Acórdão nº 1418/19.0T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO M. J.

veio instaurar a presente acção declarativa (1) contra M. M.

e esposa, M. E.

, e M. G.

e esposa, A. J.

, deduzindo o pedido de que estes sejam “condenados a: reconhecer que o Autor é comproprietário e compossuidor de 1/10 do prédio urbano, composto de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, garagem e logradouro, sito na Avenida ...

, nº …, em Bragança, inscrito na matriz predial da União de Freguesias da ..., ... e ... sob o artº ...º (correspondendo ao anterior artigo ...

da extinta freguesia ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...

/19860809; reconhecer ao Autor o direito de preferência na aquisição da quota de metade (5/10) do aludido prédio urbano, transmitida pelos primeiros aos segundos Réus por respetiva escritura pública de compra e venda celebrada em 11 de maio de 2019, e, por via disso, o direito de haver para si aquela mesma quota sobre o mesmo prédio urbano; reconhecer que tal direito de preferência é exercido mediante o pagamento por parte do Autor aos primeiros RR da quantia de 125.000,00 €, correspondente ao valor da proposta negocial que lhe foi dirigida por aqueles e que o Autor recebeu, aceitou e comunicou tempestiva e devidamente”.

Para o efeito, alegou factos tendentes a demonstrar que é comproprietário do identificado prédio e é titular do direito de preferência na venda escriturada em 11 de Maio de 2019 mediante o pagamento do indicado valor de € 125.000,00, correspondente ao da comunicação para preferência que os vendedores lhe fizeram por carta datada de 23 de Novembro de 2018, por si aceite.

Os RR. apresentaram contestação e nesta invocaram excepções de caducidade e renúncia, impugnaram parte dos factos articulados pelo A., tendo o segundo Réu deduzido reconvenção.

O Autor apresentou réplica e respondeu às excepções.

Designada a audiência prévia, destinada aos fins previstos no n.º 1 do artigo 591.º do C. P. Civil, e frustrada a conciliação das partes, foram estas aí notificadas da intenção do Tribunal de conhecer, de imediato, do mérito da causa, pelo que lhes foi facultada a pertinente discussão de facto e de direito. Seguidamente, foi determinado que se fizessem os autos conclusos, a fim de ser proferido despacho saneador por escrito.

No despacho saneador, após não ter sido admitida a reconvenção, considerando que o estado do processo permite, sem necessidade de mais provas, a apreciação dos pedidos e excepções deduzidos, passou-se de imediato a proferir sentença, tendo, no final, sido proferida a seguinte decisão: “Pelo exposto, julgo improcedentes as invocadas excepções de caducidade e renúncia e procedente a acção e, em consequência, declaro que o Autor é comproprietário e compossuidor de 1/10 do prédio urbano, composto de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, garagem e logradouro, sito na Avenida ...

, nº ..

, em Bragança, inscrito na matriz predial da União de Freguesias da ..., ... e ... sob o artº ...º (correspondendo ao anterior artigo ...

da extinta freguesia ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...

/19860809; declaro que o Autor é titular do direito de preferência na aquisição da quota de metade (5/10) do aludido prédio urbano, transmitida pelos primeiros aos segundos Réus por respectiva escritura pública de compra e venda celebrada em 11 de maio de 2019, e, por via disso, o direito de haver para si aquela mesma quota sobre o mesmo prédio urbano, mediante o pagamento por parte do Autor aos primeiros RR da quantia de € 125 000, 00; consequentemente, declaro o Réu M. G. substituído pelo Autor M. J. na escritura pública de compra e venda, celebrada em 11 de maio de 2019, da identificada quota (5/10) do prédio urbano, composto de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, garagem e logradouro, sito na Avenida ...

, n.º ..

, em Bragança, inscrito na matriz predial da União de Freguesias da ..., ... e ... sob o artigo ...

(correspondendo ao anterior artigo ...

da extinta freguesia ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...

/19860809.

Condeno os Réus nas custas da acção, cujo valor, para o efeito, é de € 125 000, 00); e o Réu M. G., nas custas da reconvenção, cujo valor, para o efeito, é de € 82 500, 00 (cf. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do C. P. Civil).

Registe, notifique e diligencie pelo registo da acção (cf. artigos 3.º, n.º 1, alínea a), 8.º, n.º 1, alínea b), e 8.º-C, n.º 2, do Código do Registo Predial).

”.

*Inconformados com essa decisão, apresentaram os RR. e reconvintes M. M.

e esposa, M. E.

, e M. G.

e esposa, A. J.

recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizaram com a apresentação das seguintes conclusões: 1. Do indeferimento da reconvenção; - A decisão de indeferimento da Reconvenção, deduzida pelo 2º Réu, padece de todo e qualquer fundamento, pois limita-se a remeter para os preceitos legais; - Ora indubitavelmente a Reconvenção nasce, precisamente, dos dois pedidos deduzidos pelo Autor, e a eventualidade da sua procedência – como veio a acontecer – para além dos mesmos; - Deixando o 1º Réu de ser comproprietário, e a Decisão ter condenado, para além do pedido, impondo a sua substituição (alteração subjetiva, sem mais) no registo, é, pois, a ação o momento próprio para reclamar os respetivos direitos ou créditos, enquanto arrendatário comercial (preferente) e dono do estabelecimento comercial, no rés-do-chão do prédio, itens 74º a 77º; - A atuação processual do 2º Réu, ao reclamar o reconhecimento de créditos (benfeitorias e despesas relativas à coisa) e compensação em virtude do peticionado pelo Autor (entrega dos 5/10 comprados) não justificaria uma ação autónoma, integrando-se, pois, no artigo 265º, nº 2, al. b) e c) do C.P.C., tendo a Decisão recorrida violado esta disposição legal o que fica invocado expressamente, além do artigo 615º, nº 1, al. b) e c) do mesmo diploma legal.

  1. Da condenação para além do pedido, Da impossibilidade de concretização, da condenação para além do pedido, em termos práticos e legais.

    Da Decisão para lá do pedido, Para além da Decisão recorrida condenar para lá do pedido, tal condenação é inconcretizável em termos de registo, uma vez que a ação não se encontra registada, a substituição do adquirente pelo preferente na titularidade do direito que o primeiro adquiriu sobre a coisa, deverá ter em conta o contrato que está na base do negócio – a preferência.

    Como o negócio ou contrato que está na base da decisão de substituição do sujeito (preferente pelo adquirente), não é o mesmo, nem o preferente tão pouco preferiu pelo valor do negócio registado, fácil será de concluir que, quer a deliberação do Conselho Técnico do Instituto dos Registos e Notariado nº 170/2008, nem os Acórdãos 855/16.7T8AMD.L1-2 e Ac. do STJ de 24/04/2014 in sítio da net IGFEJ – Proc. nº 353/2002.P1.S1, têm aplicação ao presente caso, já que naqueles terá sido exercida a preferência (porque foi omitida a comunicação para o efeito…) pelo valor pelo qual foi celebrado o contrato de transmissão do bem, o que não aconteceu nestes autos, pois o contrato que serviu de base ao registo, foi efetuado pela quantia de euros 210.000,00 e a preferência que o Autor/Recorrido diz ter exercido corresponde à quantia de euros 125.000,00, ousa-se afirmar que neste caso nem de preferência se pode falar… Violou a Decisão, desde logo, o artigo 615º, nº 1 al. e) do C.P.C.

    Igualmente a Decisão violou as alíneas b), c) e d) do referido preceito, pois é evidente uma obscuridade na Decisão, além de errónea interpretação da Deliberação do Conselho Técnico do I.R.N. e jurisprudência referida.

  2. O tribunal deixou de se pronunciar sobre o que é o direito de preferência como devia tê-lo feito, tanto que é este instituto legal que está em causa.

    Direito de preferência legal; A preferência pressupõe um despique entre duas ou mais pessoas para aquisição de um bem (não precisando o preferente de oferecer qualquer valor); O preferente é, pois, um primus inter pares, tendo o privilégio de aproveitar uma oportunidade, ao pagar o preço justo que a lei do mercado dita, pois jamais, legislador algum pretendeu afastar as leis da livre concorrência.

    Vide artigo 1305º do C.C., vide se assim não fosse, o preferente artificiosamente podia criar situações de abuso de direito, e nítido enriquecimento sem causa.

    A comunicação obrigatória para preferir, é uma comunicação, e, caso não haja proposta de valor superior (de terceiro ou outro preferente), obrigará ou não a contratar, tratando-se, pois, de uma declaração de ciência e nada mais, tendo o artigo 416º do C.C. os efeitos bem delimitados, sendo apenas um dever jurídico, vide A. C. Guedes, O Exercício…, págs. 690 e 553.

    A comunicação não pode ser entendida como proposta alguma, sendo tal o oposto ao nosso direito positivo, pois o proprietário do bem objeto da preferência tem todo o direito de tirar dele a máxima utilidade, sendo a lei que até vai nesse sentido; vide artigo 419º, nº 2 e 2130º do C.C. e ainda 1032º, 844º, 819º e 824º do C.P.C.

    - No caso concreto, rigorosamente aconteceu o supra delineado, mas com uma decisão a contrário, com contornos originais… - O Tribunal absteve-se de toda e qualquer referência ao instituto da preferência, matéria alegada de itens 14º a 52º da Contestação.

    Os factos alegados pelos Réus, constam na integra da Decisão recorrida, sendo que a Decisão foi proferida a contrário, quiçá, precisamente por a essência da preferência, ter sido votada ao desprezo, pura e simplesmente.

    Vide pág. 10 da Decisão Quanto ao aspeto da preferência releva o seguinte: - O 1º Réu informou o Autor, que o 2º Réu estava interessado na compra de metade do prédio do qual era proprietário, carta recebida a 28/nov. de 2018.

    - O Autor exerceu a preferência, respondendo, que pelo preço que o 2º Réu ofereceu estava interessado em preferir (125.000,00€); - Como o 2º Réu estava interessado nos 5/10 do prédio, do qual por sinal era e é arrendatário e dono do estabelecimento...

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