Acórdão nº 649/13.1TMFAR-E.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 – Relatório.

Em 2/2/2022, foi proferido despacho que determinou o seguinte: «sem prejuízo de a medida de acolhimento residencial aplicada à criança, (…), ter sido mantida por mais 6 meses nos termos do despacho de revisão de 5/1/2022, em 2/2/2022 “Pelo exposto, nos termos do artigo 58.º, alínea a), da LPCJP, determino que o (…) possa conviver com os pais todos os fins-de-semana em casa dos progenitores, recolhendo os pais o filho na casa de acolhimento às sextas-feiras pelas 18:00/19:00 horas e entregando a criança no mesmo local aos domingos pelas 18:00/19:00 horas.---Mais determino que o (…) possa conviver com os pais nas férias escolares da Páscoa durante o período de uma semana que deverá incluir o domingo de Páscoa.” Na sequência dessa decisão a Casa de Acolhimento “Refúgio (…)” enviou a comunicação de fls. 66, onde entre outras razões explicou que não autorizava a saída no fim de semana em causa porque não podia permitir a saídas das crianças já que podiam voltar com covid, que no entender da instituição o regime intermitente não é benéfico para o menor em causa e que no fim de semana em causa iria ser administrada a 2ª dose de vacina no menor.

Por despacho de 9/2/2022, o Tribunal manteve a referida decisão de 2/2/2022 quanto aos convívios da criança com os pais aí estabelecidos e determinou o que se segue: “Pelo exposto, mantém o Tribunal a decisão proferida em 2/2/2022 nos seus exactos termos, advertindo expressamente a Casa de Acolhimento de que deverá cumprir tal decisão e permitir a saída da criança, Paulo Pina, aos fins-de-semana para conviver com os seus pais nos termos aí definidos, sob pena de, não o fazendo, poder ser condenada em multa / sanção pecuniária compulsória de 3 UC (€ 306,00) por cada convívio incumprido de forma injustificada (artigo 829.º-A do Código Civil). Advirta ainda da possibilidade de a Casa de Acolhimento e respectivos representantes legais poderem incorrer na prática de crime de desobediência, previsto e punível pelo artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal em caso de novos incumprimentos injustificados dos convívios aos fins-de-semana determinados pelo Tribunal.” Foram prestadas informações pela Segurança Social (ATT) constantes de fls. 81 e ss.

O Ministério Público em 7/3/2022, promoveu no sentido de a Instituição ser condenada em multa e de ser extraída certidão para investigação da prática de um crime de desobediência nos termos advertidos no despacho de 9/2/2022.

Foi proferida decisão que (decisão recorrida): 1. Condenou, nos termos do artigo 41.º do RGPTC e 829.º-A do CC, o Refúgio (…), Instituição Particular Cristã de Solidariedade Social (IPSS), em multa fixada em 15 UC (€ 1.530,00).

  1. Ordenou a extracção de certidão para investigação criminal da prática pela referida IPSS e seus administradores de um crime de desobediência previsto e punível pelo artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, certidão essa contendo as peças processuais mencionadas na matéria de facto dada como provada na presente sentença e aí expressamente identificadas.

  2. Tendo em conta as participações já efectuadas ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, na pessoa do respectivo Exmo. Sr. Ministro, e ao Centro Distrital da Segurança Social de Faro, na pessoa da sua Exma. Sra. Directora, por despacho de 9/2/2022, ordenar a comunicação da presente decisão a tais entidades, advertindo-se do disposto no artigo 88.º da LPCJP quanto ao carácter reservado do processo. Mais solicite que seja comunicado por ambas as entidades a este Tribunal o resultado das referidas participações.

  3. Comunicar a presente decisão ao Exmo. Sr. Juiz Presidente desta Comarca, advertindo-se do disposto no artigo 88.º da LPCJP.

    Notifique os pais, a Casa de Acolhimento, a ATT e o Ministério Público. Registe.

    Considerando o aí exposto quanto a manter a Casa de Acolhimento a recusa de cumprimento dos convívios determinados por este Tribunal, bem como a disponibilidade dos pais para aceitarem a suspensão dos convívios aos fins-de-semana até à diligência de 1/4/2022 (convocada precisamente para se definir solução para o problema gerado pelo incumprimento da Casa de Acolhimento de tais convívios), julga-se ser de relevar a posição assumida pela ATT no sentido de estes serem suspensos até 1/4/2022, data em que os progenitores serão ouvidos. Tal decisão de suspensão de convívios até à referida data é única e exclusivamente motivada pela salvaguarda do bem-estar emocional da criança face ao comportamento da Casa de Acolhimento de impedimento de tais convívios, assegurando-se por essa via que a criança, (…), tanto quanto possível, não fique emocionalmente afectada pela ansiedade de não saber se irá ou não conviver com os progenitores nesses fins-de-semana.

    Pelo exposto, determina-se a suspensão de tais convívios aos fins-de-semana até à diligência de 1/4/2022.

    Dê conhecimento à ATT, aos pais, à Casa de Acolhimento e ao Ministério Público. Solicite à ATT que comunique por via da técnica gestora do caso pessoalmente à criança a presente decisão.

    Oportunamente, no dia 1/4/2022, o Tribunal tomará uma decisão quanto a tal questão, não se ouvindo a criança sobre o assunto, uma vez que já foi ouvida em 2/2/2022 e que importa não a melindrar.

    Aguardem, pois, os autos a realização da diligência no dia 1/4/2022.» Inconformado com tal decisão, veio o “Refúgio…” interpor recurso contra a mesma, apresentando as seguintes as conclusões do recurso (transcrição): « I. O presente recurso versa sobre a sentença proferida pelo Tribunal a quo no dia 11.03.2022, através da qual a ora Recorrente foi condenada, nos termos do artigo 41.º do RGPTC e artigo 829.º-A do Código Civil, numa multa fixada em 15 UC (€ 1.530,00), tendo sido, simultaneamente, ordenada a extração de certidão para investigação criminal da prática de um crime de desobediência.

    1. A sentença recorrida faz uma errada interpretação e aplicação da LPCJP, nomeadamente dos artigos 53.º, n.º 3, 58.º, n.º 1, alínea a) e 126.º, assim como do Regime de Execução do Acolhimento Residencial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 164/2019, de 25 de outubro, nomeadamente dos artigos 21.º, n.º 1, alínea m), artigo 22.º, alínea f), artigo 23.º, n.º 1, alínea e), artigo 24.º, alínea c), artigo 25.º, alínea d), artigo 26.º, alíneas a), f) e j) e artigo 28.º.

    2. A sentença recorrida faz, ainda, uma errada interpretação e aplicação do artigo 41.º da LPCJP e do artigo 829.º-A do Código Civil, sendo, também, nula ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, porquanto não fundamenta, em termos de direito, a aplicação destes dois normativos legais à situação da ora Recorrente.

    3. A matéria de facto provada constante da sentença não reproduz com exatidão e rigor as diversas informações constantes dos autos, incluindo conclusões e interpretações subjetivas do Tribunal a quo, as quais não são admissíveis e, por essa razão, vão impugnadas com o presente recurso.

    4. No ponto 1 da matéria de facto provada esqueceu-se o Tribunal a quo de incluir que, no despacho proferido no dia 05.01.2022, determinou a convocatória dos pais e da criança para serem ouvidos, conjuntamente com a técnica da ATT, mas também determinou a convocatória da técnica da Casa de Acolhimento para ser ouvida na mesma data, requerendo-se a V. Ex.ª a respetiva inclusão, tudo nos termos do próprio despacho de revisão datado de 05.01.2022.

    5. O ponto 4 da matéria de facto provada é uma mera falácia, que se impugna, na medida em que, como o Tribunal a quo deveria saber, a Recorrente, enquanto casa de acolhimento, não tem legitimidade para recorrer de qualquer decisão de aplicação, manutenção, alteração ou cessação de uma medida de promoção e proteção, nos termos do n.º 2 do artigo 123.º da LPCJP (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12.03.2008, proferido no âmbito do processo 625/08-1 pelo Exmo. Senhor Relator António Gonçalves, disponível em www.dgsi.pt), pelo que não se compreende a razão de se ter incluído na matéria de facto provada este ponto que deverá ser, consequentemente, eliminado.

    6. O Tribunal a quo esqueceu-se de incluir na matéria de facto assente que, ao contrário do vertido na decisão de 05.01.2022 e em violação do disposto no n.º 4 do artigo 54.º da LPCJP e alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º e alíneas a) e b) do artigo 25.º, ambos do Decreto-Lei n.º 164/2019, de 25 de outubro, na conferência realizada no dia 02.02.2022 a Técnica da ora Recorrente não foi ouvida.

    7. Esta introdução é tanto ou mais relevante para toda e qualquer decisão posterior quanto ao regime pretendido aplicar pelo Tribunal a quo, e que teria de obter necessariamente a prévia anuência da Recorrente, porquanto exigiria desta a prática de atos não compreendidos no seu normal funcionamento e/ou no seu regulamento interno.

    8. Tendo sido confrontada com o despacho proferido no dia 02.02.2022 de aplicação de um regime de residência alternada entre a Instituição e a família biológica, a ora Recorrente reagiu nos termos explanados no requerimento remetido ao Tribunal a quo no dia 04.02.2022 e que a decisão de que se recorre apenas transcreve um único parágrafo.

    9. Nesse requerimento, a Recorrente explica detalhadamente ao Tribunal a quo a sua impossibilidade objetiva, técnica, organizativa e logística de cumprir com o regime estipulado, não estando o cumprimento ou incumprimento do regime estabelecido dependente de qualquer ato de boa vontade da Recorrente, como se retira do ponto 12 da matéria de facto provada que, por essa razão, também vai impugnado.

    10. É falso que o despacho que foi notificado à Recorrente em 10.02.2022 seja fundamentado, impugnando-se o teor do ponto 11 dos factos provados.

    11. A este respeito, a Recorrente recebeu apenas a simples página da notificação lavrada pela Sra. Oficial de Justiça (…) sob a referência 123194721, através da qual foi informada de que o Tribunal a quo mantinha a sua anterior decisão e...

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