Acórdão nº 314/21.6T8BRG-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelALDA MARTINS
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães
  1. Relatório Por apenso à acção declarativa de condenação, com processo comum, que H. C.

    , residente no Caminho …, n.º .., em …, move a X, com sede em …, na Alemanha, o Autor veio intentar o presente procedimento cautelar comum, pedindo que seja determinado provisoriamente que a Requerida proceda à regularização e manutenção do seguro de doença Techniker Krankenkasse (TKK) - Segurança Social Alemã do Requerente, adstrito ao contrato de trabalho que foi celebrado, recolocando aquele na condição de beneficiário para acesso imediato a cuidados de saúde. Mais requer que seja fixado à Requerida o prazo máximo de dez dias para o referido efeito e que seja fixada uma sanção pecuniária compulsória não inferior a 100,00 € por cada dia de atraso no cumprimento.

    O Requerente alega, em síntese, que celebrou um contrato de trabalho com a Requerida no dia 1 de Abril de 2015. Após um longo período de baixa médica, apresentou-se ao serviço no dia 21 de Janeiro de 2020, mas a requerida não permitiu que retomasse o trabalho. Tal conduta configura um despedimento ilícito, na medida em que foi efectuado sem justa causa e sem precedência de processo disciplinar, razão pela qual o Requerente instaurou a acção principal contra a Requerida.

    Nessa acção, o Requerente formula o seguinte pedido: A - ser declarado ilícito o despedimento do Autor promovido pela Ré; B - em consequência, ser a Ré condenada a reintegrar o Autor, no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, correspondente ao escalão 9 de acordo com as funções para as quais foi contratado e exerce, como estabelecido no “Acordo Complementar de Agrupamento Tarifário BAP”, ou a pagar uma indemnização nos termos da lei aplicável, que no caso concreto é correspondente a doze meses de salários, no valor de 57,431.81 €; C - ser a Ré condenada a pagar ao Autor todas as quantias referidas, a título de créditos salariais que deveriam ter sido pagos pela Ré e não o foram, nomeadamente, a correcção / actualização do escalão salarial, no valor de 10,181.03 €; D - ser a Ré condenada a pagar ao Autor o subsídio de alimentação, subsídio de deslocações e trabalho suplementar de 143 horas, referente aos meses de Abril a Junho de 2015, no valor de 10,639.22 €; E - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os salários devidos desde a data do despedimento, em 21 de Janeiro de 2020, até à presente data, no valor de 59,607.26 €; F - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os salários que entretanto se vierem a vencer até ao trânsito em julgado do presente processo; G - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os proporcionais correspondentes a 30 dias de férias por ano de trabalho, não pagas e não gozadas, referentes a dois meses de férias após baixa médica e as referentes ao ano de 2020, de acordo com a legislação aplicável, no montante de 39,158.05 €; H - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os proporcionais a 12 meses a título de subsídio de Férias e subsídio de Natal, no montante de 9,571.97 €; I - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os montantes relativos ao subsídio de renda de casa, estipulados no contrato de trabalho, dos últimos 68 meses, que não foram pagos pela Ré, que confere ao Autor um acréscimo à remuneração base num total de 17,000.00 €; J - ser a Ré condenada a pagar ao Autor o complemento de reforma num total de 1,861.30 €, que deverá ser actualizado ao seu valor presente; K - ser a Ré condenada a pagar ao Autor o prémio de fidelidade num total de 960.00 €; L - ser a Ré condenada a pagar ao Autor o bónus referente à participação nos lucros da empresa, a calcular; M - ser a Ré condenada a pagar ao Autor uma quantia - a fixar pelo Tribunal – a título de indemnização por danos de natureza não patrimonial, causados na sequência do despedimento ilícito, nunca inferior a 50.000,00 €; N - ser a Ré condenada a pagar ao Autor os juros sobre as quantias invocadas, à taxa legal, desde a data em que se verificou o incumprimento até efectivo e integral pagamento; O - ser a Ré condenada a declarar o Autor como seu trabalhador à Segurança Social e às Finanças por todo o tempo que o Autor esteve ao seu serviço.

    Nessa acção, foi proferida sentença em 2/12/2021, julgando verificada a excepção dilatória de incompetência internacional do tribunal e absolvendo a Ré da instância, tendo sido interposto recurso pelo ora Requerente e aí Autor em 6/01/2021.

    Por outro lado, o Requerente alega na presente providência cautelar que é doente crónico com incapacidade parcial permanente e definitiva que carece de acompanhamento médico contínuo e de terapêuticas adequadas e reiteradas. Se o Requerente estivesse em exercício de funções, seria beneficiário do seguro de doença Techniker Krankenkasse - TKK (Segurança Social Alemã), como parte da sua retribuição mensal, e o acesso a tal assistência providenciar-lhe-ia todos os cuidados de saúde de que necessita. O apoio que o Requerente recebe do SNS português é manifestamente insuficiente para prover às suas necessidades actuais, dada a demora no acesso a consultas de diagnóstico e de especialidade e na concessão dos tratamentos. Por tal razão, a demora na tramitação da acção principal pode acarretar prejuízos irreparáveis, porque irreversíveis, na saúde do Requerente. Acresce que da adopção da presente providência não decorre qualquer prejuízo para os interesses da Requerida. Por outro lado, afirma que é competente para decidir a presente providência o Juízo do Trabalho da Comarca de Braga, onde corre a acção principal, ao abrigo do disposto no art. 35.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de Dezembro de 2012.

    O procedimento cautelar em apreço foi apresentado em 6/01/2022 e em 10/01/2022 foi proferido despacho a indeferir liminarmente o requerimento inicial por verificação da excepção dilatória de incompetência internacional do tribunal.

    O Requerente interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: «1. Não pretende o recorrente nas conclusões que se seguem, reduzir o objecto do presente recurso, que V.as Ex.as doutamente suprirão.

  2. Nos presentes autos, o Tribunal a quo indeferiu liminarmente a providência cautelar apresentada alegando a excepção dilatória de incompetência internacional do juízo do trabalho do Tribunal de Braga.

  3. O autor não pode conformar-se com a douta decisão proferida pelo Tribunal a quo pelo que da mesma interpôs recurso.

  4. Com o presente recurso pretende-se sejam apreciadas as seguintes questões, que reflectem as razões de discordância do recorrente com a douta sentença proferida: a) o erro na interpretação e aplicação do direito, pois no entender do recorrente o Tribunal a quo fez uma errada aplicação do direito; b) inexistência de transito em julgado da acção principal; c) a inverificação da incompetência internacional do Tribunal do Trabalho Português; d) omissão de pronúncia à questão do artigo 62.º do código de processo civil, e) omissão do reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia, pois no entender do recorrente não poderia ter sido indeferida liminarmente a providência cautelar por não existir incompetência internacional do juízo do trabalho, vícios que deverão ser corrigidos e cuja reapreciação se peticiona.

  5. A declaração de incompetência internacional invocada pelo Tribunal a quo encontra-se motivada numa análise crítica errada e tendenciosa, apenas com o intuito de não contrariar o pensamento proferido no processo principal. No entanto, o tribunal a quo não pode invocar uma decisão que não existe. A acção declarativa não se encontra transitada em julgado uma vez que o requerente interpôs recurso.

  6. O Tribuna a quo omite no presente caso a aplicação do artigo 35.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, independentemente da natureza da jurisdição, e regula a competência em matéria de contratos individuais de trabalho.

  7. O juízo do trabalho é internacionalmente competente para apreciar o presente procedimento cautelar de acordo com o artigo 35.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, que deve ser aplicado nos presentes autos. Este artigo diz expressamente que “… as medidas provisórias, incluindo as medidas cautelares, previstas na lei de um Estado-Membro podem ser requeridas às autoridades judiciais desse Estado-Membro, mesmo que os tribunais de outro Estado-Membro sejam competentes para conhecer do mérito da causa…”. No entanto, no caso dos autos, Portugal, também, é competente para conhecer do mérito da causa e resolver o litígio entre as partes.

  8. O Tribunal a quo menciona situações em que Portugal não é competente. Mas, não é este o caso dos presentes autos. No caso presente Portugal é competente para conhecer do mérito da causa e resolver o litígio entre as partes.

  9. O Tribunal a quo omite, também, que o mesmo Regulamento contém normas que regulam a extensão de competência e, também, o conhecimento oficioso da competência internacional por parte dos Estados-Membro, no caso Portugal, de acordo com o artigo 26.º do mesmo regulamento, circunstância que aqui deve ser aplicada uma vez que consta dos autos principais que a requerida foi devidamente citada pelo Tribunal a quo e compareceu a juízo.

  10. Da conjugação do artigo 28.º 1 com o art.º 26.º 1, conhecimento oficioso em matéria de competência internacional à luz das regras estabelecidas do Regulamento, nos casos em que o requerido domiciliado num Estado-Membro seja demandado no tribunal de outro Estado-Membro, apenas é permitido quando aquele não compareça em juízo ou quando comparecendo a sua intervenção no processo tenha tido como único objectivo a arguição da incompetência do Tribunal – o que aqui não se verifica.

  11. O art. 21.º do Regulamento estabelece que: 1. Uma entidade patronal domiciliada num Estado-Membro pode ser demandada: a) Nos tribunais do Estado-Membro em que tiver domicilio; ou b)...

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