º e 55.º, n.º alínea b) [sic] todos do Decreto-Lei n.º 128/84 de 27.04 e art.ºs 71.º e 72.º do Decreto-Lei n.º 267/85 de 16 de Julho.

  1. Com tal acção de responsabilidade civil extracontratual pretende a condenação do Réu Estado, a título principal, a pagar-lhe uma indemnização, no valor de Esc. 3.577.000.000$00 pelos prejuízos suportados pela BP em consequência da cessação de toda a sua actividade nas suas instalações de Santa Iria da Azóia e pelo prejuízo concorrencial decorrente desta situação.

  2. Para tal, alicerçou o seu pedido principal, num conjunto de factos, que na sua perspectiva, são directa ou indirectamente imputáveis ao Estado Português, mas que na sua maioria são da exclusiva responsabilidade da Sociedade Parque Expo 98 e que levaram ao encerramento e desactivação das suas instalações de Santa Iria de Azóia e à cessação da actividade industrial que a BP ali realizava.

  3. A PARQUE EXPO 98 é uma pessoa jurídica distinta do Estado, que se rege pela lei comercial, conforme resulta do Decreto-Lei n.º 88/93 de 23 de Março, pelo que os comportamentos imputados a esta são da sua inteira responsabilidade, não podendo os mesmos serem imputados ao Estado Português.

  4. No que respeita ao Estado, a causa de pedir de tais danos, ou seja, o acto ou facto do Estado que determinou o encerramento das instalações industriais de Santa Iria de Azóia, propriedade da Recorrida, é o acto de indeferimento do licenciamento pedido a 20 de Abril de 1995 do pipeline ponte/cais da Matinha/Santa fria de Azóia, resultante do parecer negativo do Ministério do Ambiente de 1996.02.05 e que lhe foi devidamente notificado 1996.02.07.

  5. E sendo que o facto essencial determinante da causa de pedir foi o indeferimento (inviabilização) do projecto de construção (ref.

    LT53-95 - 20 de Abril de 1995), e consequente licenciamento do pipeline ponte/cais da Matinha/Santa Iria da Azóia, em resultado do parecer negativo do Ministério do Ambiente de 1996.02.05, daqui resulta, que, pelo menos, desde finais de 1996, que a Recorrida/Autora tinha conhecimento do pretenso direito à reclamada indemnização.

  6. Mesmo que assim não se entenda, pelo menos desde 9 de Dezembro de 1996, que a Autora tem conhecimento que não lhe seria licenciada, em termos definitivos, a utilização da ponte/cais da Matinha, conforme informação dada pela APL relativa ao seu pedido de autorização para utilização da ponte/cais da Matinha, então licenciada à GDL.

  7. Acresce que, não é relevante para efeitos de prescrição, o facto de a Recorrida/Autora ter continuado a laborar nas instalações de Santa Iria da Azóia, até 31 de Julho de 1997, ao abrigo do licenciamento provisório de 28 de Janeiro de 1997, concedido até fins de Março de 1998.

  8. O Estado, Parque Expo98 e a Autora quando celebraram um Protocolo a 7 de Julho de 1997, pelo qual confiaram a uma Comissão a análise e decisão sobre estas matérias, não quiseram atribuir ao Protocolo natureza de convenção arbitral e à Comissão natureza de tribunal arbitral, como resulta do processo negocial precedente e dos termos em que foi celebrado o Protocolo, onde não se faz qualquer referência à arbitragem voluntária, nem ao diploma que a regula, nem aos princípios que a regem.

  9. Atenta a solução adoptada pelo Protocolo de 7 de Julho de 1997, a Comissão instituída por este, tem uma natureza atípica e informal, que funcionava à margem das regras imperativas da Lei n.º 31/86 e como tal não assume um carácter arbitral no sentido técnico utilizado pela Lei n.º 31/86 e pela CRP.

  10. Não sendo a Comissão um tribunal arbitral, a existência da Comissão, nunca poderia ser considerada, como o foi no despacho saneador, o facto interruptivo da prescrição decorrente de compromisso arbitral nos termos dos art.s. 318.º, 319.º, 320.º, 321.º, 323.º, 324.º e 325.º do CC.

  11. Pelo que, não tendo ocorrido qualquer causa de suspensão ou interrupção da prescrição, à data da propositura da acção a 7 de Julho de 2000, o direito da autora já se mostrava prescrito, atendendo que aquele prazo (de três anos estabelecido no art. 498.º, n.º 1 do Código Civil) se havia iniciado em finais de 1996 e terminado por prescrição nos finais de 1999.

  12. E constituindo a prescrição uma excepção peremptória, nos termos dos art.s 493.º, n.º 1 e n.º 3, e 496.º do CPC, aplicáveis por força do disposto no art. 5.º do CPTA, deveria o tribunal a quo ter julgado procedente a referida excepção.

  13. No caso presente, é manifesta a prescrição o direito de indemnização da Autora, desde finais de 1996, pelo que, ao decidir que o prazo se iniciou após a interrupção dos trabalhos definitivos da Comissão a 26 de Abril de 1999 ou a 29 de Março de 2000, e consequentemente o referido direito não estava prescrito, incorreu erro de julgamento.

  14. Por tudo o exposto, o despacho saneador, de que ora se recorre, deve ser revogado, por violador, do preceituado nos art.s 493.º, n.º 1 e n.º 3, e 496.º do CPC, aplicáveis por força do disposto no art. 1.º do CPTA e art.s 498.º, n.º 1, 318.º, 319.º, 320.º, 321.º, 323.º, 324.º e 325.º, do Código Civil, e, em consequência, julgar-se procedente a excepção peremptória de prescrição, absolvendo o Réu Estado Português do pedido, contudo FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS JUSTIÇA.

    […]».

    5 – Notificada para contra-alegar, a BP Portugal, S.A. apresentou as seguintes conclusões «[…] A) Questões prévias - trânsito em julgado do despacho saneador recorrido e inadmissibilidade do presente recurso a. Nos termos do artigo 685.º, número 6, do CPC, aplicável ex vi do artigo 72.º da LPTA, é na sua alegação de recurso que o recorrido pode impugnar a admissibilidade e a tempestividade do recurso.

    b. O despacho saneador recorrido já transitou em julgado em 1 de Novembro de 2004, beneficiando, desde então, da força de caso julgado formal no processo (artigos 671.º e 672.º do CPC, aplicáveis ex vi dos artigos 1.º, 72.º e 102.º da LPTA).

    c. Com efeito, o despacho recorrido foi proferido oralmente e imediatamente notificado às partes, ambas presentes e devidamente representadas, na sessão da audiência preliminar realizada em 20 de Outubro de 2004, sendo pois desta data de 20.10.2004 que se contou o prazo de dez dias para a interposição de recurso daquele despacho, nomeadamente por aplicação do disposto no artigo 685.º, número 2, do CPC, na redacção então aplicável (norma aplicável ex vi dos artigos 1.º, 72.º e 102.º, todos da LPTA).

    d. Assim e ao contrário do que sustenta o Recorrente a fls. 2330 dos autos, o prazo de interposição de recurso de despachos orais não se conta da data de disponibilização da respectiva acta às partes, aliás, nem sequer documentada nos presentes autos.

    e. O referido prazo de recurso terminou, pois, em 1 de Novembro de 2004, pelo que o recurso interposto quatro dias úteis depois, em 5 de Novembro de 2004, foi intempestivo.

    f. Note-se que o requerimento foi apresentado fora de prazo sem que o Ministério Público tenha, previamente, informado que iria usar da faculdade prevista no artigo 145.º do CPC, o que viola o entendimento já fixado nestes autos, com força de caso julgado formal (artigo 671.º, número 1, do CPC, ex vi dos artigos 1.º, 72.º e 102.º da LPTA), nomeadamente no despacho de fls. 1843, proferido em 28-02-2008.

    g. Em qualquer caso e por mera cautela, sempre se impõe alegar que as normas do artigo 145.º, números 5 e 6, do CPC, são inconstitucionais quando interpretadas no sentido de ser admissível a prática de atos processuais pelo Ministério Público, dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, sem que, pelo menos, a sua validade fique dependente da emissão de uma declaração no sentido de pretender praticar o acto nesses três dias (por violadoras dos princípios da igualdade e do direito a um processo equitativo, consagrados nos artigo 13.º, n.º 1, e 20.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

    h. Mesmo que assim não se entendesse, impunha-se considerar, tendo em conta o disposto no artigo 156.º, número 1, conjugado com o artigo 160.º, número 1, ambos do CPC, que a nulidade por omissão de pronúncia...

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