Acórdão nº 0783/11.2BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução22 de Junho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL,S.A., com os sinais dos autos, e em que é Recorrida, A………………, S.A.

, também sinalizada nos autos, apresentar arguição de nulidade, nos termos do art. 125º, nº 1, do CPPT e art. 615.º, n.º 1, al. d), e 4, do CPC, do Acórdão, proferido em 09/03/2022, que negou provimento ao recurso, com os seguintes fundamentos: 1.

O presente acórdão representa uma gravíssima decisão-surpresa como infra se demonstrará.

2.

De facto, ninguém contava com esta decisão, nem a Recorrida nas suas melhores previsões.

3.

A gravidade e importância da presente decisão-surpresa é tanto maior quanto a impossibilidade de interposição de recurso ordinária da mesma.

4.

Assim, analisado o douto acórdão constata-se que o mesmo padece de manifesta nulidade, em virtude da falta de pronúncia sobre questões que devia apreciar e a pronúncia sobre questões que não devia conhecer.

5.

Considerando que o presente Acórdão não é suscetível de recurso ordinário, a ora Recorrente vem apresentar reclamação para o mesmo tribunal, nos termos do artigo 125.º, n.º 1, do CPPT e artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e 4, do CPC.

A – Da pronúncia sobre questões que não devia conhecer 6.

Como consta do processo, a Recorrida pretendeu, somente, a anulação da liquidação da taxa com fundamento em: o erro de direito - Violação do princípio da legalidade; i) Da alegada aprovação do projeto e não do licenciamento do acesso; ii) Da alegada construção de acesso entre duas estradas públicas e não de acesso ao centro comercial; iii) Da alegada inaplicabilidade da alínea g), do n.º 1, do artigo 15.º do DL 13/71 por se tratar de estabelecimento comercial; - Da violação dos princípios da proporcionalidade e adequação; - Do erro de facto - Da área de incidência da taxa; 7.

Como se vê, de entre os vários vícios, a Recorrida também alega a construção de acesso entre duas estradas públicas e não de acesso ao centro comercial; 8.

Pois bem, a Recorrente na sua contestação invocou factos a demonstrar a existência de acesso direto de uma estrada nacional ao centro comercial.

9.

Confrontado com estes factos o tribunal de primeira instância não abordou esta questão, ou seja, pronunciou-se no pressuposto de que o acesso em discussão se fazia de modo direto a uma estrada nacional.

10.

Para o efeito, basta atentar no que é dito na sentença: A Impugnante alega que, no ano de 2008, promoveu junto da Câmara Municipal de Guimarães o licenciamento da expansão do conjunto comercial denominado “A……………..”, com acesso rodoviário à EN 105, tendo acordado com aquela a construção de troços rodoviários a suas expensas, mas realizadas por conta do Município de Guimarães, em vista à satisfação das necessidades providas pelo Município Adjudicante. Defende, por isso, que tratando-se de uma obra que tem natureza pública estava apenas sujeita a aprovação e não a licenciamento, pelo que não estaria sujeita a tributação, nos termos do artigo 11.º, alíneas a) e c) do DL 13/71 de 23 de Janeiro.

Contrapõe a entidade impugnada que o que está em causa não é a construção dos aludidos troços rodoviários, mas sim a possibilidade de uma pessoa colectiva de direito privado poder estabelecer um acesso ao seu prédio urbano através de uma infra-estrutura integrada no domínio público rodoviário do Estado (EN 105 e Variante à EN 206), concluindo que o acto administrativo de licenciamento é a forma legalmente prevista na legislação de protecção às estradas nacionais para permitir a realização da obra (estabelecimento de acessos), tendo observado, na íntegra, o princípio da legalidade.

Apreciando. (sublinhado nosso) 11.

Resumindo o que acima se diz, o tribunal de primeira instância põe em confrontação as posições das partes com o seguinte pressuposto: ▪ A Impugnante alega que, no ano de 2008, promoveu junto da Câmara Municipal de Guimarães o licenciamento da expansão do conjunto comercial denominado “A……………….”, com acesso rodoviário à EN 105, ▪ Contrapõe a entidade impugnada que o que está em causa não é a construção dos aludidos troços rodoviários, mas sim a possibilidade de uma pessoa colectiva de direito privado poder estabelecer um acesso ao seu prédio urbano através de uma infra-estrutura integrada no domínio público rodoviário do Estado (EN 105 e Variante à EN 206), 12.

Portanto, o TAF de Braga não questiona o acesso rodoviário à EN 105 e à Variante à EN 206 por parte do Centro Comercial, tendo-se debruçado sobre a natureza da obra desta ligação.

13.

Já todos vimos o que se passou: o TAF de Braga ignorou as alegações das partes e socorreu-se da jurisprudência que melhor se enquadrava ao assunto.

14.

Efetivamente, pelo tribunal é dito: Assim, no caso dos autos, importa aferir se estamos perante uma obra da iniciativa do Município de Guimarães, pois neste caso estaria apenas sujeita a aprovação por parte da Entidade Impugnada, nos termos do artigo 11º, alínea a), supra transcrito, não estando em consequência abrangida no âmbito de incidência da taxa prevista no artigo 15º. (cfr: página 23 da sentença) 15.

Ou seja, a questão do acesso direto à estrada nacional é ultrapassada, o mesmo será dizer, aceite, pois caso aquele não existisse e fosse confirmado pelo TAF de Braga, então não fazia sentido sequer estar-se a apreciar a natureza da obra.

16.

E tanto é assim, que o tribunal afirma que …não sendo possível invocar, para efeitos de tributação, o benefício que a Impugnante vai retirar da orientação do tráfego das EN 105 para o Centro Comercial, através da via municipal Rua …………. que contorna o ……….… (cfr: página 25 da sentença) 17.

Repete-se o que o tribunal de primeira instância disse: o benefício que a Impugnante vai retirar da orientação do tráfego das EN 105 para o Centro Comercial,… 18.

Efetivamente qual a vantagem da obra efetuada pela Recorrida se a mesma não fosse orientar o trânsito para o seu estabelecimento? 19.

Assim, o acesso direto da EN 105 ao centro comercial existe independentemente da natureza das suas ligações, isto é, sejam de natureza municipal ou particular.

20.

O TAF de Braga aceitou aquele acesso direto e respetivo benefício, mas questionou a natureza da obra do acesso para isentar a Recorrida do pagamento de taxa.

21.

Esta questão da ligação direta ao centro comercial foi decidida pelo TAF de Braga e transitou em julgado (artigo 628.º do CPC).

22.

E foi perante esta posição assumida pelo tribunal de primeira instância - da existência de aceso direito à estrada nacional - que a Recorrente interpôs recurso para o STJ (matéria de direito), já que se a questão fosse a existência do acesso direto (matéria de facto), então teria interposto recurso da matéria de facto para o TCA Norte.

23.

Chegados aqui a Recorrente é surpreendida pelo STA que ignora aquela decisão transitada em julgado e vem dizer que, afinal, a EN 105 liga somente a estradas municipais circundantes do centro comercial.

(cfr: página 31 e 32 do acórdão) 24.

Se fosse como defende o STA, a liquidação da Recorrente, além de não ter fundamento legal, estaria ferida pelo vício da usurpação de poder, ao taxar obras sob jurisdição municipal.

25.

Ora, a Recorrente não veio a este tribunal abordar a questão do acesso direto ou não à estrada nacional porque o tribunal de primeira instância não o questionou, deu-o como assente.

26.

Por sua vez, a Recorrida não interpôs recurso subordinado quanto a esta questão, pelo que ocorreu trânsito em julgado da mesma (artigo 628.º do CPC).

27.

Portanto, o STA está proibido de se pronunciar sobre matéria já transitada em julgado.

28.

Efetivamente, o STA não pode fazer tábua rasa do recurso da Recorrente e considerar que não existe qualquer acesso do Centro Comercial à EN 105 mas apenas uma ligação entre a EN 105 e as ruas municipais circundantes do centro comercial. (cfr: página 32 do acórdão) 29.

Repete-se: se fosse esse o entendimento do tribunal de primeira instância, a Recorrente teria recorrida daquela decisão para o TCA Norte e não abordaria exclusivamente a matéria de direito - natureza das obras -, como fez neste tribunal.

30.

Acresce que nem sequer é permitido ao STA saltar da questão da natureza da obra para outras questões tais como: ▪ a legalidade da liquidação da ampliação de pavimentos de instalações servidas por acessos à estrada, (cfr: página 32 do acórdão); ▪ a qualificação do centro comercial como instalação industrial para efeitos das normas de proteção rodoviária (cfr: página 34 do acórdão) 31.

É que o TAF de Braga não se pronunciou sobre estas questões, não tendo, inclusive, afirmado que tais questões ficavam prejudicadas atenta a alegada natureza pública da obra.

32. O que o TAF de Braga decidiu foi que: a liquidação de taxa devida pelo acesso direto de estrada nacional a centro comercial entretanto ampliado era válida, mas como esse acesso tinha natureza pública ficaria isento de taxa ou porque (i) a obra estava sujeita a aprovação (cfr: alínea a), do artigo 11.º do DL 13/71 de 23 de janeiro e página 25 da sentença) ou porque (ii) teria interesse público (cfr: alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º do DL 13/71 de 23 de janeiro e página 26 da sentença).

33.

Na verdade, para se apreciar da isenção da taxa é pressuposto que a mesma seja válida, e foi isso que fez o TAF de Braga.

34.

Portanto, o TAF de Braga entendeu que a liquidação era válida, não pondo em causa a ampliação ou a natureza do centro comercial, sendo que esta decisão transitou em julgado (artigo 628.º do CPC).

35. O que o TAF de Braga decidiu foi que a obra do acesso deveria ser isenta de taxa, pressupondo a sua legalidade, sob pena do vício de usurpação de poder por parte da Recorrente.

36.

Também aqui, o STA está proibido de se pronunciar sobre matéria já transitada em julgado.

37.

Sem prejuízo do vindo de expor, sempre se dirá que relativamente à suscetibilidade da liquidação de taxas devidas pela ampliação da área servida pela estrada nacional, a mesma foi admitida pela Ex.ma...

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