Acórdão nº 1698/16.3PCCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução15 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo sumário n.º 1698/16...., do Tribunal Judicial da Comarca ..., ... – ... – Juiz ..., por despacho, de 14.04.2021 foi a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade aplicada ao arguido AA, em substituição da pena de 7 (sete) meses de prisão, revogada e determinado o cumprimento desta. Posteriormente, por despacho de 24.06.2021, que incidiu sobre requerimento apresentado pelo arguido (em 14.04.2021), invocando a prescrição da pena de substituição, o tribunal decidiu no sentido de não se encontrar prescrita a «pena principal».

  1. Inconformado com a decisão proferida em 14.04.2021 recorreu o arguido, formulando as seguintes conclusões: 1.ª A presente motivação visa essencialmente discutir os fundamentos de facto e de direito que levaram o Tribunal a quo a decidir, a 14/04/2021, pela revogação da pena substitutiva de prestação de trabalho a favor da comunidade, decretada na sentença transitada em julgado a 02/02/2017, sendo em tal aresto o aqui recorrente condenado numa pena de 7 meses de prisão, substituída por 210 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade.

    Mas, antes de mais, como questão prévia, 2ª O prazo de prescrição normal da pena de substituição de prestação de trabalho a favor da comunidade nos presentes autos é de quatro anos contados do trânsito em julgado da sentença que a determina.

    1. Tal prazo atingiu-se em 02/02/2021, sendo necessário verificar se alguma causa de interrupção ou suspensão determinou o seu alargamento temporal, considerando as causas legais e taxativas de interrupção e suspensão da prescrição das penas criminais – cfr. a respeito dessa taxatividade o decidido no Acórdão da Relação de Coimbra de 15/01/2020 (LUÍS TEIXEIRA).

    2. Ora, o condenado nunca iniciou o cumprimento e execução da pena de substituição nos presentes autos, conforme se comprova pelas informações da DGRSP nele constantes.

    3. Existe nos autos um plano de prestação de trabalho datado de 23/05/2017 que prevê o necessário cumprimento prévio das medidas de trabalho determinadas no âmbito dos processos 1808/15.... e 74/13.... para se poder sequer iniciar o cumprimento da pena dos presentes autos.

    4. Tal plano de trabalho não foi sequer homologado, ou não homologado, por despacho judicial, não se incidindo sobre esta qualquer pronúncia.

    5. Não se acham verificadas quaisquer causas de suspensão especificadas no art. 125º nº 1 porquanto: a) Nenhuma disposição legal impediu o cumprimento ou o início da execução da pena de substituição; b) O arguido não foi declarado contumaz nos presentes autos; c) O arguido não esteve a cumprir qualquer pena ou medida de segurança privativas da liberdade; d) O arguido não foi condenado em pena de multa.

    6. Não se acham, do mesmo modo, verificadas quaisquer causas de interrupção especificadas no art. 126º do CP, porquanto: I. A execução da pena não chegou a efetivar-se ou sequer a iniciar-se; II. O arguido não foi declarado contumaz nos presentes autos.

    7. Sendo relevante notar a natureza ativa do cumprimento da específica pena de substituição em causa nos autos – a de prestação de trabalho a favor da comunidade -, por oposição à índole tendencialmente passiva da pena de suspensão da execução da pena de prisão, em que o mero passar do tempo conta como tempo de execução.

    8. E que, no caso concreto dos presentes autos, todas as informações dadas pela DGRSP demonstram que a execução da pena não se chegou, sequer, a iniciar, não tendo sido homologado o plano pelo Tribunal a quo.

    9. Para além disto, a suspensão da prescrição determinada no primitivo art. 7º nº 3 da Lei 1-A/2020, que regulou as medidas restritivas implementadas por efeito da pandemia COVID-19 entre 13 de março de 2020 e 3 de junho de 2020, não se aplica à prescrição das penas e medidas de segurança em que os arguidos foram condenados antes do período pandémico porque isso seria uma clara violação da proibição da retroatividade in pejus da lei penal, atacando diretamente qualquer interpretação que o consinta o disposto no art. 29º nºs 1 e 4 da Lei Fundamental.

    10. De igual modo, a suspensão da prescrição determinada no mais recente art. 6º-B n.º 3 da Lei 1-A/2020, vigente entre 26 de janeiro de 2021 e 6 de abril de 2021, também se não aplica, no que à prescrição das penas diz respeito, às condenações transitadas em julgado em data anterior a 13 de março de 2020, pelos mesmos motivos.

    11. Tal posição tem sido largamente seguida na variadíssima literatura jurídica que se seguiu ao dealbar da pandemia e da legislação “pandémica” em Portugal, sendo disso exemplo RUI CARDOSO e VALTER BAPTISTA – in Cadernos do CEJ, “Estado de Emergência – COVID-19 Implicações na Justiça”, Abril de 2020, 11.3 – Jurisdição Penal e Processual Penal, Parte II (Prazos substantivos), ponto 6, pp. 533 a 536 – e, na jurisprudência, seguida pelos recentes Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/07/2020 (JORGE GONÇALVES), de 09/03/2021 (VIEIRA LAMIM), e da Relação de Évora de 23/02/2021 (ANTÓNIO CONDESSO).

    12. O recorrente já invocou, nos autos, a prescrição da pena de substituição, pelos motivos expostos, por requerimento datado de 14/04/2021 (Ref.ª CITIUS...), antes mesmo de ser notificado do despacho recorrido, que lhe revoga a pena substitutiva já prescrita.

      Pelo que, 15ª Não se tendo verificado qualquer causa de suspensão ou interrupção da prescrição da pena substitutiva de PTFC, e considerando a data do trânsito em julgado e o prazo prescricional de quatro anos, nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 122º do CP, a pena de substituição determinada nos presentes autos atingiu a prescrição em 02/02/2021, prescrição que aqui novamente se invoca, como se invocou em 14/04/2021, com os efeitos extintivos da mesma legalmente previstos, prejudicando assim a possibilidade da sua revogação.

    13. Por conseguinte, prejudicada fica também a possibilidade de ressurgimento/execução da pena principal substituída de 7 meses de prisão.

      Sem prescindir, e por mera cautela de patrocínio, quanto às nulidades do art. 379º, 17.ª Mesmo que se não tivesse apercebido da possibilidade da prescrição da pena, a ocorrência dessa mesma prescrição criminal é um dado do conhecimento oficioso, e, portanto, sujeito, a pronúncia especificada por parte do Tribunal recorrido – cfr. Acórdão da Relação de Coimbra de 07/03/2018 (VASQUES OSÓRIO).

    14. O que, ao revogar a pena substitutiva sem primeiro resolver e tomar posição acerca da questão da prescrição, que, a verificar-se, prejudicaria a possibilidade de revogação, sendo uma questão do conhecimento oficioso sobre a qual se deveria pronunciar, feriu a decisão de revogação de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379º nº 1 al. c) do CPP.

      Mais, 19ª O arguido, por requerimento de 29/10/2020, na sua resposta à promoção de revogação do MP, invocou, nos pontos 16º a 19º a necessária substituição da PTFC, que se pretende revogar, por multa ou SEPP.

    15. Nestes termos, está também a decisão recorrida ferida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379º nº 1 al. c) do CPP, ao não decidir concretamente, de forma positiva ou negativa, sobre a requerida substituição da PTFC, ao abrigo do disposto no art. 59º nº 6 do CP.

      Mais ainda, 21ª No mesmo requerimento de 29/10/2020, por cautela de patrocínio, para o caso que só por mera hipótese académica se considera, nos pontos 20º a 23º, suscitou que, caso fosse de proceder com a revogação da suspensão da pena, lhe fosse determinado o cumprimento dessa pena de prisão de 7 meses em regime de permanência na habitação.

    16. Nestes termos, está também a decisão recorrida ferida de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 379º nº 1 al. c), ao não decidir concretamente, de forma positiva ou negativa, da aplicação do regime de permanência na habitação, em caso de revogação da pena substitutiva.

      Novamente sem prescindir, por cautela de patrocínio, 23ª Repetindo-se que não incidiu sobre o “plano de execução” de 23/05/2017 qualquer despacho, homologando-o ou não, nem qualquer pedido de alteração, verifica-se que o próprio Tribunal, no despacho recorrido, reconhece que estaria inviabilizada a possibilidade de iniciar o cumprimento da pena dos presentes autos.

    17. Mais reconhece que, segundo informação da DGRSP, “a EBT só o aceitaria a cumprir esta pena substitutiva se o mesmo completasse positivamente as execuções de trabalho nos outros processos pendentes”.

    18. Portanto, não apenas o início de cumprimento da pena nos presentes autos estaria condicionada ao cumprimento das horas de trabalho determinadas à ordem de outros autos, como estaria condicionada à avaliação positiva do trabalho do arguido, por parte da entidade à qual prestava o trabalho.

    19. Assim, dando-se por reproduzido o teor integral do requerimento de 29/10/2020 (Ref.ª CITIUS ...), relembrem-se três pontos, já ali assinalados: i. Em primeiro lugar, na data em que o referido plano de execução condicionado chega aos autos, o arguido teria que cumprir, em execução sucessiva, um total de 930 horas, o que corresponde a cerca de 6 meses de trabalho em exclusivo; ii. Em segundo, que o arguido já desde novembro de 2018 tinha suscitado o cúmulo jurídico das penas de cumprimento prévio à dos presentes autos, nos processos referidos no plano de execução, em especial, no processo 1808/15...., que corre termos no mesmo Juízo que os presentes, cúmulo que eliminaria as referidas penas substitutivas, e teria como consequência o início do cumprimento do presente – o que foi desconsiderado, estando neste momento a questão em recurso nesse Venerando Tribunal; iii. Por fim, repetindo, o referido plano de execução nunca foi homologado, ou não homologado, pelo Tribunal a quo.

    20. Neste quadro, a tese da “recusa tácita” do Ministério Público, que assenta em pressupostos que o mesmo MP poderia ter evitado pela devida promoção da tramitação processual tendente ao cúmulo das penas de cumprimento prévio, sendo um...

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