Acórdão nº 0217/16.6BESNT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução08 de Junho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XO DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mº. Juiz do T.A.F. de Sintra, constante a fls.195 a 202 do processo físico, a qual julgou procedente a presente impugnação intentada pela sociedade recorrida, "A…………, S.A.", tendo por objecto 243 liquidações de Imposto Único de Circulação (I.U.C.), relativas ao ano fiscal de 2012 e no valor total de € 27.717,87.

XApós notificação do recorrente (cfr.artº.639, nº.3, do C.P.Civil, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.T.) no sentido de apresentar um novo quadro de conclusões devidamente aperfeiçoado, este termina as alegações do recurso (cfr.fls.254 a 264 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: I-Relativamente aos 243 veículos dos autos, cujo suporte documental se consubstancia em “facturas de venda”, alega a Recorrida, por outras palavras, que não incide sobre si a sujeição em sede de IUC, na medida em que foram os denominados veículos alienados pela mesma antes da data da ocorrência do facto gerador de imposto, sem prejuízo de que, a norma de incidência subjectiva ínsita in n.º 1 do artigo 3.º do CIUC, admite que a pessoa em nome da qual o veículo se encontre registado possa demonstrar que não é a proprietária do veículo no período a que o imposto respeita e afaste assim a obrigação que sobre esta recai.

II-Salvo o devido respeito, que nesta sede se creia é muito, a argumentação supra não pode de todo proceder.

III-Porquanto o que se encontra efectivamente em causa, são os actos tributários stricto sensu que consubstanciaram as liquidações de IUC, relativas ao ano de 2012, sendo que, estabelece o n.º 1 do artigo 3.º do CIUC que “São sujeitos passivos do imposto os proprietários dos veículos, considerando-se como tais as pessoas singulares ou colectivas, de direito público ou privado, em nome das quais os mesmos se encontrem registados”.

IV-O legislador tributário ao referir in artigo 3.º, n.º 1, quem são os sujeitos passivos do IUC estabeleceu expressa e intencionalmente que estes são os proprietários (ou nas situações previstas no n.º 2, as pessoas aí enunciadas), considerando-se como tais as pessoas em nome das quais os mesmos se encontrem registados; V-De acordo com o acervo documental junto aos autos, o primeiro registo de propriedade dos veículos sob análise, no ano de atribuição da matrícula, encontrava-se à data da ocorrência dos factos tributários, em nome da “A…………, S.A.”, em situação activa, pelo que de acordo com o preceituado in artigos 1.º a 6.º do CIUC, se encontram reunidos todos os pressupostos de incidência objectiva, subjectiva, temporal, facto gerador do imposto e exigibilidade para a liquidação do IUC, referente ao ano de 2012; VI-De tudo quanto supra se expôs, resulta claro que os 243 actos tributários stricto sensu, ora em crise, relativos aos veículos cujo suporte documental se consubstancia em “Facturas de Venda”, não enfermam de qualquer vício de violação de lei, na medida em que à luz do disposto no artigo 3.º, n.º 1 do CIUC e do artigo 6.º do mesmo código, era a Recorrida, na qualidade de 1.ª proprietária, no ano de atribuição de matrícula, o sujeito passivo do IUC, tal como atesta a informação relativa ao histórico de propriedade dos veículos em causa, e que consta dos correspectivos autos.

VII-Não se pode deixar ainda de referir que a interpretação veiculada pela Contribuinte, ora Recorrida, se mostra totalmente contrária à letra e espírito da nossa Lei Fundamental, vulgo Constituição da República Portuguesa.

VIII-Como deve convir a ora Recorrida, o tão propalado princípio da capacidade contributiva, não é de todo o único, nem o principal princípio que enforma o sistema fiscal; IX-Ao lado deste, encontramos outros com a mesma dignidade constitucional, tais como o princípio da confiança e segurança jurídica, o princípio da eficiência do sistema tributário e o princípio da proporcionalidade.

X-Impondo-se por isso que, na tarefa interpretativa do artigo 3.º do CIUC, o princípio da capacidade contributiva seja articulado, ou se se preferir temperado, com aqueloutros princípios.

XI-A interpretação proposta pela Contribuinte, uma interpretação desconforme à realidade registral, é ofensiva do princípio basilar da confiança e segurança jurídica que deve enformar qualquer relação, mormente a jurídico-tributária.

XII-Neste sentido, atente-se à exposição de motivos referente à Proposta de Lei n.º 118/X, ou seja, à proposta de reforma global da tributação automóvel: «A presente proposta de lei procede à reforma global da tributação automóvel portuguesa, aprovando o Código do Imposto sobre Veículos (ISV) e o Código do Imposto Único de Circulação (IUC) e abolindo, ao mesmo tempo, o imposto automóvel, o imposto municipal sobre veículos, o imposto de circulação e o imposto de camionagem. Empreende-se, assim, pela primeira vez, uma reforma global e coerente dos impostos ligados à aquisição e propriedade dos veículos automóveis, figuras marcadas ao longo do tempo por um relativo abandono, disciplinadas por textos legais sem sistemática segura, nem princípio ordenador evidente.

(…) Visa-se, também, com esta reforma o aprofundamento do progresso que, nos últimos tempos, se tem feito ao nível da Administração tributária, particularmente no que respeita à gestão de um sistema de informação completo, organizado e fiável. Passando a tributação automóvel a formar um todo coerente, importa eliminar custos administrativos e de cumprimento, apostando na prevenção e controlo das situações de abuso e incumprimento.» XIII-Paralelamente, a interpretação dada pela Contribuinte, ora Recorrida, é ainda ofensiva do princípio da eficiência do sistema tributário, com óbvio prejuízo para os interesses do Estado Português.

XIV-Como refere, e bem, o Professor Doutor Albano Santos, “ (…) O imposto constitui uma realidade complexa, não só pelo vasto alcance dos problemas que coloca, mas também pelo facto de envolver sucessivas fases (da concepção à fiscalização) que, no seu todo, configuram um processo longo e dispendioso, dado o volume de recursos de vária ordem que exige. Neste quadro, a eficiência administrativa traduz a relação entre os custos financeiros decorrentes da existência do sistema fiscal e o valor das receitas que ele gera. (…) (…) É possível identificar outros custos associados à existência de um sistema fiscal, como sejam: os ‘custos administrativos’, que são predominantemente suportados pelo sector público e que se traduzem no valor do conjunto dos recursos económicos consagrados à manutenção de um sistema fiscal; e os “custos de sujeição”, que compreendem o conjunto dos encargos de diversa ordem que o sistema fiscal ocasiona aos cidadãos individualmente considerados, seja para o cumprimento das suas obrigações tributárias, seja para se eximir a elas.»; XV-A posição sufragada pela Contribuinte, neste acto Recorrida, é um entendimento que está nos antípodas daquele princípio e da própria reforma da tributação automóvel na medida em que, ao pretender desconsiderar a realidade registral, uma realidade que constitui uma pedra angular, na qual assenta todo o edifício do IUC, gera para a mesma, e em última instância para o Estado Português, custos administrativos adicionais, entorpecimento do desempenho dos seus serviços, ausência de controlo do tributo e inutilidade dos sistemas de informação registral; XVI-A argumentação veiculada pela Contribuinte, aqui Recorrida, representa uma violação do princípio da proporcionalidade, na medida em que o desconsidera no confronto com o princípio da capacidade contributiva, quando na realidade, a mesma dispõe e dispunha de mecanismos...

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